quarta-feira, 19 de setembro de 2018

MADURO SE BANQUETEIA ENQUANTO VENEZUELANOS PASSAM FOME

* Honório de Medeiros

Seja de direita ou esquerda, os tiranos são todos iguais.

Nada mais repugnante, ultimamente, que o banquete de Maduro, o ditador venezuelano, com direito a charutos individualizados enviados direto de Cuba e bebidas finas, na Turquia, enquanto seu povo, literalmente, passa muita fome.

Leia matéria e julgue você mesmo, em "El Pais": 
(https://brasil.elpais.com/brasil/2018/09/18/internacional/1537231749_772809.html)

Ou leia transcrição abaixo:

"Voltando de uma viagem à China e à Rússia, onde pediu um empréstimo para reativar a deprimida estatal petroleira PDVSA em meio à pior crise econômica já vivida na Venezuela, Nicolás Maduro fez uma parada em Istambul. O líder chavista visitou o restaurante do famoso chef turco Nusret Gökçe, conhecido como Salt Bae, que viralizou nas redes sociais por sua teatral maneira de cortar e depois salgar as carnes, como se estivesse jogando um feitiço na comida.

Os vídeos publicados nas contas do Instagram e Twitter dessa celebridade da Internet (@nusr_ett) mostram o mandatário e sua esposa, Cilia Flores, desfrutando de um corte de carne servido pelo próprio cozinheiro, e logo depois de charutos levados num umidificador personalizado com seu nome. O famoso chef também lhes entregou camisetas promocionais e, numa das gravações, Maduro faz um convite para que ele vá a Caracas.

“Queria agradecer o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, por sua visita”, escreveu o chef, que em sua rede internacional de restaurantes já recebeu celebridades como os jogadores David Beckham, Cristiano Ronaldo e Diego Armando Maradona, e também o cantor de reguetón J Balvin. Este último, aliás, insultou Maduro nos comentários da publicação, que foi apagada da conta do chef no Instagram. O vídeo se tornou trending topicmundial e gerou grande indignação nas redes sociais na Venezuela. A crise socioeconômica e a escassez fizeram os indicadores da fome se multiplicarem, segundo o último relatório da FAO (agência da ONU para a alimentação): entre 2015 e 2017, 3,7 milhões de venezuelanos sofreram de subnutrição, quatro vezes mais que no triênio de 2010-2012.

O próprio Maduro se referiu na noite de segunda-feira ao jantar em Istambul, no seu primeiro pronunciamento após pousar em Caracas. “Envio daqui uma saudação ao Nusret. Ele nos atendeu pessoalmente, ficamos conversando, nos divertindo com ele. Um homem muito simpático, ama a Venezuela", disse. O país sofre uma crônica escassez de alimentos, e especialmente de carne, que desapareceu dos estabelecimentos depois de uma nova tentativa governamental de impor controles aos preços como parte do pacote de medidas econômicas para resgatar a economia venezuelana."

domingo, 16 de setembro de 2018

TRISTE BRASIL

* Honório de Medeiros

Bem dizia Oswaldo Aranha em 1933: "O Brasil é um deserto de homens e ideias". 

Mais de homens que de ideias, acrescento eu.

Que tempos, estes!

Qual futuro pode ter um país cujo STF é presidido por um Toffoli, o Senado por um Eunício Oliveira, a Câmara por um Rodrigo Maia, e a Presidência por um Michel Temer?

Como um professo de Direito pode estimular seus melhores alunos a estudar quando um nulo, sem qualquer mérito, como Toffoli, chega à Presidência do STF?

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

CONVITE DE UM PAI ORGULHOSO

A imagem pode conter: texto

Local, dia e hora: Temis Clube Balcão Bar, Avenida Rodrigues Alves, 950 - Tirol, Sede do América Futebol Clube, 20 de setembro do corrente, a partir das 18 horas.

E o convite de Bárbara de Medeiros:

"LANÇAMENTO DO MEU TERCEIRO LIVRO

Gente, veio mais rápido do que a gente pensava, mas talvez não da forma que vocês esperavam, hahaha.

É com muito orgulho (e algumas lágrimas de incredulidade) que convido vocês ao lançamento do meu primeiro livro em colaboração - um livro de Direito, fruto de árduo trabalho com meus colegas do Núcleo de Pesquisas em Direito Internacional (NUPEDI).

Mesmo se você não é da área de Direito, esse livro pode ser importante pra você, por dois motivos:

1. Trata de temáticas atuais que permeiam o nosso dia-a-dia, se você está atualizado com as notícias do jornal. O meu artigo no livro, por exemplo, trata de refugiados e apátridas.

