quinta-feira, 27 de outubro de 2011

OS ESPERTALHÕES DE FEIRAS

sertaomeudecadadia.blogspot.com


Honorio de Medeiros


Antigamente não havia feira, no interior, sem um espertalhão. Era o espertalhão de feira. Chegava insidioso, se imiscuindo por entre as pessoas até um local apropriado, pousava a mala no chão, tirava o chapéu preto encharcado de suor, puxava um lenço amarfanhado do bolso e o passava no rosto e cabelo, abria a mala, sacava uma mesinha de madeira daquelas pré-montadas e a cobria com um pano que fora branco em alguma "era" passada, expunha vários frascos cheios de líquidos coloridos, olhava ao seu derredor, escolhia uma vítima após lançar um olhar experimentado para todos os lados e começava sua "latomia": "a senhora, é, a senhora mesmo, me ouça com atenção, porque estou vendo pela sua cor que a senhora apresenta algum incômodo no sangue. Tem dormido mal, de quando em vez, não é? Às vêzes tem sentido uma tristeza que demora a passar, não é? Algumas comidas não estão entrando bem, não é? É como digo, minha senhora, a senhora está com algum incômodo no sangue. Mas eu tenho a solução. E para o senhor também, e para você também, moça bonita. Porque aqui, nesta garrafa, está o mais potente destilado de uma erva que somente existe no coração da Amazônia, e que os índios guardam como sendo o maior segredo deles. Essa bebida cura todo mal que se origina do sangue..."

E por aí vai. O espertalhão de feira já formou um círculo em seu derredor e prende a atenção das pessoas contando casos e mais casos nos quais a cura milagrosa se estabeleceu a partir de sua beberagem. São estórias escabrosas, produzidas e contadas para prender a atenção. Voz tonitroante, olhar de águia para perceber quais são os mais impressionáveis, tiradas bem-humoradas de quando em vez, para estabelecer empatia com os ouvintes, poderia ser um estudo de caso de uma retórica firmada no dia-a-dia, na experiência brutal da luta pela sobrevivência, na prática permanente da mistificação.

 Na outra ponta do centro da feira, outro espertalhão já montou seu "circo": também em uma mesinha dispõe sobre a superfície do pano branco uma bolinha de metal acobraeado e três copos de madeira escurecidos pela sujeira e convida os incautos a descobrir onde a bolinha está escondida, enquanto rapidamente os maneja de um lado para o outro. Alguns dos incautos já ganharam uma pequena importância: isso faz parte do processo de atração das futuras vítimas - o primeiro dinheiro fácil - que começam ganhando e, no fim, sem ter notado, seu "apurado", tudo quanto ganhou na feira, foi embora para os bolsos do espertalhão, misturado com cachaça ou conhaque barato e pedaços de carne de bode.

Em outro lugar cantadores de viola "simulam" um desafio enquanto alguém "corre o chapéu". Não há peleja, não há repente, não há criatividade: tudo quanto é cantado já o foi Sertão a dentro, muitas vezes, em muitos lugares. O público pensa que está assistindo um desafio quando, na verdade, está sendo iludido com versos decorados e antigos. 

Os espertalhões de feira são como nossos políticos. E os "bestas" somos nós.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

TRISTES TEMPOS

O Governo do Rio Grande do Norte dobrou os servidores públicos estaduais.

As palavras-de-ordem sumiram, assim como as bandeiras e os panfletos. Convicções se estilhaçaram. Outras surgiram, com ares de quem pretendem ficar.

Resta o ressentimento que, na massa, costuma ser persistente, difuso e malévolo. Além de praticamente inadministrável.

Sem boas recordações do passado,  com um presente sombrio e um futuro sem esperança, o servidor público é a consequência, no Estado, assim como o Homem comum o é, na Sociedade, do que a nossa elite política construiu, ao longo dos anos, com incompetência inigualável: educação, saúde, e segurança de terceiro mundo, em pleno século XXI. Nenhum avanço; somente recuo; nenhum progresso; somente decadência.

Essa consequência cobrará de todos nós, sua fatura: teremos, no futuro, obras que serão ilhas de excelência para uns poucos, como a "Arena das Dunas", em um mar de decadência generalizada, como no caso da saúde pública.

Algo semelhante a como age a grande maioria dos prefeitos do interior: calçam as ruas e abandonam as escolas.

Para governos que se sustentam em obras, não são necessários servidores públicos; para governos que se sustentam em políticas públicas, são imprescindíveis os servidores públicos.

É essa a lição da história.

Tristes tempos.

