sexta-feira, 13 de abril de 2012

CORONELISMO: O RIO GRANDE DO NORTE NO TEMPO DOS CORONÉIS (I)

Coronelismo: o Rio Grande do Norte no tempo dos coronéis (O “Fogo” de Pau dos Ferros).

 PRIMEIRA PARTE


Cel. Antônio Joaquim de Santana



Corria o ano de 1901. No Cariri, mais precisamente em Missão Velha, o Coronel Antônio Joaquim de Santana, mais conhecido como Coronel Santana apeia, do poder, pelas armas, o Coronel Antônio Róseo Jacamaru, chefe político e intendente da Cidade. Pertencendo à família dos Terésios, originária de velhos troncos coloniais, fundadores do Engenho de Santa Teresa, entre Missão Velha e Barbalha, governou Missão Velha o Coronel Santana durante dezesseis anos e alimentou o sonho de dominar o sul do Ceará colocando, em cada município, na chefia, uma pessoa de seu sangue.


Seguiu-se, no tempo, a deposição do Coronel José Belém de Figueiredo, chefe político do Crato, em 1904, após tiroteio que durou dois dias e deixou vinte e uma vítimas, das quais oito mortas. Logo depois, em 1906, após tiroteio que durou oito horas, caiu o Coronel Manuel Ribeiro da Costa, conhecido por Neco Ribeiro, sobrinho do célebre caudilho Joaquim Pinto Madeira, este da guerra civil absolutista de 1832. Seu algoz foi o Coronel João Raimundo de Macedo, o Joca do Brejão. Venceu quem conseguiu reunir um maior exército de “cabras”.


Vieram, após, o fim do reinado político do Coronel Marcolino Alves de Oliveira, arrancado da chefia política do Quixadá pelos Coronéis Joaquim Fernandes de Oliveira e José Alves Pimentel e, em 1907, em Lavras da Mangabeira, a queda do Coronel Honório Correia Lima, curiosamente o filho mais velho de Dona Fideralina Augusto Lima e irmão de Gustavo Augusto Lima, seus carrascos.


 Não foram diferentes os anos seguintes, como qualquer leitor poderá constatar lendo “Império do Bacamarte”, obra inigualável de Joaryvar Macedo, fonte dessa pequena introdução, sem qualquer sombra de dúvida uma referência para os estudiosos do fenômeno do coronelismo no Brasil, principalmente do Sertão nordestino, e sua relação com o cangaço e o misticismo próprios da região. Joaryvar, alicerçado em profunda pesquisa bibliográfica, em jornais antigos, depoimentos pessoais, literatura de cordel, e outras fontes primárias, tais como processos-crimes, nos legou um impressionante painel histórico do Cariri cearense e seus principais personagens, os coronéis.


Teria sido esse epifenômeno, o coronelismo, circunscrito ao Sertão do Cariri? Claro que não. Muito pelo contrário, acerca de sua importância, sua presença no mundo rural brasileiro, conseqüência tardia de certa estrutura de poder típica de uma aristocracia renascida na América litorânea - os senhores de engenho pernambucanos e paulistas -, renovação da velha árvore multissecular portuguesa, podemos tomar conhecimento a partir da obra de Raymundo Faoro, “Os Donos do Poder”, e sua abordagem do feudalismo nacional, “nascido neste lado do Atlântico, gerado espontaneamente pela conjunção das mesmas circunstâncias que produziram o europeu”.


Diz-nos Faoro: “O quadro teórico daria consistência, conteúdo e inteligência ao mundo nostálgico de colonos e senhores de engenho, opulentos, arbitrários, desdenhosos da burocracia, com a palavra desafiadora à flor dos lábios, rodeados de vassalos prontos a obedecer-lhe ao grito de rebeldia. Senhores de terras e senhores de homens, altivos, independentes, atrevidos – redivivas imagens dos barões antigos”.


O próprio Joaryvar Macedo assim começa “Império do Bacamarte”: No território pátrio, o fenômeno do coronelismo esboçou-se na Colônia, tornou-se realidade no Império e consolidou-se após o advento da República. Ainda: Entre nós a Primeira República, também denominada, consoante já se esclareceu, República dos Coronéis, teve no coronelismo uma das suas marcas principais. Mais acentuado no Nordeste, o fenômeno generalizou-se por todo o País, do Amazonas ao Rio Grande do Sul.


