quinta-feira, 29 de maio de 2025

5. A INSTRUMENTALIZAÇÃO POLÍTICA DO DIREITO

 



* Honório de Medeiros


Não seria impróprio considerar o instrumentalismo aqui aludido algo semelhante ao professado por J. Dewey, “cuja marca característica consiste em admitir que toda teoria é uma ferramenta, um instrumento para a ação e a transformação da experiência (conforme LALANDE, André; “Vocabulário Técnico e Crítico da Filosofia”; Martins Fontes; 3ª edição; 1999; São Paulo; p. 573/574) mas, somente em um certo sentido, vez que limitado por seu ceticismo ontológico. Melhor, talvez, compreender esse instrumentalismo como Popper o faz: “Acho que, seriamente, ninguém negará que as teorias sejam instrumentos. Porém, são também mais do que isso. Digamos que as teorias podem ser instrumentos, mas que nem todas o serão” (POPPER, Sir Karl Raymond; “O Conhecimento e o Problema Corpo-Mente”; Edições 70; Lisboa, Portugal; 1ª edição;1997; p. 30). 

 

A epistemologia sem sujeito cognoscente e o critério de demarcação entre ciência e não-ciência, bem como o método científico, permitem-nos desmontar o aparato das teorias que se fulcram em juízos de valor, em crenças subjetivas e, para além desse desmonte, proporcionam a percepção de que o espírito que norteia o engendramento e a utilização dessas teorias, às vezes, é constituído por nítidas questões de Poder Político. ([2])

Sim, porque teorias podem ser instrumentos e, em podendo ser instrumentos, podem sê-lo do Poder Político, como o demonstra o profundo estudo da obra de Platão feito por Popper (1974:34-35), bem como a análise de alguns fatos históricos do universo jurídico.

Com efeito, embora não seja objeto desta dissertação a análise da obra de Platão feita por Popper, é interessante observar que este autor afirma terem sido a instabilidade política da época na qual aquele vivia e as consequências que esse fato acarretava na situação de sua própria família (Platão tinha sangue real) a base de seu pensamento político.

Por sua vez, essa base se exprimia através de uma deliberação: “deter qualquer mudança política” (OAC:34), que alimentava seu desejo de implantar, em Atenas, o arcaico modelo vigente em Esparta, e que era totalmente contrário às reformas de natureza democrática empreendidas na principal cidade da Grécia Ática.

Por outro lado, para que se perceba o uso que o Poder Político pode fazer dessas teorias cujas premissas são argumentos retóricos - os “entimemas” -, aos quais alude Perelman, basta lembrarmos o papel que a ideia de “Razão” prestou à instauração do Estado Absoluto e à Revolução Francesa, cada uma a seu tempo e a seu modo totalmente diferentes uma da outra.                    

Por exemplo, Bobbio (1995:63), explica que:

“.... a ideia de codificação surgiu, por obra do pensamento iluminista, na segunda metade do século XVIII e atuou no século passado: portanto, há apenas dois séculos o direito se tornou direito codificado. Por outro lado, não se trata de uma condição comum a todo o mundo e a todos os países civilizados. Basta pensar que a codificação não existe nos países anglo-saxônicos. Na realidade, a codificação representa uma experiência jurídica de dois séculos típica da Europa continental”.

E continua:

“É, de fato, propriamente durante o desenrolar da Revolução Francesa (entre 1790 e 1800) que a idéia de codificar o direito adquire consistência política. Este projeto nasce da convicção de que possa existir um legislador universal (isto é, um legislador que dita leis válidas para todos os tempos e lugares) e da existência de um direito simples e unitário. O movimento pela codificação representa, assim, o desenvolvimento extremo do racionalismo, que estava na base do pensamento jusnaturalista, já que à idéia de um sistema de normas descobertas pela razão ele une a exigência de consagrar tal sistema num código posto pelo Estado. Estas idéias, que apelavam não só para a razão mas também para a autoridade do Estado, foram favoravelmente acolhidas pelas monarquias absolutas do século XVIII, sendo estas, inclusive, uma expressão do fenômeno histórico observado com o nome de despotismo esclarecido”. (Idem, p.65)

Para o fortalecimento do Estado, lançou-se mão da codificação, portanto, com base na noção de “Razão”, que tinha os seguintes contornos: leis válidas para todo o tempo e lugares e um direito simples e unitário.

Trata-se da positivação do Direito, ou seja, da instauração da norma escrita. Mas como, ao mesmo tempo, o direito positivado pode ter sido baluarte ou instrumento para a construção do Estado absolutista e arma importante do ideário liberal-burguês e seu projeto hegemônico? A resposta é imediata: a possibilidade de sua instrumentalização.

É o que se depreende da leitura de Miaille:

“Todo o sistema das idéias dessa época converge em um único ponto: contra os preconceitos da feudalidade, é preciso fazer valer a Razão. A Razão propõe naturalmente uma inversão da ordem das coisas. Enquanto que o terceiro estado (SIEYÈS) que deveria ser tudo não é nada politicamente, a nobreza, que não é nada, é tudo e reina verdadeiramente. Será preciso conferir ao terceiro estado o lugar que logicamente deveria ter: Não se pode fazer nada sem ele, tudo se faria infinitamente melhor sem os outros. Porque é que é possível admitir que o terceiro estado seja tudo politicamente? Porque não representa de modo nenhum interesses particulares, como a nobreza ou o clero, mas os interesses da quase totalidade da sociedade. O terceiro estado abrange, pois, tudo o que pertence à nação; e tudo o que não é terceiro estado não pode ser visto como sendo a nação. O terceiro estado já não pode continuar a ter o lugar subalterno que a sociedade feudal lhe reservara: tem de ser a realidade nacional de que não era outrora senão a sombra. Como é possível que a razão possa admitir que uma nação de 25 milhões de pessoas seja governada por menos de 200 000 privilegiados? Se a Nação é portanto a única noção que a Razão pode admitir, é que esta Nação será doravante formada por indivíduos livres e iguais em direitos. Esta idéia de liberdade e igualdade sobretudo é indispensável à constituição de uma sociedade nova. Já não se trata de governar na base de privilégios, mas de direitos próprios de cada indivíduo: Não se é livre por privilégios, mas pelos direitos que pertencem a todos. Por outras palavras, o governo racional dos homens não é senão possível se se admitir que cada um deles é titular de direitos fundamentais cujo exercício a comunidade vai proteger. A liberdade no sistema feudal não pertencia senão a alguns: eram outros tantos privilégios; doravante, a liberdade pertencerá a todos: serão outros tantos direitos. A razão humana permitiu, pois, repor a ordem numa sociedade mal organizada, ou melhor, instaurar uma nova ordem fundada nos indivíduos, depositários de direitos inalienáveis e sagrados, numa palavra, de direitos naturais. Não basta proclamar a existência e a validade do direito natural como resposta às questões levantadas pela França dos fins do século XVIII, há que passar essas exigências à prática: há que romper o direito positivo. Nesse sentido, O DIREITO NATURAL É UMA ARMA DE COMBATE [grifo original]. É com esta arma que a nobreza liberal e a grande burguesia se vão bater a partir de meados do século XVIII e desenvolver as suas reivindicações”. (Miaille, 1979:255-256)

Portanto, essa mesma ideia de “Razão”, enquanto estratégia de combate a ser levada a cabo por aqueles que a instrumentalizariam, através da positivação de alguns direitos ditos inerentes ao ser humano, eternos espaciotemporalmente, serviu a vários senhores.