2. Você vai estar ajudando a desenvolver a pesquisa universitária no Brasil, que urgentemente precisa de patrocínio.

Espero vocês lá pra lhes dar um abração!"

terça-feira, 11 de setembro de 2018

PLATÃO E SUA ONIPRESENÇA


Honório de Medeiros

* Emails para honoriodemedeiros@gmail.com
* Respeitemos o direito autoral. Em conformidade com o artigo 22 dLEI Nº 9.610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998, que altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências, pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou.


Platão põe na boca de Codro, no Banquete: "Supondo acaso que Alcestes... ou Aquiles... ou o próprio Codro teriam buscado a morte - afim de salvar o reino para seus filhos - se não tivessem esperado conquistar a memória imortal de sua virtude, pelo qual, em verdade os recordamos?"

Recordo, então, de Ernst Becker, e seu A Negação da Morte.

Para Becker  o que há de fundamental no ser humano é o medo da morte.

Esse medo, que está em cada um de nós desde que construímos nossas primeiras noções acerca de nós mesmos e do que nos cerca, é o motor que nos impulsiona e a fonte de nossa permanente angústia.

Agimos, em consequência, para reprimi-lo, construindo "mentiras vitais" que nos permitam a ilusão de permanência histórica e explicam, assim, a conduta do homem.

Delas a mais importante é a ânsia por heroísmo, que em acontecendo, nos permitiria sobreviver na memória dos outros.

Creio, mas posso estar enganado, que Becker bebeu na fonte instigante que mina de Power: A New Social Analysis, de Sir Bertrand Russel, onde ele expõe a teoria de que os acontecimentos sociais somente são plenamente explicáveis a partir da ideia de Poder.

Não algum Poder específico, como o Econômico, ou o Militar, ou mesmo o Político, mas o Poder com “P” maiúsculo, do qual todas os tipos são decorrentes, irredutíveis entre si, mas de igual importância para compreender a Sociedade.

A causa da existência do Poder, para Russel, seria a ânsia infinita de glória, inerente a todos os seres humanos.

Se o homem não ansiasse por glória, não buscaria o Poder. Infinita posto que o desejo humano não conhece limites. Essa ânsia de glória dificulta a cooperação social, já que cada um de nós anseia por impor, aos outros, como ela deveria ocorrer e nos torna relutantes em admitir limitações ao nosso poder individual.

Como isso não é possível, surgem a instabilidade e a violência.

Mas não somente.

No Estadista Platão alude, em tradução direta do grego arcaico por Sir Karl Popper para A Sociedade Aberta e Seus Inimigos a uma "Idade de Ouro, a era de Cronos, uma era em que o próprio Cronos rege o mundo e em que os homens nascem da terra, (...) seguida pela nossa própria era, a de Zeus, um período em que o mundo é abandonado pelos deuses e só conta com seus próprios recursos, sendo, consequentemente, um tempo de acrescida corrupção."

É de se recordar toda a obra de Talkien, principalmente o Silmallirion e sua cronologia do surgimento das raças que povoaram a Terra Média até que os homens a assumissem em definitivo, na Quarta Era.

Teria a leitura de Platão influenciado a obra do erudito autor de O Senhor dos Anéis?

 Arte: filosofia.com.br

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

CARIRI CANGAÇO EM SÃO JOSÉ DE BELMONTE - PROGRAMAÇÃO

IMPERDÍVEL! Em um lugar mágico, no qual a literatura, o misticismo, o cangaço e o coronelismo marcaram encontro por intermédio dos seus estudiosos, o Cariri Cangaço, mais uma vez, expõe a alma sertaneja nordestina brasileira para seus admiradores pelo Brasil e o mundo, sob a batuta de seu Curador Manoel Severo Barbosa.


PROGRAMAÇÃO CARIRI CANGAÇO
SÃO JOSÉ DE BELMONTE 2018


QUINTA-FEIRA, 11 de Outubro de 2018

19h – Noite Solene de Abertura 
Castelo Armorial
São José de Belmonte

19h10min - Apresentação do Grupo de Bacamarteiros
Associação dos Bacamarteiros de São José de Belmonte

19h20min – Formação da Mesa de Autoridades
19h30min – Hino Nacional


19h30min – Apresentação do Cariri Cangaço
Por Conselheiro
HONÓRIO DE MEDEIROS 
Natal-RN

19h45min - Fala das Autoridades

20h20min - Entrega de Diplomas a homenageados
ROMONILSON MARIANO 
KAYSON DE OLIVEIRA PIRES 
ROBÉRIO CARVALHO BEZERRA
JACKSON CARVALHO 
VALDIR JOSÉ NOGUEIRA MOURA
Por Conselheiros e Pesquisadores 
JOÃO DE SOUSA LIMA
ELANE MARQUES
RODRIGO HONORATO
WILTON SILVA

