Seleções do Reader's Digest
Nas Seleções do Reader's Digest que meu pai colecionara na década de 40 eu lia, entre menino e adolescente, uma seção cujo título era “Histórias da Vida Real”. Não me lembro mais de qualquer delas, exceto uma: durante a Segunda Guerra Mundial, as moças americanas eram incentivadas a participarem do esforço comum escrevendo para seus compatriotas combatentes mundo afora. Um deles começou a corresponder-se com uma jovem do interior de um daqueles estados americanos do Oeste. Passaram-se os anos e as cartas, que começaram cordiais, mas distantes, assumiram um teor cada vez íntimo, com troca de confidências, sonhos, planos e tudo quanto diz respeito a uma correspondência amorosa.
Tudo correu perfeitamente bem exceto pela recusa obstinada da moça em enviar, para seu correspondente, uma fotografia e o nome da cidadezinha na qual morava. Todas suas cartas eram enviadas da Estação Central de Trem da capital do seu Estado. Ele argumentava dizendo que gostaria de ter, perto de si, não apenas suas cartas e tudo quanto de bom elas lhe diziam, mas, também, uma imagem para a qual pudesse olhar naqueles momentos terríveis pelo qual estava passando. Ela lhe respondia, justificando-se, que o amor, entre eles, começara pelo espírito, e assim deveria continuar até o momento em que, finalmente, pudessem encontrar-se frente a frente, e uma fotografia poderia lhe dar uma falsa impressão que a realidade viria a desmascarar.
Finalmente a guerra terminou. Ele escreveu-lhe para combinar o encontro e ela pediu-lhe que estivesse no dia e hora marcados, na Estação Central de Trem da capital do seu Estado, quando seria reconhecida por trazer, nas mãos, um ramo de rosas vermelhas. Esta era a única forma de reconhecê-la que ele dispunha: não sabia como ela era, em qual cidade vivia, e se, ao menos, seu nome era real ou fictício.
Meio-dia em ponto. O trem para. Ele salta e olha, ansioso, para todos os lados. Há poucos transeuntes na Estação. Ninguém que aparente ser uma moça desacompanhada portando um ramo de rosas vermelhas nas mãos. Começa a frustração. Será que foi enganado ao longo de todos os anos? Tudo quanto ela lhe dizia por carta, o amor que nascera, os planos construídos, seriam mentiras? Parado, a maleta aos pés, a expressão ansiosa, ele olhava em todas as direções tentando justificar um possível atraso, talvez algum acontecimento de última hora, um obstáculo inesperado...
O tempo passou-se. Uma hora depois, convicto que tinha sido iludido, ele começou a dirigir-se para o guichê de vendas de passagens. Pretendia ir embora o mais rápido possível. Quando se aproximou do guichê viu, sentada, próxima ao local, uma senhora de aproximadamente sessenta anos trazendo, em suas mãos, um buquê de flores vermelhas. “Então é isso?”, perguntou-se. “Ela é esta senhora, e por essa razão não teve coragem de enviar-me uma fotografia sua?” Parado, perplexo, pensou em esconder-se – não era possível aceitar que aquela senhora fosse sua amada. E agora, deveria honrar o amor espiritual com o qual se comprometera e que independia de idade ou poderia justificar a si mesmo sua fuga alegando ter sido manipulado?
Não resistiu. Aproximou-se. “Senhora, seu nome é Lucy?” “Não, ela pediu-me para ficar aqui algum tempo, com essas rosas na mão, aguardando que alguém viesse a sua procura; ela está ali”, e apontou. Um pouco além, vindo em sua direção, com outro buquê de rosas vermelhas nas mãos, uma belíssima mulher, muito além do que ousara sua imaginação, sorria-lhe discretamente.
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