Com efeito, com ela o jusnaturalismo racionalista (o iluminismo) respondeu, à época, o problema que lhe fora proposto: se antes engendrara a positivação do Direito que, em uma primeira etapa, lastreou o absolutismo das Casas Reinantes, em uma segunda etapa juridicizou as condições necessárias para a implantação da nova realidade econômico-política – a burguesia.

Aliás, outra não é a opinião de Ross (2000:307) a esse respeito, quando afirma que o Direito natural é “primeira e principalmente, uma ideologia criada pelos detentores do poder – os estadistas, os juristas, o clero – para legitimar e robustecer a sua autoridade” podendo, portanto, tanto estar de um lado quanto do outro em relação ao ordenamento jurídico em vigor, mas, sempre, com certeza, sendo um instrumento do Poder Político.

Goyard-Fabre (1999:289), constata o mesmo:

“A história nos ensina ora que o princípio da legitimidade é invocado contra o direito estabelecido – foi o caso dos partidários de Luís XVIII que defendiam, contra o direito positivo da Revolução e do Império, o valor da tradição dinástica -, ora que o governo é declarado ilegítimo por ser ilegal – foi o caso do regime de Vichy na medida em que derivava da lei de 10 de julho de 1940, aplicada em violação da Constituição”.

Como fecho, Bobbio (2000:229)  nos conta que assim se referiu Naudé, em "Considerazioni politiche sui colpi di stato" (1639) acerca do massacre na noite de São Bartolomeu, praticamente construindo o conceito de “razão de estado” para vergar a ordem jurídica, em 23 e 24 de agosto de 1572: “Não terei escrúpulos em afirmar que esta empresa foi mais que oportuna, importantíssima e justificada por razões mais que eficientes”.

São muito variadas as fontes que nos permitem constatar esse epifenômeno onipresente, qual seja o da instrumentalização política de aparatos teóricos, na história da humanidade.

Faoro (2000:11), em sua obra-referência “Os Donos do Poder”, na qual retoma e aprofunda os conceitos de patrimonialismo e estamento burocrático analisando-os a partir da formação política brasileira, desde suas mais longínquas raízes portuguesas, observa o quanto o direito romano serviu aos interesses da Igreja que trabalhou, e muito, para romanizar a sociedade, impondo um modelo de pensamento e um ideal de justiça que servia a seus propósitos tanto mais quanto ambíguas as premissa nas quais se fulcrava.

Diz ele, textualmente:

“O clero, desde o distante século VI, convertido o rei visigótico ao catolicismo, trabalhou para romanizar a sociedade. Serviu-se, para esta obra gigantesca, do direito romano, o qual justificava legalmente seus privilégios, revelando-se o instrumento ideal para cumprir uma missão e afirmar um predomínio”.

Popper empreendeu, por exemplo, ao longo da surpreendente aplicação de sua teoria do conhecimento ao domínio da política, em “A Sociedade Aberta e seus Inimigos”, uma heterodoxa e veemente crítica a Hegel, ao ponto de identificar o historicismo hegeliano com a filosofia do totalitarismo moderno. (OAC:86)

Diz Popper:

“A dialética de Hegel, assevero, foi concebida em ampla medida com o fito de perverter as idéias de 1789. Hegel estava perfeitamente consciente do fato de que o método dialético pode ser utilizado para retorcer uma idéia em seu oposto. (...) Como segundo exemplo desse uso da dialética, escolherei o tratamento que Hegel dá à exigência de uma CONSTITUIÇÃO POLÍTICA[3], que ele combina com seu tratamento da LIBERDADE e da IGUALDADE. (...) Vejamos primeiro como Hegel retorce a igualdade em desigualdade: ‘A afirmação de que os cidadãos são iguais perante a lei contém uma grande verdade. Expressa, porém, desse modo, é apenas uma tautologia; apenas diz, em geral, que existe um estatuto legal, que a lei rege. Mas, para ser mais concreto: os cidadãos ... são iguais perante a lei apenas naqueles pontos em que também são iguais FORA DA LEI. APENAS ESSA IGUALDADE QUE POSSUEM EM PROPRIEDADE, IDADE, ETC... PODE MERECER TRATAMENTO IGUAL EM FACE DA LEI... As próprias leis ... pressupõem condições desiguais ... Poder-se-ia dizer que o grande desenvolvimento e o amadurecimento da forma dos estados modernos é justamente o que produz a suprema desigualdade concreta dos indivíduos da atualidade’. (...) ‘A questão <a quem cabe o poder de fazer uma constituição>? é a mesma que <quem deve fazer o Espírito de uma Nação>’? ‘É pelo ingênito Espírito e pela história da Nação – que é apenas a história desse espírito – que as constituições têm sido e são feitas’. ‘A totalidade viva que preserva e continuamente produz o Estado e sua constituição ... é o Governo ... No Governo, considerado como uma totalidade orgânica, o Poder Soberano, ou Principado ... é a vontade do Estado que tudo sustenta e tudo decreta, seu mais alto Cume e sua oni-penetrante Unidade. Na forma perfeita do Estado, em que todos e cada um dos elementos ... encontraram sua existência livre, essa vontade é a do INDIVÍDUO QUE EFETIVAMENTE DECRETA; É A MONARQUIA. A constituição monárquica é, portanto, a constituição da razão desenvolvida’”. Continua Popper: “E, para ser ainda mais específico, explica Hegel, numa passagem paralela da sua FILOSOFIA DA LEI, que a <decisão final ... à autodeterminação ABSOLUTA constitui o poder do príncipe como tal> e que < o elemento ABSOLUTAMENTE decisivo no todo ... é um só indivíduo, o monarca>”.

Popper entende que a filosofia de Hegel foi inspirada, portanto, em seu interesse na restauração do governo prussiano de Frederico Guilherme III, a quem coube comandar a reação ao vendaval revolucionário francês, razão pela qual distorceu, a partir da manipulação dialética, a ideia de Estado, Razão, Igualdade e Liberdade - herança iluminista daquele movimento político, para concretizar, isso sim, o ideal absolutista do genial imperador.

Ao fazê-lo, a partir de matrizes adulteradas do pensamento de Platão, Aristóteles e Heráclito de Éfeso, instaurou uma nefasta e enganosa influência que ainda hoje perdura.

E apresenta, quanto a essa influência, o testemunho insuspeito, acerca de Hegel, de ninguém mais, ninguém menos, que Schopenhauer, para corroborar sua assertiva: “Ele exerceu, não só na filosofia, mas em todas as formas da literatura alemã, uma influência destruidora, ou poder-se-ia ainda dizer, pestilenta. Combater essa influência, com todas as forças e em toda ocasião, é dever de todos os que forem capazes de julgar independentemente. POIS, SE NOS CALARMOS, QUEM FALARÁ”?

Surpreendente é considerar que se verdadeira a suposição de ter respondido Hegel ao problema específico que a época e suas próprias circunstâncias históricas lhe apresentou, qual seja o de engendrar a solução filosófica ao “problema” criado pelo pensamento revolucionário francês, assegurando-se lhe, assim, o papel de “pensador oficial” do império prussiano, ter-nos-emos deparado com um exemplo paroxístico de instrumentalização do saber filosófico em proveito ideológico, a par de uma extrema habilidade na condução de seu intento.

