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segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

DO OUTONO DA VIDA


"- Sinto saudades da minha juventude - responde - ou, melhor, do que essa juventude tornava possível... Por outro lado, descobri que o outono tranquiliza. Na minha idade, é necessário se sentir a salvo, longe dos sobressaltos produzidos pela primavera.

(...)

- Sei a que está se referindo - diz, finalmente. - Também acontece comigo. Um dia me dei conta de que havia mais pessoas desagradáveis nas ruas, os hotéis já não eram tão elegantes nem as viagens tão divertidas. Que as cidades estavam mais feias e os homens mais grosseiros ou menos atraentes...

("O Tango da Velha Guarda"; Arturo Pérez-Reverte).

Arte pinçada em oblogdafabrica.blogspot.com

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

OS LIVROS VIRARAM UM PRODUTO SUPÉRFLUO...



"Você estudou um pouco de economia, Marc? Os livros viraram um produto supérfluo. As pessoas querem um livro que as agrade, relaxe e divirta. E se não for você a lhes dar um livro assim, alguém dará, e você acaba indo parar na lata de lixo."
(Personagem de "A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert"; Joël Dicker).

sexta-feira, 9 de maio de 2014

UM A SÓS ENTRE TANTOS



Não consigo permanecer por muito tempo em um teatro ou cinema. Mal posso ler um jornal, raramente leio um livro moderno. Não sei que prazeres e alegrias levam as pessoas a trens e hotéis superlotados, aos cafés abarrotados, com sua música sufocante e vulgar, aos bares e espetáculos de variedades, às Feiras Mundiais, aos Corsos, aos centros culturais e às grandes praças de esportes. Não entendo nem compartilho essas alegrias, embora estejam ao meu alcance, pelas quais tantos milhares anseiam.
(O lobo da estepe; HESSE, Hermann)

* Arte em: gavetadoivo.wordpresse.com  

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

DO OUTONO DA VIDA




- Sinto saudades da minha juventude - responde - ou, melhor, do que essa juventude tornava possível... Por outro lado, descobri que o outono tranquiliza. Na minha idade, é necessário se sentir a salvo, longe dos sobressaltos produzidos pela primavera.
(...)
- Sei a que está se referindo - diz, finalmente. - Também acontece comigo. Um dia me dei conta de que havia mais pessoas desagradáveis nas ruas, os hóteis já não eram tão elegantes nem as viagens tão divertidas. Que as cidades estavam mais feias e os homens mais grosseiros ou menos atraentes...
(O Tango da Velha Guarda; Arturo Pérez-Reverte).

* Arte pinçada em oblogdafabrica.blogspot.com

sábado, 25 de janeiro de 2014

DE SOLTEIRONAS




* Honoré de Balzac
"O CURA DE TOURS"


"Não têm todas as solteironas um talento particular para acentuar as ações e as palavras que os ódios lhes sugere? Arranham como gatos. E, além disso, não somente ferem, mas sentem prazem em ferir e em mostrar à vítima que a feriram."


Arte: ventodoagreste.blogspot.com

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

QUANTO ÀS MULHERES QUE SE VENDEM, SEJAM QUAIS SEJAM

Em "A Sonata a Kreutzer", de Tolstoi:
 
"Não concorda comigo? Permita-me demonstrar-lhe o que digo - começou, interrompendo-me. - O senhor me diz que as mulheres da nossa sociedade vivem com interesses diferentes daqueles das mulheres nas casas de tolerância, mas eu lhe digo que não é assim, e vou demonstrá-lo. Se as pessoas diferem quanto aos objetivos da existência, quanto ao conteúdo interior da vida, esta diferença tem que se refletir sem falta na aparência exterior também. Mas olhe para aquelas, para as infelizes e desprezadas e, depois, para as senhoras da mais alta sociedade: os mesmos trajes vistosos, os mesmos modelos, os mesmos perfumes, o mesmo desnudamentos dos braços, dos ombros, dos seios, o mesmo traseiro apertado e em posição saliente, a mesma paixão por pedrinhas, por objetos caros e brilhantes, os mesmos divertimentos, danças, músicas e canções. Assim como aquelas aplicam todos os seus recursos para atrair os homens, fazem estas também. Nenhuma diferença. Numa distinção rigorosa, deve-se apenas dizer que as prostitutas a curto prazo são geralmente desprezadas, e as prostitutas a prazo longo, respeitadas."

