terça-feira, 20 de setembro de 2011

A PEDAGOGIA DO ESPETÁCULO

catablogandosaberes.com.br


Honório de Medeiros


                        Ouço, muitas vezes, elogios feitos à capacidade de um professor ou palestrante de prender a atenção da platéia à custa de piadas, gracejos, histrionismo, até mesmo do que se convencionou denominar “perfomances’. Estas últimas abrangendo trejeitos, mugangas, interpretações corporais...

Quando isso ocorre sempre me lembro da história de um debate na área do Direito no qual um dos debatedores, um dos ícones do nosso ensino jurídico, após assistir, perplexo, durante um longo tempo toda a sorte de bizarrices encetadas por um seu colega no afã de levar os ouvintes à diversão, iniciou sua participação comunicando, secamente, aos estudantes, que “ali estava para os levar a pensar, não para diverti-los”.

                        Penso que essa é a missão do professor, palestrante ou conferencista: atrair e, se possível, até mesmo galvanizar a inteligência dos ouvintes, por intermédio da forma e do conteúdo do seu pronunciamento dirigido à razão. Assim foi desde a Grécia de Demóstenes, passando pela Roma de Cícero, a Idade Média de Bossuet e Massilon, até os dias de hoje, quando reverenciamos Churchill e Martin Luther King, em todos os lugares, enfim, onde o respeito pelo saber e por aqueles que o honram se constitui em diferencial de civilização.

Pois bem, no Brasil, guardadas as exceções de praxe, prepondera o populismo pedagógico, ou seja, a concepção de que é a vontade da platéia, ávida por diversão, que deve balizar a forma da exposição do professor, ou palestrante. Quanto mais divertido o expositor, mais concorridas suas participações, ao ponto de aulas, ou palestras, se transformarem em verdadeiras sessões do humorismo que se convencionou denominar “stand up comedy”.  

                        Essa prática de chamar a atenção divertindo, aparentemente válida na infância, levada a cabo ininterruptamente, conduz a uma conseqüência funesta: ao interromper a linearidade da argumentação – quando há - predispõe a mente, por si só tendente à agitação, a perder o foco, a concentração, a capacidade de apreender o todo e suas implicações na argumentação proferida, a se deter no episódico, no fragmentário, no superficial.

                        Aliás, disciplina intelectual é um verdadeiro anátema no ambiente acadêmico de hoje em dia. Não se lê, não se escreve, não se fala dentro dos padrões que a lógica da argumentação impõe. Não é a ditadura da regra gramatical que se quer; é a lógica da argumentação e a argumentação lógica. Não é a camisa-de-força das regras ortográficas que se deseja obedecer; é a linearidade do raciocínio e o raciocínio linear. Não é à técnica da língua a quem devemos nos submeter; é à clareza do pensar e ao pensamento claro.

                        Não há, hoje, no geral, quando deveria – e muito – haver, rigor intelectivo, disciplina de pensamento, lógica argumentativa. Há espasmos intuitivos, logorréia superficial, pensamento fragmentado. E, em muito contribui para essa realidade, a “pedagogia do espetáculo” e a incapacidade do ouvinte em firmar sua atenção no que lhe é dito.



A rigor, nas universidades brasileiras, os estudantes são tratados com o mesmo método de ensino utilizado em sua meninice: gincanas, júris simulados, aulas-espetáculos, tudo vale a pena para se passar a idéia de que o aluno participa diretamente do processo de aprendizagem. É uma equação sinistra: quanto mais se opta pelo espetáculo, que privilegia os sentidos, menor o desenvolvimento da capacidade de concentração, da disciplina da razão. Não por outra causa essa tendência amplia a quantidade de textos mal escritos e de pronunciamentos mal alinhavados, todos resultantes da incapacidade de se pensar com clareza.

                        A lição do passado está aí, para quem souber apreendê-la a partir das pesquisas especializadas: sem disciplina intelectual e física, não se chega a lugar algum.



COMENTÁRIO DO AUTOR:



Após a publicação do texto acima, recebi a seguinte postagem do Prof. Dr. Gilson Ricardo de Medeiros Pereira, autor de "Servidão Ambígua - Valores e condição do magistério":

  
"Olhe, Honório,

concordo com tudo. Ontem mesmo, na abertura dos trabalhos (após a greve) do nosso Grupo de Pesquisa Ateliê Sociológico Educação &Cultura, eu afirmei algo semelhante. Disse que esperava que os orientandos se expusessem, pois quanto mais a gente se expõe, mais proveito tira da discussão; e disse ainda, na esteira de Bourdieu, que a exposição de um trabalho de pesquisa é o oposto imediato de um show, no qual as pessoas se exibem, procuram ser vistas e, com isso, procuram mostrar o que valem no mercado. Esta precaução, num grupo de pesquisa, é importante para combater a idéia exaltada do pesquisador como gênio inteligente e a pesquisa como procura algo mística das razões últimas das coisas, ou, pior ainda, a pesquisa como truque de predigistador. O trabalho artesanal de pesquisa que desenvolvemos incorpora uma ética propriamente científica voltada ao cultivo daquela modéstia que só os que sabem que nada sabem possuem - para lembrar o velho Sócrates.
Parabéns pelo texto, num momento em que a papagaiada performática substitui o trabalho conceitual - paciente, duro e muitas vezes indigesto.abração, gilson."