PATOS, ONDE EXISTIU UMA LAGOA (1)

Virgílio Trindade


                   Saímos cedo de Pau dos Ferros no rumo de Patos, na Paraíba, em busca das raízes de Massilon. Lá chegamos ao meio-dia. Hospedamo-nos no Hotel Zurick. À noite perguntamos ao recepcionista porque o hotel tinha esse nome. Com certo sarcasmo sertanejo, respondeu: “o homem andou por lá e por certo achou esse nome bonito.” Franklin Jorge comentou: “se Cascudo tivesse estado aqui escreveria uma crônica com o seguinte título “Zurick em pleno Sertão paraibano; faria algo grandioso e o dono terminaria recebendo o título de cônsul honorário da Suíça”.

                   Fomo à Matriz. Prédio simples. Chegamos em plena missa das 16:00 horas. Rodeamos a Igreja cujos fundos dão para uma rua estreita, pequena. Olhávamos para uma porta, indecisos, quando um homem trigueiro, alto, encorpado, trinta e poucos anos, cabelo curtíssimo, à escovinha, vestido com uma camisa de mangas compridas abotoada nos pulsos se aproximou maciamente. Desejou-nos uma boa tarde. Perguntei-lhe se ali era a Secretaria da Paróquia. Ele disse que não e nos apontou onde ficava. Perguntei-lhe se era padre. Confirmou com aqueles ademanes típicos, mas discretos, de seminarista, contidos por sua estrutura física maciça embora não desmesurada e nos entregou sua mão também macia para apertarmos. Padre Francisco foi gentil, delicado.

                   Na livraria da cidade perguntamos à vendedora pelas obras dos autores locais. Ela nos apontou, com certa displicência, um canto afastado de uma estante. Encontramos uma gramática em versos, que eu logo comprei, e livros e mais livros de um poeta local. O poeta praticamente inundara a livraria. Não se tratava de vários volumes de um livro de poesia. Tratava-se de vários livros de poesia a ocupar a livraria. Nada mais.

 Depois, fomos às ruas: vibrantes, febris, plenamente comerciais. Carros, motos, bicicletas... Pessoas vinham e iam rápidas, com aquele semblante típico de quem precisa chegar logo em algum lugar qualquer, para resolver algo. Não vimos pedintes, nem pastoradores de carro, nem lavadores de pára-brisa, nem deficientes físicos. Vimos uma louca, personagem folclórico, que me abordou na farmácia: “lindão, me dê um dinheiro”. Como não dar? “Ela dá sempre esse golpe em quem não é daqui” me diz a caixa da farmácia.

Raros são os passeantes. Os flâneurs. A maioria mulheres. As mulheres de Patos são belas, não bonitas. Há uma diferença entre ser bela e ser bonita. A mulher, quando é bela, desafia o tempo. Não pede emprestado à juventude aquilo que já possui. Belas, as mulheres de Patos. Suavemente arredondadas, como um ideal rafaelita amoldado à realidade anoréxica dos tempos atuais. Altivas. Ou contidas. Ou dissimuladas. Pernas longas, levemente grossas, torneadas. Narizes afilados. Belos dentes. Compuseram um contraste marcante com o bulício comercial suburbano que ocupou nossos olhos enquanto caminhávamos pelas ruas da cidade. Não haveria ruas onde não se compra e não se vende? Aparentemente não. Em qualquer lugar havia essa atividade febril, tipicamente burguesa, que pressupunha uma interação constante entre as pessoas e que se opunha à percepção do aparente distanciamento das belas mulheres de Patos.

                   “Por que Patos?”, perguntei a Virgílio Trindade, a quem seu primo homônimo Virgílio Trindade, comerciante no Mercado Central, por nós procurado por indicação de um transeunte como sendo bastante antigo na praça, reputa como grande escritor. Recebeu-nos muito bem. Tem um programa político em uma rádio importante da cidade. Magro, moreno, careca, sentado por trás de um birô anacrônico em um escritório de um só vão no centro da cidade, com sua voz característica de fumante e locutor, nos presenteou com um livro de crônicas de sua autoria, “Relíquias”. Falou-nos do programa político: “é complicado”. “Por quê?” “A todo instante a gente está falando com alguém ao telefone, ao vivo, no ar, e a criatura grita: eu voto em Lula! Já pensou?”

                                     

terça-feira, 25 de outubro de 2011

II CONGRESSO NACIONAL DO CANGAÇO E III SEMANA REGIONAL DE HISTÓRIA

Bilhete do Presidente da SBEC:

"Caros Sócios e amigos,

O II Congresso Nacional do Cangaço e III Semana Regional de História teve inicio nesta segunda feira (24).

Ultrapassamos o numero de 470 participantes entre estudantes, professores, pesquisadores, e o evento irá até a sexta feira (29).

Ainda há tempo de participar. Venha para Cajazeiras/PB e se hospede no Gravatá Flat Hotel através do site www.gravatahotel.com.br

Prestigie a SBEC e a UFCG/CFP.

Abraços,
Lemuel Rodrigues da Silva"