quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

FELIZ 2010!




A TODOS OS AMIGOS E LEITORES DESTE BLOG

DIÁRIO DE VIAGEM



No avião, para Salvador, ouço a gargalhada de Bárbara.

"O que foi?"

"Rubem Alves disse aqui que 'o trabalho intenso faz mal à criatividade."

"Eu acho", digo. Lembrei-me de Aristóteles, que dizia não haver filosofia sem ócio.

Ou seja, se quisermos ser criativos, sejamos vagabundos.

Viva a vagabundagem!

PS: O livro do grande Rubem Alves é "Ostra Feliz Não Faz Pérola", editora Planeta, coletânea de crônicas. Livro muito agradável.

E chegamos.  Cadê a moça que nos vinha pegar no aeroporto? Tudo pago, tudo acertado?

Bárbara liga para ela: "Linda" - o nome é esse mesmo - "cadê vc?"

"Quem é?", pergunta uma voz sonolenta do outro lado do celular,  pelas 8:30 da manhã.

"Eu, Bárbara, que lhe contratei para fazer o traslado do aeroporto para o hotel".

"Ihhh! Bárbara, passou pela cabeça. Guenta a mão que eu tô chegando".

É a Bahia, meu Rei!




quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

PEQUENAS FÉRIAS!




De pernas para o ar, em Salvador.

Tudo meio lento, devagar-quase-parando.

Afinal, estamos na Bahia, meu Rei!

Honório de Medeiros

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

A CASA GRANDE DA FAMÍLIA DIÓGENES EM PEREIRO, NO CEARÁ

Após ver as fotos, leia a Crônica no "Post" abaixo

Fotos por Honório de Medeiros


Observem o tamanho e o tipo das chaves dos quartos



A chave em contraste com um mosaico do piso



O nome do fundador da família no Brasil




O quarto das celas



Cumeeira



A Casa Grande da Família Diógenes em Pereiro, Ceará



A Castelã ladeada pelo filho mais velho e um neto

A ESTRANHA PEREIRO - II



Pereiro, Ceará

Por Honório de Medeiros
 
Do final do século XVIII, e construída com areia trazida a pé, pelos escravos, do leito do rio Jaguaribe, a cem quilômetros de distância, a Casa Grande da Fazenda Trigueiro, postada próxima à margem da estrada entre São Miguel, Rio Grande do Norte, e Pereiro, Ceará, impressiona quem a vê desde a distância. “São trinta e oito compartimentos”, diz-nos Zé Denis, filho mais velho de Dona Deocides, a viúva Castelã. “Todos imensos”, penso eu, ao ser levado a cada um deles. “Imensos na largura e na altura”.

Peço à cozinheira para ficar próximo à janela da cozinha. Uma vez fotografada, dará uma noção do tamanho da janela – bem maior que ela, que deve ter um pouco mais que um metro e meio. Excetuando a cozinha, todos os outros compartimentos do térreo não têm janelas para fora e se comunicam com os vãos centrais. Se houvesse um ataque – índios, antes, cangaceiros, depois – a única porta que permite o acesso ao interior da casa seria fechada, todos subiriam para o andar superior – no qual ficam as janelas – e a defesa estaria garantida. “A porta funciona como uma ponte levadiça de castelos medievais”, eu digo, observando a chave imensa que a fecha, trazida, da Suíça, na época da construção.

As paredes têm quase um metro de largura. Ocultam segredos ancestrais, como ossos humanos, restos mortais de pessoas emparedadas sabe-se lá quando nem por que, semelhantes aos encontrados certa vez, quando se tentou estabelecer uma comunicação entre dois compartimentos. “Naquela época”, diz-nos Zé Denis, que já foi vereador em Pereiro, mas hoje se dedica a tomar conta da propriedade e da mãe, “como não havia “campo santo” (cemitério), as pessoas mais importantes eram sepultadas assim, acho que seguindo o exemplo das igrejas.” Cada detalhe chama a atenção: são biqueiras para escorrer a água da chuva, de cobre, reproduzindo a boca de um tubarão, também vindas da Suíça; os arabescos da cumeeira da Casa que, nos cantos, lembram um “s” deitado, mas, na realidade, são uma letra grega; a “sapata” – base na qual se assenta todo o imóvel -, que na parte anterior, dando para uma área enorme, como se fosse uma praça de chão batido, em torno da qual todas as construções são postadas, deve ter quase dois metros de altura. É o sótão, um andar inteiro, onde os escravos aguardavam, noite afora, o momento de sua morte, não por outro motivo denominado “quarto dos suplícios”...

“Noite de chuva, as tábuas rangendo, o barulho do vento, que tal Zé Denis”, pergunto. Ele fica sério. “Está vendo aquela casa ali do lado?” “Claro”, respondo. “Na década de oitenta fomos morar nela. Ficou insuportável viver aqui. Batiam as portas, rangiam as tábuas, as luzes apagavam inexplicavelmente, ouvíamos lamentos, arrastar de passos, desapareciam as coisas.” “Frei Damião”, prossegue, “esteve em São Miguel para uma de suas Missões e conseguimos falar com ele que veio aqui e realizou um exorcismo. Só assim pudemos voltar.” “Tinha que ser em Pereiro”, pensei ao me lembrar do episódio do cemitério, relatado antes. “Ficou tudo resolvido?” “Melhorou muito, mas ainda ontem, por duas ou três vezes, na hora do almoço, alguém bateu palmas e me chamou pelo nome, insistentemente. Quando eu saía para o pátio era o canto mais limpo.”