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

A GRANDE CONSPIRAÇÃO EVIDENCIADA

Bruno Lima Rocha é cientista político

(www.estrategiaeanalise.com.br / blimarocha@gmail.com)

A história aqui narrada é uma autêntica causadora de “comportamento de manada”, quando centenas de investidores seguiram os passos de agentes econômicos com projeção de força em nível planetário, e resolveram por simplesmente, quebrar um país. No caso, a Grécia.

Vazara por algumas publicações espanholas – como o diário Publico e jornais sindicais – que no dia 8 de fevereiro de 2010, no endereço localizado no número 767 da 3ª Avenida, em plena Nova Iorque, houve uma reunião de notáveis “jogadores vorazes” do mercado de capitais.

Ali se combinou de comum acordo, desvalorizar o euro e romper o que restara da coluna vertebral da Grécia.

Nesse episódio, cujo local físico era a sede da Monness, Crespi e Hardt (empresa que opera através de uma subsidiária da Goldman Sachs) estavam presentes, dentre outros operadores financeiros em escala planetária: Aaron Cowen, representante da SAC Capital Advisors, empresa fundada por Steven A. Cohen e que maneja 16 bilhões de dólares em fundos de investimento; David Einhorn, da Greenlight Capital, participante do ataque derradeiro a Lehman Brothers ocorrido no outono de 2008; Donald Morgan, da Brigade Capital, cuja mensagem organizacional ressalta que, dentre seus produtos incluem-se ativos tóxicos ou papéis podres; além de, obviamente, um representante do Fundo Soros.

Teria sido nessa noite do inverno na América do Norte quando se combinou, de forma orquestrada, um ataque aos papéis gregos.

Asseguro que não se trata de evento ocasional e menos ainda de teoria conspiratória. O que de fato ocorre são reuniões periódicas, desta envergadura, incluindo outro encontro semelhante, datado em plena quebradeira fraudulenta do segundo semestre de 2008.

Tais fatos são corroborados em documentários como “Capitalismo, uma história de amor”, de Michael Moore; e “Trabalho Interno”, de Charles Ferguson. Ora, se as reuniões são freqüentes e trata-se de informação privilegiada, porque a mídia especializada não as cobre, uma vez que tem acesso parcial? O acobertamento midiático dá-se por aí.

O Wall Street Journal deu uma nota apagada ao evento, vindo a publicar algo somente em sua edição de 26 de fevereiro de 2010. Em plena era digital, o portal de economia de Rupert Murdoch (controlador do conglomerado NEWS CORP) tarda 18 dias para dar uma informação estratégica para o futuro de mais de 11 milhões e duzentos mil cidadãos gregos.

Depois dessa, será que alguém ainda acredita em balelas como “equilíbrio ótimo” ou “racionalidade dos mercados”?!

LANÇAMENTO DE "REGIONALISMO SERTANEJO", DE RUBERVÂNIO RUBINHO LIMA


Regionalismo Sertanejo, livro do escritor pauloafonsino Rubervânio Rubinho Lima, terá também presença no maior evento sobre cangaço e estudos culturais relacionados ao Nordeste, o CARIRI CANGAÇO 2011.

O livro conta com textos que percorrem por aspectos da literatura em que autores consagrados do período denominado como Regionalismo de 30 é vivido, além também de apontar que, mesmo muitos anos após esse movimento literário regionalista, alguns autores do presente também tratam das mesmas temáticas, o que aponta a resignificação de temas como coronelismo, seca, cangaço e muito mais.

Rubervânio Rubinho Lima é um jovem escritor pauloafonsino que acaba de lançar mais um livro. O primeiro foi “Conversas do Sertão”, uma coletânea de contos lançada em 2009. O título já indica a clara opção do escritor pelo regionalismo literário. Histórias do povo do sertão, sua fala, vestuário, medos, alimentação, tudo aquilo que chamamos de cor local. Agora Rubinho nos brinda com “Regionalismo sertanejo”, uma coletânea de quatro estudos sobre seu assunto preferido. A sequência dos livros deixa clara sua paixão pelo tema. O autor de literatura regionalista resolve estudar sua própria linha de trabalho.

