quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

OS OUTSIDERS



Outsider

Por Honório de Medeiros

Poderíamos denominá-los outsiders lembrando-nos da tipologia criada por Norbert Elias. Talvez o conceito do sociólogo judeu-alemão não abarque os que irei estudar, mesmo tangencialmente. Não importa. Vou me apropriar do nome e utilizá-lo para o fim visado. Lógico que poderíamos denominá-los gauches, lembrando-nos de Carlos Drummond de Andrade. Aplica-se, aqui, o mesmo raciocínio anterior. Prefiro outsiders pelo significado etimológico que o Dicionário estudantil, o Michaelis, mostra: s. estranho, intruso.

Estranhos a quê? À privacidade do detentor do Poder – e de sua entourage - para quem, eventualmente trabalhe, por não confundir relação de trabalho com relação pessoal; à idéia de franquear sua intimidade ao detentor do Poder – e à sua entourage; à bajulação; à omissão no que diz respeito à discordância, se preciso for, no que diz respeito às idéias e/ou ações do detentor do Poder; à conformação própria de uma oposição branda para demarcar posições; ao jogo do Poder e ao Poder do jogo do Poder; à atitude de marcar presença física para ser visto e lembrado como alguém da corte; à subserviência; à aniquilação do respeito por si mesmo, na medida em que corpo e mente passa a ser instrumentos daqueles que os mantém.

Intrusos para o círculo íntimo do Poder embora perifericamente dele fazendo parte, momentaneamente, em virtude de sua competência técnica. Quem é intruso não tem acesso às idéias que realmente estão impulsionando o Poder. Não compreende as ações que delas decorrem, por mais inteligente que seja. Não consegue entender – às vezes até mesmo perceber – a linguagem cifrada através da qual os integrantes do círculo íntimo se manifestam. Com sua chegada se estabelece o silêncio ou o barulho dirigido. O intruso incomoda, é um obstáculo tanto mais difícil por que ele faz parte da engrenagem embora atrapalhe na medida em que não possa ser envolvido – usado - sem que perceba aquilo que realmente está por trás do processo no qual está mergulhado.

Os outsiders – todos eles – em algum momento de sua vida foram moídos por aqueles no meio dos quais conviviam. Foram mastigados, deglutidos e vomitados. Suas essências não podiam ser assimiladas pelo sistema. Não se tratou de oposição externa ao Poder. Não é irridência, sublevação, contestação explícita, revolução. Não. É incompatibilidade com o estamento ao qual até então o outsider pertencia apesar de ser outsider. Ser outsider foi sua glória e sua tragédia. Fez com que fosse trazido e depois expelido. Trazido graças a seu talento, sua competência individual – nada que se assemelhe à conseqüência de um compadrio, de um afilhadismo, de um parentesco qualquer. E expelido por que impossibilitado, graças a sua excentricidade moral, ou psicológica, ou filosófica, ou todas juntas, de acompanhar-se da carneirada e sua vocação para serem usadas pelos lobos ao custo de balangandãs, bijuterias, penduricalhos materiais ou emocionais.




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