sábado, 2 de novembro de 2013

JUSTIÇA? QUE JUSTIÇA?


Honório de Medeiros


                               Aos meus alunos do curso de Filosofia do Direito, vez por outra eu propunha o seguinte problema:
“Façam de conta que vocês são chefes de uma estação de trens, responsáveis, entre outras coisas, pela direção que as locomotivas devem tomar em seus percursos diários.”
“Um dia, durante o expediente, vocês recebem um comunicado urgente lhes informando que uma das locomotivas que passam em sua estação está completamente desgovernada e em alta velocidade.”
“Em sua estação vocês têm a possibilidade de conduzir a locomotiva, apertando os botões A ou B, por duas diferentes opções.”
“Seu tempo para decidirem é extremamente curto. Algo como segundos.”
“Vocês sabem que na linha A trinta homens estão trabalhando na manutenção. E sabem que na linha B cinco homens lá trabalham fazendo o mesmo.”
“Qual a decisão de vocês?”
Em todos os anos de ensino, a resposta foi sempre a mesma: todos optaram por apertar o botão B. Ao lhes indagar por que faziam assim, respondiam-me que lhes parecia certo submeter a linha na qual estavam menos homens à possibilidade do choque.
Então eu lhes perguntava: “e se, na linha B, estava um engenheiro de manutenção, que por coincidência, era pai de vocês e um irmão, seu auxiliar”?
Seguia-se um silêncio embaraçoso. A grande maioria se recusava a responder a questão. Um ou outro, muito pouco, tendia para um lado ou para o outro.
Questões como essas começam a ser esmiuçadas pela psicologia social, um ramo que em muito deve seus avanços à combinação de duas vertentes poderosas: a teoria da seleção natural de Darwin, e o afã em larga escala, tipicamente americano, de realizar pesquisas de campo.
É nesse nicho que transita Leonard Mlodinow, festejado autor de “O Andar do Bêbado”, em seu novo livro denominado “Subliminar: como o inconsciente influencia nossas vidas”.
Mlodinow é doutor em física e ensina no famoso Instituto de Física da Califórnia. Mais que isso, ele é coautor, junto com Stephen Hawking – sim, isso mesmo – de alguns livros de inegável sucesso tanto de público quanto de crítica.
Em “Subliminar” Mlodinow, fundamentado em vasta pesquisa, apresenta hipóteses instigantes, como essa que eu transcrevo abaixo:
“Como enuncia o psicólogo Johathan Haidt, há duas maneiras de chegar à verdade: a maneira do cientista e a do advogado. Os cientistas reúnem evidências, buscam regularidades, formam teorias que expliquem suas observações e as verificam. Os advogados partem de uma conclusão a qual querem convencer os outros, e depois buscam evidências que a apoiem, ao mesmo tempo em que tentam desacreditar as evidências em desacordo.
Acreditar no que você quer que seja verdade e depois procurar provas para justifica-la não parece ser a melhor abordagem para as decisões do dia a dia.
(...)
Podemos dizer que o cérebro é um bom cientista, mas é um advogado absolutamente brilhante. O resultado é que, na batalha para moldar uma visão coerente e convincente de nós mesmos e do resto do mundo, é o advogado apaixonado que costuma vencer o verdadeiro buscador da verdade.”
Muito embora o autor se refira a advogados, claro que ele alude a todos quanto lidam com a tarefa de produzir, interpretar e aplicar a norma jurídica.
Em assim sendo faz sentido acreditar, como muitos acreditam, que os juízes, por exemplo, primeiro constroem um ponto de partida extrajurídico (sua visão do mundo, seus valores, seus interesses pessoais, etc.) e, somente depois, buscam evidências que apoiem suas futuras decisões.
A Retórica é exatamente isso, enquanto técnica.
A pergunta seguinte: a partir de quê os operadores do Direito constroem esse ponto de partida pode ser lida em um dos mais instigantes capítulos da obra de Mlodinow: “In-groups and out-groups”. Nesse capítulo o autor chama a atenção para um epifenômeno que, hoje, é fato científico: a tendência que temos de favorecer “os nossos”:
“Os cientistas chamam qualquer grupo de que as pessoas se sentem parte de um ‘in-group’, e qualquer grupo que as exclui de ‘out-group’. (...) É uma diferença importante, porque pensamos de forma diversa sobre membros de grupos de que somos parte e de grupos dos quais não participamos; como veremos, também veremos comportamentos diferentes em relação a eles.”
“Quando pensamos em nós mesmos como pertencentes a um clube de campo exclusivo, ocupando um cargo executivo, ou inseridos numa classe de usuários de computadores, os pontos de vista de outros no grupo infiltram-se nos nossos pensamentos e dão cores à maneira como percebemos o mundo.”
“Podemos não gostar muito das pessoas de uma maneira geral, mas nosso ser subliminar tende a gostar mais dos nossos companheiros do nosso ‘in-group’.”
Essa constatação – de que gostamos mais de pessoas apenas por estarmos associados a elas de alguma forma – tem um corolário natural: também tendemos a favorecer membros do nosso grupo nos relacionamentos sociais e nos negócios (...)”
Ou seja, como diz o senso comum: para os amigos tudo; para os indiferentes, a lei; para os inimigos, nada...
Se assim o é, e a ciência vem mostrando que sim, um dos corolários da obra de Mlodinow é pelo menos intrigante, e dá razão ao que dizem, desde há muito, os anarquistas e marxistas: a "visão de classe" contamina as decisões do aparelho judiciário. Não somente do aparelho judiciário. Contamina a produção, interpretação e aplicação da norma jurídica.
Isso quanto aos marxistas e anarquistas. Quanto aos darwinistas, nem se discute mais o assunto. Para quem não é anarquista ou marxista, basta Gaetano Mosca, que também aborda, brilhantemente, essa perspectiva, quando trata da "classe política dirigente".
E quanto ao mundo jurídico? Neste caso, ainda está muito atrasada a discussão. Ainda há "juristas" que discutem se Direito é ou não ciência...

