segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

A ESTUPIDEZ NATIVA


François Silvestre


          Começa o ano e a repetição do assassinato das grotas na serra já dá sinais de sua presença.
         São chagas imitando a catapora que as queimadas e broques ferram as encostas e descidas de uma serra minimalista, bela e descuidada. Não há governo federal, estadual ou municipal. Não há um órgão sequer de defesa do patrimônio ambiental que se manifeste ou reprima esse crime. Nem Ibama, Idema, Prefeitura ou Ministério Público.
         Olhos d’água, passarinhos, caças, angicos, ipês, macaúbas, mutambas, ubaias, frejós, mororós, cajazeiras, jitiranas, cajaranas, coqueiros, catolés, trapiás, jucás, mucunãs, jatobás. Tudo a pedir socorro ao infinito. Órfãos e vítimas da irresponsabilidade e nulidade desse aparato todo, caríssimo ao bolso de todos nós. 
         Seriam todas árvores seculares. E pássaros trinando a vida. Juritis, corrupios, pintassilgos, sanhaçus da grota, canários; não existem mais.
         E das árvores existentes, são filhotes que escapam do broque de hoje para morrer no ano que vem. Não engrossam o caule, não frondam, não belam.
         Dorme nas gavetas da Câmara Municipal um PL elaborado por mim, com a garantia unânime dos vereadores de que viraria Lei. Faz mais de nove anos. Nem sei se ainda dorme ou se foi sepultado na lixeira.
         Cuidava das grotas, da regulamentação da caça, da proteção da flora e do patrimônio arquitetônico. Nas primeiras ameaças dos eleitores useiros na prática da destruição, um vereador propôs uma audiência pública. Seria uma audiência para perguntar à população se a serra merece ou não ser preservada. Mesmo com a cavilação da proposta, tal audiência nunca ocorreu.
         Agora, ano de eleição, declarei que não voto em nenhum deles. Um grande amigo, que é vereador e participou da reunião que aprovou o projeto, disse que vai retomá-lo. Já lhe pedi permissão para não acreditar. E mantenho o voto nulo.
         Num sítio aqui perto da minha casa, o proprietário juntou o folharal e tocou fogo. Matou vários cajueiros e chamuscou alguns outros. Matam fruteiras para plantar palmeiras imperiais. Esse monstrengo arbóreo que só faz sentido no Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
         Um Juiz, que já foi desta Comarca, plantou três delas em frente da sua casa inabitada. Sua folhagem cobriu a rede elétrica. Quando cai uma palma sobre os fios, nós ficamos de quatro a cinco horas sem energia. Pois a Cosern tem um escritório para atender trinta e duas cidades.
         Enquanto isso todo mundo se descabela se arrancarem uma folha do “maior cajueiro do mundo”. Como se houvesse cajueiro em todo o resto do mundo.
          Cá, no oeste, tem a maior oiticica do mundo, a maior timbaúba do mundo. Sem falar nos jumentos, abandonados na beira das estradas, cada um com o maior do mundo. Té mais.

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