No Rio Grande do Norte, que houve coronéis, disso não há qualquer dúvida. Basta consultar “Coronéis do Seridó”, de Pery Lamartine, e conhecer desde o Coronel João Damasceno Pereira de Araújo, o João Damasceno do Saco do Martins, até o Coronel Cazuza do Ipueira, passando por Silvino Bezerra de Araújo Galvão, José Bernardo de Medeiros, Laurentino Theodoro da Cruz e vários outros senhores proprietários de terra e líderes políticos. Todos descendentes de portugueses que avançaram Sertão adentro, a arrancar da indiada insubmissa a terra que lhes pertencia imemorialmente, até o fim da Guerra dos Bárbaros (1687-1697), quando, por fim, do Vale do Açu, passando por Apodi, no Alto Oeste, até o Seridó, em Acauã, os vitoriosos fincaram definitivamente seus marcos sob os despojos do conflito.


      Mas teria havido, no Rio Grande do Norte, alguma deposição, entre coronéis, pela força das armas? Alguma violenta tomada do poder?

CONTINUA SEXTA-FEIRA VINDOURA... 

quinta-feira, 12 de abril de 2012

POEMA DE DESPEDIDA

 

Rabindranath Tagore

Do musicaindianabrasil.com

Poema de despedida





"É hora de partir, meus irmãos, minhas irmãs
Eu já devolvi as chaves da minha porta
E desisto de qualquer direito à minha casa.
Fomos vizinhos durante muito tempo
E recebi mais do que pude dar.
Agora vai raiando o dia
E a lâmpada que iluminava o meu canto escuro
Apagou-se.
Veio a intimação e estou pronto para a minha jornada.
Não indaguem sobre o que levo comigo.
Sigo de mãos vazias e o coração confiante."


Rabindranath Tagore – (1861 – 1941) – Poeta, músico, escritor, dramaturgo e romancista indiano.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

MENSALÃO: O ATALHO PARA DESMORALIZAR O SUPREMO!

Ministro do STF Ricardo Lewandowski

QUAL É A DELE?

Mensalão: o atalho para desmoralizar o Supremo, por Augusto Nunes



Blog de Augusto Nunes

Revisor do processo do mensalão, que se arrasta no Supremo Tribunal Federal desde agosto de 2007, o ministro Ricardo Lewandowski ainda não concluiu o parecer que começou a ser digitado em dezembro, mas está pronto na cabeça há cinco anos.
Relator do pedido de inquérito contra o senador Demóstenes Torres, precisou de algumas horas para autorizar a solicitação da Procuradoria Geral da República e determinar a quebra do sigilo bancário do parlamentar goiano.
Surpreendido pela demonstração de agilidade, o Brasil decente sente-se à vontade para exigir, como registrei no comentário de 1 minuto para o site de VEJA. que o revisor Lewandowski trabalhe com a mesma rapidez do relator Lewandowski.
Como sabem até os cabides das togas, os 38 mensaleiros só se sentarão no banco dos réus ainda em 2012 se o ministro terminar o serviço até 15 de maio. Ultrapassada essa data, os 38 envolvidos com a organização criminosa chefiada por José Dirceu só serão julgados em 2013.
É com isso que sonham os protagonistas do maior dos escândalos do Brasil republicano, que seriam presenteados com três motivos para dormir sem sobressaltos.
Primeiro: o governo e a base alugada escapariam do desgaste provocado pela exumação, em plena temporada eleitoral, das incontáveis delinquências promovidas por pecadores da aliança governista envolvidos na roubalheira colossal.
Segundo: os meliantes teriam consideravelmente ampliada a chance de beneficiar-se do mecanismo da prescrição.
Terceiro: atingidos pela aposentadoria compulsória, os ministros Cezar Peluso e Ayres Britto estariam fora do julgamento. Gente com culpa no cartório não se dá bem com juízes que votam de acordo com fatos.
Nas páginas amarelas de VEJA, Ayres Britto, que assumirá neste 19 de abril a presidência do STF, deixou claro que só falta o parecer do revisor para que o caso chegue ao desfecho.
Lewandowski pode votar como quiser. Pode absolver os chefes da quadrilha “por falta de provas”. Pode enfileirar pretextos para explicar o inexplicável. Pode até tentar induzir o restante do STF a “amaciar para Dirceu”. Mas não tem o direito de retardar o epílogo de uma história que começou há sete anos.
Como informa o texto sobre a campanha batizada de “Missão Ampulheta”, publicado na seção Feira Livre, Lewandowski logo saberá oficialmente que os brasileiros decentes têm pressa.
É preciso obrigá-lo a cumprir seu dever. É preciso, sobretudo, alertá-lo para o tamanho do perigo: quem conduz um processo pelo caminho mais demorado acaba descobrindo que percorreu o atalho mais curto para a desmoralização do Supremo.