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

O SEGREDO DA EFICIÊNCIA NA GESTÃO PÚBLICA


 
 
Honório de Medeiros
 
 
                    Alguns anos atrás o Fórum Nacional da Previdência debateu os problemas da Previdência Nacional. E uma das propostas debatidas consta de um relatório elaborado por Vicente Falconi, do Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG), de Minas Gerais, o mesmo que foi responsável, entre 2002-2006, pelo choque de gestão pelo qual passou o Governo de Minas e que culminou em zerar o déficit orçamentário, que era de 2,3 bilhões de reais, originando um saldo para investimentos de mais de três bilhões.

                   Há algo de original, quanto à gestão pública, na “doutrina” Falconi? Não. Na verdade Falconi resgata, para o setor público, o conceito “PDCA” (Planejar, Desenvolver, Checar e Agir) desenvolvido no Japão, mas criado nos EUA na década de 20, para a iniciativa privada. Agregue-se ao PDCA, mais especificamente no P, de Planejar, os famosos “o que, por que, como e quando”, que a sopinha de letras está completa e o planejamento estratégico, pelo menos no papel, aparece perfeito.

                   Na verdade, conforme a própria literatura acerca de gestão pública aponta, o grande problema está no “Checar”. Tradicionalmente as administrações públicas relegam, quando existe algum planejamento – e o mais das vezes os governos começam sem nenhum – a atividade de checar e padronizar, se tudo estiver correndo bem, ou checar e corrigir, se algo não estiver dando certo. E relegam graças a uma série de componentes dentre os quais avulta, pela importância, o despreparo e a falta de compromisso com aquilo para o qual foram conduzidos pelo voto popular.

                   Não há checagem, por que não é dado prazo para o alcance da meta. Não é dado prazo por que não há decisão política de cobrar resultados quando ele termina. Pior: mesmo que houvesse prazos, o mau gestor não seria punido, vez que a razão principal de sua presença no “staff” decorre de conchavos políticos ou premiação espúria por conduta partidária. Não há acompanhamento rígido do planejamento estabelecido por que os compromissos políticos dobram as necessidades administrativas e todo o planejamento – quando o há – rui por terra já no primeiro ano de administração.

                   Então podemos creditar o sucesso do choque de gestão em Minas Gerais à decisão política do Governador de implementá-la, contra tudo e contra todos. Acredito plenamente que deve ter importado sobremaneira a capacidade de Falconi no sentido de convencer o Governador de que era possível alcançar as metas estabelecidas se houvesse respaldo às ações a serem desenvolvidas. Caso contrario teríamos mais uma boa intenção condenada. E o inferno, dizem, está cheio de boas intenções.