Uma curiosidade histórica: Frederico II, da Prússia, com certeza sabia da importância de respaldar sua política em lastro filosófico; é dele um interessante livro no qual comenta “O Príncipe”, de Maquiavel.

Nos escritos de Jena anteriores à “Fenomenologia”, Hegel, que não chegou a publicar “A Constituição da Alemanha”, exalta Maquiavel com o firme propósito de lutar pela unificação do seu país.

Para tanto, insiste fortemente no combate à liberdade individual – característica, segundo ele, do povo alemão – em defesa da guerra, este instrumento de coesão.

Essa liberdade individual danosa somente pode ser combatida por um Estado forte. Assim, e finalmente, não haveria uma lei moral ou um direito natural que se sobreponha ao direito de um Estado. E o direito do Estado é proporcional a sua força.

Um outro exemplo de instrumentalização política de aparatos teóricos é a questão dos direitos humanos. Em um artigo publicado na Folha de São Paulo, de 11 de dezembro de 1998, cujo título é “Cultura ocidental é astuta”, Contardo Calligaris começa lembrando a seus leitores que os direitos humanos não são inerentes ao ser humano como o são nascer com pernas e braços.

Ao contrário, dizer direitos inerentes ou naturais é um artifício retórico  que visa colocá-los acima do diálogo ou argumentação política. Após lembrar que a ideia de direitos humanos e sua universalidade encontrou sua primeira formulação no século XVII, Calligaris observa que eles se fizeram valer porque um grupo (Declaração de Independência norte-americana) disse que valiam “e se fez polícia”.

E remata: “Desde a primeira declaração dos direitos humanos no século 18, parece que progressivamente fomos perdendo o ânimo. Desistimos da coragem de nossas escolhas políticas e morais e preferimos então encontrar para elas justificativas naturais”.

Outro exemplo começa com a hipótese de que a idéia de Justiça (THEMIS) é anterior à de Direito (DIKE) escrito.

A Justiça, como nos faz crer o texto homérico, é “o cetro e a lei”, ou seja, os instrumentos entregues pelos deuses aos reis para que estes engendrem a coesão social, façam, concedam Justiça.

Hesíodo nos mostra, principalmente em seu épico pessoal “ERGA”, que a peculiar estrutura política grega, onde o povo (aqueles que não pertencem à nobreza) dispunha de uma rara independência de espírito, permitiu sua luta para a concretização de um ideal de classe: o Direito escrito, que a todos submete, reis, nobres, povo, realizando a Justiça, fundamentalmente alicerçado na noção de isonomia.

Até então, o desejável, mas não somente na cultura grega, quanto na egípcia, hebraica ou nas civilizações de escrita cuneiforme era a “satisfação das partes”, a reforçar a premissa do desejo, implícito, da classe dirigente de promover a “coesão social” ([4]): a Justiça dada, concedida pela elite sendo substituída por aquela buscada, almejada, pelo povo.

Trata-se de uma ruptura, uma revolução.

Como surgiu essa ideia de isonomia? Jaeger (1986:67) menciona que seria possível acreditar na possibilidade de seu surgimento decorrer, por um processo oriundo da associação de ideias, da compensação satisfatória em mecanismos de troca, seja de mercadoria, seja para satisfazer uma perda decorrente de um atentado ao equilíbrio entre as partes.

Essa instrumentalização jurídica da isonomia foi resultante da compreensão, por parte daqueles que não eram nobres, e ela é intrinsecamente política, de que era necessário colocar esta classe também sobre o jugo da lei, ou seja, tornar todos iguais debaixo de um só manto, para assegurar sua própria sobrevivência.

Ressalte-se que, muitos séculos depois, essa foi a cruzada empreendida pelo jusnaturalismo racionalista, enquanto ideário burguês – tendo como fio condutor a subjacente ideia de “Razão” ([5]) - para quebrar os privilégios da nobreza e implantar a hegemonia da nova classe ascendente durante a Revolução Francesa: igualdade!

 A “Razão”, essa reinvenção do iluminismo, criação grega ([6]), permitia a construção do discurso da isonomia, da igualdade, ele mesmo usado, séculos antes, pelos “demos” grego para criar a democracia, ou seja, o governo da maioria sob o manto da lei.

Assim, é fácil concluir que a ideia de Direito escrito para assegurar-se a obtenção da Justiça, é criação política. 

Ironia da história, melhor, dos seus protagonistas: uma mesma bandeira – a noção de Razão -, duas práticas políticas distintas.

Ou seja, em síntese, um aparato teórico frágil pode ser instrumento político da estrutura de Poder Político vigente, qualquer que seja ele.


[2] “O poder de um indivíduo ou instituição é a capacidade de este conseguir algo, quer seja por direito, por controle ou influência. O poder é a capacidade de se mobilizar forças econômicas, sociais ou políticas para obter um certo resultado, e pode ser medido pela probabilidade de esse resultado ser obtido em face dos diversos tipos de obstáculos ou oposição enfrentados. Não é essencial à sua definição que o resultado seja conscientemente procurado pelo agente: o poder pode ser exercido na ignorância de sua existência ou efeitos, embora, claro, seja frequentemente exercido de forma deliberada” (BLACKBURN, Simon; “Dicionário Oxford de Filosofia”; Jorge Zahar Editor; Rio de Janeiro; 1ª edição;1997; p. 301).

[3] Este, como os seguintes, no presente capítulo, são grifos de Popper.

[4] GILISSEN, John; “Introdução Histórica ao Direito” 1988; p. 53. O “Maât”, modelo do direito não escrito, o objetivo a ser perseguido pelos detentores do poder, tem poressência ser o “equilíbrio”; o ideal, a esse respeito, é por exemplo “fazer com que as duas partes saiam do tribunal satisfeitas”.

[5] Vejam-se os escritos do Abade Sièye.

[6] A civilização grega distingue-se das outras pela invenção da filosofia: a realidade explicada não mais através de mitos ou religião e, sim, da Razão.


* Texto constante do "Poder Político e Direito (A Instrumentalização Política da Interpretação Jurídica Constitucional)"; MEDEIROS, Honório de. Belo Horizonte: Dialética Editora. 2020. À venda na Amazon.

quarta-feira, 28 de maio de 2025

4. A APREENSÃO DO FENÔMENO JURÍDICO

 



MEDEIROS, Honório de. Poder Político e Direito (A Instrumentalização Política da Interpretação Jurídica Constitucional). Belo Horizonte: Editora Dialética. 2020.

* Honório de Medeiros 

Ultrapassando a discussão acerca de serem ou não aceitáveis, para seus críticos, as premissas ontognosiológicas de Karl Popper em relação à existência do “terceiro mundo” ou “Mundo 3”, mas acatando, até pelo fato de terem resistido às tentativas de refutação, como conjecturas sofisticadas, tais premissas, cumpre, então, deixar claro que o Direito é, enquanto teoria ou fato social, e na mesma medida, por exemplo, da linguagem ou da arte, algo integrante do “Mundo 3” , ou seja, é um objeto dito cultural, naquele sentido mais singelo ao qual alude Machado Neto (1987:144) “cultura (...) como tudo aquilo que o homem ajunta [agrega] à natureza”.

