Franklin Jorge
“Atingi uma idade na qual que posso mensurar a extensão do meu fracasso. Em nenhum momento da minha vida, antes de me tornar o que sou, conjecturei de abdicar do meu projeto – ou utopia, caso queira – de, através da elaboração de uma obra que me justificasse no futuro, dar o testemunho de minha existência: o breviário de uma existência dominada pelo ato de escrever. Sempre estive convicto de que nascemos para a realização de uma obra capaz de persuadir o mérito”. – Assim o escritor e jornalista Franklin Jorge se apresenta em conversa com este entrevistador, Honório de Medeiros.
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Nascido no Ceará - Mirim e criado no Assu, em uma propriedade rural que explorava, quando nasceu, a cultura do algodão, a que chamavam de “ouro branco”, e foi pioneira na exploração da agricultura irrigada naquela rica e peculiar região do estado, Franklin Jorge pertence – ao seu Ceará - Mirim natal e ao Assu telúrico e primordial em sua sensibilidade; pertence, também, ao humanismo com que se nutriu o seu precoce talento.
Eis, na íntegra, a entrevista:
Honório de Medeiros: Vc saiu do NJ por quê?
Franklin Jorge: O jornal viu-se constrangido a fazer cortes, como outras empresas que estão sofrendo com os prejuízos causados à economia e aos demais setores pelo governo do ex-presidente Lula. Alguns acumularam editorias e funções. Eu continuo escrevendo meu jornal aos domingos.
Se assumisse a Fundação José Augusto [FJA] quais seriam suas primeiras medidas?
Franklin Jorge: Devolveria a instituição à Cultura, contrariando uma prática banal e corriqueira – “serviço”, como queiram - que tem prestado em quatro décadas a gestores inescrupulosos, arrogantes, cheios de si, auto-suficientes e inócuos em suas eventuais ou pontuais realizações que atendem tão somente e sempre à satisfação de uma fome indormida e contrariada de “poder” e notoriedade de egos doentes e sem pensamento; uma gente que tem mamado nas tetas da quê, aqui no Rio Grande do Norte, é velha e flácida – a cultura “pensada” pelo “oficialismo”.
Reuniria os reais talentos da nossa terra, independentemente de suas possíveis idiossincrasias e credos (estéticos, ideológicos, políticos, etc.), e transformaria suas idéias e utopias em ações plurais, concretas e interativas.
Tornaria a Fundação José Augusto instrumento da Cultura e extinguiria qualquer ranço de personalismo vigente, de homenagens auto-impostas, de cabotinismo consagrado por todas as gestões que deram o ar de sua graça e enfeitaram por um momento a comédia da cultura potiguar; masturbações, enfim, que só satisfazem o ego dos gestores nomeados por interesses partidários – ou como ocorre vulgarmente em todos os governos, por “afilhadismo”, como vimos com o chefe da Casa Civil de Micarla de Souza, empregando de uma só tacada dois filhos seus em sinecuras na Câmara Municipal de Natal.
Escusado dizer que nunca deram expediente... Enfim, velhas práticas que meramente extorquem ou exaurem os recursos públicos sem reverter em proveito efetivo para a Cultura e os potenciais consumidores de Cultura.
Efetivaria mudanças estruturais e avançaria com uma política de cultura debatida e bem pensada por setores que produzem ou consomem cultura na brava terra de Poti, índio velho que vinha a ser um comedor de cabeças de camarão.
Programaria uma política de cultura pluralista, absolutamente não impositiva, democrática – como deve ser a cultura antenada com os cidadãos. Enfim, valorizaria o uso dos nossos impostos extorsivos e malcuidados.
Decretaria obrigatório o dinamismo, a insatisfação, o exercício experimental da liberdade, a qualidade em tudo que diz respeito à cultura sem demagogia e populismo encruados e, antes de qualquer outra deliberação, aboliria o comodismo e o não ter o que fazer na Fundação José Augusto. Creio que todos nós já sonhamos alguma vez com o dia em que a FJA deixaria de ser o túmulo da cultura norte-rio-grandense.
Quem, no RN, escreve bem hoje?