                   O respaldo ao qual aludo acima é, principalmente, no sentido de punir todos quanto não estejam plenamente integrados ao planejamento. E premiar os que estão. Se a checagem mostra que a meta não foi alcançada e isso não aconteceu por falta de competência ou interesse então o gestor intermediário, ou seja, o responsável terá que se afastado imediatamente sob pena de comprometer o esforço total. Esse elo da engrenagem que não funciona é como uma célula cancerosa: se não for destruída imediatamente vai originar uma metástase no futuro.

                   Portanto não há segredo. O problema é político. Embora seja necessário ressaltar: a tarefa de criar e conduzir esse processo demanda um “know-how” que não é para qualquer um. Existem ingredientes para além da “sopinha de letras” que somente são detectados, analisados e integrados por quem é do ramo: vocação, talento e disciplina.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

ROBERTO CARLOS É UM BABACA!

Raissa Tâmisa
 
Roberto Carlos é um babaca. E o problema de Roberto Carlos não é a biografia, é o toc. Toc já é uma babaquice. Um cara que dedica mais de 10 anos da vida à vida de Roberto Carlos é outro babaca. Mas a babaquice dele tem que ser permitida, porque todas as outras são. A galera do procure saber (que merda ser esse o nome dessa comissão, sempre usei essa frase e adoro a história dela) conseguiu ser tão babaca quanto. O leitor que compra uma biografia de Roberto Carlos também é um babaca. Eu que estou escrevendo sobre isso, estou vendo o roda viva, também tenho toc e ainda tô chamando todo mundo de babaca, sou mais babaca ainda. Mas ninguém ganha do STF, campeão da babaquice e da falta do que fazer. Brasil, ou o país da inversão de prioridade.

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

 
NÃO TOMAMOS A INICIATIVA PORQUE NÃO VALE A PENA, OU NÃO VALE A PENA PORQUE NÃO TOMAMOS A INICIATIVA?

domingo, 27 de outubro de 2013

QUEM RAPTOU PETER PAN?




Bárbara de Medeiros
 
Quando você é criança, eles te oferecem uma caixa cheia de hidrocor, lápis de cor e giz de cera de todas as possíveis tonalidades. Te dão uma cartolina e dizem: “seja criativo!; o céu é o limite!”, e, por um tempo, nem isso é.
Eu vi céus cor-de-rosa, nuvens roxas e um sol azul sorrindo, lindo – porque naquele tempo, parecia natural que mesmo ele tivesse sentimentos. Eu vi barcos voarem, melancias nascerem em árvores imensas, chuvas de coração e sempre pensei “por que não?”.
O céu não era o limite.
Em algum momento os lápis se perderam, os hidrocor falharam e eu tenho quase certeza que sentei em cima da caixa-de-giz-de-cera, daí o porquê de estarem quebrados. Só sei que não me oferecem mais a caixa, e eu me sinto um pouco patética por querer sentar no chão e molhar meus dedos nas tintas.
Eles agora me forçam crenças, me sufocam com verdades que somente os são para quem as oferece e me rebaixam com um fervor que me faz questionar como pude acreditar que todas as coisas tinham sentimentos. Não tenho mais o sonho de ser astronauta, mas, sim, o de ganhar dinheiro em uma profissão que há de me custar a felicidade e a paciência.
E aparentemente o céu nunca foi nem será rosa (será que essa gente nunca assistiu a um pôr-do-sol?).
Eu olho ao redor, querendo ver se alguém está tão desconfortável nessa situação quanto eu. Mas quem eu vejo está tão desconfortável quanto eu nessa situação. E o que eu vejo me assusta ainda mais: toda essa gente que um dia pensei conhecer já se conformou com a vida de adultos, e agora age como se nunca tivesse estado na pele de uma criança.
Eu me remexo na cadeira de madeira (quem diria que o chão era tão confortável?) e rezo para que as horas andem para trás e me levem com elas para um tempo em que minha maior frustação era não conseguir construir um castelo de areia, e minha maior tristeza era constatar que meu chocolate tinha acabado.
Onde está meu pincel? Onde vocês colocaram meu vestido de princesa?
Afinal, quem raptou Peter Pan?