VILA-MATAS: O DESAPARECIMENTO E A BUSCA DA ESSÊNCIA LITERÁRIA

Enrique Vila-Matas
De rascunho.gazetadopovo.com.br

 Edições > 144 > Revista "Cult" > Entrevista com Enrique Vila-Matas

O desaparecimento e a busca da essência literária em Doutor Pasavento

 Wilker Sousa

Quando da recente morte de J.D. Salinger (1919-2010), muito se especulou acerca das razões que o levaram à sua longa reclusão na pequena Cornish, em New Hampshire. Após a retumbante fama advinda da publicação de O Apanhador no Campo de Centeio, Salinger deixou o frenesi nova-iorquino e optou pela tranquilidade de sua casa de campo, onde viveu de 1953 até sua morte. Escritores mais familiarizados com holofotes ou ainda aqueles que fazem da fama o substrato de suas carreiras por certo veriam essa atitude como um verdadeiro contrassenso. Em contrapartida, outros, como Samuel Beckett (1906-1989), o suíço Robert Walser (1878-1956) e o espanhol Enrique Vila-Matas, julgariam sábia a postura de Salinger. O primeiro, quando soube que ganhara o Nobel, fugiu; Walser passou os últimos anos de sua vida em um manicômio, onde escreveu microtextos, sem nunca publicá-los; e Vila-Matas faz do desaparecimento um dos eixos centrais de sua obra.

Em “A Arte de Desaparecer”, conto presente em Suicídios Exemplares (1991), o personagem Anatol pena ao ver publicado um dos romances que guardara em seu baú. Seduzido pelas possíveis benesses da glória literária, em contraposição ao tédio e ao anonimato de sua recém-chegada aposentadoria, o “escritor secreto” permite que um editor publique suas obras. Contudo, logo é tomado por arrependimento e foge, restando-lhe a conclusão de que “a obrigação do autor é desaparecer”. O conto, acredita Vila-Matas, seria a origem do tema em sua obra, assunto que desenvolveria com ainda mais força em Doutor Pasavento, romance publicado em 2005 e que chega neste mês às livrarias brasileiras. O livro é narrado por Andrés Pasavento, romancista que, após ser convidado a dar uma palestra em Sevilha, decide desaparecer subitamente. Para tal, converte-se no psiquiatra Doutor Pasavento, isola-se de seu universo habitual e passa a escrever sobre sua ânsia de viver à margem. O resultado é uma narrativa híbrida, cuja presença marcante do gênero ensaio e o diálogo com grandes nomes do pensamento e da literatura revelam o uso não gratuito da notável erudição de Vila-Matas. Na entrevista a seguir, concedida à CULT por e-mail, Vila-Matas fala sobre o romance, os limites impostos pela linguagem, e explica por que a glória do autor é o avesso da essência literária.

CULT – Por que o tema do desaparecimento é tão recorrente em sua obra?

Enrique Vila-Matas – Na realidade, o verdadeiro escritor deseja somente escrever; busca mais a solidão para escrever do que a aparição em público. A aparição midiática do escritor é a antítese da essência de seu ofício. Em Suicídios Exemplares há um conto que parece ser a origem dessa minha dedicação ao tema da necessidade de desaparecer. É o conto “A Arte de Desaparecer”, baseado, certamente, em uma história real, aquela do escritor secreto Gesualdo Bufalino. Esse narrador siciliano escrevia sem a intenção de publicar, mas foi descoberto por seu compatriota Leonardo Sciascia e convencido por ele a publicar um romance que tinha guardado – um romance genial, e aí começaram os problemas para o pobre Bufalino.

CULT – Ainda sobre o desaparecimento: a grande obra literária tende a perpetuar-se e, inevitavelmente, também aquele que a escreveu. Embora lutem o tempo todo para desaparecer, esse foi o principal paradoxo vivido por escritores como Walser, Salinger e também o Doutor Pasavento?