Dona Deocides nos mostra o local da sala onde estão as fotografias da família. Uma me chama imediatamente a atenção. Em sépia, os contornos de Dona Carolina Fernandes, viúva de Manoel Diógenes, o português construtor da Casa Grande da Fazenda Trigueiro. Uma Fernandes, assim como os da Casa Grande da Fazenda São João, em Marcelino Vieira; e os da Casa Grande da Fazenda Sabe Muito, em Caraúbas, as três maiores do Alto Oeste, salvo engano. Todos ligados por laços de parentesco com Matias Fernandes Ribeiro, o genro do fundador de Martins, Francisco Martins Roriz, e de sua esposa Micaela.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

A BLINDAGEM DO COLARINHO BRANCO: A LEGISLAÇÃO SATIAGRAHA



Arnaldo Esteves Lima

Deu no Valor

Cristine Prestes, colunista

28/12/2009

Nas últimas semanas, duas decisões da Justiça garantiram uma importante vitória a empresários que respondem a processos judiciais por lavagem de dinheiro no Brasil. As defesas do empresário Daniel Dantas, dono do grupo Opportunity, e dos responsáveis pelo fundo MSI, acusado de usar o Corinthians para lavar dinheiro, conseguiram afastar temporariamente o juiz Fausto De Sanctis, da 6ª Vara Criminal da Justiça Federal de São Paulo, dos processos gerados pelas operações Satiagraha e Perestroika, respectivamente.

As decisões foram tomadas pelo ministro Arnaldo Esteves Lima, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no caso de Dantas, e pelos desembargadores que compõem a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, no caso do MSI, e na prática impedem o juiz De Sanctis de determinar qualquer medida nas duas ações penais sob sua responsabilidade. As liminares foram concedidas diante dos chamados pedidos de exceção de suspeição – recursos nos quais a defesa dos acusados alega falta de imparcialidade do juiz da causa para julgar os processos.

Ainda que o recurso traga, em seu nome, a palavra “exceção”, vem se tornando regra desde que os casos gerados pela atuação mais ofensiva e articulada da Polícia Federal e do Ministério Público na investigação de crimes do colarinho branco – cujo auge foi a Operação Satiagraha, deflagrada em julho de 2008 com a prisão de Dantas – passaram a cair nas mãos do juiz De Sanctis, que coleciona pedidos de suspeição contra si.

A nova estratégia elaborada pela defesa dos acusados de crimes do colarinho branco vem ganhando respaldo na Justiça, embora ainda dependa de confirmação tanto no STJ quanto no TRF. Em ambos os tribunais, colegiados de magistrados terão que decidir pela aplicação literal da lei em vigor, que prevê o afastamento do juiz no caso de relação profissional, de aconselhamento, parentesco ou amizade com o réu; ou pela extensão da possibilidade com uma interpretação mais ampla do que estabelece o atual Código de Processo Penal.

Mas, a depender do Congresso Nacional, em um futuro breve a defesa dos réus de crimes do colarinho branco ganhará um reforço de peso. Um projeto de lei idealizado pelo presidente do Senado, José Sarney, e elaborado por uma comissão de juristas convocada pelo senador promove profundas alterações no Código de Processo Penal brasileiro.

Prevista para ser votada no início do próximo ano legislativo, a “Legislação Satiagraha” engendrada por Sarney, a pretexto de modernizar uma lei datada de 1941, constrói uma verdadeira blindagem aos réus de ações penais no Brasil. O projeto enfraquece e esvazia a primeira instância da Justiça com mecanismos que facilitam o afastamento de juízes por suspeição, reduz drasticamente suas funções no processo penal e permite até mesmo que a defesa do réu faça uma investigação paralela, identificando fontes e entrevistando pessoas.

Uma das principais inovações do Projeto de Lei nº 156, de 2009, é a criação do inédito juiz de garantias. É ele quem passará a receber do Ministério Público pedidos de medidas cautelares para a produção de provas que sustentem a denúncia – como buscas e apreensões, interceptações telefônicas e quebras de sigilo fiscal e bancário. Ao juiz da causa caberá apenas julgar o processo – ainda que não tenha participado da chamada fase de instrução, quando são produzidas as provas. O argumento dos que defendem a criação do juiz de garantias é o de que, no momento em que julga o processo, o juiz da primeira instância já está “contaminado” por opiniões formadas durante a fase de instrução, quando defere as medidas cautelares. Ainda que isso seja verdade, até mesmo advogados criminalistas simpatizantes da ideia admitem que uma das consequências dessa separação possa ser simplesmente a falta de provas para sustentar uma sentença condenatória – mesmo que o juiz da causa tenha a convicção de que houve o crime.

Já distanciado da instrução do processo, o juiz da primeira instância, pelo texto do Projeto de Lei nº 56, também poderá se tornar passível de uma avalanche de decisões judiciais a determinar seu afastamento da causa. Com a inserção de apenas um parágrafo na atual legislação, o projeto amplia sobremaneira as chances da defesa de pedir a suspeição do juiz ao propor um texto que, na linguagem jurídica, é chamado de “dispositivo aberto”, ou sujeito a diversas interpretações na Justiça. Diz o texto do projeto que o juiz pode ser afastado do processo “se mantiver relação jurídica de natureza econômica ou moral com qualquer das partes, das quais se possa inferir risco à imparcialidade”. Não será necessária muita criatividade para aplicar o dispositivo.

Se ainda restam dúvidas a respeito da intenção do Projeto de Lei nº 156, seu artigo 24 é derradeiramente esclarecedor. Prevê que “quando o investigado exercer função ou cargo público que determine a competência por foro privativo, que se estenderá a outros investigados na hipótese de crimes conexos ou de concurso de pessoas, caberá ao órgão do tribunal competente autorizar a instauração do inquérito policial e exercer as funções do juiz das garantias”. Na prática, significa que todos os réus que respondem a processos penais ao lado de pelo menos um que tenha foro privilegiado por conta do cargo que ocupa garantirão o mesmo benefício. Significa também que a polícia e o Ministério Público só poderão instaurar inquéritos contra os detentores de foro privilegiado mediante autorização da instância competente para julgá-los – o Supremo Tribunal Federal (STF), no caso de deputados, senadores, presidentes, ministros de Estado etc.