terça-feira, 4 de junho de 2013

PROUST: UM EXERCÍCIO DE ESTILO (SWAMM E AS MULHERES)


 
Marcel Proust
“Em Busca do Tempo Perdido”
Volume 1
“No Caminho de Swann”
Tradução de Mário Quintana; Editora Globo; 3ª edição; 6ª reimpressão; p. 243.
 
                               “Não era desses que, por preguiça ou resignado sentimento da obrigação que lhes impõe o fastígio social de se amarrarem a determinada margem, evitam os prazeres que lhes oferece a realidade fora da posição mundana onde vivem acantonados até a morte, acabando por chamar de prazeres, na falta de coisa melhor e por força do hábito, às medíocres diversões e aborrecimentos suportáveis que sua existência encerra. Swann, esse, não procurava achar bonitas as mulheres com quem passava o tempo, mas sim passar o tempo com as mulheres que primeiro achara bonitas. E muitas vezes eram mulheres de beleza bastante vulgar, pois as qualidades físicas que buscava sem se dar conta estavam em completa oposição com aquelas que lhe tornavam admiráveis as mulheres esculpidas ou pintadas por seus mestres prediletos. A profundeza, a melancolia da expressão, gelavam-lhe os sentidos, que despertavam, ao contrário, ante uma carne sadia, abundante e rosada.
                   Quando encontrava em viagem uma família com a qual seria elegante não travar relações, mas em que descobriria certa mulher com um encanto que ainda lhe era desconhecido, ‘guardar a linha’ e enganar o desejo que ela lhe despertara, substituir o prazer que poderia conhecer com ela por um prazer diferente, escrevendo a uma antiga amante para que viesse vê-lo, isso lhe pareceria uma abdicação tão covarde diante da vida e uma renúncia tão estúpida a uma nova felicidade, como se em vez de visitar a terra onde se achava, se metesse em seu quarto, a olhar ‘vistas’ de Paris. Não se encerrava no edifício de suas relações, mas fizera com ele, para poder erguê-lo novamente em toda parte onde uma mulher lhe agradasse, uma dessas tendas desmontáveis que os exploradores carregam consigo. Quanto ao que não podia ser transportado ou trocado por um prazer novo, ele o considerava sem valor, por mais invejável que parecesse aos outros. Quantas vezes seu crédito junto a uma duquesa, formado com os desejos que a dama acumulara durante anos, de lhe ser agradável, sem nunca haver encontrado uma ocasião propícia, não o desfazia Swann de uma vez por todas, reclamando dela, com um indiscreto despacho, uma recomendação telegráfica que o pusesse imediatamente em contato com um dos seus intendentes cuja filha lhe chamara a atenção no campo, como faria um esfaimado que trocasse um diamante por um pedaço de pão!”
 
ARTE: william.com.br

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

MONTAIGNE E A DESCOBERTA DA LENTIDÃO (PREGUIÇA)


Michel de Montaigne

sarahbakewell.com


Para Carlos Santos, no outono de sua existência.