Em pauta a atualidade da literatura regionalista, suas origens e alguns dos nomes mais conhecidos do estilo. O regionalismo surge como afirmação da região, de suas particularidades, em relação ao conjunto da nação. É uma das manifestações da literatura moderna. O auge do regionalismo na literatura se dá entre os anos 30 e 50. Graciliano Ramos, Jorge Amado e José Lins do Rego são alguns dos nomes mais conhecidos. Uma das características principais desta literatura é a denúncia dos problemas sociais da região: a seca, a fome, a sede, os desmandos das elites locais, além de temas como CANGAÇO, Coronelismo, etc, são revividos. Na visão de Rubinho a vigência destes flagelos sociais ainda nos dias de hoje provoca a atualidade deste tipo de literatura.

SINOPSE DO LIVRO

Estudos que percorrem por alguns aspectos ligados ao período do Regionalismo, iniciado no fim da década de 20 e início de 30. Essa literatura trouxe uma linguagem seca e ríspida, apontando um novo realismo, inspirado pelas primeiras obras a retratarem o sertão, a seca, o banditismo, o coronelismo, o messianismo, no período do Modernismo. Autores como Graciliano Ramos, Lins do Rego, Jorge Amado, José Américo de Almeida, Rachel de Queiroz, formam o elenco dos escritores que trataram das temáticas regionalistas, seguindo uma linha de realismo crítico e representando os problemas do Brasil daquela época. Além disso, também trata de autores atuais que, através do uso de temáticas abordadas no período do Regionalismo de 30, tais como Cangaço, seca, coronelismo, ressignificam essa literatura.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

"SEO" CHICO PIU E A TEORIA DA EVOLUÇÃO



Honório de Medeiros

                   Não fossem as fotografias guardadas com muito carinho, nas quais um Honório de Medeiros aparece magro e sorridente, sem rugas e cabelos grisalhos, as lembranças daquele mágico passeio a cavalo, eu e Silvério Crestana, até a fazenda de café de “Seo” Chico Piu, serra acima na área rural de São Carlos, interior montanhoso de São Paulo, tudo seria apenas borrão na minha memória, algo como um filme antigo, com paisagens e pessoas esmaecidas pelo tempo. Pego-as e sorrio, sempre. Depois, um toque de amargor toma conta do espírito e lamenta a juventude passada, os amigos que se foram, os sonhos desfeitos, as promessas não cumpridas, os amores perdidos. “C’est la vie”, diriam os franceses.

                   Naquela tarde conheci “Seo” Chico Piu, homem sob todos os aspectos singular. Em primeiro lugar vivia quase recluso, lá no seu pé de serra. Raras vezes descia à cidade. Bastava-lhe, para viver bem, estar pisando descalço sua terra rica e roxa, cercado por sua gente, que lhe margeava como uma tribo ao seu cacique. “Seo” Chico era baixo, moreno gretado pelo sol, de braços e pernas fortes, espadaúdo, e com uma face como que esculpida em bronze, com traços muito demarcados. Mas o que impressionava eram seus pés. Estes, de fato, se viram sapatos, ou mesmo chinelos, foi em tempos muito idos, segundo suas próprias palavras. Eram verdadeiros cascos, endurecidos por todos os invernos e verões aos quais “Seo” Chico os havia submetido. Segundo nos contou, e sua família confirmava, descia descalço até mesmo para a cidade, onde raramente ia. E, nos pés, não sentia frio ou calor, não era sensível à água ou à rocha mais dura.

                   “Seo” Chico era homem de pouca conversa quando no trabalho ao qual se entregava como qualquer um dos seus trabalhadores. Junto a eles, colhia o café, batia, ensilava, ensacava, derrubava as reses, ferrava-as... Um maestro em pleno exercício de sua arte, cegamente obedecido por seus músicos. Um general a conduzir seu exército com doçura, mas com firmeza. Era, basicamente, dono de cafezais e de rebanho leiteiro, que se espargiam serra abaixo, tendo a Casa Grande como epicentro. Vivesse no Sertão nordestino e nele tivesse aquela terra e todo aquele gado seria um homem de posses, por assim dizer.

No final de uma tarde como aquela, no entanto, tempo esfriando ligeiro indicando noite gelada a chegar, visita no pátio da casa grande e rústica, a sisudez era deixada de lado e o café forte e a aguardente feita sob sua própria orientação lhe iluminavam o semblante e abriam seu coração e mente originando conversas recheadas de casos passados e argutas observações acerca da vida, dos homens e das coisas.

                   Mas tudo que é bom dura pouco.

                   Com a chegada da noite veio a hora de voltar sob a fria luz da lua, a passo leve, nas trilhas estreitas, para manter a compostura e a possibilidade de se envolver com a beleza da serra sob o luar.

Tomamos o último café, bebemos a última caneca de cachaça e ele, se despedindo, bateu na anca da mula que me conduzia, apontou para mim e para si próprio, e como que refletindo, me disse para guardar comigo que o tempo havia lhe ensinado ser a vida, acerca da qual tanto havíamos falado, como uma serra de onde cada um descia na justa medida em que outro subia lhe tomando o lugar.