O projeto de Sarney é um duro golpe na já quase inexistente possibilidade de punição do crime do colarinho branco no Brasil, que não raro envolve detentores de cargos públicos. Caso seja aprovado no Congresso, passa a ser do Supremo a competência para julgar boa parte dos processos penais por crimes econômicos no país. Dos poucos que restarem, saliente-se, pois só será investigado quem o Supremo quiser.

O CASO ABDELMASSIH



Roger Abdelmassih

Deu na Folha de S. Paulo

O caso Abdelmassih

De Fernando de Barros e Silva:

Vamos começar fazendo três perguntas: 1. Quantas pessoas estão encarceradas hoje no país, em regime de prisão preventiva, sem que ainda tenham sido julgadas? 2. Quantas, entre as pessoas que se encontram nessa condição, chegam a ter seus pedidos de soltura apreciados pelo Supremo Tribunal Federal? 3. E quantas conseguem ver seu caso atendido em apenas quatro meses pelo presidente da mais alta corte do país?

A resposta talvez conduza à conclusão de que o doutor Roger Abdelmassih é um homem de sorte. Ou que pagou os advogados certos. O jornal "Le Monde" tinha razão, mas pegou leve ao dizer que nosso Judiciário é "preguiçoso". Às vezes, só às vezes, é ágil até demais.

O habeas corpus de Gilmar Mendes, que, no recesso da Justiça, libertou o médico acusado de molestar sexualmente pelo menos 39 mulheres, causa óbvio mal-estar.

As vítimas (supostas?) depositavam na expertise do doutor a esperança de engravidar -e a situação de vulnerabilidade física e emocional em que foram atacadas, conforme os relatos, confere ao escândalo feição especialmente repugnante.

"HABEMUS GILMAR"



Gilmar Mendes

Deu em O Globo


De Elio Gaspari:

Pindorama tem dois tipos de presos. Aqueles que gramam a cana e os que ganham habeas corpus quando o doutor Gilmar Mendes responde pelo expediente do Supremo Tribunal Federal.

O médico Roger Abdelmassih foi preso no dia 17 de agosto e seus advogados conseguiram soltá-lo porque pediram um habeas corpus quando o tribunal estava em recesso e o pedido foi à mesa do doutor Gilmar.

O mesmo tribunal já negara um habeas corpus ao mesmo doutor, em decisão tomada pela ministra Ellen Gracie.

Abdelmassih não é um Daniel Dantas qualquer. Ele carrega no seu prontuário 56 acusações de estupro. O doutor garantia às clientes que em sua clínica não usava embriões de "qualquer neguinha de rua".

DISTINÇÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA



Miyamoto Musashi

"Lu Tzu, ou Lu Hsiang Shan (jap. Riku-shi): filósofo chinês (1139-93) cujo pensamento se opunha ao de Chu Hsi (1130-1200). De acordo com Lu Tsu, não há distinção entre princípio e força material" ("Musashi"; Eiji Yoshikawa).

RUI AZEREDO PERGUNTOU, ENRIQUE VILA-MATAS RESPONDEU



Enrique Vilas-Mata

Rui Azeredo, jornalista e revisor literário e agora “bloguista” (http://portalivros.wordpress.com/). Foi durante treze anos jornalista em “O Comércio do Porto”. Passou por várias secções e quando o jornal fechou em 2005 era sub-editor de “Cultura”. Já agora, quando o “Comércio” fechou, em 2005, foi trabalhar para as Edições ASA como revisor. Hoje em dia é revisor literário “freelancer”:

"Enrique Vila-Matas, entre outras obras, é o autor de “O Mal de Montano” (Teorema), uma obra que vagueia entre o diário íntimo e o romance, a viagem sentimental, a autoficção e o ensaio. Acima de tudo é um livro sobre literatura, uma homenagem à literatura em todas as suas vertentes. Trata-se de uma obra difícil de classificar, já que tão depressa se está dentro do pensamento do narrador como se passa para a descrição de uma viagem. O escritor catalão explicou a génese e, de certa forma, o conteúdo de “O Mal de Montano.

Rui Azeredo - O seu romance “O Mal de Montano” é absolutamente original e inovador. Foi algo predefinido ou essa já era a ideia inicial?

Enrique Vilas-Mata - Telefonaram-me para casa de uma instituição de Madrid chamada Fundación de Ciencias y de la Salud, da qual nunca tinha ouvido falar. Queriam convidar-me para uma conferência sobre “literatura e doença”. Ouvi as suas repetidas mensagens no gravador do telefone, mas não queria responder porque pensei que era uma instituição que pretendia que fosse a Madrid para me convencer a deixar de fumar. Assustavam-me. Enviaram-me uma carta a dizer que me pagavam para fazer a conferência. Nunca me tinham oferecido tanto dinheiro por uma intervenção de uma hora. Aceitei, mas não sabia de que doença haveria de falar. Uma amiga disse-me para falar de literatura e loucura. Decidi falar de literatura e de alguém que sofria da doença de literatura, que não podia viver sem ela. Era alguém o mais oposto possível a um “Bartleby”, ou seja, o mais oposto a alguém que deixou de escrever ou de se interessar apaixonadamente pelo literário. A conferência – quinze páginas – foi dando origem ao livro, sobre o qual ignorava tudo quando comecei a escrevê-lo."

"OS TRABALHOS E OS DIAS" (FRAGMENTOS); HESÍODO



Hesíodo

Tradução do grego arcaico por Mary de Camargo Neves Lafer


“Convida quem te ama para comer e deixa quem te odeia
sobretudo convida aquele que mora próximo de ti,
pois se alguma coisa estranha acontecer em teu lugar
os vizinhos sem atar o cinto acorrem, os parentes, não.
Flagelo é um mau vizinho, quando um bom vantagem é.
Tem fortuna quem tem a fortuna de um bom vizinho ter;
nem um boi só morreria se mau não fosse teu vizinho.
Mede bem o que tomas de teu vizinho e devolve bem
na mesma medida, ou mais ainda, se puderes,
para que precisando depois o encontres mais generoso.
Não faças maus ganhos, maus ganhos granjeiam desgraça.
Ama a quem te ama e freqüenta quem te freqüenta;
dá a quem te dá e a quem não te dá, não dês.
Ao que se dá se dá e ao que não dá, não se dá.
(...)
Nem mulher de insinuadas ancas te engane a mente
palreando provocante com o olho em teu celeiro;
quem em mulher confia em ladrões está confiando.
(...)
Se nas entranhas riqueza desejar teu ânimo,
assim faze: trabalho sobre trabalho trabalha.”