"Montaigne seria uma boa referência para o moderno Movimento Devagar, que, originado no fim do século XX, aos poucos foi se disseminando e se transformou quase num culto. Como Montaigne, seus seguidores fazem da lentidão uma espécie de princípio moral. Seu texto fundador é o romance The Discovery of Slowness (A descoberta da lentidão), de Sten Nadolny, que conta a vida do explorador do Ártico Jonh Franklin, cujo ritmo natural de vida e pensamento é descrito como o de um velho preguiçoso depois de uma longa massagem e de um cachimbo de ópio. Na infância, Franklin é alvo de zombaria, mas ao chegar ao extremo Norte ele encontra o ambiente perfeitamente adequado a seu temperamento: um lugar onde todo mundo faz as coisas calmamente, onde pouco acontece e onde é importante parar para pensar antes de se precipitar na ação. Muito depois de publicado na Alemanha em 1983, The Discovery of Slowness continuava nas listas de best-sellers, sendo propagandeado até como um manual alternativo de administração. Enquanto isso, surgiu na Itália um desdobramento culinário do Movimento Devagar, o slow food, que teve origem como protesto contra as filiais do McDonald's em Roma e acabou se transformando em toda uma filosofia do bem viver" ("COMO VIVER"; Sarah Bakewell; Objetiva; 2012, Rio de Janeiro).


Sarah Bakewell vive em Londres, onde ensina escrita criativa na City University e cataloga coleções de livros raros para o National Trust. Foi curadora de livros antigos na Wellcome Library.

terça-feira, 10 de abril de 2012

O VERDADEIRO DESTINO DE UM GRANDE ARTISTA

Gaston Bachelar

Em marciomariguela.wordpress.com


"O verdadeiro destino de um grande artista é um destino de trabalho. Em sua vida chega a hora em que o trabalho domina e conduz sua destinação. As infelicidades e as dúvidas podem atormentá-lo por muito tempo. O artista pode vergar sob os golpes da sorte. Pode perder anos numa preparação obscura. Mas a vontade de obra não se extingue desde que ela encontrou uma vez seu verdadeiro foco. Começa então o destino de trabalho. O trabalho ardente e criador atravessa a vida do artista e confere a essa vida virtudes de linha reta. Tudo vai em direção à meta numa obra que cresce. Cada dia, esse estranho tecido de paciência e entusiasmo torna-se mais ajustado na vida de trabalho que faz de um artista um mestre."

Gaston Bachelard (1884-1962), "Le Droit de Rêver"

domingo, 6 de novembro de 2011

A DIALÉTICA NÃO DEVE AVENTURAR-SE COM A VERDADE

Schopenhauer
dialogocomosfilosofos.com.br

"A dialética não deve, portanto, aventurar-se na verdade, do mesmo modo como o mestre de esgrima não leva em consideração quem de fato está com a razão no litígio que causou o duelo: acertar e defender, eis o que interessa. O mesmo vale na dialética: ela é uma esgrima intelectual; somente quando entendida desse modo puro pode ser apresentada como uma disciplina própria, pois, se nos colocamos como metga a pura verdade objetiva, retornamos à mera LÓGICA; se, por outro lado, nos colocamos a realização de proposições falsas, temos então a mera SOFÍSTICA."

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

AS SOCIEDADES PRIMITIVAS NÃO TÊM O ESTADO PORQUE O RECUSAM

Pierre Clastres


Pierre Clastres

"Como sociedades completas, acabadas, adultas e não mais como embriões infrapolíticos, as sociedades primitivas não têm o Estado porque o recusam, porque recusam a divisão do corpo social em dominantes e dominados."

"ARQUEOLOGIA DA VIOLÊNCIA" (Cap. VI, A Questão da Violência nas Sociedades Primitivas)

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

"O GENE EGOISTA"

Post Scriptum ao texto "O SISTEMA JOGA SUJO":

"Penso que um novo tipo de replicador surgiu recentemente neste mesmo planeta. Está bem diante de nós. Está ainda na sua infância, flutuando ao sabor da corrente no seu caldo primordial, porém já está alcançando uma mudança evolutiva a uma velocidade de deixar o velho gene, ofegante, muito para trás.
O novo caldo é o caldo da cultura humana. Precisamos de um nome para o novo replicador, um nome que transmita a idéia de uma unidade de transmissão cultural, ou uma unidade de imitação.