Dito isso, me lembrou que “seu pensamento” se tratava de um presente, assim como a garrafa da mais pura cachaça de sua moenda que me passou às mãos, deu um passo para trás, ajeitou o casaco de lã por sobre os ombros tocados pelo sereno da noite e lá ficou, a nos observar partindo, com seus pés indiferentes à temperatura que caíra bruscamente e, com certeza, desconhecendo meu conhecimento sorvido dos livros acerca da teoria da evolução que diziam, de forma muito pomposa e circunspecta, aquilo que ele concluira somente observando, no seu pé de serra, a vida passando ao largo.    

O QUE É QUE ESSA TERRA TEM?

(Imitação burlesca do samba "O que é que a baiana tem",

de Dorival Caymmi


O que é que essa terra tem?

O que é que essa merda tem?


Tem muito poeta, tem!

Tem bardos de beco, tem!

Tem erva do diabo, tem!

Tem craque na rua, tem!

Tem coca sobrando, tem!

Ricaço roubando, tem!

Tem muito veado, tem!

Piranha na esquina, tem!

Tem fome e miséria, tem!

Mas como os ladrões vão bem!


Se você for reclamar

Você se fode - é o fim,

Você se fode – é o fim,

Você se fode – é o fim...


O que é que essa terra tem?

O que é que essa bosta tem?


Tem mil faculdades, tem!

Fudendo no preço, tem!

Formando analfas, tem!

De seis em seis meses, tem!

Doutor pra caralho, tem!

Cultura fraquinha, tem!

Mamata os governos, têm!

Tem muito otário, tem!

Aqui, não se fode bem!

- O que é que essa terra tem?



Só vem a Natal que tem

Uma promessa de ouro,

Uma maleta assim.

Quem não tem um pistolão

Não se queixe a mim.

Um sabichão de foro

Uma fome sem fim

Quem não tem um pistolão

Quem não tiver a fim

Oi, vai fazer pantim,

Oi, vai fazer pantim.

Uma bruaca de ouro

E um canalha ruim.

Quem não tem um pistolão,

Oi, vai dançar no fim.

Oi, vai dançar no fim...


Laélio Ferreira

Natal/set/2011

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

O PRIMEIRO A EXERCER A TIRANIA SOBRE OUTROS HOMENS

nimrod-palace.jpg



"Filho de Cus e neto de Cam, filho de Noé, Nemrod (há também em português a forma Nimrod, que parece mais correta em relação à origem hebraica) foi o fundador da Babilônia, segundo o Gênesis (10, 8-12). Era um homem valente, 'robusto caçador diante do Eterno'. Foi o primeiro a exercer a tirania sobre outros homens. Contos árabes e persas fazem dele o centro de muitas lendas."

OS INTELECTUAIS NA IDADE MÉDIA; LE GOFF, Jacques.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

A POESIA VIROU PAGODE



Franklin Jorge


Escrevendo certa vez, em circunstância jornalística, disse o critico Jayme Hipólito Dantas, dos nossos escritores, que não costumam exercer o direito à crítica, corroborando dessa forma para a consolidação de um perfil do intelectual como um provinciano tímido e alienado das provocações proporcionadas pelo acicate da realidade.

Realmente, se nos detemos para verificar se são justas ou não as suas palavras, deparamo-nos com um quadro que deixa muito a desejar, seja no exame direto das obras aqui produzidas seja nas páginas do próprio jornal, quando chamados a opinar ou discorrer sobre os fatos, mostram-se os nossos escritores superficiais ou indiferentes às questões que dizem respeito ao pleno exercício da cidadania. O resultado é um caldo ralo e insípido, a delatar a pobreza de idéias e o descomprometimento em relação à sistemática da história e aos próprios mecanismos literários.

Contam-se nos dedos, portanto, entre os nossos autores, aqueles que parecem dispor de um acervo de idéias e do conhecimento necessário à produção de uma obra que extrapole os limites do anedótico e do charlatanismo literário, sempre tão presentes em uma produção que excede em diletantismo e numa cultura insuficiente que prospera diante da apatia e do absenteísmo de editores que se escusam de exercer plenamente o seu papel, no sentido de proporcionar ao leitor, sob a forma de um texto bem escrito e concatenado, a originalidade do enfoque capaz de fazê-lo interagir com o autor.

A verdade crua e seca nos diz que os nossos escritores evitam opinar, a não ser que o faça como louvação, para não sofrerem contestação, posto que sabidamente ninguém desmente elogios, especialmente num âmbito que se faz notar pela elefantíase de egos inflados como balões de aniversário de kids.

Nota-se, com raras exceções, a dificuldade com que se depara o escritor ao escrever em prosa, uma prova das mais difíceis, pois ao contrário da poesia costuma expor mais claramente as deficiências de um talento limitado à serviço de uma cultura geralmente precária, pois adquirida às pressas e de qualquer jeito, com o intuito de se fazer notar mais pela aparência do que pelo conteúdo; mais pelo excesso de autoconfiança do que pelo estilo que distingue o homem de letras daquele que não o é.