Leia mais em http://greciantiga.org/:

"Hesíodo é o mais antigo poeta grego de que se tem notícia com alguma certeza. Pode-se situá-lo com razoável grau de confiabilidade no início do Período Arcaico mas, a rigor, não há nenhuma evidência tangível de sua existência histórica, salvo informações contidas em sua própria obra.

A poesia hesiódica insere-se no âmbito da poesia épica e, assim como os poemas homéricos, representa a culminância de um longo período de evolução das tradições orais. Na Antiguidade, Hesíodo era tão considerado quanto Homero.

As informações biográficas de que dispomos foram fornecidas pelo próprio Hesíodo em uma de suas obras, Os Trabalhos e os Dias. O poeta viveu em Ascra, na Beócia, no final do século - VIII ou início do século - VII (c. -700), período de crise agrícola e social. O pai era um imigrante de Cime, na Ásia Menor, que se tornou agricultor e vivia com dificuldade de uma pequena propriedade rural próxima do Monte Hélicon. Teve vários litígios com um irmão, Perses, a respeito da divisão da herança paterna.

A exemplo do pai, Hesíodo viveu de sua pequena propriedade rural, mas parece ter recebido treinamento de rapsodo e certamente conhecia os poemas homéricos. A tradição lhe atribui a vitória em um concurso de poesia nos jogos fúnebres de Anfídamas, em Cálcis (Eubéia).

Como os poemas homéricos, sua obra parece ser uma coletânea de mitos e tradições conservados oralmente — no caso, tradições da Beócia, região em que viveu. Hesíodo foi, no entanto, o primeiro a utilizar suas próprias experiências como tema de poesia e a cantar a vida simples do homem do campo.

Dois de seus poemas chegaram integralmente até nós, a Teogonia e Os Trabalhos e os Dias. Temos também um longo trecho de outro poema a ele atribuído, o Escudo de Héracles, certamente composto em época bem mais tardia (século - VI). De outras obras que na Antiguidade também foram conservadas sob seu nome, como o Catálogo das Mulheres, restam apenas fragmentos.

A Teogonia conta a formação do mundo (cosmogonia) e a origem dos deuses (teogonia) e heróis; é um verdadeiro catálogo de deuses. O formato utilizado por Hesíodo nessas obras têm paralelo em textos hititas de -1400/-1200 e textos babilônicos ainda mais antigos. Em Os Trabalhos e os Dias o poeta relata seus problemas legais com o irmão Perses, fornece informações minuciosas sobre a agricultura, e discorre sobre a importância da justiça e do trabalho.

Devido ao contraste entre as duas obras, há ainda uma certa controvérsia quanto à atribuição da autoria da Teogonia, de tema bem diverso de Os Trabalhos e os Dias, a Hesíodo.

Numerosos manuscritos e fragmentos de papiros com os poemas hesiódicos chegaram até nós.

Assim como Homero, Hesíodo usou basicamente o dialeto iônico e os versos hexâmetros datílicos característicos da epopéia. Certamente conhecia os poemas homéricos, pois os epítetos épicos e expressões formulares que utilizou são semelhantes; mesmo o vocabulário lembra muito a poesia de Homero.

Mas enquanto que estruturalmente a poesia hesiódica se assemelha à homérica, a temática tem ao mesmo tempo uma distância pequena e grande. Pequena, se considerarmos a Teogonia: Homero recorre frequentemente a narrativas míticas; Hesíodo preocupa-se em agrupar os deuses e heróis em um catálogo organizado e inteligível. Grande, se considerarmos os Trabalhos e os Dias: Homero canta a vida e os problemas dos aristocratas; Hesíodo descreve a dura vida quotidiana dos camponeses, suas preocupações e problemas. As nítidas e precisas imagens que evoca, inclusive, indicam conhecimento pessoal e profundo da vida rural e de seus problemas.

Quanto ao estilo e à finalidade da poesia, o contraste é profundo. Hesíodo tem estilo didático e pessoal, bem distante da "grandiosidade" e impessoalidade de Homero. Enquanto que o poeta da Ilíada e da Odisséia nada fala de si mesmo e descreve os festins e as guerras dos aristocratas a uma audiência de aristocratas, Hesíodo identifica-se, usa quase sempre a primeira pessoa, dá opiniões. Mais que simplesmente divertir ou distrair, sua poesia têm uma nítida função didática, a exemplo dos antigos textos sapienciais das civilizações sumeriana, egípcia e babilônica."

sábado, 26 de dezembro de 2009

O MENINO JESUS QUE HABITA MINHA MEMÓRIA



Carlos Santos, em dois momentos

Por Carlos Santos

"As famílias felizes parecem-se todas; as famílias infelizes são infelizes cada uma à sua maneira" (Leon Tolstói em "Anna Karenina").

A frase em epígrafe abre um dos clássicos da literatura mundial, do russo Leon Tolstói. É também necessária na crônica de nosso tempo, nessa atmosfera inebriante do Natal.

Minha caixa de e-mails está abarrotada de mensagens. Que bom ser lembrado, apesar de quase não ser visto pela maioria ou sequer conhecido pessoalmente.

Ganho afagos. Retribuo-os na medida das aspirações de cada remetente.

