domingo, 15 de maio de 2011

O JOGO DA SEDUÇÃO

o globo.globo.com

Honório de Medeiros

                   “Antigamente”, dizia um amigo meu, “a mulher se sentia ameaçada pelo interesse masculino”. “Era algo instintivo”. “E só no começo, claro”. “Essa sensação de ameaça era algo ancestral”, ele explicava, “do tempo do baraço e do cutelo”. Eu ponderei que essa expressão não se adaptava bem ao tema, mas ele afastou a ponderação com um gesto de enfado, dizendo que a expressão era muito interessante para somente ser usada quando descrevendo cenas de violência de coronéis nordestinos de ontem e antes-de-ontem. Algo como uma licença poética. “Baraço e cutelo quer dizer, aqui, do tempo em que as mulheres eram agarradas pelos cabelos e arrastadas à força, mas ainda acontecendo nas guerras de hoje quando há estupro em massa”.

                   “Essa ameaça, pressentida”, continuava ele, “é o primeiro passo no jogo da sedução”. “Através dela o homem avisa do seu interesse e a mulher se prepara para bancar o jogo ou fugir dele”. “A partir daí tudo não passa de uma questão de negaceio, ida e vinda, recuo e avanço, tais e quais, até o bote recíproco”. “Um ritual, nada mais, nada menos, em tudo e por tudo igual ao que se pode observar natureza afora ou adentro, que os deuses sábios inventaram para seu folguedo no teatro da vida, mas com uma finalidade óbvia: o multiplicai-vos do qual nos fala a Bíblia”. “Ou seja, o ritual, que nas outras espécies denominamos de ‘acasalamento’, tem como objetivo a nossa propagação, seja isso bom ou ruim”.

                   “Entretanto – e aí é que está o ‘x’ da questão, às vezes a mulher não capta interesse algum no predador com o qual se depara. Nenhum interesse. Nada de nada. E ela, principalmente se for acostumada a negar olhares, quanto mais um sorriso, que premiem o interesse de quem lhe procura por causa de sua beleza, enquanto avalia a situação, fica perplexa”. “Claro! Em seu instinto, assim como na razão, esse tipo de conduta não está previsto: um homem indiferente a si”. “Será que ele...? - as perguntas são muitas, enquanto percebe o interesse dele voltado para outras.” “O que está acontecendo, ela se pergunta, há algo de errado comigo?”

                   “Acontece que às vezes o predador não foi despertado por ELA – isso acontece”. “Às vezes é por que a outra tem algo – uma energia, como se diz hoje – que mexe diretamente com ele”. “Mas às vezes nada mais é que puro cálculo!” “Ele agiu como se soubesse aqueles bordões de técnicas de venda de antigamente: ‘primeiro chamar atenção, depois...’” “O que poderia chamar mais a atenção de uma mulher bonita que uma solene indiferença inicial, uma indiferença que cale fundo, despertando a síndrome da rejeição?”.

                   “Agora veja”, terminou meu amigo, “isso tudo foi antigamente, quando havia um jogo do qual todos participavam, chamado sedução.” “Uns melhores, outros nem tanto.” “Hoje, ah, hoje, bem... se seus rótulos estão em dia, seja qual seja sua tribo, então é só colher.” “Não terá sido necessário plantar nada.” “Como você acha que Ronaldinho Gaúcho se vira?”

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