Franklin Jorge: Em prosa, Marcelo Alves Dias que acaba de lançar em Natal com grande sucesso seus “Ensaios Ingleses” para o qual que tive o prazer de escrever as orelhas; Rodrigo Levino, o que há de novo e instigante em nossas letras; Adriano de Souza; Woden Madruga, que jamais publicou um livro na vida e tem recheio para vários; Jarbas Martins e Márcio de Lima Dantas, meus críticos prediletos; Sheyla Azevedo; Nivaldete Ferreira; Bartolomeu Correia etc. Em poesia, hoje, no Rio Grande do Norte, qualquer calhorda escreve em versos e arrota em sonetos.
A Sociedade dos Poetas Vivos e Afins, por exemplo, tem mais de 500 associados, ou tinha, pois li isso faz alguns anos, quando ainda não se difundira os blogues. Agora talvez tenha 15 mil! Poetas, aqui, nascem e morrem como moscas.
Quando vc vai voltar a publicar? Há algum livro para sair?
Franklin Jorge: Só Deus sabe... Não faço parte de panelinhas e cheiro mau para o “oficialismo”... Tenho, a despeito dessa contingência, 44 títulos inéditos, além dos dois últimos volumes do “Spleen de Natal”. Tenho, programado pela Editora Flor de Sal, “O escrivão de Chatam”, uma seleção do que escrevi sobre livros e autores estrangeiros (Proust, Shakespeare, Balzac, Osamu Dazai, Mishima, Marguerite Yourcenar, Wilde, George Orwell, Thomas Mann, Luisa Mercedes Levinson, Borges, Elias Canetti, Ernesto Sábato, Montaigne, Maquiavel, José Saramago, Eça de Queiroz, Baudelaire, etc.). Porém não tenho mais ânimo para rever textos, cortar, emendar, e, assim, vou sempre protelando a publicação...
Ah, o livro tem um prefacio magnífico de Anderson Braga Horta, da Academia Brasiliense de Letras. É meu livro preferido, ao lado de “Fantasmas Cotidianos”, que espero reeditar; já está revisto e aumentado e continua sendo, em minha opinião, o melhor de meus livros.
O jornal impresso e o livro tradicional estão condenados?
Franklin Jorge: O jornalismo está sendo reinventado na blogosfera e é muito mais dinâmico e pode ser, ainda, mais profundo, abrangente, interativo, pois é a comunicabilidade mais completa e capaz de se irradiar instantaneamente numa mídia planetária livre, que acolhe a participação universal. A edição impressa ainda não avançou nesse processo e corre sério risco, mas creio que, afinal, se casando com as novas mídias e tecnologias da comunicação, há de sobreviver para um público que cada vez mais se faz critico da informação. Quanto ao livro – como o conhecemos -, creio que caminha para ser um objeto de culto ou de fetichismo para alguns grupos de intelectuais e fetichistas que se deliciam com um belo artefato gráfico ou com o que transmite e contém o livro cultuado por uma confraria de leitores obsessivos. Nós leitores seremos perseguidos e caçados pela policia de governos totalitários que se foram gestando por socialistas e comunistas de plantão, ou seja, de partidários e adeptos dos regimes de mão única, totalitários e tirânicos, como vemos pipocar em toda a parte graças ao silêncio dos bons. Eu, pessoalmente, sempre pensei que chegaremos a viver nesse tempo de exclusões e tortura. E, como os antigos cristãos que se reuniam nas catacumbas de Roma para ouvirem a Palavra, também seremos perseguidos e nos esconderemos para discutir e desfrutar da suprema criação da inteligência humana – o Livro. A obra-prima do homem.
De todas as polêmicas nas quais se envolveu, qual a que vc considera mais interessante?
Franklin Jorge: Sem dúvida a que surgiu em Mossoró, há uns vinte anos, quando fui perseguido pelo filho de Dix-huit Rosado, prefeito já muito velho e sem o tino certo que se deixou tiranizar por um filho pobre de espírito e descompensado.
Creio que fui a primeira pessoa, nessa época, a enfrentar de fato a oligarquia que sustenta os interesses da família Rosado, em mais de sessenta anos de exploração de uma indústria florescente – a política, patrimônio e usufruto de algumas famílias que se especializaram na exploração do Rio Grande do Norte. Ele moveu mais de vinte processos contra mim e foi perdedor em todos. Antes, quis me calar usando a força bruta.