Somos, todos, ou quase todos, amigos cibernéticos e distantes. Entretanto nem por isso queremos ser tachados de forma vil, como abomináveis monstros das neves, quase glaciais.

Mudamos ou mudou o mundo? Mudamos todos e mudamos o mundo? Mudou o mundo e estamos todos mudados? Um necessário questionar que talvez jamais produza resposta concreta e irremovível.

O sacolejo imperceptível da terra - rotação e translação - nos mantém do jeito que somos há milhões de anos: criaturas em permanente mutação. Para melhor ou pior? Eis outra questão crucial a ser respondida. Ou não.

Louvamos o nascimento do Menino Jesus, mas Ele é quem ocupa menor espaço à mesa farta, sob o espocar de champanhes e em meio à gargalhada trovejante. Talvez aí, inconscientementes, sejamos fiéis aos demais 364 dias do ano.

Tem sobrado muito pouco à renúncia, à generosidade, à solidariedade e à compaixão.

Há-nos a predominância de uma razão predatória, instintiva e seletiva. O ter em vez do ser. Pior: tudo é gerado sob a mesma justificativa - em nome da felicidade -, o nirvana que cada um persegue, sem que saiba se valerá a pena ao final. É o "eldorado" particular.

Comemoramos o que somos ou a expectativa do que pretendemos ser? Ou será que toda essa atmosfera é um pouco de penitência pelo o que somos no íntimo?

Meu encantamento com o Natal passou há tempos. Ou o deixei congelado na infância mais tenra, onde fi-lo diferente porque eu era diferente. Feliz por ser ingênuo ou com a ingenuidade fundamental para poder ser feliz. Sei lá.

Época em que meus olhos passeavam pela imensidão do presépio de dona Maria de Uriel, em Mossoró. Sua casa - modesta, sem luxo - era próxima à então "Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT)" e para lá puxava uma romaria de curiosos.

Enchia-me de alegria ver todo aquele mundo a meus pés. Belém em miniatura, viva e encantadora, apesar de Herodes.
Provável que tudo tenha começado a ruir, perder sua magia, quando descobri que meu presente (um time de botão do Fluminense, claro) não era oferta do Papai Noel. Ansioso, respiração presa, vi quando chegou - de madrugada - por outras mãos mais conhecidas e confiáveis. E daí?

Mesmo assim, nunca deixei que soubessem da minha "incrível" descoberta. Melhor preservar esse segredo, raciocinei.

Sobrou em mim um pouco daquele menino feliz. Ainda bem. Permita-se-me que deixe aqui essas minhas lembranças.

"Fisicamente, habitamos um espaço, mas, sentimentalmente, somos habitados por uma memória", me alerta Saramago.

Feliz Natal!

ARTE



Bárbara Tuchman

"O maior recurso, e a realização mais duradoura da humanidade, é a arte. O domínio da linguagem demonstrado por Shakespeare e seu conhecimento da alma humana; a complicada ordem de Bach, o encantamento de Mozart" ("A Prática da História"; Bárbara Tuchman).

MARQUETINGUE DE GUERRA ELEITORAL


Marquetingue

Por Honório de Medeiros

Faz parte de nós: decidimos e simplificamos.

Vejam só: bonito X feio; bom X mal; novo X velho; passado X futuro; povo X elite; rico X pobre; Potiguar X Baraúnas; ABC X América; Fla X Flu; Mossoró X Natal; Sertão X Mar; gordo X magro; carne X verdura, e assim por diante.

Essa tendência à simplificação se torna tanto mais presente quanto mais radical for o processo emocional no qual estejamos envolvidos.

Uma guerra, por exemplo, é um processo emocional no qual estamos radicalmente envolvidos.

Toda eleição é uma guerra de idéias: nela, nós eleitores, decidimos e simplificamos.

Agora: essa simplificação pode ser deixada “solta”, numa eleição, e vai surgir de qualquer maneira, ou pode ser induzido seu surgimento.

Induzir o surgimento da simplificação somente é possível quando se capta e veicula massivamente a síntese das idéias que estão em guerra.

Fizemos assim na campanha de Geraldo Melo: era passado (João Faustino) X futuro (Geraldo Melo); foi feito assim na campanha de Aluízio Alves: era o novo (Aluízio) X o velho (Dinarte, representado por Djalma Marinho); foi feito nos EUA: é o arcaico, a guerra (McCain) X a esperança, a paz (Obama, “Yes, We Can”).

Em Mossoró, por exemplo, as sínteses estão à espera de uma indução (marquetingue): rosados X mudança (quem for a favor dos rosados é contra a mudança; quem for a favor da mudança é contra os rosados).

Como se descobre essa síntese? Com inspiração – quando se é um gênio ou próximo disso (Aluísio em 1960), ou com pesquisas qualitativas.

Na primeira campanha de Nilton Figueiredo para Prefeito de Pau dos Ferros, criei o almoço com o eleitor. Todos os dias, em ruas e bairros diferentes, Nilton almoçava na casa de um eleitor simpatizante. Era uma verdadeira festa. E uma festa que se contrapunha ao imobilismo do candidato adversário, perigosamente surfando em uma imaginária onda de favoritismo...

Descobri que era importante desconstruir, imediatamente, a possibilidade de se estabelecer Nilton como candidato da elite, enquanto Aliatah, pelo seu próprio perfil – quem o conhece sabe acerca do que eu estou escrevendo -, seria o candidato do povo. Ao colocar Nilton dentro das casas, em suas cozinhas, em contato direto com o eleitor, comendo com eles, inverti a expectativa. Aliatá passou a ser o que Nilton deixara para trás: alguém distanciado da população, que se recusava a caminhar pelas ruas pedindo voto. Assim vencemos o mito, o governo estadual e o federal.

