Honório
de Medeiros
Quando os poucos que têm muito comem tudo, deixando os farelos para os
muitos que têm pouco.
Desde que Goebbels lançou o mote “de tanto se
repetir uma mentira, ela acaba se transformando em verdade”, em contrapartida
para alguns poucos argutos observadores da realidade ficou fácil identificar
esse lugar-comum na retórica usada pela elite predadora quando concretiza o
processo de iludir o “Zé Povinho”.
É o caso, por exemplo, da Teoria do Bolo Econômico
– “primeiro crescer, depois repartir”, popularizada nos anos 70 do século
passado, aqui no Brasil, por ninguém menos que Delfim Neto.
Aliás, esse processo de iludir é um dos meios por
intermédio dos quais o jogo do poder é jogado pela elite predadora
configurando, assim, o retrato em negativo da seleção dos mais aptos – em certo
momento específico da história – conforme pensado por Herbert Spencer na
esteira do pensamento darwiniano, jogo esse bancado via estratagemas, ou seja,
idéias que são usadas retoricamente para obter e, uma vez obtida, prolongar a
exploração do “Zé Povinho”.
No caso da “teoria do bolo econômico” tal idéia,
uma vez surgida, qual “meme” - um análogo cultural do gene na genética -, como
descrito por outro darwiniano, Richard Dawkins, terá uma sobrevida útil
proporcional à nossa incapacidade em destruí-la. Na verdade esse “meme” vai,
por sua vez, se replicar infinitamente em ambiente fértil, qual seja aquele
formado por pessoas sem escrúpulos mais os inocentes úteis.
Em outras palavras, mas mantendo o mesmo sentido,
assim é que uma idéia econômica – fruto da mais ilegítima elite predadora –
nasce, sobrevive e vem constituindo, desde então, o arsenal que a elite
predadora usa para explorar, seja porque não tem noção daquilo do qual está
fazendo parte, seja por puro cinismo, deliberadamente. É a teoria do bolo
econômico. Para os defensores da Teoria do Bolo Econômico, quanto mais ele
crescer, mais pessoas comem.
Como essa idéia funciona na prática? Funciona
assim: alguns predadores internacionais precisam fazer o dinheiro circular
voltando para o ponto de partida mais robusto, bem mais gordo: nasce, então a
noção de Uma Grande Obra, constituída obviamente pelo conjunto de várias outras
obras menores, quase sempre em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento.
Por exemplo: uma “Copa do Mundo de Futebol” em algum País cuja infra-estrutura
física não esteja pronta para o evento, tal como qualquer um do Oriente Médio,
África ou mesmo o Brasil. O Brasil, sejamos mais claros, foi escolhido a dedo a
partir de parâmetros muito bem definidos, dentre eles a possibilidade da
circulação de idéias e capital sem grandes obstáculos que atrapalhem os
negócios.
Feito isso começa um imenso e lucrativo trabalho,
para toda a elite predatória envolvida no “Grande Projeto”, de arrebanhamento
dos “corações e mentes”. É onde entra toda a cadeia alimentar da qual ficarão
fora apenas as piabas, por razões ululantes, constituída pela “mídia famélica”,
os políticos de sempre, os empreiteiros, ah! os empreiteiros, a arraia-miúda
que tal quais os peixes-pilotos se alimentam com as sobras dos tubarões, e até
mesmo, pasmemos juntos, os intelectuais orgânicos, aqueles sem espinha dorsal,
que vivem se contorcendo para prestarem serviços vendendo argumentos: convencer
os basbaques, como no caso do Rio Grande do Norte, acerca da importância
indizível, pela magnitude, da tal “Arena das Dunas”, para o progresso econômico
do nosso Estado.
Desenvolvimento para quem? O Estado não existe, é
uma hipostasia; o Estado sou eu, é você, somos nós. Ninguém fala pelo Estado.
Ninguém.
Lê-se, por exemplo, na mídia incauta, que “A Grande
Obra” é importante para sanear a malha viária. Qual malha viária? A de Mossoró?
A de Caicó? A de Pau dos Ferros? Ora, convenhamos, “a malha viária”, enquanto
as delegacias de polícia, no interior e na capital não têm computador, papel,
armas, carros, homens... Lê-se, também, na mídia inocente inútil, que “a Grande
Obra” vai gerar muitos e muitos empregos. Sabemos que empregos são esses:
sazonais. Desaparecem quais pipoqueiros e vendedores de cachorro quente em
final de festa de padroeira. O grosso do dinheiro, aquele que realmente
importa, esse já foi embora em busca de outros nichos a serem predatoriamente
explorados.
Essa é a lógica do capital. Uma vez comprada a
idéia, ou seja, o investimento, imediatamente os investidores entram na luta
com um discurso uníssono: “a Grande Obra” é fundamental para o desenvolvimento
do Estado, e quem for contra ela é contra o Estado. O mote do velho Goebbels
entrou em ação.
Não há muito mais a dizer agora
exceto que se trata de uma luta vã essa contra o desperdício do nosso dinheiro.
Os poucos irridentes contrários à farsa que se desenrola impávida e colossal
não dispõem de meios à altura dos adversários para sublevar os “corações e
mentes”. Não têm como comprometer os aparelhos do Estado: Legislativo,
Judiciário e Executivo, nessa sublevação. Talvez se faça presente a voz
solitária do Ministério Público. Duvido. Não podem massificar a informação que
a historia oferece gratuitamente a quem souber procurá-la, de que grandes obras
não valem por si só, que o digam os milhares de “elefantes brancos” existentes
mundo afora. Consultem o Google, aqueles que não crêem. Não podem apontar o
exemplo dos países sérios, como os escandinavos. Praticamente não têm como
fazer a defesa de investimentos maciços em políticas públicas na educação,
saúde e segurança. Em quais veículos de massa irão falar em Amartya Senn e seu
trabalho acerca de “Desenvolvimento como Liberdade”? Liberdade esta que se
confunde com segurança, saúde, educação...
Infelizmente o exemplo dos países civilizados nos
quais a Sociedade escolhe, primeiramente, suas políticas públicas, para em
seguida e se for o caso, construir a obra necessária para implementá-la, não
tem como ser apresentado aos norte-rio-grandenses imensamente carentes de
saúde, segurança, educação. Pois que não haja dúvidas: se consulta popular
houvesse era assim que nosso povo disporia seus recursos.
Chega a ser doloroso: muito embora seu dinheiro banque o bolo que
poucos, que têm muito, irão comer à farta, para os muito que têm pouco sobrarão
apenas as migalhas.
Um comentário:
ESTUPENDO
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