sábado, 12 de maio de 2012

A QUESTÃO DO PODER


Ernest Becker  


Por Honório de Medeiros


            Em “Power: A New Social Analysis”, Sir Bertrand Russel expõe a teoria de que os acontecimentos sociais somente são plenamente explicáveis a partir da idéia de Poder[1].

 Não algum Poder específico, como o Econômico, ou o Militar, ou mesmo o Político[2], mas o Poder com “P” maiúsculo, do qual todos os tipos são decorrentes, irredutíveis entre si, mas de igual importância para compreender a Sociedade.

            A causa da existência do Poder, diz ele, é a ânsia infinita de glória[3], inerente a todos os seres humanos.

Se o homem não ansiasse por glória, não buscaria o Poder. Ânsia infinita posto que o desejo humano não conhece limites.

Essa ânsia de glória dificulta a cooperação social, já que cada um de nós anseia por impor, aos outros, como ela deveria ocorrer e nos torna relutantes em admitir limitações ao nosso poder individual. Como isso não é possível, surge a instabilidade e a violência.

            Essa ânsia de glória, cuja manifestação objetiva é o exercício do Poder, pode ser encontrada em qualquer ser humano: explicitamente nos guerreiros, santos, ou políticos, e implicitamente nos seus seguidores: Xerxes não precisava de alimentos, roupas, ou mulheres quando invadiu Atenas; Newton não precisava lutar pela sobrevivência quando empreendeu escrever seus “Principia”; São Francisco de Assis e Santo Inácio de Loyola não precisavam criar ordens religiosas para difundir a palavra de Cristo.

Somente o amor ao Poder explicaria realizações tão singulares.

            Portanto, para Russel, a força propulsora das transformações sociais se resume no apego do indivíduo ao Poder glorioso, que é inerente a qualquer ser humano.

            Cabe agora indagar: o que leva o homem a ansiar por glória, e em ansiando, lutar pelo Poder, posto que este é o instrumento, segundo se depreende da leitura de Russel, por meio do qual nós a obtemos?

            Ernest Becker desenvolveu, a partir da leitura de Oto Rank e Soren Kiekergaard, em sua obra premiada com o Pulitzer de 1974, a teoria de que buscamos o heroísmo para lutarmos contra a morte. Poderíamos introduzir a noção de  “heroísmo” como uma etapa a ser trilhada para alcançarmos a “glória” sem desconstruirmos sua teoria? Creio que sim.

            Diz-nos ele em seu prefácio:

            “A perspectiva da morte (...) impõe uma concentração admirável da mente. A tese principal deste livro é que ela faz muito mais que isso: a idéia de morte, o temor a ela, persegue o anima humano como nenhuma outra coisa: ela é um dos maiores incentivos da atividade humana – atividade em grande parte destinada a evitar a fatalidade da morte, a vencê-la negando de algum modo se ela o destino final do homem”.

            Mas e qual a causa dessa tão acirrada, desmedida, imemorial, mas não unânime luta contra a morte? Que ela não é unânime nos dá idéia o suicídio, algo tão complexo que levou Albert Camus a dizer certa vez ser ele a grande questão filosófica do século XX.

            E quanto ao desaparecimento voluntário, a negação da busca pela glória, no qual cabe, tão bem, “l’enfant terrible” francês Arthur Rimbaud, autor do célebre “Une saison en enfer?

            Complexo.

 É possível que muito embora Russel tenha razão quanto à explicabilidade dos fatos sociais a partir do Poder, assim mesmo com “P” maiúsculo, não seria a ânsia de glória que levaria o Homem a buscá-lo, mas, talvez, a necessidade de ampliação do espaço de possibilidade de sua sobrevivência, e da sua espécie, uma herança hereditária, tal como nos aponta Charles Darwin, que, em tendo razão, coloca o que o marxismo propõe como etapa natural do processo...




[1] Poder, segundo Bobbio, em Teoria Geral da Política, no início do capítulo acerca de Política e Direito, diz que Poder  deve ser entendido como a capacidade de influenciar, condicionar, determinar a conduta de alguém.
[2] Bobbio, em Teoria Geral da Política, abre o capítulo alusivo a Política e Direito expondo que o termo “Política” diz respeito às ações por meio das quais se conquista, mantém e exerce o Poder último ou soberano, tal e qual o dos governantes sobre os governados.
[3] Em Darwin a obtenção  da“glória” é um dos meios por intermédio dos quais o homem amplia as possibilidades de sobrevivência dos seus gens.

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