Vila-Matas – Serve para o Doutor Pasavento também. Mas, se é certo que a obra e o escritor, como você disse, tendem a se perpetuar, também é certo que no fim, através do tempo, a obra viajará irremedialmente sozinha na imensidão. E um dia a obra morre, como morrem todas as coisas, como se extinguirão o Sol e a Terra, o sistema solar e a galáxia, e a mais recôndita memória dos homens.

CULT – Há uma passagem no livro em que o narrador diz não escrever um romance. Em outro momento, exalta Sterne por ter feito de Shandy antes um ensaio sobre a vida do que propriamente um romance. Você acredita que o romance é um gênero em extinção? A tendência é caminharmos para experiências híbridas, de modo que se diluam cada vez mais as fronteiras entre os gêneros?

Vila-Matas – O romance não somente não desaparecerá como ainda terá vida longa, embora adotando formas diferentes daquelas que conhecemos hoje.

CULT – Beckett, que tanto lidou com os limites impostos pela linguagem, desejava alcançar o essencial para um dia poder descartá-la, desaparecer com ela. No que se refere à sua obra, você vive um impasse semelhante?

Vila-Matas – A essência da literatura são o silêncio e o desaparecimento? Beckett dizia que era preciso seguir escrevendo, mesmo que tudo já estivesse dito. Creio que faço algo parecido. Sou consciente de que toda a literatura moderna nasceu quando Montaigne confessou, no começo de seus Ensaios, que escrevia com a intenção de conhecer-se a si mesmo. Hoje já sabemos perfeitamente que tipo de consequências isso trouxe. Não muito depois de começarmos a “buscar a nós mesmos” na literatura, começaram a se desenvolver uma lenta mas progressiva desconfiança nas possibilidades da linguagem e o temor de que ela nos arraste a zonas de profunda perplexidade. É dentro dessa busca e perplexidade que eu escrevo todos os dias. Para levar a cabo essa busca, necessito me isolar, escrever, desaparecer em meu local de trabalho.

terça-feira, 10 de abril de 2012

O VERDADEIRO DESTINO DE UM GRANDE ARTISTA

Gaston Bachelar

Em marciomariguela.wordpress.com


"O verdadeiro destino de um grande artista é um destino de trabalho. Em sua vida chega a hora em que o trabalho domina e conduz sua destinação. As infelicidades e as dúvidas podem atormentá-lo por muito tempo. O artista pode vergar sob os golpes da sorte. Pode perder anos numa preparação obscura. Mas a vontade de obra não se extingue desde que ela encontrou uma vez seu verdadeiro foco. Começa então o destino de trabalho. O trabalho ardente e criador atravessa a vida do artista e confere a essa vida virtudes de linha reta. Tudo vai em direção à meta numa obra que cresce. Cada dia, esse estranho tecido de paciência e entusiasmo torna-se mais ajustado na vida de trabalho que faz de um artista um mestre."

Gaston Bachelard (1884-1962), "Le Droit de Rêver"