Daí a proliferação de poetas, ou seja, de pessoas de sensibilidade que se iludem com a facilidade com que o verso acode ao chamamento da vaidade, sem consideração pelas exigências do aprendizado que se faz sob o circulo da lâmpada, na solidão e no silêncio. Prova-a a existência de uma sociedade de poetas que, sozinha, conta com mais de quinhentos associados. Fazem parte daquele famoso grupo identificado por Machado de Assis, se não me engano em “Esaú e Jacó”, que possui sensibilidade, mas carece de talento; ou seja, sente, mas não sabe expressar…

Toda essa pagodeira me faz lembrar o Sylvio Romero, um dos mestres de Cascudo, que dizia ser a pobreza intelectual de um povo proporcional ao número de seus poetas. Levando-se em consideração o eminente polígrafo, em relação àqueles que versejam entre nós, estaríamos inapelavelmente no mais baixo patamar da cultura.

sábado, 10 de setembro de 2011

A ARTE DE BÁRBARA LIMA


Deus está onde a solidão dos homens e das coisas ousa aparecer 


Brasil profundo, Brasil arcaico


Quão frágil a cerca que imagina conter o infinito


O RECADO

Honório de Medeiros


                   O recado, como não poderia deixar de ser, chegara por vias transversas – havia sempre, no Sertão, quem era escalado para essas missões: se fôssemos ao comício falar desceríamos direto para o caixão. Não havia meio-termo. Nossa ida significaria mais alento na candidatura do intruso, do “forasteiro” (era assim que nosso amigo oposicionista, vindo de outro Estado, era chamado), do inimigo que, pela primeira vez, era uma ameaça concreta ao poder estabelecido há tanto tempo que os habitantes da cidadezinha o imaginavam tão inalterável quanto o nascer e pôr-do-sol.

                   Eu e meu companheiro de cruz e espada, logo convocado, nos reunimos imediatamente e ele cogitou de mobilizar sua família, famosa pela valentia e embates travados Sertão afora e adentro. Era particularmente conhecido um seu irmão, homem de quem diziam ter a violência por companheira, mas desistimos porque não dava mais tempo: era fim de tarde e o comício seria logo mais, começo da noite.

                   Em nenhum momento passou pela nossa cabeça que não iríamos. Ao contrário. Pelo código de honra vigente no Sertão tínhamos que ir em marcha batida rumo ao possível sacrifício, como se não houvesse outra opção, como se nossa ida fosse algo inexorável. Era fato que eles, os que haviam lançado o repto, esperavam isso mesmo – nosso recuo – para deflagarem o achincalhe e a desonra públicas. As cartas estavam na mesa e a tensão, que já era perceptível desde cedo da manhã no dia do comício, piorara sensivelmente com o conhecimento público do desafio. Agora, minuto a minuto, hora a hora, as atenções de todos estavam voltadas para os nossos próximos passos.

                   Chegou a hora. O povo estava na rua. O murmúrio da multidão chegava a nós apesar do barulho dos carros de som. Nosso carro se aproximou lentamente do palanque. Parou. Ajeitamos as armas inúteis que deslizavam nas cinturas dos nossos corpos suados e se mantinham presas pelos cinturões apontando os canos para as nádegas. Inúteis porque, caso houvesse algum disparo vindo da multidão postada próxima ao palanque contra qualquer um de nós, não teríamos tempo nem possibilidade de reagir. E não podíamos atirar contra a multidão. Éramos alvos perfeitos, recortados contra as luzes dos refletores que incidiam sobre o palanque.

                   Olhávamos para todos os lados, e para a frente, ansiosos. Estariam nossos amigos atentos, no meio da multidão? Conseguiriam eles evitar algum atentado? De onde viriam os tiros?  Esperariam eles que antes falássemos? Tudo isso percorria nossa mente enquanto os outros oradores se sucediam. Um após o outro todos denunciavam a tentativa de intimidação, até que chegou a nossa vez.

                   Meu companheiro, homem conhecido por sua valentia, pegou no microfone. O silêncio se estabeleceu. Todos aguardavam. Ele se voltou para mim, me pediu que segurasse o microfone perto de sua boca, agarrou cada lado da camisa com uma mão, puxou violentamente, os botões saltaram e seu peito nu ficou à vista de todos, enquanto seu brado, ampliado pelas caixas-de-som, ecoava praça afora: “querem nos matar, comecem por mim, aqui estou exposto esperando as balas dos covardes”.

                   Estabeleceu-se o frenesi. A multidão, excitada, berrava, aplaudia, invadiu o palanque, nos pegou nos braços e nos carregou pela praça, dando voltas, várias vezes, até nos depositar no nosso carro, junto com o candidato, e nos acompanhar até sua residência onde a festa durou até o amanhecer.  