E:  “um simples objeto natural – uma pedra, digamos – se utilizado pelo homem, mesmo sem modificação de sua estrutura – usada como peso de papéis, suponhamos – já se tornou cultura, por passar a funcionar na vida humana, no mundo do homem, onde se lhe atribui um posto e um sentido”. (OAC:156) 

 

4.1 APREENSÃO DO FENÔMENO JURÍDICO

 

Seria tal objeto cultural apreensível a partir dos postulados estabelecidos pela teoria que afirma serem as ciências culturais (ou do espírito) ontologicamente distintas das naturais, em uma vertente que tem, como fulcro, o pensamento de Dilthey? Ou a ciência seria uma só, identificada não pelo seu objeto mas, sim, por seu método? 

Neste ponto, necessário se faz retornar a Popper. 

 

4.2 CIÊNCIA NATURAL X CIÊNCIA DO ESPÍRITO

 

Ao contrário do que se poderia supor, não é necessário recorrer – pois é errado - ao primado epistemológico que, calcando-se em Durkheim, propugna como premissa tratar os fatos sociais enquanto coisas, em um viés empirista, para contestar Dilthey, que postula serem os objetos culturais, tal qual o Direito, não descritíveis, como o são aqueles peculiares às ciências ditas naturais, mas, sim, compreensíveis, através de um processo no qual o sujeito cognoscente “apreende” a essência do objeto cognoscível.

Esse processo é descrito, por exemplo, pela fenomenologia de Merlau-Ponty, citada por Herkenhoff ( 1979:71),  e nada mais é que a roupagem moderna de uma antiga idéia exposta por Platão no “Teeteto”.

Feyerabend (1977:56-57) a critica não por considerar  que o objeto cognoscível apreendido seja mais que o reflexo das tentações intelectuais do sujeito cognoscente, mas, sim, porque tende à preservação do “status quo”, na medida em que a análise fenomenológica usa um instrumental formado a partir de premissas teóricas já bem solidificadas no analista.

Ou seja, nem o Idealismo ingênuo, tampouco o Realismo intransigente. 

Para tanto, Popper (1975:161) propõe, como já dito anteriormente, não ser importante para o conhecer saber-se acerca de quem o produz, mas, sim, do produto.

Ou seja, “qualquer análise intelectual significativa da atividade de compreender tem de procede,r principalmente, senão inteiramente, por analisar o resultado da nossa manipulação de unidades estruturais e instrumentos do “terceiro mundo” (Mundo 3).

Pouco importa, portanto, a subjetividade de sua apreensão, intelecção, uma vez que, somente ao ser exposta objetivamente, interagir com a realidade externa ao sujeito cognoscente, através de asserções, proposições, argumentações, essa apreensão poderá redundar em efeitos tanto no “segundo mundo” ou “Mundo 2”, quanto no “terceiro mundo” ou “Mundo 3”.

O resultado desse “compreender”, “intuir” a essência de algo, enquanto permanece no sujeito cognoscente, é inexistente para o mundo exterior; ao ser enunciado, passa a submeter-se aos critérios estabelecidos pela ciência quanto à verdade ou falsidade da afirmação feita, demonstrando, assim, inexistir distinção entre a ciência natural e a ciência do espírito. 

Popper afirma: o método científico é um só. Enquanto ciência, um determinado ramo do conhecimento humano assim o é designável não a partir do objeto cognoscíve,l mas, sim, pelo método utilizado para apreendê-lo. 

Ao conjeturar-se algo acerca de um objeto de natureza cultural (objeto este entendido não no sentido platônico das formas e idéias, que seriam eternas e absolutas e existentes, portanto, anteriores ao homem, mas cuja confirmação quanto à sua existência não é possível pelos padrões científicos atuais) cujas características peculiares foram constatadas e descritas ao longo dos séculos e cujas descrições sobreviveram a críticas, provas e testes severos, perscrutou-se a veracidade do conteúdo desses enunciados, no sentido de saber-se se eles seriam verdadeiros ou falsos.

Utilizou-se, assim, um processo próprio que envolve um rígido controle crítico da análise indutiva das premissas propostas. Fez-se, então, ciência. Em síntese: conjecturas submetidas à prova, método único para a ciência do espírito e ciência natural. 

O âmago da questão é o errado entendimento acerca de qual seja o verdadeiro método da ciência natural. Para muitos pensadores, mesmo depois da demolidora crítica de David Hume, a ciência natural começa pela observação e continua, pela indução, até a teoria. Segundo esta teoria, os quatro sentidos, bem como o tato, constituem a fonte de todo o conhecimento. É o que se pode denominar de exacerbação do Realismo. 

Aqueles que não concordaram em trazer para a área de humanas esse errado método das ciências naturais[1] enveredaram pela Hermenêutica enquanto ciência do espírito, essa corrente moderna do antigo Idealismo. 

 

4.3 A HERMENÊUTICA ENQUANTO TEORIA SUBJETIVISTA ACERCA DA INTERPRETAÇÃO

 

Nesse sentido, convém expor, de forma mais substancial, qual a percepção que Popper tem acerca da postura de Dilthey e Colingwood, por ele citados, mas que se aplicaria, também, necessariamente, a Emilio Betti,[2] Gadamer,[3] Miguel Reale e sua utilização do método fenomenológico para apreensão do fenômeno jurídico,[4] e aos arautos da filosofia da linguagem, pois fundamental para a crítica da hermenêutica enquanto teoria subjetivista.[5] 

Segundo Popper, todos esses filósofos sustentam que as ciências humanas distinguem-se substancialmente das naturais posto que às primeiras cabe compreender o homem, mas, não, à natureza. Essa “compreensão”, fundamentalmente, seria uma identificação intuitiva com os outros, a partir dos gestos, fala e ações, dos produtos da mente humana, atitude impossível de conceber-se em relação ao universo físico, compostos químicos, células e outros. 

Entretanto, mesmo havendo essa aparente distinção em relação ao objeto cognoscível, qual seja “compreender” para as humanidades e “entender” para as ciências da natureza, o método da conjectura e refutação, que caracteriza a ciência é comum às duas: tanto vale para a “reconstrução de um texto danificado como na construção de uma teoria da relatividade”. (Popper,1975:176)

E, ainda, nada é diferente, no ponto-de-partida e na chegada: uma situação-problema originada pela discrepância entre o conhecido e o desconhecido, a exaustão do “modelo” descritivo anterior existente acerca do objeto em tela, o engendrar de conjecturas-soluções (teorias experimentais) que, em sendo enunciadas – portanto expostas de forma objetiva -, serão submetidas aos critérios de controle da verdade científica através da lógica dedutiva, tudo isso é patrimônio comum a ambas. 

Ou seja, embora possa haver divergência entre a ciência humana e natural, seria apenas quanto à forma como o objeto cognoscível se apresenta ao sujeito cognoscente, pois, enfim, o método para apreendê-lo é o mesmo: parte-se sempre de problemas, sejam eles práticos ou incongruências de natureza abstrata. Não há, portanto, um abismo “tipológico” entre um e outro: em ambos começamos pela tensão criada entre nossas expectativas e a realidade, para prosseguirmos então conjeturando soluções ao problema surgido e os controlando através da crítica e/ou teste científico. 