Quem me apontou esse caminho foram as pesquisas que mandei fazer através de dez jovens recrutados em Alexandria e treinados por mim mesmo. Eles vinham semanalmente e faziam a pesquisa que me permitia monitorar a eleição. Ao interpretá-las compreendi como o eleitor percebia Aliatah e Nilton Figueiredo. E decidimos. Quando Nilton se dirigia para um bairro previamente escolhido, já sabia o que ia encontrar e dizer. Levava propostas e não escondia as omissões de Dr. José Fernandes, Prefeito à época, ou sua atuação apoiando Nilton, quando era o caso.

Nada há de especial em tudo isso. Era apenas a experiência que a campanha de Geraldo Melo para Governador, no Super G, sob a regência de Pedro Simões, me permitira acumular. E comprovada através das edições do “Folha do Alto Oeste”, que em seu último número, “cantou” quanto seria a maioria de Nilton.

Foi tiro e queda.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

BILHETE DE SÉRGIO DANTAS

Dr. Honório:


Agradeço a divulgação do folheto, mas informo que o mesmo se encontra com edição esgotada desde o ano de 2006.

Saudações

Sérgio Dantas.'.

POSTAGENS PARALISADAS






Síndrome de Bartleby

Caros amigos:

Problemas técnicos e um pouco da Síndrome de Bartleby atrapalharam as postagens ontem e hoje.

Espero voltar amanhã, a Deus querer.

Fiquem com o espírito natalino.

Honório de Medeiros

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

"LAMPIÃO E O RIO GRANDE DO NORTE", POR SÉRGIO DANTAS



Sérgio Dantas, de blazer, ao lado de Vera Ferreira, a neta de Lampião

Honório de Medeiros

“Lampião e o Rio Grande do Norte”, cujo subtítulo é “A história da grande jornada”, de Sérgio Augusto de Souza Dantas, Gráfica Editora, exposto à venda nas livrarias de Natal, é uma obra seminal. Não é possível mais, a partir do lançamento, tratar do Cangaço, seja no Rio Grande do Norte, seja de uma forma geral, sem uma consulta à obra.

Mossoró é assunto importante, no livro. Não pode ser diferente. Mesmo tratando da incursão do bando de Lampião ao Rio Grande do Norte, desde sua entrada pela Tromba do Elefante, margeando Luis Gomes, até sua saída, no rumo de Limoeiro do Norte, Ceará, a ida a Mossoró é onipresente, por que o quixó preparado por Massilon e o Cel. Isaias Arruda, de Aurora, Ceará, no qual Virgolino – assim mesmo, com “o”, como nos previne o Autor – é parte fundamental do trabalho.

As informações colhidas durante quatro anos de pesquisa, perambulações, visitas, entrevistas, cruzamento de informações, consulta à literatura hoje vastíssima sobre o cangaço estabelece um contraponto interessante com o estilo do Autor. Para coroar, um valioso acervo fotográfico é colocado à disposição de quem adquiriu o livro.

Em relação a Massilon, acerca do qual mantenho permanente interesse, Sérgio Dantas, jovem juiz norteriograndense agrega informações valiosíssimas, dentre elas o “raid” que esse personagem singular empreendeu nos costados do Jaguaribe e Cariri logo após o episódio de Mossoró. Isso significa dizer que a lenda segundo a qual Massilon, mesmo antes da célebre foto de Limoeiro, Ceará, já se separara de Lampião e teria ido embora para o Norte, não é verdadeira. Alguns, inclusive, diziam que o cangaceiro que aparece na foto tirada em Limoeiro não seria, na realidade, Massilon.

Detalhada, a história da marcha espanta pela riqueza de detalhes. Assim, ficamos sabendo da passagem de Lampião por todo o território do Rio Grande do Norte cidade por cidade, povoado por povoado, sítio por sítio, fazenda por fazenda. Os acontecidos nas cercanias de Martins e Umarizal, antiga “Gavião”, são relatados com precisão. E tudo quanto aconteceu em Apodi, antes da chegada de Lampião, protagonizado por Massilon, recebe tratamento de pesquisador sério e interessado.

A descrição geográfica e sociológica dos lugares pelos quais passou o bando de cangaceiros merece respeito. Através dela é possível perceber o dia-a-dia daquelas comunidades existentes no início do século XX. E a descrição dos mal-tratos, arruaças, bebedeiras, torturas físicas e psicológicas comove e revela a sensibilidade do Autor.

Agora resta esperar que a obra semeie críticas e informações outras, alguma correção de rumo – se for o caso – para retornar ainda mais rica para o acervo dos historiadores e sociólogos do Brasil. É assim que ocorre quando uma obra deixa de pertencer ao Autor, por sua importância, e passa a fazer parte do referencial bibliográfico ao qual pertence.

STJ: UMA VERGONHA!

Deu no Blog do Ailton


STJ: UMA VERGONHA

DEUS SALVE A JUSTIÇA

Enviado em 22/12/09 às 20h31min por Ailton Medeiros

Se você, leitor, ainda tem dúvida sobre como funciona a Justiça brasileira, leia o que vai abaixo. É de estarrecer. Saiu no blog de Luis Nassif, mas o autor do texto é Samuel Possebon. Confira:

Como jornalista que acompanha há alguns anos as atividades do grupo Opportunity, liguei para o STJ e procurei a assessoria de imprensa para solicitar o inteiro teor da decisão do ministro Arnaldo Esteves Lima. Fui atendido por uma simpática e eficiente funcionária que me prestou as seguintes informações: a assessoria de imprensa também não tem a decisão, que tampouco está disponível no site do STJ. O problema, segundo me informou a funcionária, é que a decisão foi tomada na sexta-feira, final do dia, último dia de expediente antes do recesso que vai até dia 1 de fevereiro. Com isso, o pessoal que cuida da distribuição interna das decisões já estava de folga. Perguntei quando conseguiria uma cópia e fui informado que isso só estará disponível em fevereiro, quando o ministro e o tribunal voltarem da folga de fim de ano e quando, finalmente, o despacho do ministro será publicado. O fato de a decisão não ter sido publicada, dise a assessoria do STJ, não significa que ela não esteja válida, já que é uma decisão liminar comunicada por telegrama às partes.

