quarta-feira, 12 de junho de 2013

OLHO TÁTICO: SELEÇÃO PRECISAVA VENCER, AGORA A MISSÃO É APRENDER A CRIAR ESPAÇOS

André Rocha

http://www.espn.com.br/blogs/olhotatico#1


Reuters
Luiz Felipe Scolari, técnico da seleção brasileira, passe instruções para o lateral Marcelo
 
Felipão instrui Marcelo.Técnico da seleção solta laterais e prende volantes.
 
 
A vitória era necessária. O paradoxo de jogar pelo resultado em amistoso é um dos maiores problemas do Brasil país sede, sem eliminatórias. Desde Mano Menezes.
Luiz Felipe Scolari precisa entrosar a base que escolheu, mas também fazer experiências. A conclusão é que o grupo é bom, mas não há o time.
Ao menos conseguiu a tão esperada vitória contra uma seleção forte ou tradicional. Mesmo a desfalcada e retrancada França, que mostrou respeito em Porto Alegre repetindo o 4-1-4-1 compacto e fechado de quando enfrenta a Espanha bi da Europa e campeã mundial.
Quantas fases vitoriosas de times e seleções não começaram com um triunfo sem brilho, mas que resgata a confiança?
No entanto, para que o bom momento se consolide é preciso mais do que fazer Neymar voltar a render com a camisa verde e amarela e produzir além dos três gols e das três assistências em 2013.
A seleção tem que definir uma maneira de jogar. A dificuldade continua sendo criar espaços. Mano apostava em linhas avançadas, trocas de passe e movimentação. Dunga, o antecessor, adiantava a marcação, pressionava, incentivava os chutes de fora da área e jogadas aéreas até abrir o placar e depois matar o oponente nos contragolpes.
Felipão investe nas laterais. No primeiro tempo, o Brasil girou a bola e atacou os franceses com o quarteto ofensivo - Hulk pela direita, Oscar mais por dentro e Neymar à esquerda atrás de Fred - e mais Daniel Alves e Marcelo. Ora abertos, ora procurando o centro para ocupar o espaço que seria de Paulinho chegando de trás. Nem sinal dos "80% ataque" que Luiz Gustavo diz ser o pedido do técnico ao volante do Corinthians.
O time tende a jogar bolas na área procurando o centroavante ou definir com o meia aberto buscando a diagonal. Porque não há um elemento aparecendo de surpresa pelo centro ou se apresentando como opção para a virada de jogo mais rápida. Por isso a exigência de volantes que saibam jogar. No meio, eles têm espaços para avançar e não sobrecarregar o meia de ligação. Scolari convocou os melhores, mas os subutiliza no 4-2-3-1/4-4-1-1 presos bem próximos aos zagueiros.
 
Olho Tático
No primeiro tempo, volantes presos para os laterais se juntarem ao quarteto ofensivo e tentar furar o fechado 4-1-4-1 francês.
No primeiro tempo, volantes presos para os laterais se juntarem ao quarteto ofensivo e tentar furar o fechado 4-1-4-1 francês.
 
 
Tudo se resolveu na segunda etapa quando a França enfim abriu as linhas, Luiz Gustavo roubou, Fred se deslocou em aceleração e Oscar aproveitou o espaço deixado. O gol que facilitou as mudanças e, principalmente, os contragolpes.
Com Fernando e Hernanes no meio e Lucas e Jô se juntando a Neymar no ataque, saiu o contra-ataque que quase deu errado quando Paulinho, mais avançado, não foi preciso no passe para Lucas, mas Neymar acertou a assistência e Hernanes o chute que bateu na trave antes de vencer Lloris.
 
Olho Tático
Paulinho e Hernanes no meio, Lucas e Neymar abertos, Jô no comando do ataque - a formação no contragolpe do segundo gol.
Paulinho e Hernanes no meio, Lucas e Neymar abertos, Jô no comando do ataque - a formação no contragolpe do segundo gol.
 
 
No final, a experiência de David Luiz como volante mais plantado - não terceiro zagueiro, nem um "novo Edmilson 2002" - e a velocidade de Bernard pela esquerda que abriu espaços para a arrancada de Marcelo em diagonal que terminou no pênalti convertido por Lucas. Fim do jejum.
 
Olho Tático
No final, David Luiz à frente da zaga com Dante e Bernard voando pela esquerda.
No final, David Luiz à frente da zaga com Dante e Bernard voando pela esquerda.
 
A repetição da palavra "espaço" é proposital, não um erro deste que escreve na composição do texto. O bom futebol é o que melhor o administra.
Rinus Michels, da célebre Holanda de 1974, foi o primeiro a exigir o que se faz hoje: reduzir o campo de ação do adversário sem a bola e alargar o próprio quando a retoma. Adiantar as linhas defendendo e voltar atacando, recuando até o goleiro se for preciso para obrigar o oponente a sair.
No Brasil isso é motivo para vaias. Ainda mais no sul do país, onde se pratica um jogo intenso e vertical desde sempre. Então é bola para frente, ainda que seja para bater no muro de defensores. Ou esperar o erro para responder rápido e com espaço, sempre ele. Nem sempre acontece. Se o rival for às redes antes, então...
É este o cenário da seleção repleta de dúvidas, mas com a certeza de que invariavelmente entrará em campo, já a partir da estreia na Copa das Confederações contra o Japão, com o favoritismo e a obrigação de vencer em casa para superar o trauma do Maracanazo de 1950.
O desafio maior é saber lidar com esse peso. Nos pés e na cabeça.

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