A distinção possível entre ciência natural e ciência humana decorre, basicamente, do fato de a ciência humana ter, como tarefa, estudar objetos do “terceiro mundo” ou “Mundo 3”. Essa afirmação, como não poderia deixar de ser, contraria fundamentalmente uma teoria como a Hermenêutica, que defende ser objetos da ciência do espírito ou ciências humanas ou, ainda, culturais, o estudo dos objetos do “segundo mundo” ou “Mundo 2” e que, por conseguinte, devem ser apreendidos e explicados através da Psicologia ou Psicanálise.[6] 

É óbvio que a compreensão envolve uma atividade de natureza subjetiva, mas há que se distinguir entre essa atividade e seu resultado. Como lembra Popper (1989:151):

“Por seu turno, a interpretação pode ser vista como um produto do Mundo 3 de um ato pertencente ao Mundo 2, e também como um ato subjetivo. Mas mesmo que a consideremos um ato subjetivo, a este ato corresponde, em todo o caso, também um objeto do Mundo 3. Considerada como um objeto do Mundo 3, a interpretação constitui sempre uma teoria. Vejamos, por exemplo, uma interpretação da história, uma explicação da história. Pode ser apoiada por uma série de argumentos, assim como através de documentos, inscrições e outros testemunhos históricos. Deste modo, a interpretação revela-se como uma teoria e, como toda teoria, assente noutras teorias e noutros objetos pertencentes ao terceiro mundo.” 

Assim, o resultado de uma interpretação somente tem valor a partir do momento em que podemos operar com seus enunciados enquanto objetos do “terceiro mundo” ou “Mundo 3”.

Em decorrência, as explicações subjetivas, necessariamente calcadas em premissas que não se sustentam quando não submetidas ao método da ciência, devem ceder lugar a enunciados, asserções, proposições lógicas. Troque-se, então, a psicologia da descoberta pela lógica da descoberta.

Revela-se, assim, o caráter subjetivista da Hermenêutica enquanto ciência do espírito. 

Portanto, do ponto de vista metodológico, segundo Popper, não há a pretendida distinção entre ciência humana e natural, e o Direito, a norma jurídica, enquanto “habitante” do “terceiro mundo” ou “Mundo 3”, deve ser apreendido a partir dos postulados metodológicos expostos pela epistemologia sem sujeito cognoscente e, nunca, a partir de primados estabelecidos em decorrência de crenças subjetivas. Esses postulados, para lembrar o critério de demarcação por Popper estabelecido entre ciência e não-ciência, exigem a submissão das premissas nas quais se fulcra, por exemplo, a idéia de “compreensão”, ao crivo da possibilidade de refutação, via teste ou prova, para ser aceito enquanto paradigma científico – algo com certeza impensável em relação à Hermenêutica. 

A aceitação da Hermenêutica – com fulcro no “segundo mundo” ou “Mundo 2” – enquanto ciência do espírito, proposta nitidamente idealista, pode permitir, tendo em vista a fragilidade de sua base teórica, o ocultamento e a instrumentalização política das técnicas interpretativas: a técnica pode ter, como qualquer artefato, uso indistinto, mesmo quando expostas as carências de suas premissas. 

Portanto, devemos e podemos fugir da errada compreensão acerca do verdadeiro método da ciência, seja ela natural ou do espírito. Não devemos enveredar pelo Idealismo ingênuo – mesmo que brilhantemente exposto, tampouco pelo Realismo exacerbado – como o é o positivismo lógico, o empirismo e a fenomenologia. O método da ciência é um só: ele não somente discrepa da concepção arcaica, qual seja o critério observação-indução-teoria, tanto para objetos naturais quanto culturais, como o faz em relação à Hermenêutica que se revela sem sentido na medida em que tira de cena o objeto cognoscível para empreender a análise do sujeito cognoscente. 

Perceber, a partir do estudo dessas questões de natureza ontognosiológica e, mesmo, epistemológicas, a fragilidade de algumas teorias como postas no mundo científico e originando, quiçá, errôneas decisões quando se consubstancializam,  permite entender por que podem algumas delas serem instrumentalizadas pelo Poder Político. Permite, também, combatê-las do ponto de vista lógico, ressaltando a fragilidade de suas premissas e persistência em existir, tomando-se distância, assim, da discussão de caráter ideológico que, com certeza, somente conduz a impasses políticos na hora de se resolverem conflitos sociais. 

Outra não foi, portanto, a razão pela qual tanto se perseverou na exposição dos fundamentos filosóficos, com fulcro em Popper mas, também, em Bachelard, da crítica a crenças de natureza subjetiva, qual sejam aquelas que têm, como lastro, seja o Idealismo ingênuo, seja o Realismo exacerbado. Em quase todas elas, haja vista a possibilidade de sua instrumentalização política, é possível detectar-se o interesse político que as manipula. É nesse sentido que se supõe ser a Hermenêutica, entendida enquanto ciência do espírito ou teoria do significado, a pseudo-ciência de um errado objeto. E o manejo consciente ou inconsciente das teorias que ela enseja, um véu sob o qual se escondem outros desígnios que não apenas o crescimento do conhecimento.


[1] Durkheim tentou trazê-lo. Para tanto propôs atribuir ao fato social o caráter de “coisa”, a ser desvendado através do método de observação e indução.

[2] “Um quarto cânone hermenêutico, estreitamente ligado ao precedente e como esse atinente ao sujeito do processo interpretativo: aquele que proporemos chamar cânone da adequação do entender ou cânone da reta correspondência ou consonância hermenêutica, pelo qual o intérprete deve esforçar-se para colocar a própria atualidade vivente em íntima adesão e harmonia com a mensagem que – segundo a apropriada imagem de Humboldt lhe vem do objeto de modo que um e outro vibrem em uníssono.” (Trecho da Teoria Generale della Interpretazione de Emilio Betti, traduzido e transcrito por PESSÔA, Leonel Cesarino; em “A Teoria da Interpretação Jurídica de Emilio Betti”; Sérgio Antônio Fabris Editor; Porto Alegre; 1ª edição; 2002; p. 110/111). Metafísica pura!

[3] Ver, no caso, “Verdade e Método”, através do qual Gadamer expõe, principalmente “O problema do método”, na primeira parte de sua obra, que trata da “Liberação da Questão da Verdade desde a Experiência da Arte”.

[4] Ver, no caso. BLANCO, Pablo Lopez; “La Ontología Jurídica de Miguel Reale”; Editora Universidade de São Paulo; 1ª edição; 1975; São Paulo; p. 16.

[5] Necessário faz-se distinguir entre teorias subjetivistas do conhecimento – aquelas com ênfase no idealismo, e interpretação subjetiva em Direito – aquela que se propõe interpretar a norma jurídica a partir da intenção do legislador.

[6] Como é o caso da Hermenêutica de Paul Ricouer e Habermas ou, mesmo, de Emilio Betti.


* Texto constante do "Poder Político e Direito (A Instrumentalização Política da Interpretação Jurídica Constitucional)"; MEDEIROS, Honório de. Belo Horizonte: Dialética Editora. 2020. À venda na Amazon.

terça-feira, 27 de maio de 2025

3. A APREENSÃO DA REALIDADE

 


* Honório de Medeiros


1 EPISTEMOLOGIA SEM SUJEITO COGNOSCENTE

 

É em decorrência dessa ontognosiologia ou, melhor dizendo, é acatando essa afirmação de caráter ontológico de Popper, qual seja, a de que a Realidade é constituída desses três subuniversos; que o “terceiro mundo” ou “Mundo 3” é habitado por “objetos” como acima descritos (intrínseca natureza cultural); e que o conhecimento objetivo cresce na medida de nossa (sujeito cognoscente) interação com o conteúdo do “terceiro mundo” ou “Mundo 3” (objeto cognoscível), que pode ser entendida sua epistemologia e a importância que ela assume para a crítica, às teorias interpretativas cujas premissas sejam “auto-evidentes”, ou “evidentes em si mesmas”, como é o caso daquelas de caráter subjetivistas.