 (...) Espero que meus amigos classicistas me perdoem se abreviar mimeme para meme.

Exemplos de memes são melodias, ideías, slogans, as modas no vestuário, as maneiras de fazer potes ou construir arcos. Tal como os genes se propagam no pool genético saltando de corpo para corpo através dos espermatozóides ou dos óvulos, os memes também se propagam no pool de memes saltando de cérebro para cérebro através de um processo que, num sentido amplo, pode ser chamado de imitação. Se um cientista ouve ou lê sobre uma boa idéia, transmite-a aos seus colegas e alunos. Ele a menciona nos seus artigos e palestras. Se a idéia pegar, pode-se dizer que ela propaga a si mesma, espalhando-se de cérebro para cérebro."

"O GENE EGOISTA";  Capítulo 11: "Memes: os novos replicadores"; Richard DAWKINS.


segunda-feira, 3 de outubro de 2011

"O INIMIGO DO POVO"

Henrik Ibsen


Post Scriptum ao texto "O SISTEMA JOGA SUJO":

"PREFEITO - Deus me livre! Tenho horror a brigas ou discussões com quem quer que seja. Mas exijo que tudo se resolva segundo os regulamentos e passe pela autoridade legitimamente constituída para esse fim. Nada de operações clandestinas!

DR. STOCKMANN - Tenho eu por acaso o hábito de usar caminhos escusos ou clandestinos?

PREFEITO - Não digo que você tenha feito isso. Mas sei que tem a tentação permanente de fazer as coisas por sua própria conta. E, numa sociedade bem organizada, isso é indamissível. As iniciativas particulares devem se submeter, custe o que custar, ao interesse geral, ou melhor, às autoridades encarregadas de zelar pelo bem geral."

"UM INIMIGO DO POVO", Henrik Ibsen, Primeiro Ato. 

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

O PRIMEIRO A EXERCER A TIRANIA SOBRE OUTROS HOMENS

nimrod-palace.jpg



"Filho de Cus e neto de Cam, filho de Noé, Nemrod (há também em português a forma Nimrod, que parece mais correta em relação à origem hebraica) foi o fundador da Babilônia, segundo o Gênesis (10, 8-12). Era um homem valente, 'robusto caçador diante do Eterno'. Foi o primeiro a exercer a tirania sobre outros homens. Contos árabes e persas fazem dele o centro de muitas lendas."

OS INTELECTUAIS NA IDADE MÉDIA; LE GOFF, Jacques.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

EM "DOUTOR PASAVENTO", DE ENRIQUE VILA-MATAS

Robert Walser


"Em Walser, o discreto príncipe da seção angélica dos escritores, eu pensava com freqüência. E já fazia anos que ele era meu herói moral. Admirava a extrema repugnância que lhe causava todo tipo de poder e sua precoce renúncia a qualquer esperança de sucesso, de grandeza. Admirava a sua singular determinação de querer ser como todo mundo quando na realidade não podia ser igual a ninguém, porque não desejava ser ninguém, e isso era algo que sem dúvida lhe dificultava ainda mais o desejo de ser como todo mundo. Admirava e invejava sua caligrafia, que no último período de sua atividade literária (quando se entregou àqueles textos em letra minúscula conhecidos como microgramas), foi se tornando cada vez menor e o levou a substituir o traço da pena pelo do lápis, porque sentia que este se encontrava 'mais perto da desaparição, do eclipse'. Admirava e invejava seu lento mas firme deslizamento em direção ao silêncio. O escritor mexicano Christopher Domínguez Michael chegou a dizer que em meus livros a aparição rotineira de Robert Walser era tão necessária como a de Sandokan no ciclo salgariano."

