segunda-feira, 26 de agosto de 2013

NÃO, CUBA NÃO POSSUI UMA DAS MELHORES MEDICINAS DO MUNDO!

Rodolfo Cabral
 
 
Tenho tentado me abster do debate do programa "Mais Médicos". As discussões beiram à imbecilidade recíproca. Mas alguns argumentos merecem destaque.

 O primeiro de todos é a excelência da medicina cubana. Não, Cuba não possui uma das melhores medicinas do mundo. Vou contar algo sobre o capitalismo, que talvez choque o mundo: ele não tem escrúpulos. Hotéis de luxo em cuba custam menos de U$ 50,00, se a medicina cubana fosse esse supra-sumo da eficiência, haveria milhares de pacotes CVC para tratamento médico em Cuba, pouco importando com os debates políticos, o capitalismo acharia um jeito.
 
Os dados sobre a saúde cubana também não são confiáveis, apesar de se mostrar como único país das Américas que controlou a AIDS, o país não dispõe do exame ELISA, principal para detecção da doença. Contudo, a medicina cubana se adaptou à falta de recursos. A limitação de exames, medicamentos e até de outros profissionais, fizeram com que os médicos cubanos fossem exímios num tipo de medicina rara em nosso meio, uma medicina mais preventiva, mais "caseira", com menos recursos. ESSA é a razão de médicos cubanos serem requisitados mundo afora, eles aprenderam a tratar a pessoa em condições que outros médicos não foram preparados. As regiões para as quais os médicos serão mandados serão áreas carentes, não serão enviados para um centro de referência contra o câncer, mas um interior cujos principais casos serão diarreia infantil e garganta inflamada. Qualquer outra coisa é basicamente estabilizar e enviar para a capital.

Outra falácia é desenhar os médicos como monstros insensíveis. Eles tem a razão deles! Trabalhar numa periferia ou numa cidade do interior, na qual não se tem enfermeiros qualificados, onde você se torna único responsável pela vida daquela população é desumano! Eles não são playboys burgueses por quererem trabalhar onde tem condições mínimas, eles são racionais. Você não pode obrigar um médico a trabalhar feito um condenado por "amor" à vida. Professores, quase anualmente, fazem greves por melhores condições para o ensino público e salários mais compatíveis. É direito deles reivindicar essas condições, e além de direito deles, é benefício próprio.

 Outro argumento que beira a ser chulo é que não faltam juízes no interior por haver plano de carreira. Na verdade, os médicos não quereriam um plano de carreira como os dos "juízes", se soubesse do que se trata. Primeiramente, um juiz em início de carreira ganha 12 mil líquido, havendo um déficit enorme de juízes no Brasil. Esse mesmo juiz, leva cerca de 15 anos para ser removido para uma comarca de 2ª entrância (entrância, não instância), que seria uma cidade de em torno de 30 mil a 60 mil habitantes, dependendo do Estado. Se seguisse a carreira semelhante aos dos juízes, os médicos não poderiam dar plantão por fora, não teriam outro emprego, não poderiam POSSUIR consultórios, montar clínicas. Juiz também não tem carga horária. Apesar das audiências serem poucas, é comum os juízes trabalharem fins de semana e feriado, em casa, para cumprir as metas do CNJ, caso contrário ficam fora da linha de promoção (e os quinze anos, podem passar a ser 20). Hoje, um juiz em cinco desistem nos primeiros dois anos de carreira, numa área de trabalho na qual o maior salário que você consegue é o de juiz, depois de cinco anos estudando para um concurso público, que facilmente supera os 10 mil candidatos por vaga.

 Sobre o valor repassado por Cuba... isso é realmente preocupante. O salário médio de um médico cubano é de R$ 600,00 por mês. Segundo explicações (vi no portal do pragmatismo político, não recordo em qual artigo) a justificativa para retensão dos salários pelo governo cubano é para que o salário não seja excessivamente alto, a ponto de desestimular os médicos na ilha, nem baixo, para estimular a vinda. Ocorre um problema sério aí. No Brasil, vigora o princípio pelo qual o Direito trabalhista aplicado é o pátrio, se os serviços forem feitos aqui. Há o princípio da isonomia salarial , os médicos cubanos não podem receber menos pelo mesmo trabalho, apenas por serem cubanos. Como o governo é tomador dos serviços, responde solidariamente pela falta do salário. Isso, falo, do ponto de vista patrimonial, porque do ponto de vista humanístico, dispenso comentários.
Por fim, o programa "Mais Médicos" é mais benéfico. Trabalho com prefeitura de interior, sei da dificuldade dos municípios em contratar e pagar, não é falta de boa-fé, é de dinheiro mesmo.

Um comentário:

Luiz Melo disse...

Como de hábito, excelente texto. Sobre a questão do ordenamento justrabalhista, quero ver a posição do MPT quanto ao tema. Já que duvido muito algum dos médicos cubanos vá ingressar com uma RT, ainda mais com as famílias destes profissionais ainda em Cuba pois proibidas de acompanhá-los ao contrário das dos demais médicos contratados para esse programa.
Some-se a isso o problema do próprio sistema de contratação. Afinal, se prestação de saúde é uma atividade permanente do Estado, como contratar desta forma? Parece-me que vamos repetir o Programa Saúde da Família...