Honório de Medeiros
Quarta
teoria: o ataque a Mossoró resultou de um plano político (sexta parte)
JERÔNIMO ROSADO
No
que diz respeito à Mossoró e a Jerônimo Rosado, a historiografia é avara em
relação a essa época, excetuando-se as obras de Raul Fernandes e Raimundo
Nonato, que tratam apenas do episódio específico da invasão da cidade por
Lampião.
Não
há, como se pode constatar, mesmo quando consultamos “NOTAS E DOCUMENTOS PARA A
HISTÓRIA DE MOSSORÓ”, de Luis da Câmara Cascudo, ou “HISTÓRIA DE MOSSORÓ”, de
Francisco Fausto de Souza, praticamente nada alusivo aos anos vinte.
Sabemos, entretanto, por textos esparsos, que o
começo da ascendência dos Rosados em Mossoró nasce com o século XX, a partir de
Jerônimo Rosado, paraibano de Pombal, que se casara com uma integrante da
tradicional família Maia,
enviuvara, desposara sua cunhada, e estava em Mossoró desde 1890 pelas mãos do
líder político – já nos idos de 1917 - Coronel Francisco Pinheiro de Almeida
Castro, casado com Dna. Yayá,
da família Veras e Saldanha, parenta, portanto, de Benedito Saldanha.
Sob a liderança de Almeida Castro, Jerônimo Rosado foi Presidente da Intendência Municipal de
Mossoró entre 1917 – 1919:
Presidente
da Intendência: Jerônimo Rosado; Vice, doutor Antônio Soares Junior.
Intendentes: Sebastião Fernandes Gurgel, Francisco Xavier Filho, Francisco
Borges de Andrade, Raimundo Leão de Moura e Camilo Porto de Figueiredo.
Em 1920-1922 Jerônimo Rosado seria, novamente,
intendente (vereador). Muito amigo de Almeida Castro, chegando a ser, junto com
Rafael Fernandes, um dos dois principais suportes de sua trajetória política,
quando aquele, em 1921, seguiu para o Rio de Janeiro no intuito de assumir seu
mandato de Deputado no Congresso Federal, Jerônimo Rosado foi designado, junto
com Rafael Fernandes, para assumir a direção política do município, em carta
aberta à população.
Mas em 20 de junho de 1922 morria Almeida Castro.
Poucos dias depois, no “O Mossoroense” de 15 de
julho de 1922, em sua primeira página, é publicado um Edital do Partido
Republicano Federal informando a população que a chefia política do Município
ficaria sob os cuidados de um Diretório constituído por Raphael Fernandes, como
Presidente; Cel. Manoel Cyrillo dos Santos, Vice; e Jerônimo Rosado, 1º
Secretário, dentre outros.
Nesse mesmo “O Mossoroense” se informava que Raphael
Fernandes fora indicado pelo Governador Ferreira Chaves para substituir Almeida
Castro no Congresso Federal.
Chegavam os Fernandes, assim, à chefia política da
segunda maior cidade do Rio Grande do Norte, com forte influência em todo o
Oeste e Alto Oeste potiguar.
Consequência dessa situação vai ocorrer logo em
1926, quando da escolha do novo Prefeito de Mossoró:
1926-1928:
Presidente, Rodolpho Fernandes de Oliveira Martins; Vice, Hemetério Fernandes
de Queiroz. Intendentes: Luís Colombo Ferreira Pinto, Francisco Clemente
Freire, Antonio Teodoro Soares Frota, Manuel Amâncio Leite e Francisco Borges
de Andrade.
Por qual razão Jerônimo Rosado foi preterido? Tanto
o Presidente, quanto o Vice, eram ligados por laços familiares diretamente a
Rafael Fernandes. Jerônimo Rosado foi, assim, escanteado das posições políticas
que o falecido Almeida Castro para ele reservou ao longo de sua vida de
liderança em Mossoró.
Não que Jerônimo Rosado, discreto, lamentasse
publicamente o fato. Muito antes pelo contrário. Em Mossoró era pública e
notória sua amizade com Raphael Fernandes.
Mas não havia qualquer aproximação sua com o Coronel
Rodolpho Fernandes. Ficou ele ressentido com seu alijamento do poder?
Por sua vez os coronéis Quincas e Benedito Saldanha,
se de fato planejavam a hegemonia política na região, e para tal lutaram tão
ferozmente contra o Partido Popular alguns anos depois, defendendo o
Interventor Mário Câmara, contavam, portanto, com esses dois fatos, para tentar
a ampliação de seu espaço de poder no Oeste potiguar: o desejo do Governador
José Augusto de minar a liderança ascendente dos Fernandes e ressentimento de
Jerônimo Rosado com seu alijamento do topo da política mossoroense pela
ascensão do Coronel Rodolpho Fernandes.
Não que Jerônimo Rosado fosse homem de maquinações
maquiavélicas na luta pelo poder, diga-se de antemão. Pelo menos até onde se
sabe. Muito antes pelo contrário, é de se presumir. Sua conduta foi e é
considerada irrepreensível até hoje.
Mas era uma liderança política inconteste e
influente em Mossoró, respeitado política e empresarialmente, muito mais
significativa, em termos de prestígio, que Antônio Soares, o “nome” da oposição
e do Governador José Augusto em Mossoró.
Se Almeida Castro, anos antes, rompera com os
Maranhão,
não seria estranho Jerônimo Rosado romper com os Fernandes e se aliar a José
Augusto.
