quinta-feira, 7 de abril de 2016

DE UM SILÊNCIO ATORDOANTE

* Honório de Medeiros                         
Eles chegaram em silêncio, cada um trazendo uma toalha na mão, estenderam-nas próximas uma da outra, na areia da praia, e começaram a colher o sol que chegava intenso e voluptuoso, por sobre cada nesga da carne juvenil que lhe era oferecida. Pois eles eram jovens, muito jovens. E, em certo momento, como se cumprindo um ritual, ainda em silêncio, beijaram-se longamente, agressivamente, parecendo quererem ocupar o mesmo lugar no espaço através da boca, não dos lábios, pois estes desapareceram na voragem mecânica da carícia trocada. Como começaram, terminaram. Nada disseram um para o outro. Afastaram-se cada um para seu espaço pessoal e se entregaram, talvez, a um devaneio que os isolava do instante há pouco vivido.

Não sendo carinho aquele beijo trocado tão mecanicamente poderia ser chamado de carícia? Talvez não. Talvez a carícia implique em uma anterior consciência de um momento erótico a ser construído até mesmo com certo vagar, que não afastaria uma comparação audaciosa com o cuidado que se cultiva na elaboração da obra de arte. Não por outro motivo diz-se que o autor, ao examinar com o tato a obra de arte, na realidade está acariciando-a. Na carícia as mãos, o próprio corpo, constroem arabescos ou bordados sutis que prometem mais pelo que insinuam do que, propriamente, pelo contato em si. A pele, de quem recebe, retesa-se na espera de algo que talvez não venha, ou se vier, vem parca, contida, para que a sede ou a fome aumente cada vez mais em uma espiral ilimitada.

Ali, naquele momento em que os corpos dos dois adolescentes se conectaram através das bocas, seria difícil dizer o que houve. Não foi carinho – o toque amoroso despido de erotismo; não foi carícia – toque apaixonado carregado de sensualidade; que teria sido? Talvez o cumprimento de um ritual ao qual se adere por pura falta de imaginação ou desconhecimento. Como não sabem, e não sabem que não sabem, como construirão a arte da entrega física? Talvez, apenas, instintivamente, reproduzam um ancestral propósito que seus genes possuam, na ânsia de reproduzirem-se utilizando os corpos como instrumentos. Talvez, apenas, reproduzam mimeticamente uma cena vista em outros lugares, construída por atores sociais desconhecidos.

E como vieram saíram, ainda em silêncio, quando o sol os expulsou. Falaram-se, óbvio. Nada que louvasse o relacionamento que os unia. Nada que rendesse homenagens á beleza daquela luminosidade ímpar que escandia o mar e a areia. Nada que trouxesse o dia como pauta de uma conversa preguiçosa, coloquial, á toa. Tudo quanto houve, lá, entre ambos, foi um silêncio atordoante... 

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