Themis
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Por Honorio de Medeiros
Diz-nos
Werner Jaeger[1] que foi Hesíodo, “o
profeta do Direito”, segundo suas palavras, quem introduziu em os Erga, depois intitulado pela posteridade
de Os Trabalhos e os Dias, no qual o
tema é um processo contra seu irmão Perses, “invejoso, briguento e preguiçoso,
que, depois de ter malbaratado a herança paterna, insiste em novos pleitos e
reclamações”, a idéia do Direito.
Dike é uma divindade independente. “É a
filha de Zeus, que se senta junto dele e se lamenta quando os homens abrigam
desígnios injustos, porque tem de prestar-lhe contas deles”. Jaeger atribui a
“identificação da vontade divina de Zeus com a idéia do direito e a criação de
uma nova personagem divina, Dike”, à
força religiosa e seriedade moral com que a nascente classe camponesa e os
habitantes da cidade sentiram a exigência da proteção do Direito.
Se,
desde há muito, toda a manifestação do Direito é privilégio dos nobres que
administravam a justiça de acordo com a tradição, sem leis escritas, lembra
Jaeger, o aumento da oposição entre aqueles e os cidadãos livres, estes
surgidos em decorrência do enriquecimento, levou o povo a exigir leis escritas.
É para combater os excessos da classe dominante que a palavra Direito, dike, se converte no lema da luta:
“Direito escrito era direito igual para todos, grandes e pequenos”.
Homero
designava o Direito com outro termo: Themis.
Etimologicamente significa “lei”. Os nobres patriarcais julgavam de acordo
com a lei proveniente de Zeus criada, portanto, livremente, segundo o Direito
consuetudinário e o próprio saber. “O conceito de dike não é etimologicamente claro. Vem da linguagem processual e é
tão velho quanto themis. Dizia-se das
partes contenciosas que ‘dão e recebem dike’.
Assim se compendiava numa palavra só a decisão e o cumprimento da pena. O
culpado ‘dá dike’, o que equivale
originariamente a uma indenização, ou compensação. O lesado, cujo direito é
reconduzido pelo julgamento, ‘recebe Dike’,
O Juiz ‘reparte Dike’. Assim, o
significado fundamental de dike equivale
aproximadamente a dar a cada um o que lhe é devido. Significa ao mesmo tempo,
concretamente, o processo, a decisão e a pena”.
Enquanto
themis refere-se originalmente à
autoridade, legalidade e validade do Direito, dike significa o cumprimento da justiça. A efetivação, o
instrumento de e para a Justiça.
Jaeger
observa que este termo, dike, desde sua
origem, uma acepção mais ampla: o sentido da igualdade, passível de ser
compreendida a partir da idéia popular original segundo a qual se tem de pagar
igual com igual, devolver exatamente o que recebeu e dar compensação pelo
prejuízo causado. “A exigência de um direito igualitário constitui a mais alta
meta para os tempos antigos. Forneceu uma medida para decidir as questões sobre
o ‘meu e teu’, e dar o seu a seu dono. Repete-se aqui, na esfera jurídica, o
problema que na mesma época encontramos na esfera econômica e que levou à
fixação de normas de pesos e medidas para o intercâmbio de mercadoria.
Procurava-se uma ‘medida’ justa para a atribuição do direito e foi na exigência
de igualdade, implícita no conceito de dike,
que se encontrou essa medida.
É
essa a opinião de Jean-Marc Trigeaud, citado por Jean-Cassien Billier e Aglaé
Maryoli em História da Filosofia do Direito[2]:
“Progressivamente, a palavra dike vai
substituindo themis. A dike (de dêiknimi: mostrar) representa a justiça sob um aspecto mais
intelectual que voluntário, e é vinculada apenas indiretamente à vontade
divina.”
Assim
também pensa José López Hernández[3]:
“Sin embargo, em su evolución semántica, la ‘themis’, de origen patriarcal y
guerrero, fue sustituída por la ‘dike’, una legislación más humana, producida
por el hombre y al servicio de los hombres. Dike evolucionó em el sentido de
oponerse a la fuerza y se convirtió em uma virtud; el que posee esta virtud es
‘dikaios’ (justo).”
Ou
seja, para os gregos antigos, o Direito como conhecemos hoje seria (e deveria
ser) um instrumento para a obtenção da Justiça (valor).
[3] “HISTORIA DE LA FILOSOFÍA
DEL DERECHO CLÁSICA Y MODERNA”; tirant lo blanch; 1ª edição; 1998; Valencia.
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