quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

PRENÚNCIO DE UMA GUERRA ANUNCIADA (I)


Manoel Severo, de terno, e Dr. Napoleão Tavares.
 
 
Por Manoel Severo (*)
 
Sem dúvidas é sempre importante quando nos referimos ao ciclo do cangaço de Lampião, procurarmos contextualizar o ambiente no qual ele nasceu, viveu, suas origens, o que o cercava; a que tipo de sociedade rural ele estava submetido, e também conhecer as oligarquias dominantes da região e suas implicações no destino do mais famoso filho de Zé Ferreira; hoje trouxemos um pouco da histórica disputa entre os Pereiras e os Carvalho.

Remonta ainda os temos do império a origem da quase eterna guerra entre as famílias Pereira e Carvalho, oriundas do Vale do Pajeú, sertão de Pernambuco, berço de dois dos maiores fenômenos do cangaço nordestino, Sinhô Pereira e Virgulino Ferreira da Silva, vulgo Lampião, não poderíamos de forma alguma retratar um pouco da história desses instigantes personagens sem falar desse pano de fundo que foi a batalha ao longo de quase um século envolvendo membros dessas duas oligarquias sertanejas.

Conta-se que tudo começou ainda em 1838, quando vivíamos a época do império; um representante do Partido Liberal, membro da família Carvalho, Francisco Aves de Carvalho foi acusado de mandante do assassinato do Coronel Joaquim Nunes Magalhães, do Partido Conservador, ligado à família Pereira. Ali começaria a guerra que seria nos idos de 1910 até 1922 pano de fundo para o surgimento deste que seria conhecido por Rei do Cangaço, Virgulino Ferreira.

Dentre as tantas “pelejas” entre as duas ilustres famílias, nos deteremos ao dia 15 de outubro de 1907 quando foi morto a tiros, o coronel Manoel Pereira da Silva Jacobina; o “Padre” Pereira, um ex-seminarista, daí o apelido. Filho do barão do Pajeú, patriarca do Clã dos Pereira, esposo de Dona Chiquinha e pai de Luiz Padre; Padre Pereira era irmão de outro Manoel Pereira, esse, pai do jovem Né Pereira, mais conhecido por Né Dadu e do menino Sebastião, futuro Sinhô Pereira. O assassinato de Padre Pereira a mando de João Nogueira, da família Carvalho, teve como motivo a disputa pela partilha de bens de sua própria esposa, uma Pereira, Dona Benuta, que era sobrinha do referido coronel, o que deveria vir a ser um elo para a pacificação das duas famílias acabou sendo a origem da fase mais sangrenta da luta entre os dois lados.

Sebastião Pereira, sentado, e Luiz Padre, de pé.
Padre Pereira, assumiu o comando da família após a morte de seu pai, o Barão do Pajeú. Era tido como um homem de paz, caridoso, que sempre estava fazendo o bem aos sertanejos do Vale do Pajeú. Por sua condição social, e seu caráter de liderança e conciliação, tinha a casa sempre cheia de amigos e agregados, por ser uma figura extremamente querida no seio da região, teria sido escolhido para ser morto pelo Clã adversário.
Dona Chiquinha a viúva, incutia no seio da família o desejo incontrolável da vingança e o ódio foi sedimentando ainda mais o coração dos membros do clã Pereira, principalmente a partir de seu filho único, Luiz Padre, na época com 16 anos. Ainda no mesmo mês de outubro, seu sobrinho, Né Dadu, cunhado de João Nogueira, matava dois membros da família: Joaquim, irmão de Nogueira e um primo deste. Ato seguido João Nogueira emboscava o cunhado com cerca de 20 homens em sua propriedade na Serra Vermelha, o fato é que também João Nogueira acabou sendo morto e a sanha de Né Dadu e seu grupo não parou por ai, ainda sob as ordens de D. Chiquinha mataram outro membro da família Carvalho, Eustáquio Carvalho, proprietário da fazenda Catolé, fato que trouxe ainda mais combustível para a ferrenha luta.

Em março de 1908 eclodia a resposta dos Carvalho que sob o comando de seu patriarca Coronel Antônio Alves do Exu ataca a vila de São Francisco, berço dos Pereira, à frente de mais de 300 cabras e jagunços. A defesa dos Pereira fica novamente a cargo de Né Dadu e pouco mais de 25 homens. O combate teria tido outro desenrolar se não fosse a chegada para ajudar os Pereiras de Manuel Pereira Lins, o Né da Carnaúba com cerca de 70 homens e do Coronel Antônio Pereira com mais de 60 cabras, que acabou com a fuga dos Carvalhos liderados pelo Coronel Antônio do Exu.

Naquela época os dois clãs dominavam a política do Vale do Pajeú, de um lado os Carvalho sob a liderança do Coronel Antônio Alves do Exu e seus familiares e agregados. De sua fazenda Barra do Exu, comandava vários outros coronéis de barranco, distribuídos em várias fazendas das redondezas de Vila Bela e outros municípios, com destaque para a fazenda Umburanas de Sindário e seus irmãos Antonio e José. Já os Pereira tinham em Manuel Pereira Lins, da fazenda Carnaúba seu líder maior, o Né da Carnaúba, que sucedia o Coronel Antônio Pereira, forçado a fugir para o Ceará em função de perseguições políticas.

Continua...
 
(*) Manoel Severo é criador e curador do Cariri Cangaço (www.cariricangaco.com)

4 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom texto, parabens.

Leila Leticia

Lima Verde disse...

História fantástica e muito bem contada, abraços ao Mestre Severo, do cariri cangaço.

Saudações a Honorio de Medeiros

Fernando Cesar Lima Verde

CARIRI CANGAÇO disse...

Querido Honório, te agradeço a gentileza em repercutir nosso texto em seu blog; sem dúvidas a qualidade do mesmo e o merecimento são pequenos, mas aí vem o tamanho de sua generosidade.

Abração

Beijo nas Bárbara e Diogo

Severo

Helio disse...

Prezado dr. Honorio, parabens pelo texto de nosso amigo Severo, um rapaz talentoso inclusive na escrita,kkkkk. Vamos intimá-lo a se dedicar a uma obra sobre o cangaço, eu já desafiei-o a escrever "os bastidores do Cariri Cangaço".

SDS Seu criado em Juazeiro do Norte
Professor Mario Helio