terça-feira, 16 de julho de 2013

O MELANCÓLICO LAMENTO DO SAX


 
 
Rodrigo Baia
 
"O ser humano se torna triste e solitário quando ele descobre que..." (Clarice Lispector)
 
Em meados de 2007, no final da minha adolescência, conheci um rapaz chamado "Éri".
Foi em uma época que eu trabalhava na região do Centro de SP, Praça da República. Éri vivia nas ruas, tinha em torno de 30 anos e era um exímio tocador de saxofone.
Naquela época eu estava passando por muitos conflitos emocionais, pessoais, profissionais, familiares... Enfim, conflitos de todas as ordens. Mas me recordo bem que o frio açoitava a pele das pessoas nas ruas.
Eu saia do escritório onde eu trabalhava, no 13º andar de um edifício que dava vista para a praça e, no caminho da parada de ônibus, ainda com um cigarro aceso, sempre parava para ouvir os discursos do mendigo Éri, que falava sobre Kafka e Karl Marx, dentre outros.
As vezes não o encontrava no caminho da parada, mas ouvia, vindo de algum lugar na Praça da Republica o melancólico lamento de seu sax, ao tocar "Unforgettable".
Parecia uma sincronia, pois enquanto eu terminava o cigarro, ainda podia ouvir as ultimas notas de seu lamento.
Depois de tudo, sempre passava algum tempo tentando descobrir o que poderia ter levado um rapaz bonito, jovem, culto e inteligente à empunhar apenas um saxofone velho, e enfrentar as ruas e o rigoroso inverno de São Paulo... Tanta vida, tanto talento e, principalmente tantas coisas para serem contadas estavam simplesmente resvalando na gélida sujeira do Centro.
Hoje entendo o que pode ter acontecido de tão grave, o que pode ter levado Éri a desistir de tudo, de todos e se igualar despudoradamente aos que pedem, aos que não têm nada.
Talvez o mendigo tenha descoberto que de fato nunca teve nada. E quando acordou para essa realidade, o frio e as ruas viraram seu maior bem, seu melhor aconchego.
Arte em fabiomozar.blogspot.com

Um comentário:

Unknown disse...

Esse texto belo me fez rever o centro de São Paulo. Da Barão de Itapetininga, da Sete de Abril, desaguando na Praça D. José Gaspar...Abraço de François.