segunda-feira, 9 de abril de 2012

CONHECIMENTO E LIBERDADE

Liberdade!
vedanta.pro.br

Por Honório de Medeiros

                               Uma das consequências do mundo virtual de hoje, ou pós-modernidade, se assim o quiserem denominar, é que seremos todos ignorantes no geral e conhecedores no particular. Saberemos cada dia mais, acerca de cada dia menos, e, nesse ritmo, talvez saibamos, um dia, individualmente, quase tudo acerca de quase nada.
                   Isso me lembra algo vivido na adolescência: um Congresso Internacional de Fitopatologia, promovido pela Escola Superior de Agricultura de Mossoró (ESAM), para o qual se anunciava a presença de um belga, professor-doutor, especialista na reprodução de um tipo de mosca sazonal, existente nos nossos litorais. Ou seja, quase tudo acerca de quase nada.
                   A verdade é que nosso cérebro possivelmente não suporta fazer a síntese de todo o conhecimento específico ao qual temos acesso, para estabelecer generalizações consistentes.
                   Os troncos quem compõem o nosso conhecimento geral, Marx, Freud, Darwin, Einstein, e alguns outros, para ficarmos no século XX, aos poucos estarão de tal forma diluídos na nossa memória, que o conhecimento específico possível e atual, individualmente, consequências dessas teorias fundantes, de tão afastado do original que os precedeu, dele somente guardará, se guardar, pálida lembrança.
É o caso, por exemplo, de citações de trechos descontextualizados desses pensadores, possíveis de serem encontrados em trabalhos acadêmicos, com os quais guarda vaga relação.
                   Vejamos o exemplo da produção dita científica nos mestrados e doutorados: de tão especializada se apresenta que seus elaboradores passam a ver a realidade por um olho só, quando deveriam ser como o monstro guardião do Pomo das Haspérides, na mitologia grega, que tinha cem olhos.
                   Caso queiramos pensar em profundidade, estabelecendo as conexões possíveis do presente com o passado intelectual comum à espécie humana, teremos sempre que nos reconstruir teoricamente, buscando reiteradamente nossas fundações intelectuais, em uma escala que não tem fim, dado o conhecimento existente.
Onde iremos parar?
Não há tecnologia que nos permita esse maciço empreendimento de inferências, de intuições e deduções, partindo-se de premissas gerais que nos conduzam às conclusões possíveis, após relacioná-las com as infinitas possibilidades que são os fatos ou fenômenos atuais, permitindo-se, então, um permanente e denso saber.
 Experimentem teclar, por exemplo, no Google, o verbete “marxismo”, e constatar a quantidade de textos ao qual o leitor tem acesso!
                   Assim, em consequência, encastelados em nichos de saber, seremos cada vez mais manipuláveis, posto que os fundamentos do conhecimento que alicerçam nossa compreensão acerca do que nos cerca, como a questão da liberdade, está se esgarçando rapidamente.
                   Acaso as novas gerações se dão conta das causas e do contexto no qual surgiu a discussão acerca da liberdade? Sabem do titânico choque de ideias entre Platão e os Sofistas no que diz respeito à relação entre o Homem e sua Realidade Moral? Entendem que a vitória de Platão e o consequente exílio intelectual dos sofistas conduziu a civilização ocidental a um longo período de trevas no que diz respeito à liberdade?
Esgarçar que ocorre, também, em decorrência da necessidade inexorável de vivermos vertiginosamente uma realidade que não compreendemos, de tão fugaz e complexa, e não podemos parar para compreendê-la, o que torna possível a reconstrução diária, por parte de quem controla a mídia, por exemplo, do sentido do que seja liberdade. Tal é o processo do qual são criadores e criaturas as elites dominantes.
                   Não vivemos, pois; sobrevivemos enquanto espasmos. Somos iludidos e nos auto-iludimos. Estamos hoje tão nus quanto nossos ancestrais mais remotos, quando lutavam em meio hostil, caçando e coletando, muito embora as selvas, os desertos e o gelo, onde nos debatemos hoje, sejam de outro tipo.
                   Como não podemos Conhecer, com C maiúsculo, somos manipuláveis.
Somos crianças com os conhecimentos específicos necessários para sobrevivermos e alimentarmos a realidade que nos nutre e da qual nos alimentamos. Sabemos, como dito acima, cada dia mais acerca de cada dia menos. Sabemos quase tudo, certo dia, sobre quase nada. Este é nosso destino, nossa glória, nosso ocaso...
                   E como sabemos cada dia mais acerca de cada dia menos, e somos impelidos a tal, e aceitamos, para sobrevivermos na superfície da realidade, com uma extrema especialização decorrente da divisão do trabalho que nos é imposta, perdemos o contato com o restante do todo, e, em nossa ignorância quanto a esse fato, nos curvamos aos que vêm nos dizer o que nós somos e como devemos fazer em relação às pessoas e às coisas e fenômenos.
                   Somos instados, manipulados, a não perguntarmos acerca do que nos dizem ou escrevem, para não escutarmos que se não nos perguntam acerca do que conhecemos, porque devemos indagar acerca do que não conhecemos? Cada qual com seu cada qual... É dessa forma que as finanças públicas, constituídas pelo nosso suor, às vezes nosso sangue, são um verdadeiro mistério. Razões de Estado, diriam...
                   Viveremos, no futuro, como os seres humanos de Matrix, sonhando que viviam, quando viviam para sonhar, enquanto a máquina que os mantinha imersos em sonhos, e que é uma alegoria do Estado, se nutria desse sono eterno?