12. CONCLUSÃO. BIBLIOGRAFIA.
“Não subsistiria se não a fecundasse o adubo dos interesses, que se aproveitam da armadura espiritual, conservando-a por fora e dilacerando-a por dentro.” (FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder)
Assim, a interpretação jurídica, sobremodo a constitucional, a partir dos paradigmas, das normas de conteúdo difuso, e até mesmo do uso das técnicas apropriadas, como lembra Norberto Bobbio (2000:220) citando HansKelsen, pode ser, de fato é instrumento de e do Poder Político.
Pois o ordenamento jurídico, esse aparato teórico proteiforme, de contornos indefinidos e conteúdo ambíguo no espaço e no tempo, essa massa moldada pela estrutura de Poder Político atuante em cada momento histórico específico da qual fazem parte os operadores do Direito, sempre existiu, antes mesmo do surgimento do Estado, como o demonstra o que há de mais recente no estudo da instauração do princípio da hierarquia, a partir da Psicologia Evolutiva.
Então a interpretação jurídica, em última instância, pode e deve ser entendida enquanto Vontade Política – os que detêm o Poder Político optam por esse ou aquele, um ou outro caminho, a partir de interesses remotos ou imediatos.
Por fim, não é verdadeiro que a lei em si diga o que é certo ou errado – esta é uma armadilha que resulta do emprego político de aparatos teóricos frágeis: ela é instrumento dos seus intérpretes.[2]
Tampouco a realidade permite, como a ciência o demonstra: ela não nos diz, nós é que lhe atribuímos a nossa Moral.
Pode-se comprovar empiricamente (trata-se de uma hipótese resistente à ação do tempo) que a Vontade Política permeia o discurso interpretativo – isso é um fato de natureza sócio-política habilmente dissimulado pelos detentores do Poder Político.
É nesse sentido que é útil perceber o caráter instrumental do Direito: para, entre outras coisas, não ser refém das armadilhas retóricas produzidas a partir de aparatos teóricos frágeis, rompendo com uma conquista que remonta à Grécia – o respeito à lei – e aceitando um modelo de produção, interpretação e aplicação do ordenamento jurídico por meio do qual os detentores do Poder Político, ou mesmo aqueles que os combatem, tentam impor seus interesses pessoais ou de grupo.
Esse respeito à lei pode e deve ter uma conotação moderna, do ponto de vista lógico: trata-se de não aceitar a possibilidade de raciocínios jurídicos fundados em fontes outras que não a própria Norma Jurídica, bem como não aceitar interpretações calcadas em delírios argumentativos, o mais das vezes agasalhados em normas de conteúdo difuso que, por sua amplitude de incidência, se presta a qualquer papel.
Não é possível aceitarmos teorias que defendam a possibilidade da Norma Jurídica ser extraída do meio ambiente social; tampouco podemos aceitar teorias fulcradas nos pseudoditames da Razão enquanto verdade auto-evidente.
Devemos acatar, isso sim, o primado da Norma Jurídica enquanto premissa inicial do raciocínio jurídico, entre outros motivos, se não o for pela argumentação acima desenvolvida, pelo respeito à vontade do povo que, para construir o ordenamento jurídico que a contém, se expressou através dos seus representantes legítimos e legais.
Possibilidade de ir além dos limites estabelecidos pela Norma positivada os há, contanto que se permaneça dentro das fronteiras do ordenamento jurídico estabelecidas legalmente – como, aliás, tão elegantemente propôs Hans Kelsen.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BACHELARD, Gaston. O Novo Espírito Científico. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Tempo Brasileiro, 1968.
BACHELARD, Gaston. O Racionalismo Aplicado. 1ª ed., Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1977.
BARROSO, Luis Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 2ª ed., São Paulo: Editora Saraiva, 1998.
BERGEL, Jean-Louis. Teoria Geral do Direito. 1ª ed., São Paulo: Martins Fontes.
BLACKBURN, Simon. Dicionário Oxford de Filosofia. 1ª ed., Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1977.
BLANCO, Pablo Lopez. La Ontología Jurídica de Miguel Reale. 1ª ed., São Paulo: Editora Universidade de São Paulo, 1975.
BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. 1ª ed., São Paulo: Ícone Editora, 1995.
________ O Positivismo Jurídico. 1ª ed. São Paulo: Editora Ícone, 1996.
________Teoria do Ordenamento Jurídico. 10ª ed., Brasília: Editora Unb,1997.
________Teoria Geral da Política. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Campus, 2000.
BONAVIDES; Paulo. Curso de Direito Constitucional. 5ª ed., São Paulo: Malheiros, 1994.
COELHO, Luis Fernando. Lógica Jurídica e Interpretação das Leis. 1ª ed.,Rio de Janeiro: Forense; 1979.
CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
DENNET, Daniel C. A Perigosa Idéia de Darwin. 1ª ed., Rio de Janeiro : Editora Rocco, 1998.
ELIAS, Norbert. A Sociedade de Corte. 1ª ed., Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
ENGELS, Friedrich. A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. 14ª ed., Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 1997.
FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder. 15ª ed., Rio de Janeiro: Editora Globo, 2000, v.1.
FEYERABEND, Paul. Contra o Método. 1ª ed., Rio de Janeiro: Editora Francisco Alves,1977.
FOUCAULT, Michel. La Verdad y las Formas Jurídicas. 1ª ed., Barcelona: Gedisa, 1980.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 24ª ed., Petrópolis: Editora Vozes, 2001.
GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. 1ª edi., Lisboa, Portugal: Fundação Calouste Gulbenkian, 1988.
GOYARD-FABRE, Simone. Os Princípios Filosóficos do Direito Político Moderno. 1ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1999.
HEISENBERG, Werner. A Parte e o Todo. 1ª ed., Rio de Janeiro: Contraponto Editora, 1996.
HERKENHOFF, João Batista. Como Aplicar o Direito. 1ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1979.
HESSEN, Johannes. Teoria do Conhecimento. 1ª ed. 2ª tiragem, São Paulo: Martins Fontes, 2000.
JAEGER, Werner. Paidéia. 1ª ed., São Paulo/Brasília: Martins Fontes/Editora Universidade de Brasília, 1986.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6ª ed. Coimbra: Armênio Amado Editora, 1984.
________ Teoria Geral das Normas. 1ª ed., Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1986.
________ Teoria Geral do Direito e do Estado. 3ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1995
________ O que é Justiça. 3ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 2001.
LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 2ª ed., Lisboa, Portugal: Fundação Calouste Gulbenkiam, 1989.
LOSANO, Mário G. Os Grandes Sistemas Jurídicos. 1ª ed., Lisboa, Portugal/São Paulo, Brasil: Editorial Presença/Martins Fontes, 1979.
MAIA, Alexandre da. Ontologia Jurídica. 1ª ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2000.
MACHADO NETO, A. L. Sociologia Jurídica. 6ª ed., São Paulo: Editora Saraiva,.
MIAILLE, Michel. Uma Introdução Crítica ao Direito. 1ª ed., Lisboa, Portugal : Moraes Editores, 1979.
PERELMAN, Chaïm. Lógica Jurídica. 1ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 1998.
POPPER, Sir Karl Raymond. A Lógica da Pesquisa Científica. 2ª ed., São Paulo: Editora Cultrix.
________Conjecturas e Refutações. 1ª ed., Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1972
________ A Sociedade Aberta e seus Inimigos. 1ª ed., Belo Horizonte/São Paulo:.
________ Conhecimento Objetivo. 1ª ed., Belo Horizonte/São Paulo: Itatiaia/Edusp, 1975.
________ Autobiografia Intelectual.1ªed., São Paulo: Cultrix/Edusp, 1977.
________ Lógica das Ciências Sociais. 1ª ed. Rio de Janeiro/Brasília: Editora Tempo Brasileiro/Universidade de Brasília, 1978.
________ O Realismo e o Objectivo da Ciência. 1ª ed., Lisboa, Portugal: Publicações Dom Quixote, 1987.
________ Em Busca de um Mundo Melhor. 2ª ed., Lisboa, Portugal: Editorial Fragmentos,1989.
POULANTZAS, Nicos. O Estado, o Poder, o Socialismo. 4ª ed., São Paulo: Editora Graal,.
QUILLET, Pierre. Introdução ao Pensamento de Bachelard. 1ª ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1977.
RIGAUX, François. A Lei dos Juizes. 1ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 2000.
ROSS, Alf. Direito e Justiça. 1ª ed., São Paulo: Edipro, 2000.
SARAIVA, Paulo Lopo: Influência da Ciência Jurídica na Decisão Judicial. separata da Revista Vox Legis; Vol. 139; Julho de 1980.
SOUTO e FALCÃO, Cláudio e Joaquim. Sociologia e Direito. 2ª ed., São Paulo: Editora Pioneira, 1999.
STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) Crise. 1ª ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 1999.
VATTIMO, Gianni. A Tentação do Realismo. 1ª ed. Rio de Janeiro: Lacerda Editores. 2001.
VIEITO; Aurélio Agostinho V. Da Hermenêutica Constitucional.1ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2000.
[1]
“A magistratura constitui-se numa verdadeira elite, participando decisivamente
do comando político nacional e exercitando um forte poder no contexto social”
(SARAIVA, Paulo Lopo; “Influência da Ciência Jurídica na Decisão Judicial”;
separata da Revista Vox Legis; Sugestões Literárias; Vox Legis; Vol. 139; Julho
de 1980; p. 46
[2]
Na Folha de São Paulo de 4 de Janeiro de 2002, Mouna Naim, articulista do “Le
Monde”, conta-nos que três sauditas acusados de homossexualismo foram
decapitados e o Ministério da Informação “disse que o País considerava a penal
capital o meio mais eficaz de salvaguardar o direito humano mais elementar: o
direito à vida”.
Texto constante do livro "Poder Político e Direito (A Instrumentalização Política da Interpretação Jurídica Constitucional)"; MEDEIROS, Honório de. Belo Horizonte: Dialética Editora. 2020. À venda na Amazon e estantevirtual.com.br