Enrique Vila-Matas, "Doutor Pasavento"  

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

"CONFISSÕES DO IMPOSTOR FELIX KRULL"; THOMAS MANN



Thomas Mann

"Outra idéia fixa muitas vezes ocupava naquele tempo meu espírito e ainda hoje não perdeu seu encanto e significado: o que é mais útil - indagava a mim mesmo -, representar o mundo grande ou pequeno? E isso significava o seguinte: homens importantes, pensava eu, generais, estadistas, naturezas de conquistadores e líderes de todos os tipos, que se erguem muito acima dos outros, certamente são feitos de tal maneira que o mundo lhes parece pequeno como um tabuleiro de xadrez. De outro modo não teriam a impiedade e frieza para agir, audaciosos e imprevisíveis, segundo seus próprios planos, passando por cima da felicidade e dos sofrimentos individuais. Mas, por outro lado, uma concepção tão limitadora indubitavelmente pode fazer com que não se chegue a nada na vida; pois quem considera mundo e pessoas pouco ou nadaa, cedo terá consciência da sua insignificância, tendendo a cair na indiferença e na preguiça. Preferirá, com desdém, ignorar os espíritos alheios - além disso, sua insibilidade e alheamento chocarão os demais e ofenderão um mundo geralmente tão seguro de seu próprio valor, anulando inclusive a possibilidade de sucessos imprevistos. Então, perguntava-me eu, será mais aconselhável ver no mundo e nas pessoas algo de grande, magnífico e importante, do qual vale a pena tentar obter respeito e valor? É preciso considerar que essa visão por assim dizer aumentadora e respeitosa facilmente nos torna vítimas de automenosprezo e inibição, de modo que o mundo há de passar sorrindo por cima de um rapazinho ingênuo e servil, em busca de amantes mais viris. Mas, por outro lado ainda, essa atitude crédula e devota em relação ao mundo traz grandes vantagens. Pois quem confere grande importância às coisas e às pessoas não apenas as lisonjeará por isso, garantindo para si a gratidão delas, mas também dará ao seu pensamento e ao seu comportamento uma seriedade, uma paixão, uma responsabilidade que, na medida em que o tornam amável e importante, também lhe podem trazer os maiores sucessos e poderes."

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

"A CARTUXA DE PARMA", DE STENDHAL


Stendhal

“A duquesa ficou encantada.
- Se formos expulsos – disse-lhe ela -, iremos ver-te em Nápoles. Mas, já que aceitas até nova ordem a solução das meias roxas, o conde, que conhece bem a Itália atual, encarregou-me que te prevenisse do seguinte: podes crer ou não crer no que te ensinarem, mas nunca faças nenhuma objeção. Imagina que te ensinam as regras do jogo de “whist”; pensarias em fazer objeção a essas regras? Eu disse ao conde que eras um crente e ele se alegrou muito; isso é útil quer nesse mundo, quer no outro. Mas se crês, não caias na vulgaridade de falar com horror de Voltaire, Diderot, Raynal, e de todos esses desmiolados franceses precursores das duas Câmaras. Que esses nomes raramente te saiam da boca; mas, enfim, quando preciso, fala desses senhores com uma ironia calma; é gente de há muito refutada, e cujos ataques não surtem mais efeito. Crê cegamente em tudo que te disserem na Academia. Lembra-se que haverá gente que tomará nota fielmente das tuas menores objeções; poderão perdoar-te uma pequena aventura galante se for bem conduzida, mas nunca uma dúvida; a idade suprime a aventura e aumenta a dúvida. Procede de acordo com esse princípio no tribunal da penitência. Terás uma carta de recomendação para um bispo factótum do cardeal arcebispo de Nápoles; somente a ele deverás confessar tua escapada na França e tua presença, no dia 18 de junho, nas cercanias de Waterloo. Aliás, deves abreviar, diminuir tanto quanto possível essa aventura, confessa-a apenas para que não te possam acusar de a teres ocultado; eras tão moço, naquela época!... A segunda advertência que o conde te manda é esta: se te ocorre um argumento brilhante, uma réplica vitoriosa que mude o curso da conversação, não cedas à tentação de brilhar, conserva-te calado; as pessoas finas verão teu espírito em teus olhos.”