A assessoria me informou também que atualmente só quem tem a decisão são os advogados do Opportunity que, ainda segundo a assessora, já distribuíram trechos para alguns jornalistas, pois alguns repórteres leram, para o pessoal da área de imprensa do STJ, partes do despacho. Respondi que não pediria isso aos advogados de Dantas porque prefiro ter de fonte primária qualquer coisa que diga respeito ao Opportunity, e que infelizmente teria que me conformar com as informações publicadas até aqui, onde não se lê, até o momento, a argumentação do ministro Arnaldo. Ou seja, qualquer coisa mais precisa sobre isso, só em fevereiro. Vou tentar por outras vias saber um pouco mais, mas nenhuma será segura como ter diretamente do STJ o que o STJ decidiu.

QUEM SE BENEFICIOU COM A DECISÃO DO STJ NO CASO "DANIEL DANTAS"



Corrupção

Deu na Folha de São Paulo:


DECISÃO DO STJ BENEFICIA 62 COTISTAS DO FUNDO DE DANTAS

Liminar paralisa inquérito que investigava remessa de recursos para as Ilhas Cayman.

Para envolvidos na Operação Satiagraha, medida pode resultar no cancelamento de processos e de inquéritos, que já estavam na fase final.

A decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que suspendeu todas as medidas judiciais da Operação Satiagraha beneficiou pelo menos 62 cotistas do Opportunity Fund, sediado nas Ilhas Cayman, suspeitos de cometer crimes de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e sonegação fiscal.

O inquérito da Polícia Federal sobre o fundo já estava em fase final, com dezenas de investidores já interrogados e indiciados pelos supostos delitos. A expectativa da PF era que esse inquérito resultasse na terceira ação penal da Satiagraha.

A conclusão das apurações não será possível nas próximas semanas diante da decisão liminar (provisória) do ministro Arnaldo Esteves Lima, do STJ, que, no último dia 18, congelou todas a medidas contra o banqueiro Daniel Dantas tomadas pelo juiz federal Fausto Martin De Sanctis, da 6ª Vara Criminal de São Paulo.
Além de paralisar o inquérito, a decisão, se confirmada pelos demais ministros do tribunal, poderá anular toda a investigação, que começou em 2004.

O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ERROU: MAIS UMA VEZ, CONTRA A SOCIEDADE



22/12/2009 - 11:31

Maierovitch: o STJ errou

Da Terra Magazine

Daniel Dantas: STJ erra e favorece o banqueiro.

O Superior Tribunal de Justiça, – por decisão cautelar do ministro Arnaldo Esteves Lima, da 5ª Câmara, (1) suspendeu as apurações policiais relativas à Operação Satiagraha, (2) afastou o juiz Fausto de Sanctis e (3) paralisou todos os atos investigatórios e processuais em curso.

No jargão popular, “ colocou-se tudo no congelador”. Tudo paralisado, no interesse do potente banqueiro Daniel Dantas, já condenado à pena de 10 anos de reclusão, mais R$12 milhões de multa patrimonial, por consumada corrupção.

Por coincidência, a decisão judicial faz recordar uma certa interceptação telefônica referente à “quadrilha” do banqueiro Dantas, que, num restaurante da capital de São Paulo e com tudo filmado e gravado, quis corromper a polícia federal.

Da referida interceptação constou que Daniel Dantas apenas temia os juízes de primeiro grau, instância inicial. Nos tribunais superiores, acertava tudo.

O ministro Arnaldo Esteves Lima errou e minou, com a sua decisão, a segurança social, pública. Suspender toda a atividade policial diante de um oceano de indicativos de crimes graves, representa, no mínimo, um ato temerário, data vênia. Uma inversão tumultuária, contra o prevalente interesse público e à luz de veementes indícios de gravíssimos crimes.

Em outras palavras, com habeas corpus canhestro conferido a Daniel Dantas pelo ministro Gilmar Mendes, e confirmado por voto do relator Eros Grau, ambos do Supremo Tribunal Federal (STF), só faltava parar com a investigação e o processo. E Daniel Dantas, com a liminar do ministro Arnanldo Esteves Lima, conquistou, embora provisoriamente, um “bill” (declaração) de idoneidade.

Afastar um juiz cautelarmente por suspeição, tudo bem. Mas, não colocar outro no lugar, em substituição e para tocar atos urgentes só favorece o infrator, ou melhor, a criminalidade operada pelos potentes.

Mais uma vez, Daniel Dantas obtém sucesso na Justiça.

Pano Rápido. Um pequeno aviso. Não mais estamos no tempo do obscurantismo. Portanto, decisão judicial pode ser comentada e criticada. Num estado democrático, a decisão judicial tem de ser cumprida, mas não está imune à critica.

CITAÇÕES



"Além disso, e em RUA DE MÃO ÚNICA que Benjamin que propõe um novo uso para as citações: em vez de se servir delas, para demonstrar erudição, ele aproveita o prestígio que elas adquiriram para surpreender seus eventuais leitores, sacudindo-o do torpor em que o colocaram os hábitos mentais cultivados pela ideologia conservadora dominante nas nossas sociedades: 'Citações, no meu trabalho, são como salteadores de estrada que assaltam, armados, os viajantes, para roubar-lhes as convicções'" ("Walter Benjamin, O Marxismo da Melancolia"; Leandro Konder).

O SILÊNCIO



pOR Honório de Medeiros

Eles chegaram em silêncio, cada um trazendo uma toalha na mão, estenderam-nas próximas uma da outra, na areia da praia, e começaram a colher o sol que chegava, intenso e voluptuoso, por sobre cada nesga da carne juvenil que lhe era oferecida. Por que eles eram jovens, muito jovens. E, em certo momento, como se cumprindo um ritual, ainda em silêncio, beijaram-se longamente, agressivamente, parecendo quererem ocupar o mesmo lugar no espaço através da boca, não dos lábios, pois estes desapareceram na voragem mecânica da carícia trocada. Como começaram, terminaram. Nada disseram um para o outro. Afastaram-se cada um para seu espaço pessoal e se entregaram, talvez, a um devaneio que os isolava do instante há pouco vivido.