                   É difícil, depois de tanto tempo, lembrar tudo quanto foi dito. Na memória, apenas a lembrança da mistura de barulho, cores, cheiros, e adrenalina percorrendo as veias intumescidas. Na lembrança, apenas a memória do brado feroz, o peito indicado, o convite para o tiro, o alívio pela certeza de que, naquele dia, nada ocorreria, a consciência de que havíamos ganho a batalha.

Mas e a guerra, que apenas começara?   

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

AINDA LEMBRANÇAS DA POLÍTICA

flickr.com
Colégio Diocesano Santa Luzia


Honório de Medeiros


                                      Não saberia dizer quando começou meu fascínio pela política, e não confundo este estado-de-espírito com as lembranças doloridas das campanhas do passado em Mossoró que o presente insiste em não sepultar. Teria sido na Mossoró de minha meninice, quando meu pai, lacerdista de carteirinha, punha-me em sua frente e, sentado à cadeira de balanço, escutava e aplaudia meus discursos infantis sem nexo? Ou, quem sabe, teria sido quando nos serões familiares iluminados pelos candeeiros de gás em Tibau, nas férias de final-de-ano, falava-se em antepassados políticos e aventureiros da fortuna que levaram consigo, ao morrer, a antiga glória dos Fernandes?

                                      Teria sido a estranha amizade e admiração nascida por meu tio-avô André Fernandes, General de Exército de brilhante carreira – único a chegar a esse posto tendo começado como soldado raso - e ex-deputado federal, a quem atribuíam ter caído em desgraça por sua lealdade não ao político, mas ao ex-Presidente João Goulart, de quem era sub-chefe da Casa Militar, na hora de sua queda e que, próximo aos 70, vinha todos os anos a Tibau e fazia questão de me levar consigo, eu, menino, para ser seu companheiro nas suas longas e silenciosas caminhadas matinais? Como não admirar alguém que assumia contornos heróicos ante meus olhos espantados com feitos tais como ter passado um ano inteiro sem sorrir unicamente para testar sua autodisciplina?    

                                      Talvez, no entanto, nada tenha sido tão importante quanto ter convivido com a “turma da janela”, na 4ª Série “A” Ginasial do Colégio Diocesano Santa Luzia. Era 1972 e nós – eu os nomeio para homenagear a saudade -, Fernando Negreiros, Jânio Rêgo, Paulo Maia, Segundo Paula, Benjamim Júnior, Monte Júnior – tão precocemente desaparecido, e Chaves Júnior, no intervalo das aulas, todos praticamente na faixa dos 14 para 15 anos, invariavelmente tínhamos discussões intensas, apaixonadas, acerca de política. Ali, naquele tempo, espontaneamente, aprendíamos a debater, e, em decorrência, a argumentar: nós ficaríamos reféns da tarefa de nos mantermos atualizados e expor claramente tudo quanto pensássemos, sob pena de sermos contraditados furiosamente. As diferenças políticas entre nossos pais não nos contaminavam. Éramos grandes amigos e não sabíamos.

                                      Ou, então, quem sabe, teria sido o eco longínquo e estranho da luta subterrânea que se travava nos grandes centros, aureolado por aquela palavra que somente falávamos, por um temor muito natural, em voz baixa e entre iguais: “comunismo”. Era o tempo de se deitar no patamar da Igreja de São Vicente e, à meia-noite, de papo-pro-ar, ouvirmos a transmissão da Rádio de Moscou, que somente Janiro Rêgo sabia localizar, para o Brasil. Comentávamos as prisões de mossoroenses que lutavam contra os militares e as cassações dos políticos de oposição no Rio Grande do Norte.

                                      Não havia ainda qualquer leitura ideológica, naquele tempo. Embora fôssemos leitores vorazes, estávamos mergulhados em plena literatura. Não nos passava pela cabeça, e não havia alguém que nos doutrinasse, ler Marx ou quem quer que fosse dessa área. Na época, eu começava a me interessar pelos franceses e devorava Victor Hugo e sua obra completa, e me preparava para ler uma coleção com as principais obras dos prêmios Nobel, todos de “Seu” Luis Fausto Paula de Medeiros, meu vizinho: quem, hoje, se lembra de Knut Hamsun, autor de “Fome”? A biblioteca de Jaci Rêgo, a biblioteca de Ida Marcelino, a biblioteca de Chico Sena... A biblioteca do Diocesano!

