sexta-feira, 22 de maio de 2015

A ARENA DAS DUNAS E A TEORIA DO BOLO ECONÔMICO

* Honório de Medeiros

De quando os poucos que têm muito comem tudo, deixando os farelos para os muitos que têm pouco.


Desde que Goebbels lançou o mote “de tanto se repetir uma mentira, ela acaba se transformando em verdade”, em contrapartida ficou fácil identificar esse lugar-comum na retórica usada pela elite predadora enquanto concretiza o processo de iludir o “Zé Povinho”.

É o caso, por exemplo, da "Teoria do Bolo Econômico" – “primeiro crescer, depois repartir”, popularizada nos anos 70 do século passado, aqui no Brasil, por Delfim Neto, de trágica memória.

Aliás esse processo de iludir é um dos meios por intermédio dos quais o jogo do poder é jogado pela elite predadora configurando, assim, o retrato em negativo da seleção dos mais aptos conforme pensado por Herbert Spencer na esteira de Darwin, jogo esse bancado via estratagemas, ou seja, idéias que são usadas retoricamente para obter a adesão e, uma vez obtida, prolongar a exploração do “Zé Povinho”.

No caso da “teoria do bolo econômico” tal idéia, uma vez surgida, qual “meme” - um análogo cultural do gene na genética -, como descrito por outro darwiniano, Richard Dawkins, terá uma sobrevida útil proporcional à nossa incapacidade em destruí-la. Na verdade esse “meme” vai, por sua vez, se replicar infinitamente em ambiente fértil, qual seja aquele formado por pessoas sem escrúpulos e os inocentes úteis.

Em outras palavras, mas mantendo o mesmo sentido, assim é que uma idéia econômica – fruto da mais ilegítima elite predadora – nasce, sobrevive e vem constituindo, desde então, parte do arsenal que a elite predadora usa para explorar, seja porque não tem noção daquilo do qual está fazendo parte, seja por puro cinismo, deliberadamente, a patuléia.

É a "Teoria do Bolo Eeconômico". Para os defensores da "Teoria do Bolo Econômico", quanto mais ele crescer, mais pessoas comem.

Como essa ideia funciona na prática? Funciona assim: alguns predadores internacionais precisam fazer o seu dinheiro circular voltando, depois, para o ponto de partida mais robusto, bem mais gordo. 

Nasce, então, a noção de Uma Grande Obra, constituída obviamente pelo conjunto de várias outras obras menores, quase sempre em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento.

Por exemplo: uma “Copa do Mundo de Futebol” em algum País cuja infra-estrutura física não esteja pronta para o evento, no Oriente Médio, África ou mesmo o Brasil. O Brasil, sejamos mais claros, foi escolhido a dedo a partir de parâmetros muito bem definidos, dentre eles a possibilidade da circulação de idéias e capital sem grandes obstáculos que atrapalhem os negócios.

Feito isso começa um imenso e lucrativo trabalho, para toda a elite predatória envolvida no “Grande Projeto”, de arrebanhamento dos “corações e mentes”.

É quando se forma toda a cadeia alimentar da qual ficarão fora apenas as piabas, por razões óbvias e ululantes, constituída pela “mídia famélica”, os políticos de sempre, os empreiteiros, a arraia-miúda que tal quais os peixes-pilotos se alimentam com as sobras dos tubarões, e até mesmo, pasmemos juntos, os intelectuais orgânicos, aqueles sem espinha dorsal, que vivem se contorcendo para prestarem serviços vendendo argumentos: convencer os basbaques, como no caso do Rio Grande do Norte, acerca da importância indizível, pela magnitude, da tal “Arena das Dunas”, para o progresso econômico do nosso Estado.

Desenvolvimento para quem? O Estado não existe, é uma hipostasia; o Estado sou eu, é você, somos nós. Ninguém fala pelo Estado. Ninguém.

Lê-se, por exemplo, na mídia incauta, que “A Grande Obra” é importante para sanear a malha viária. Qual malha viária? A de Mossoró? A de Caicó? A de Pau dos Ferros? Ora, convenhamos, sanear “a malha viária”, enquanto as delegacias de polícia, no interior e na capital não têm computador, papel, armas, carros, homens... Lê-se, também, na mídia inocente inútil, que “a Grande Obra” vai gerar muitos e muitos empregos. Sabemos que empregos são esses: os sazonais.

Desaparecem quais pipoqueiros e vendedores de cachorro quente em final de festa de padroeira. O grosso do dinheiro, aquele que realmente importa, esse já foi embora em busca de outros nichos a serem predatoriamente explorados.

Essa é a lógica do capital. Uma vez comprada a idéia, ou seja, o investimento, imediatamente os investidores entram na luta com um discurso uníssono: “a Grande Obra” é fundamental para o desenvolvimento do Estado, e quem for contra ela é contra o Estado. O mote do velho Goebbels justifica sua fama.

Não há muito mais a dizer agora exceto que se trata de uma luta vã essa contra o desperdício do nosso dinheiro.

Os poucos irridentes contrários à farsa que se desenrola impávida e colossal não dispõem de meios à altura dos adversários para sublevar os “corações e mentes”. Não têm como comprometer os aparelhos do Estado: Legislativo, Judiciário e Executivo, nessa sublevação.

Talvez se faça presente a voz solitária do Ministério Público. Duvido. Não podem massificar a informação que a história oferece gratuitamente a quem souber procurá-la, de que grandes obras não valem por si só, que o digam os milhares de “elefantes brancos” existentes mundo afora.

Consultem o Google, aqueles que não crêem. Não podem apontar o exemplo dos países sérios, como os escandinavos. Praticamente não têm como fazer a defesa de investimentos maciços em políticas públicas na educação, saúde e segurança. Em quais veículos de massa irão falar em Amartya Senn e seu trabalho acerca de “Desenvolvimento como Liberdade”? Liberdade esta que se confunde com segurança, saúde, educação...

Infelizmente o exemplo dos países civilizados nos quais a Sociedade escolhe, primeiramente, suas políticas públicas, para em seguida e se for o caso, construir a obra necessária para implementá-la, não tem como ser apresentado aos norte-rio-grandenses imensamente carentes de saúde, segurança, educação. Pois que não haja dúvidas: se consulta popular houvesse era assim que nosso povo disporia seus recursos.

Chega a ser doloroso: muito embora seu dinheiro banque o bolo que poucos, que têm muito, irão comer à farta, para os muito que têm pouco sobrarão apenas as migalhas.

Um comentário:

Unknown disse...

Bom dia, Magister.
Já teve a oportunidade de passar os olhos em "Ordem Mundial", de Henry Kissinger? O cidadão quase repete aquele sociólogo. Tipo "esqueçam o que escrevi".
aluisiolacerda@gmail.com