Não sendo carinho aquele beijo trocado tão mecanicamente poderia ser chamado de carícia? Talvez não. Talvez a carícia implique em uma anterior consciência de um momento erótico a ser construído até mesmo com certo vagar, que não afastaria uma comparação audaciosa com o cuidado que se cultiva na elaboração da obra de arte. Não por outro motivo diz-se que o autor, ao examinar com o tato a obra de arte, na realidade está acariciando-a. Na carícia as mãos, o próprio corpo, constroem arabescos ou bordados sutis que prometem mais pelo que insinuam do que, propriamente, pelo contato em si. A pele, de quem recebe, retesa-se na espera de algo que talvez não venha, ou se vier, vem parca, contida, para que a sede ou a fome aumente cada vez mais em uma espiral ilimitada.

Ali, naquele momento em que os corpos dos dois adolescentes se conectaram através das bocas, seria difícil dizer o que houve. Não foi carinho – o toque amoroso despido de erotismo; não foi carícia – toque apaixonado carregado de sensualidade; que teria sido? Talvez o cumprimento de um ritual ao qual se adere por pura falta de imaginação ou desconhecimento. Como não sabem, e não sabem que sabem, como construirão a arte da entrega física? Talvez, apenas, instintivamente, reproduzam um ancestral propósito que seus genes possuam, na ânsia de reproduzirem-se utilizando os corpos como instrumentos. Talvez, apenas, reproduzam mimeticamente uma cena vista em outros lugares, construída por atores sociais desconhecidos.

Como vieram saíram, ainda em silêncio, quando o sol os expulsou. Falaram-se, óbvio. Nada que louvasse o relacionamento que os unia. Nada que rendesse homenagens á beleza daquela luminosidade ímpar que escandia o mar e a areia. Nada que trouxesse o dia como pauta de uma conversa preguiçosa, coloquial, á toa. Tudo quanto houve, lá, entre ambos, foi um silêncio atordoante...

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

FELIZ NATAL E PRÓSPERO ANO NOVO



Agradeço e retribuo os votos de Feliz Natal e Próspero Ano Novo que chegaram a este blog.

O meu desejo é que em 2010, individualmente, sejamos muito felizes.

E, coletivamente, tenhamos um mundo melhor, um Brasil sem corrupção, um Rio Grande do Norte com segurança, saúde e educação pública de Primeiro Mundo.

Vale a pena sonhar.

Vamos a 2010!

http://www.honoriodemedeiros.blogspot.com/

CORAGEM



"Coragem é fazer aquilo de que se tem medo" ("Gaijin"; Marc Olden).

A ESTRANHA PEREIRO - I



Pereiro, Ceará

Por Honório de Medeiros

No pequeno cemitério – o antigo – de Pereiro, cidade duas vezes secular que se estende ao comprido e preguiçosamente entre serras, localizado no centro da cidade, passeio entre os túmulos, as árvores e as flores com sua guardiã, Dona Maria, procurando o jazigo perpétuo de Décio Hollanda, aquele mesmo que quis tomar Apodi pelas armas através da valentia de Massilon. Ela aponta: “são três; aqueles dois lá e este aqui, mas eu não sei quem é essa pessoa que o senhor está procurando.”

Voltamos para a entrada naquele caminhar desconexo de quem anda nos cemitérios antigos de cidades pequenas, tomando cuidado para não pisar em algum montículo inesperado que guarde os restos mortais de alguém. Eu lhe elogio a limpeza, a arborização e as flores do cemitério. “Obrigada”, diz. “Já faz vinte e cinco anos que estou aqui. Antes de mim era uma senhora com quem aprendi tudo e que também passou vinte e cinco anos.” “É muito tempo”, falo quase para mim mesmo. “Para eles, não”, responde, fazendo um arco amplo com o braço e envolvendo toda a área.

Dona Maria é baixinha, moreno-clara, entroncada. Sexagenária, eu diria. Muito limpa e bem arrumada, não há sinal de desmazelo em si. Os cabelos não guardam qualquer fio branco. Seria pintura? Não, observo de perto. Filhos, netos, todos foram criados através do labor contínuo e obscuro entres velas, flores frescas ou murchas e os restos mortais de seus conterrâneos.

“Qual o fato mais estranho que a senhora presenciou neste cemitério?” Ela não hesita em responder. Talvez a mesma história já tenha sido contada muitas vezes. “Uma viúva” - começa esboçando um olhar distante, “que chega sempre toda de preto para rezar naquele túmulo muito antigo encostado à parede. Ninguém sabe de quem ele é. O tempo já apagou, há muito, as inscrições. Não há qualquer documento a respeito. Eu mesma já pesquisei. Ela somente aparece quando não há ninguém, além de mim, no cemitério. Passa por mim, eu dou bom dia ou boa tarde, ela responde com um aceno de cabeça que intimida a gente, vai até o túmulo e reza em pé mesmo. Aí sempre acontece alguma coisa que me distrai e quando olho novamente ela já não está presente.”

“Alguém mais a viu?” “Não, somente eu.”

Chegamos à entrada. “Espere”. Desaparece por trás de algumas árvores e volta logo depois com uma flor branca entre os dedos. “Tome, é para o senhor”. “Ah, um bogari (jasminum sambac)!” “O senhor conhece?” “Era a flor predileta de minha mãe”. Eu agradeço, tocado. Ela nota a minha emoção. Vou me afastando, a flor próxima ao nariz, linda, pura, perfumada. Depois eu a ofereci à castelã da Casa-Grande da Fazenda Trigueiro, onde Frei Damião procedeu ao ritual exorcista próprio para afastar almas penadas, mas isso é outra história...