                                      O certo é que eu já estava envolvido, seduzido pela Política e não sabia, no final da minha adolescência. Assim não foi difícil, ao chegar em Natal, indo estudar na Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte, em 1974, entrar na política estudantil. Fiz política estudantil na Etfrn, fiz no Churchill, fiz no Curso de Matemática, fiz no Curso de Direito. De Mossoró eu trouxera essa paixão que nascia; o afeto pelo jogo de xadrez; o amor eterno, perene, pelos livros, e uma timidez com a qual eu lutaria e luto, sem tréguas, e vou lutar, pelo resto da vida.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

"O INTELIGENTE E O SABIDO"

Enviado por Ricardo Sobral

Pe. Zé Luiz

A QUEM INTERESSAR POSSA

Pe. Zé Luiz
Há duas categorias de pessoas que, sobretudo no Rio Grande do Norte, merecem um debruçamento maior, uma atenção mais atenta, um enfoque mais aproximado: o inteligente e o sabido.
O inteligente é como o grão. Se não morrer, será infecundo. A fecundidade do sabido é feita na cotidianidade dos seus sonhos.
O inteligente é aritmético. Consegue sobreviver. O sabido é geométrico. Quase sempre vive sobre. O inteligente é polivalente na ordem do conhecimento. O sabido, na ordem do aproveitamento. O inteligente é grosseiro às vezes, mas humano, profundamente humano. O sabido se irrita, mas é sempre fino. Fino e aderente. Sobretudo ao poder. E quando eu falo em Poder, não me refiro pura e simplesmente ao Sistema. Me refiro ao poder, podendo. Feito de números. Sobretudo de números.
O inteligente pode ser desligado. O sabido, nunca. O inteligente gosta de se encontrar com velhos amigos. O sabido prefere localizar novos. Se vão lhe render dividendos. O inteligente é simples. O sabido é complexo.
Chegar a ele, às vezes não é fácil. O mundo é dos sabidos. A vida, dos inteligentes. Na sua intensidade. A ambição do inteligente é limitada. Porque limitada, nem consegue ser ambição. O sabido é, sobretudo, ambicioso, explicação maior do seu sucesso. O inteligente poderá ser sábio. O sabido, jamais. A fé do inteligente é escatológica.
Do sabido, circunstancial. O inteligente não consegue ser audaz. A ousadia, porém, é o oxigênio do sabido. O inteligente aguarda a morte como passagem; para o sabido, ela não é objetivo de cogitações.
O inteligente gosta de bibliotecas; o sabido, de computadores. O inteligente sonha com Paris, escreve maravilhosamente sobre Paris, mas suas notas são escritas em Tibau ou na Redinha. O sabido dorme em Lisboa, acorda em Hong-Kong e janta em Ponta Negra.
O inteligente sorri. E no sorriso se esboça a silhueta da paz. O sabido ri. E ri gostosamente. O inteligente tem saudades; o sabido, nostalgia. O inteligente mergulha no silêncio. O sabido vira taciturno. O inteligente fica só, para estar com os outros; o sabido, para libertar-se deles.
O inteligente cria; o sabido amplia. O inteligente ilumina; o sabido ofusca. O inteligente pensa em canteiros de flores; o sabido, em projetos de reflorestamento. O antônimo de inteligente é burro, de sabido é besta; às vezes (quem sabe) viram sinônimos.
Ser, para o inteligente é fundamental. Parecer, para o sabido é prioritário. E como vivemos no mundo das aparências, nele o inteligente não terá vez. Desde que mude os seus critérios. Aí então, aflora a crise do desencanto.
É quando a mediocridade se entroniza, o supérfluo se instala e a inteligência se rende. A não ser que o inteligente se chame Unamuno, reitor imortal. Por isso, ele foi magnífico. Do contrário não teria sido reitor, mas feitor. E de feitores o Brasil está cheio. Sabidos, por sinal.
Sabido é Diógenes da Cunha Lima. Inteligente é Jarbas Martins.
Cascudo é inteligente. Sabida é sua entourage.
Inteligentes são Zila Mamede e Otto Guerra.
Inteligente é Waldson Pinheiro. Inteligente foi Miriam Coeli. Inteligente é Padre Ônio (de Cerro Corá) e Dom Heitor (de Caicó). Inteligente foi Dom Costa (de Mossoró). Inteligente foi o pastor José Fernandes Machado.
Inteligente é Anchieta Fernandes. Inteligente é Vingt-un.
O inteligente compra livros. O sabido, ações.
Para o sabido, as letras que realmente valem são letras de câmbio. Inteligente é quem trabalha para viver razoavelmente. Sabido é quem consegue que outros trabalhem para que ele viva maravilhosamente. O inteligente sua. O sabido transpira.
O inteligente acorda cedo. Para ele, Deus ajuda a quem madruga. O sabido acorda tarde. Outros madrugam por ele. Sem o inteligente, o que seria do sabido?
Inteligentes são Manoel Rodrigues de Melo e Raimundo Nonato.
Sabido é Paulo Macedo. Também "imortal".
Inteligente é Dorian Jorge Freire. Sabido é Canindé Queiróz.
inteligentes são Eulício e Inácio Magalhães. Inteligente era Hélio Galvão. Sabido é Valério Mesquita.
Inteligentes eram José Bezerra Gomes e João Lins Caldas. Inteligente foi Jorge Fernandes. Sabido, Sebastião.
Inteligente é Erasmo Carlos. Sabido é Roberto.
Inteligente foi Garrincha. Sua inteligência, porém, não foi além de suas pernas. Com elas, encantava. Sabido é Pelé. Transformou suas pernas em objeto de lucro. Não é a toa que a cidade de Garrincha se chama Pau Grande. E Pelé nasceu onde? Não foi em Três Corações?
Ao mesmo tempo pode amar Xuxa, o Cosmos ou as audiências na Casa Branca.
Há um campo, porém, onde o número de sabidos é pródigo. Mas pelo menos hoje, eu não quero pensar nos inteligentes e sabidos quando se trata de competição eleitoral.
Aqui, o sabido leva sempre vantagem. Quem não se lembra de 74?
O inteligente não era Djalma? Sabido, porém, foi Agenor.
E o povo do RN optou por quem? Pelo inteligente ou pelo sabido?