E os coronéis Quincas e Benedito Saldanha sabiam que
graças aos laços familiares de Jerônimo Rosado, natural de Pombal, na Paraíba,
casado duas vezes no seio da família Maia, tradicional aliada dos Saldanha, com
o desaparecimento do Coronel Rodolpho Fernandes da política, a balança penderia
a seu favor em Mossoró e Região.
Contra Jerônimo Rosado depõe sua estranha ausência
na defesa da cidade que escolhera para si e sua família e que o recebera tão
bem ao ponto de lhe guindar à participação concreta na sua elite dirigente. Não
há registro, sequer, de sua participação nas reuniões promovidas pelo Coronel
Rodolpho Fernandes, antes da invasão, para discuti-la.
Não é aceitável a desculpa, muitas vezes ouvida em
Mossoró, de que Jerônimo Rosado fugiu da luta contra Lampião para preservar sua
numerosa família.
O Coronel Rodolpho Fernandes, por exemplo, assim
como outros, obrigou Raul Fernandes, seu filho, dezoito anos à época, a
embarcar com sua esposa, filha e netos no trem que saiu da cidade conduzindo
mulheres, crianças e idosos, mas contou sempre com a ajuda de seu filho mais
velho
na trincheira do Palacete. Paulo Fernandes, seu outro filho, estava naquele ano
no Rio de Janeiro, onde fazia medicina.
Foto gentilmente cedida por Orlando Martins
Estamos, agora, em pleno 1927, e o Coronel Rodolpho
Fernandes é o Prefeito de Mossoró, segunda maior cidade do Rio Grande do Norte.
Aos poucos vamos inter-relacionando Massilon,
Quincas e Benedito Saldanha, José Augusto Bezerrra de Medeiros, Jerônimo
Rosado, e Rodolpho Fernandes.
Mossoró rivaliza com Natal, a capital. Sua
população, incluindo a do município, era, em 1927, de 20.300 habitantes. Natal
alcançava 30.600, nos diz Raul Fernandes.
A ascensão ao poder do Coronel Rodolpho Fernandes
revela o predomínio político que sua família, descendente do filho de um português casado com
uma filha do fundador de Martins, o português Francisco Martins Roriz,
adquirira ao longo do tempo, e que se baseava, fundamentalmente, na exploração
industrial da cultura do algodão e do sal.
Aqueles eram novos tempos, o Coronel Rodolpho
Fernandes o pressentia. O Sertão, através de José Augusto Bezerra de Medeiros
granjeara, para si, o poder que os Maranhão, ricos usineiros do açúcar,
entregaram lentamente aos coronéis proprietários de terra onde o algodão
brotava.
Esse mesmo poder, entretanto, calcado na terra,
cedia agora, por sua vez, espaço a uma burguesia que se firmava por intermédio
da industrialização e do comércio em larga escala.
Os Fernandes estavam à frente desse processo de
mudança e iriam viver seu apogeu logo mais, após a vitoriosa campanha do
Partido Popular
contra o Interventor Mário Câmara, com a eleição do médico Rafael Fernandes
para dirigir os destinos do Rio Grande do Norte.
Nogueirinha, casado com Julieta Fernandes. Foto gentilmente cedida por Orlando Martins
Enquanto não se consolidava de vez o poder estadual
nas mãos dos Fernandes, seguidores de José Augusto Bezerra de Medeiros, na
capital, olhavam com preocupação o avanço político da família oestana em Mossoró,
cidade de liderança inconteste do Oeste Potiguar, sob o comando do Coronel
Rodolpho Fernandes.
No Alto
Oeste, sua cidade principal, Pau dos Ferros, já era dominada pelo Coronel
Adolpho Fernandes, parente e correligionário do Coronel Rodolpho Fernandes. De
Mossoró para dentro, até a fronteira com a Paraíba e o Ceará, incluindo,
portanto, Martins
e Luis Gomes, os Fernandes dominavam. Em Apodi, embora o Coronel Chico Pinto
não fosse Fernandes, era correligionário, compadre, contraparente
e amigo pessoal do Prefeito de Mossoró.
Mas a oposição em Mossoró não descansava, era
aguerrida e o eco dos seus passos chegava até os salões do Palácio do Governo,
onde auxiliares diretos de José Augusto Bezerra de Medeiros o intrigavam junto
ao Coronel Rodolpho Fernandes e vice-versa.
Em carta dirigida ao escritor Nertan Macedo,
Paulo Fernandes, filho do Coronel Rodolpho Fernandes, enfatiza essa intriga
entre os dois líderes políticos:
O Governador
do Rio Grande do Norte, Doutor José Augusto Bezerra de Medeiros e o seu chefe
de polícia, Desembargador Manoel Benício de Melo, estavam à época, em franco
dissídio com o prefeito de Mossoró (meu pai); O Sr. Mirabeau Melo, chefe da
repartição do telégrafo em Mossoró era irmão do chefe de polícia, e atuava como
informante das coisas locais e porta voz do governo era um medíocre intrigante,
inadequado para a missão que o destino lhe reservou pois tanto o governador do
estado e seu chefe de polícia como o prefeito de Mossoró eram homens de bem e
do mesmo partido político de modo só se compreende o dissídio entre eles em
torno do problema de interesse público em virtude da ação maléfica de
mexeriqueiros
(...).