Ou seja, citando Popper: “a epistemologia tradicional, com sua concentração no ‘segundo mundo’, ou no conhecimento no sentido subjetivo, é irrelevante para o estudo do conhecimento científico”.

Ainda: “os cientistas agem com base numa suposição ou, se preferirdes, numa crença subjetiva (pois assim podemos chamar a base subjetiva de uma ação) referente [apenas] ao que é promissor em termos de crescimento iminente no terceiro mundo do conhecimento objetivo”. (OAC:113)

Por que falham as teorias subjetivistas do conhecimento? Popper nos diz que falham por várias razões, dentre as quais, a mais importante é supor que todo o conhecimento é subjetivo ou que ele somente é possível a partir da observação ou da experiência sensorial, ou seja, aquilo mesmo acerca do qual nos falou Gaston Bachelard quando pediu que nos acautelássemos tanto com o Idealismo ingênuo, quanto com o Realismo exacerbado.

Contra essas teorias subjetivistas, Popper defende que o conhecimento não é o mesmo que meu conhecimento – ao contrário do que se acredita, ele é resultado da absorção de tradições (senso comum) e pensamento crítico. Por exemplo: saber onde se localiza a garagem da própria casa é o meu conhecimento, resulta de minha própria experiência. Mas essa experiência é resultante da apropriação intelectiva da tradição (senso comum) e não da observação.

No fundo, o subjetivista crê que o senso comum ou a experiência decorreu da observação. Entretanto, para Popper (1987:118), tomando-se por base as ciências biológicas, “é muito possível acreditar-se que o homem, assim como os animais e, mesmo, os insetos, nasçam com tradição ou instinto inatos”.

Evidente que poderia alegar-se que esse conhecimento inato teria sido oriundo de observações de gerações anteriores. Tal afirmativa não procede, uma vez que, de há muito, a ciência já escanteou o “lamarquismo” e sua crença na “experiência observacional individualmente adquirida”, ou seja, mudanças ocasionadas por fatores exógenos ao indivíduo, optando pelo darwinismo.

Este, ao contrário daquele, entende que o conhecimento resulta de uma “avaliação” interna em relação a expectativas não satisfeitas quanto ao mundo exterior.

Diz Popper (OAC:121):

 “O análogo psicológico ou biológico de uma hipótese pode ser descrito como uma expectativa ou antecipação, de um acontecimento. Essa expectativa ou antecipação pode ser consciente ou inconsciente. Consiste na prontidão do organismo para agir, ou reagir, em resposta a uma situação de um certo gênero específico. Consiste na ativação (parcial) de certas disposições.

Exemplos clássicos da maneira como expectativas inconscientes se podem tornar conscientes são: falhar um degrau (<Pensei que não houvesse aqui nenhum degrau>), ou ouvir um relógio parar (<Não me apercebia de o ouvir trabalhar, mas ouvi-o quando parou>).

O nosso organismo estava a antecipar, inconscientemente, certos acontecimentos, e só ficamos conscientes do fato depois de as nossas expectativas terem sido frustradas, ou falsificadas.

Este estar preparado de forma disposicional para o que há de vir parece ser o verdadeiro análogo biológico do conhecimento científico. Num organismo animal, as disposições para reagir de uma certa maneira a certos gêneros de estímulos são, em parte, inatas.

A minha tese é a de que, tanto quanto são adquiridas, são modificações de disposições inatas que são <plásticas> e que se desenvolvem e mudam, ao serem ativadas por estímulos, e, especialmente, também sob influência do fracasso e do sucesso (e talvez associados a sentimentos dolorosos e de prazer); pois as ações e reações que são desencadeadas pelos estímulos são, regra geral, orientadas para certos objetivos biológicos. Deste modo, o organismo desenvolve o seu conhecimento disposicional inato: aprende por tentativa e erro”.

Muito diferente, portanto, do quadro desenhado por Hume quando de sua análise do problema da indução, qual seja, o de que o conhecimento surge a partir de repetições de observações.

Nenhum exemplo, entretanto, pode ser mais marcante para contrariar esse falso empirismo que o de Helen Keller ([1]): cega, surda e muda, entretanto, capaz de engendrar uma possibilidade de comunicação com o mundo exterior, graças a uma “disposição” inata para aprender e resolver problemas básicos relacionados com sua sobrevivência.

Aliás, outro não é o pensamento de Bachelard, como posto anteriormente.

Se Popper nos apresenta a lógica do conhecimento, aquele nos apresenta a psicologia do conhecer e, em o fazendo, diz-nos que o vetor do conhecimento, em última instância, sempre vai do racional para o real.

É neste sentido que a epistemologia sem sujeito cognoscente de Popper nos permite rejeitar, do ponto de vista filosófico, qualquer teoria acerca da interpretação que tenha como fulcro, base, premissa inicial, postulado, ou pressuposto, crença subjetiva exposta enquanto “argumento de autoridade” como o são, por exemplo, aquelas que se expressam a partir de juízos de valor, e, não, juízos de fato e que, no devido tempo, serão objeto de crítica quanto a sua possível utilização enquanto instrumento do Poder Político, na medida de sua fragilidade teórica.

Também se manifesta contra esse entendimento contrário à natureza subjetivista de algumas teorias Perelman (1998:1) logo no início de sua “Lógica Jurídica”, convidando-nos a desprezar a atividade mental de quem raciocina (o processo de pensar) e enveredar pelo produto (o resultado do pensar) da nossa atividade intelectual, entendida como sendo algo de natureza objetiva: o modo como foi formulado (argumentos), o estatuto das premissas e da conclusão, e assim por diante.

2 CRITÉRIO DE DEMARCAÇÃO ENTRE CIÊNCIA E METAFÍSICA. POSSIBILIDADE DE CRÍTICA A TEORIAS SUBJETIVAS.

Este critério – o da epistemologia sem sujeito cognoscente - ao qual se soma, na tarefa de fornecer subsídio para a crítica a teorias de conteúdo subjetivista, o de demarcação entre ciência e não-ciência ([2] ), que consiste   em  somente  considerar aquela,  enquanto tal,  não porque   se caracterize pela observação e método indutivo, já que a lógica indutiva foi refutada, nos moldes até então propostos quanto a sua utilização, por David Hume, e os fatos e a história lhe deram razão, haja vista a física moderna pós-Einstein e seu caráter altamente abstrato e especulativo para o qual, evidentemente, falta uma base empírica enquanto ponto-de-partida, embora não lhe falte cientificidade, mas, sim, e segundo o próprio Popper, por serem suas afirmações passíveis de refutação:

“De acordo com essa concepção, que mantenho, um sistema só deve ser considerado científico se faz afirmativas que podem chocar-se com observações; de fato, as teorias são refutadas pelas tentativas de provocar esses choques – isto é, pelos esforços para refutá-las. Portanto, testabilidade vem a ser o mesmo que refutabilidade, e pode ser adotada como critério de demarcação” (Popper, 1972:284).