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

INSTALADO, EM RECIFE, O "COMITÊ DA MEMÓRIA, VERDADE E JUSTIÇA"

Por Jorge Brito

Instalado, em Recife, o “Comitê da Memória, Verdade e Justiça,” com a presença de vultos históricos da luta contra a Ditadura Militar.


“Onde se escondem os criminosos do regime militar”?


Com a presença e representação de vultos históricos da resistência à Ditadura de 64, como Gregório Bezerra (por seu filho Jurandir Bezerra), Francisco Julião (por sua filha Anexina Julião), Elizabeth Teixeira, Abelardo da Hora, ex-deputados Agassiz Almeida e Clodomir Morais, instalou-se, há poucos dias, na av. Visconde de Suassuna 99, Boa Vista, Recife, com mobilização de várias entidades defensoras dos direitos humanos e o apoio do Ministério Público de Pernambuco, o Comitê pela Memória, Verdade e Justiça, visando articular respaldo dos amplos segmentos da sociedade para a aprovação do projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional, cujo objetivo é a abertura dos arquivos da repressão militar de 1964/1985.


Obedecendo a uma ampla programação, coordenada pelo vereador Marcelo Santa Cruz e Edival Cajá, com destaque para exibição do filme Os Trinta anos da Anistia e execução do hino das Ligas Camponesas e, afinal, o momento mais alto dos trabalhos: depoimentos de personalidades da contemporânea história de resistência ao regime militar de 64, entre as quais, Elzita Santa Cruz, em nome dos mortos desaparecidos, Alexina Julião, Agassiz Almeida, Elizabeth Teixeira, Clodomir Morais, Abelardo da Hora e Jurandir Bezerra.


Esta mobilização em nível nacional para a criação de Comitês da Memória, Verdade e Justiça em vários estados do país contou, em Pernambuco, com o apoio decisivo do Ministério Público, por seu Procurador-Geral de Justiça, Aguinaldo Fenelon de Barros, com formação desde as suas lides acadêmicas em defesa das liberdades democráticas. A criação desses comitês visa despertar a sociedade brasileira para o projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional, que cria a Comissão Nacional da Verdade, a qual tem por finalidade a abertura dos arquivos secretos da repressão militar.


Com o auditório do Ministério Público completamente lotado, vários testemunhos foram ouvidos, destacadamente, com profunda emoção, o de Alexina Julião, que relatou o longo padecimento de seu pai pelos calabouços do regime militar e o seu exílio em vários países.


Outro depoimento pranteado com intenso sentimento de dor foi o de Elizabeth Teixeira, causando na plateia intensa emoção. Depondo, Agassiz Almeida relatou o seu desterro logo nos primeiros dias de abril de 1964 à ilha de Fernando de Noronha, onde se encontravam Miguel Arraes e Seixas Dória. Com grande impacto de indignação, Agassiz externou a sua revolta em face da conivência do Brasil com os torturadores e genocidas da ditadura militar, cuja atitude violadora das convenções internacionais mereceu da ONU e da OEA veemente condenação.


Há 32 anos, acentuou Agassiz Almeida, um congresso emasculado fez publicar, em 1979, uma lei a que deram o nome de anistia.


O que se assistiu no curso desses anos, desde a promulgação dessa caricata lei de anistia? Um desfile da impunidade satisfeita e até agressiva.


Que democracia excrescente!


Na elaboração do meu livro A Ditadura dos generais, estive em vários países: Argentina, Chile e Uruguai. Assisti a torturadores e genocidas arrastados às barras da Justiça e condenados.


Aqui, no Brasil, formou-se, pior do que a impunidade, um nicho do cinismo em que os torturadores, acobertados por certo militarismo caolho e amparados em poderes comprometidos com o que existe de mais sórdido no recente passado da nossa história, agridem o próprio Estado Democrático de Direito.


Este Comitê da Memória, Verdade e Justiça tem a História como fanal.