* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
O DILEMA ENTRE SER
FILÓSOFO OU SONÂMBULO
Ivan Maciel de Andrade
Ao nos ocuparmos de temas
jurídicos, sempre e inevitavelmente nos situamos diante do dilema proposto por
Ortega y Gasset: ou nos tornamos filósofos ou sonâmbulos. Filósofos – se nos
questionamos sobre aspectos ontológicos, axiológicos e epistemológicos do Direito.
Sonâmbulos – se nos conformamos com o mero conhecimento, interpretação e
aplicação das normas (genéricas e abstratas ou individualizadas) que compõem o
Direito Positivo. Não há outra opção. E sabemos que, habitual e frequentemente,
os profissionais do Direito – por falta de preparo teórico, resistências
ideológicas e outros fatores extrajurídicos – se limitam ao exercício de
atividades superficiais e mecânicas, alheios a qualquer preocupação crítica, o
que os caracteriza inelutavelmente como verdadeiros sonâmbulos. Muitas vezes
conseguem armazenar bom número de informações sobre leis, decretos, resoluções,
jurisprudência, e se utilizam desse material, criteriosamente organizado e
atualizado, para o desempenho das mais diferentes funções jurídicas. Mas esse é
o seu horizonte – a dogmática jurídica, na sua expressão mais restrita, mais
limitada, mais operacional.
Isso é o que distingue Honório de
Medeiros de outros muitos que escrevem sobre temas jurídicos. Honório tem uma
preocupação filosófica, mesmo abordando questões que têm acentuado interesse
para a própria dogmática jurídica. A ótica filosófica está muitas vezes
simplesmente subjacente, implícita, pressuposta no tratamento atribuído ao
estudo e à análise de uma vasta gama de enunciados (alguns deles controversos)
pertencentes a diferentes ramos do Direito.
Aspecto importante a ressaltar é
que os textos de Honório de Medeiros utilizam uma linguagem acessível, direta,
despojada de tecnicismos. Essa peculiaridade torna o seu livro de leitura não
somente útil como agradável. É algo que valoriza sobremodo a substância, o
conteúdo das concepções expostas e constitui notável exceção à forma –
geralmente inóspita – escolhida pelos autores de obras jurídicas para
expressarem suas ideias, cuja inconsistência, muitas vezes, fica disfarçada
atrás de palavras e construções de insuportável pedantismo.
Vale observar que poucos, raros,
no Brasil, se interessaram ou se interessam pela vertente filosófica do
Direito. Os exemplos de A. L. Machado Neto e de Tércio Sampaio Ferraz ainda
permanecem isolados e inigualáveis. Talvez não tenha surgido ninguém depois
deles com o mesmo grau e densidade de conhecimentos jusfilosóficos e com uma
contribuição tão original, profunda, complexa e, ao mesmo tempo, fortemente
didática à abordagem dos grandes problemas teóricos suscitados pelo fenômeno
jurídico.
Sempre me dediquei ao estudo
desses aspectos teóricos, sem prejuízo de minhas atividades no Ministério
Público Estadual e, depois, na advocacia. Na condição de professor de Introdução
ao Estudo do Direito da UFRN, habituei-me a questionar a respeito da natureza
do Direito, da necessidade de sua existência dentro da sociedade, dos
princípios que regem a criação, interpretação e aplicação das normas jurídicas.
Através desses estudos, creio ter construído uma modesta visão crítica e
analítica do Direito.
Lembrando-se, certamente, da orientação filosófica que eu imprimia às minhas aulas no curso de Direito da UFRN, Honório de Medeiros, meu brilhante ex-aluno, resolveu convidar-me para estas palavras iniciais. Sinto-me homenageado e, ao mesmo tempo, feliz em constatar o quanto Honório de Medeiros foi bem-sucedido nas investigações teóricas que realizou, augurando que elas sejam acompanhadas de novas produções de igual nível de qualificação – tanto no âmbito formal, como na abrangência e proficiência dos temas abordados.
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