Por fim, e para completar essa via-crucis tão complexa acerca do obstáculo epistemológico que é uma teoria subjetivista (a Hermenêutica enquanto ciência do espírito, por exemplo), convém observar aquilo que Popper (1987:107) expõe a esse respeito:

 “A intenção dos filósofos empiristas, de Bacon a Hume, Mill e Russel, era prática e realista. À exceção, possivelmente, de Berkeley, todos eles queriam ser realistas terra-a-terra. Mas as suas epistemologias subjetivas estavam em contradição com as suas intenções realistas. Em vez de atribuírem à experiência sensível o importante, mas limitado poder de testar, ou de inspecionar as novas teorias acerca do Mundo, esses epistemólogos sustentaram <a teoria de que todo o conhecimento é derivado a partir da experiência sensível>, E fizeram <é derivável> equivaler a <é indutivamente derivado>, ou, ainda mais freqüentemente, a <tem origem>. Nunca viram claramente que não é a origem das idéias que deveria interessar aos epistemólogos, mas sim a verdade das teorias; (...)”

Assim, o Realismo, essa ontognosiologia possível, a possibilidade concreta de conhecimento objetivo a partir da crítica de teorias acerca dos habitantes do “terceiro mundo” ou “Mundo 3” enquanto objetos cognoscíveis, a epistemologia sem sujeito cognoscente, o critério de demarcação entre ciência e não-ciência permitem expor a fragilidade teórica do Idealismo, do positivismo, empirismo e fenomenologia enquanto exacerbação realista, das crenças de natureza subjetivistas que não somente se fazem presentes na interpretação jurídica mas, inclusive, em alguns casos, permitem sua instrumentalização.

 

 * Texto constante do "Poder Político e Direito (A Instrumentalização Política da Interpretação Jurídica Constitucional)"; MEDEIROS, Honório de. Belo Horizonte: Dialética Editora. 2020. À venda na Amazon.


(1) Helen Keller não dispunha da capacidade inata e base genética para interpretar como símbolos os símbolos bastante artificiais, o do nome da água, por exemplo; enquanto esta lhe corria sobre as mãos, a professora escrevia nelas a palavra <água> (Conforme Sir Karl Raymond Popper; “O Conhecimento e o Problema Corpo-Mente”; Edições 70; Lisboa; 1ª edição; 1997; p. 60).

([2] ) Não seria errado substituir “não-ciência” por “metafísica”. A opção por aquela, em detrimento desta, decorreu de uma opção por uma linguagem mais incisiva. Em uma, como na outra, pode-se compreender melhor a distinção a partir da demarcação, em Kant, entre fenômeno e coisa-em-si. O termo “metafísica” pressupõe uma gnosiologia, o quê amplia o universo de sua abrangência. Essa gnosiologia, como se pode supor, por ser calcada no conhecimento absoluto proporcionado pela intuição direta das coisas, a partir da Razão, parece mais um privilégio de místicos.

segunda-feira, 26 de maio de 2025

2. DO QUE SE CONSTITUI A REALIDADE

 



* Honório de Medeiros


“O conhecimento foi, portanto, inventado” (FOUCAULT, Michel Foucault; A Verdade e as Formas Jurídicas).

 

Em se acreditando na existência da Realidade enquanto algo existente independente da nossa consciência, ou seja, em uma linguagem mais apurada tecnicamente, no objeto (de objectum = o que está no caminho de nossa ação) cognoscível, pode-se concebê-la como constituída de três subuniversos distintos: “primeiro, o mundo de objetos físicos ou de estados materiais; segundo, o mundo de estados de consciência ou de estados mentais, ou talvez de disposições comportamentais para agir; e, terceiro, o mundo de conteúdos objetivos de pensamento, especialmente de pensamentos científicos e poéticos e de obras de arte”. (Popper, 1975:108)

Popper sugere a existência não somente do ponto de vista concreto, real, do sujeito cognoscente (os estados de consciência aos quais alude), do objeto cognoscível, mas também do resultado da interação entre eles, o “terceiro mundo”, ou “Mundo 3”, constituído de sistemas teóricos, problemas, situações de problemas, argumentos críticos, estados de discussão, estado de um argumento crítico, conteúdos de revistas, livros e bibliotecas.

O autor rebate a crítica possível de que o conteúdo do “terceiro mundo” ou “Mundo 3” seja “expressões simbólicas ou lingüísticas de estados mentais subjetivos”, em síntese, meios de comunicação para “evocar, em outros, estados mentais similares ou disposições comportamentais para agir”, afirmando a existência de “dois sentidos diferentes de conhecimento ou de pensamento: (1) conhecimento ou pensamento no sentido subjetivo, constituído de um estado de espírito ou de consciência ou de uma disposição para agir/reagir; e (2) conhecimento ou pensamento num sentido objetivo, constituído de problemas, teorias e argumentos como tais”. (OAC:110)

Nesse sentido objetivo, afirma Popper, o conhecimento seria totalmente independente de qualquer alegação, argumento da autoridade ([1]), dogma-de-fé ([2]), disposição para afirmar, princípio da evidência ([3]) enfim, da subjetividade do conhecedor. Tal conhecimento é “conhecimento sem conhecedor; é conhecimento sem sujeito que conheça”. (OAC:111) E cita Frege: “Por pensamento entendo não o ato subjetivo de pensar, mas o seu conteúdo objetivo”. (OAC: 111)

Popper exemplifica, para demonstrar a distinção entre objeto do “segundo mundo” ou “Mundo 2” e “terceiro mundo” ou “Mundo 3”; com afirmações típicas do “segundo mundo” ou “Mundo 2”:

                                               “(1) Sei que você está tentando provocar-me, mas não serei provocado.

                                               (2) Sei que o último teorema de Fermat não foi provado, mas creio que será provado um dia.

                                               (3) De ‘The Ofxord English Dictionary’ sobre o verbete ‘Conhecimento’: conhecimento é um ‘estado de estar ciente ou informado’”.

Em todas elas, predomina a crença de natureza subjetiva de quem faz a afirmação. Três exemplos, a seguir, do “terceiro mundo” ou “Mundo 3”:

                                               “(1) De The English Dictionary sobre o verbete ‘Conhecimento’: conhecimento é um ‘ramo de aprendizado; uma ciência; uma arte’.

                                               (2) Levando em conta o estado atual do conhecimento matemático, parece possível que o último teorema de Fermat possa ser indecisível.

                                               (3) Atesto que esta tese é uma contribuição ao conhecimento original e significativa”. (OAC:112)

Neste caso, as afirmações podem ser analisadas em si mesmas e podem ser submetidas ao crivo da crítica científica, a testes, a provas, independentes de quem as fez, na medida em que elas se submetem ao critério regulador da “Verdade” ou “Falsidade” do afirmado, entendida aquela como qualquer asserção ou proposição cujo conteúdo se adapte aos fatos.([4])

Convém aqui explicar, embora de maneira superficial, “a teoria da verdade objetiva” de Alfred Tarsky e sua importância para a epistemologia de Karl Popper.

Em relação a Popper e sua epistemologia, a teoria de Tarsky se revela sobremaneira importante tendo em vista a diferença fundamental, por ele apontada, entre a inferência dedutiva e a suposta inferência indutiva.

