Liberdade!
vedanta.pro.br
Uma
das consequências do mundo virtual de hoje, ou pós-modernidade, se assim o
quiserem denominar, é que seremos todos ignorantes no geral e conhecedores no
particular. Saberemos cada dia mais, acerca de cada dia menos, e, nesse ritmo,
talvez saibamos, um dia, individualmente, quase tudo acerca de quase nada.
Isso me lembra algo vivido na adolescência: um
Congresso Internacional de Fitopatologia, promovido pela Escola Superior de
Agricultura de Mossoró (ESAM), para o qual se anunciava a presença de um belga,
professor-doutor, especialista na reprodução de um tipo de mosca sazonal,
existente nos nossos litorais. Ou seja, quase tudo acerca de quase nada.
A verdade é que nosso cérebro possivelmente não
suporta fazer a síntese de todo o conhecimento específico ao qual temos acesso,
para estabelecer generalizações consistentes.
Os troncos quem compõem o nosso conhecimento
geral, Marx, Freud, Darwin, Einstein, e alguns outros, para ficarmos no século
XX, aos poucos estarão de tal forma diluídos na nossa memória, que o
conhecimento específico possível e atual, individualmente, consequências dessas
teorias fundantes, de tão afastado do original que os precedeu, dele somente
guardará, se guardar, pálida lembrança.
É
o caso, por exemplo, de citações de trechos descontextualizados desses
pensadores, possíveis de serem encontrados em trabalhos acadêmicos, com os
quais guarda vaga relação.
Vejamos o exemplo da produção dita científica nos
mestrados e doutorados: de tão especializada se apresenta que seus elaboradores
passam a ver a realidade por um olho só, quando deveriam ser como o monstro
guardião do Pomo das Haspérides, na mitologia grega, que tinha cem olhos.
Caso queiramos pensar em profundidade, estabelecendo
as conexões possíveis do presente com o passado intelectual comum à espécie
humana, teremos sempre que nos reconstruir teoricamente, buscando reiteradamente
nossas fundações intelectuais, em uma escala que não tem fim, dado o
conhecimento existente.
Onde
iremos parar?
Não
há tecnologia que nos permita esse maciço empreendimento de inferências, de
intuições e deduções, partindo-se de premissas gerais que nos conduzam às
conclusões possíveis, após relacioná-las com as infinitas possibilidades que
são os fatos ou fenômenos atuais, permitindo-se, então, um permanente e denso
saber.
Experimentem teclar, por exemplo, no Google, o
verbete “marxismo”, e constatar a quantidade de textos ao qual o leitor tem
acesso!
Assim, em consequência, encastelados em nichos de
saber, seremos cada vez mais manipuláveis, posto que os fundamentos do
conhecimento que alicerçam nossa compreensão acerca do que nos cerca, como a
questão da liberdade, está se esgarçando rapidamente.
Acaso as novas gerações se dão conta das causas e
do contexto no qual surgiu a discussão acerca da liberdade? Sabem do titânico
choque de ideias entre Platão e os Sofistas no que diz respeito à relação entre
o Homem e sua Realidade Moral? Entendem que a vitória de Platão e o consequente
exílio intelectual dos sofistas conduziu a civilização ocidental a um longo
período de trevas no que diz respeito à liberdade?
Esgarçar
que ocorre, também, em decorrência da necessidade inexorável de vivermos
vertiginosamente uma realidade que não compreendemos, de tão fugaz e complexa, e
não podemos parar para compreendê-la, o que torna possível a reconstrução
diária, por parte de quem controla a mídia, por exemplo, do sentido do que seja
liberdade. Tal é o processo do qual são criadores e criaturas as elites dominantes.
Não vivemos, pois; sobrevivemos enquanto espasmos.
Somos iludidos e nos auto-iludimos. Estamos hoje tão nus quanto nossos
ancestrais mais remotos, quando lutavam em meio hostil, caçando e coletando, muito
embora as selvas, os desertos e o gelo, onde nos debatemos hoje, sejam de outro
tipo.
Como não podemos Conhecer, com C maiúsculo, somos
manipuláveis.
Somos
crianças com os conhecimentos específicos necessários para sobrevivermos e
alimentarmos a realidade que nos nutre e da qual nos alimentamos. Sabemos, como
dito acima, cada dia mais acerca de cada dia menos. Sabemos quase tudo, certo dia,
sobre quase nada. Este é nosso destino, nossa glória, nosso ocaso...
E como sabemos cada dia mais acerca de cada dia
menos, e somos impelidos a tal, e aceitamos, para sobrevivermos na superfície
da realidade, com uma extrema especialização decorrente da divisão do trabalho
que nos é imposta, perdemos o contato com o restante do todo, e, em nossa
ignorância quanto a esse fato, nos curvamos aos que vêm nos dizer o que nós
somos e como devemos fazer em relação às pessoas e às coisas e fenômenos.
Somos instados, manipulados, a não perguntarmos acerca
do que nos dizem ou escrevem, para não escutarmos que se não nos perguntam
acerca do que conhecemos, porque devemos indagar acerca do que não conhecemos?
Cada qual com seu cada qual... É dessa forma que as finanças públicas,
constituídas pelo nosso suor, às vezes nosso sangue, são um verdadeiro
mistério. Razões de Estado, diriam...
Viveremos, no futuro, como os seres humanos de
Matrix, sonhando que viviam, quando viviam para sonhar, enquanto a máquina que
os mantinha imersos em sonhos, e que é uma alegoria do Estado, se nutria desse
sono eterno?
Nenhum comentário:
Postar um comentário