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

"A SONATA A KREUTZER", TOLSTOI


Tolstoi

"Não concorda comigo? Permita-me demonstrar-lhe o que digo - começou, interrompendo-me. - O senhor me diz que as mulheres da nossa sociedade vivem com interesses diferentes daqueles das mulheres nas casas de tolerância, mas eu lhe digo que não é assim, e vou demonstrá-lo. Se as pessoas diferem quanto aos objetivos da existência, quanto ao conteúdo interior da vida, esta diferença tem que se refletir sem falta na aparência exterior também. Mas olhe para aquelas, para as infelizes e desprezadas e, depois, para as senhoras da mais alta sociedade: os mesmos trajes vistosos, os mesmos modelos, os mesmos perfumes, o mesmo desnudamentos dos braços, dos ombros, dos seios, o mesmo traseiro apertado e em posição saliente, a mesma paixão por pedrinhas, por objetos caros e brilhantes, os mesmos divertimentos, danças, músicas e canções. Assim como aquelas aplicam todos os seus recursos para atrair os homens, fazem estas também. Nenhuma diferença. Numa distinção rigorosa, deve-se apenas dizer que as prostitutas a curto prazo são geralmente desprezadas, e as prostitutas a prazo longo, respeitadas."

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

"NO CAMINHO DE SWANN", PROUST


Proust

"Até então, como muitos homens cujo gosto artístico se desenvolve independentemente da sensualidade, houvera uma estranha disparidade entre as satisfações que concedia a uma e outra coisa, gozando na companhia de mulheres cada vez mais grosseiras, a sedução de obras mais e mais refinadas, levando, por exemplo, uma criadinha a um camarote reservado, para assistir à representação de uma peça decadente que ele tinha vontade de ouvir ou a uma exposição de pintura impressionista, e persuadido, aliás, de que uma mulher do mundo cultivado não compreenderia muito mais do que a criada, mas não saberia calar-se tão gentilmente.
(...)
Tendo aliás deixado enfraquecerem as crenças intelectuais da sua juventude, e havendo o seu ceticismo de mundano penetrado até elas, sem que o soubesse, pensava (ou pelo menos o pensara tanto tempo que ainda o dizia) que os objetos do nosso gosto não possuem em si mesmos um valor absoluto, mas que tudo é questão de época, de classe, tudo consiste em modas, as mais vulgares das quais valem tanto como as que passam por mais distintas."

sábado, 21 de novembro de 2009

"OS MAIAS", DE EÇA DE QUEIRÓS



Eça de Queirós

"Taveira ultimamente introduzira o dominó no Ramalhete, e havia agora ali, às vezes, partidas ardentes, sobretudo quando aparecia o marquês. Porque a paixão do Taveira era bater o marquês.

Mas foi necessário que o marquês acabasse de bracejar, de desenrolar o arrazoado com estava acabrunhando o Craft, que do fundo da poltrona, de cachimbo na mão e com ar de sono, respondia por monossílabos. Era ainda a propósito do artigo do Ega, da definição de 'senso moral'. Já tinha falado de Deus, de Garibaldi, até do seu famoso perdigueiro 'Finório"; e agora definia a Consciência... Segundo ele, era o medo da polícia. Tinha o amigo Craft visto já alguém com remorsos? Não, a não ser no teatro da Rua dos Condes, em dramalhões...

- Acredite você uma coisa, Craft - terminou ele por dizer, cedendo ao Taveira que o puxava para a mesa. - Isto de consciência é uma questão de educação. Adquire-se como as boas maneiras; sofrer em silêncio por ter traído um amigo, aprende-se exatamente como se aprende a não meter os dedos no nariz. Questão de educação... No resto da gente é apenas o medo da cadeia, ou da bengala..."