A teoria que explica a correspondência entre a verdade e os fatos, até então considerada pelos lógicos como destituída de sentido, foi salva por Tarsky a partir de sua afirmação de que uma teoria que analise qualquer relação entre um enunciado e um fato deve estar exposta em metalinguagem, ou seja, numa linguagem na qual se possa falar de outra linguagem, bem como empregar descrições de fatos, inclusive palavras como “fato”.

Popper (1972:249), exemplifica:

 “O caráter altamente intuitivo das idéias de Tarsky parece tornar-se mais evidente (como descobri ao ensiná-la) se decidirmos primeiramente considerar ‘verdade’, de forma explícita, um sinônimo de ‘correspondência com os fatos’, para então (deixando ‘verdade’ de lado) procedermos à explicação da idéia de ‘correspondência com os fatos.’ Vamos considerar assim em primeiro lugar as duas formulações seguintes, cada uma das quais enuncia muito simplesmente (numa metalinguagem) as condições necessárias para que uma determinada assertiva (de linguagem objeto) corresponda aos fatos: 1) A afirmativa ‘a neve é branca’ só corresponde aos fatos se a neve for, de fato, branca. 2) A afirmativa ‘a grama é vermelha’ só corresponde aos fatos se a grama, for, de fato, vermelha”.

Assim Tarsky resgatou, para a lógica, o papel de critério regulador de enunciados teóricos a partir da verdade objetiva. E esse resgate se tornou fundamental para a epistemologia de Popper, na medida em que lhe permitiu fugir das experiências subjetivas com as crenças, ou seja, com teorias calcadas no “segundo mundo” ou “Mundo 2”, aquelas que derivam da posição subjetivista que só permite conceber o conhecimento como uma modalidade de estado mental, uma crença, uma disposição para agir.

Pois, a partir de então, prepondera a função mais importante da pura lógica dedutiva, qual seja a de que ela é um sistema de crítica, no sentido exposto por Popper em sua décima-sexta tese na contribuição de abertura ao simpósio de Tübingen, que originou o famoso debate entre ele e a “Escola de Frankfurt”, representada por Adorno e Habermas:

 “A lógica dedutiva é a teoria da validade das deduções lógicas ou da relação de conseqüência lógica. Uma condição necessária e decisiva para a validade de uma conseqüência lógica é a seguinte: se as premissas de uma dedução válida são verdadeiras, então a conclusão deve também ser verdadeira.” (Popper,1978:26)

Como desdobramento de sua ontognosiologia, Popper apresenta três teses cruciais em relação ao “terceiro mundo” ou “Mundo 3”: a primeira é a de que “o terceiro mundo” ou “Mundo 3” é um produto natural do animal humano; a segunda tese de apoio  é que o “terceiro mundo” ou “Mundo 3” é amplamente autônomo, mesmo embora constantemente atuemos sobre ele e por ele sejamos atuados: é autônomo apesar do fato de ser produto nosso e de ter um forte efeito de retrocarga sobre nós, isto é, sobre nós enquanto habitantes do “segundo mundo”, e mesmo sobre o “primeiro mundo”; e a terceira tese de apoio (e, pensamos, absolutamente crucial) é que através desta interação entre nós e o terceiro mundo é que o conhecimento objetivo cresce, e que há estreita analogia entre o crescimento do conhecimento e o crescimento biológico, isto é, a evolução de plantas e animais.(OAC:114)

Cabe perguntar se podemos considerar “reais” os habitantes do “terceiro mundo” ou “Mundo 3”. Em um certo sentido sim: são “reais” as imagens vistas na televisão?  Essas imagens, lembra Popper (1977: 194)

“correspondem ao resultado de um processo pelo qual o aparelho descodifica mensagens altamente complexas e ‘abstratas’, transmitidas com o auxílio de ondas; em razão disso, devemos, creio eu, chamar de ‘reais’ essas mensagens codificadas, ‘abstratas’. Elas devem ser decifradas e o resultado dessa decifração é real.”

Por fim, comente-se a afirmação de Popper no sentido de que há uma analogia entre o crescimento do conhecimento e o biológico. Na realidade, como ele mesmo afirmou ao longo do tempo, a teoria da evolução pode ser compreendida como um “programa metafísico”, tal qual o Realismo, que se sustenta na medida em que resiste a todas as críticas realizadas. A teoria da evolução foi a macroteoria que sobreviveu melhor à virada do milênio, quando até mesmo Einstein foi redimensionado a partir da mecânica quântica.

Embora a sobrevivência da teoria da evolução a torne cada dia que passa mais importante para a tentativa de explicação de muitos fenômenos – haja vista o surgimento, a título de exemplo, da Psicologia Evolutiva e da Sociobiologia – não podem ter caráter científico algumas tentativas teóricas de conteúdo “animista” que, nos últimos anos, pretendeu dar ao Direito uma “atitude” adaptativa.

As instituições não agem; somente os indivíduos assim o fazem, dentro ou através delas. Por essa razão, parece ingênuo não somente considerar a hipótese acima como científica, mas, também, uma outra que pretendeu atribuir ao Direito capacidade de auto-organização no limite do caos. Neste caso, trata-se da transplantação, sem a devida cautela, de uma ousada metafísica do mundo físico para o social.

Nada disso invalida, entretanto, a afirmativa de Popper no sentido de considerar que “de um ponto de vista biológico e evolutivo, a ciência ou o progresso da ciência pode ser considerada como UM INSTRUMENTO [o grifo é nosso] usado pela espécie humana para se adaptar ao ambiente, para invadir nichos ambientais e até para inventar novos nichos ambientais.” (Popper, 1978:51) Nem muito menos uma ousada conjectura: a de que o Direito seja, também, um instrumento desse tipo e, por essa razão, se modifique de acordo com a necessidade humana ao longo da história.


[1] Trata-se de raciocínio fulcrado em premissa logicamente irrelevante. “É cometida quando, em vez de tentar refutar a verdade do que se afirma, ataca-se o homem que fez a afirmação” (conforme COPI, Irving M.; Introdução à Lógica; Editora Mestre Jou; São Paulo; 1978; ou quando “justifica uma afirmação baseando-se no valor de seu autor: Aristóteles dixit, Aristóteles disse” (REBOUL, Olivier; Introdução à Retórica; Martins Fontes; São Paulo; 1998).

[2] “Em geral, uma crença que se sustenta com uma certeza injustificada, sem que tenha sido colocada em questão” (BLACKBURN, Simon; Dicionário Oxford de Filosofia; Jorge Zahar Editor; Rio de Janeiro; 1997).

[3] Conforme o Idealismo de Descartes: “a primeira regra é não aceitar nenhuma coisa verdadeira, se não a reconhecer evidente como tal” (ALVES, Alaôr Caffé; Lógica; Edipro; São Paulo; 2000). É a dependência, como se diz em filosofia, do princípio da “verdade material”, aquela cuja característica é a de ser uma proposição verdadeira em si mesma, independente do contexto de qual faz parte.

[4] Conforme a teoria da verdade objetiva de Alfred Tarsky


* Texto constante do "Poder Político e Direito (A Instrumentalização Política da Interpretação Jurídica Constitucional)"; MEDEIROS, Honório de. Belo Horizonte: Dialética Editora. 2020. À venda na Amazon.