20h40min - Comenda ao Mestre Ariano Suassuna
"Personalidade Eterna do Sertão"
MANUEL DANTAS SUASSUNA
Por Conselheiros
IVANILDO SILVEIRA 
JULIANA PEREIRA

20h45min - Comenda ao Castelo Armorial
"Equipamento Imprescindível à Memória e Cultura do Sertão" 
CLÉCIO NOVAES
Por Conselheiros
WESCLEY RODRIGUES
CRISTINA COUTO

20h50min - A Força e a Tradição de São José de Belmonte
VALDIR JOSÉ NOGUEIRA MOURA

21h20min - O Legado do Cariri Cangaço
MANOEL SEVERO BARBOSA

21h45min - Coquetel de Encerramento
Castelo Armorial

SEXTA-FEIRA
Dia 12 de Outubro de 2018

8h30min - Saída para Visita Técnica

9h - Fazenda Cristóvão de Ioiô Maroto
São José de Belmonte

9h30min - Descerramento da Placa Comemorativa do
Marco da Fazenda Cristóvão

10h – Conferência: “A Trama da Invasão de Belmonte e a 
Morte de Gonzaga em outubro de 1922"
VALDIR JOSÉ NOGUEIRA MOURA

12h - Almoço 

14h - Visita Guiada e Comentada:
Centro Histórico de Belmonte
Rua Cel. Luiz Gonzaga Gomes Ferraz
Rua Soldado Heleno
Antiga Casa do Coronel Gonzaga Ferraz
COMISSÃO ORGANIZADORA LOCAL

15h30min - Adro da Matriz de São José
CORTEJO DA CAVALHADA DE ZECA MIRON

16h20min -Estádio Carvalhão
Apresentação da Cavalhada de Zeca Miron 

NOITE

19h45min - Castelo Armorial
São José de Belmonte

Mestre de Cerimônia 
ROSSI MAGNE

20h - Comenda à Cavalhada Zeca Miron
MESTRE RÉGIS 
Por Conselheiro e Pesquisador:
KYDELMIR DANTAS
ROBÉRIO SANTOS

20h10min - Comenda à Associação de Bacamarteiros
ERNESTO SÁVIO CARVALHO
Por Conselheiro e Pesquisador:
EDVALDO FEITOSA
DANIEL WALKER

20h15min - Comenda ao IHGP-Instituto Histórico e Geográfico do Pajeú

AUGUSTO MARTINS
Por Conselheiro e Pesquisador:
GERALDO FERRAZ
HEITOR FEITOSA MACEDO

Noite de Conferências

20h30min -A Saga Carvalho e Pereira
HELVÉCIO NEVES FEITOSA 
DÊNIS CARVALHO
LUIZ FERRAZ FILHO

21h30min -Sinhô Pereira e Luis Padre
SOUSA NETO
JORGE REMÍGIO

Mesa:
MANOEL SEVERO
VALDIR JOSÉ NOGUEIRA

SÁBADO
Dia 13 de Outubro de 2018

8h30min - Saída para Visita Técnica

9h30min - "Casa de Pedra" - Serra do Catolé
São José de Belmonte

10h30min - Conferência:“O Fogo de 1924 e Ferimento no Pé de Lampião pela Volante de Teophanes Ferraz"
CLÊNIO NOVAES

11h - Visita ao Sítio Histórico da "Pedra do Reino"
Entrada do Rei e da Rainha da Cavalgada 2018, 
sob salva de tiros dos Bacamarteiros e Cruzamento de Lanças.

11h20min - Conferência: "A Espetacular Ilumiara Pedra do Reino"
MANUEL DANTAS SUASSUNA

12h - Conferência: “No Reino Encantado da Pedra do Reino"
ERNANDO ALVES DE CARVALHO

13h - Almoço

13h30min - Homenagem e Diploma ao "Tempero do Reino"
Por Conselheira e Pesquisadora:
LILI CONCEIÇÃO
RÚBIA LÓSSIO

NOITE

19h45min - Castelo Armorial
São José de Belmonte 

19h30min - Apresentação
RITA PINHEIRO
A Garimpeira da Cultura

20h15min – Entrega de Diplomas a Homenageados
CARLOS SANTOS 
ELIANE GIOLO 
JORGE FIGUEIREDO
CÍCERO AGUIAR
LUCIANO COSTA
Por Conselheiros e Pesquisadores:
MANOEL SERAFIM
PROFESSOR PEREIRA
LUIZ RUBEN BONFIM
CARLOS ALBERTO SILVA

Noite de Conferências

20h30min -A Pedra do Reino na Literatura Nacional e Internacional
DÉBORA CAVALCANTES DE MOURA

21h10min -Vídeo e Debate
"Mentiras e Mistérios de Angico"
ADERBAL NOGUEIRA
Laser Vídeo
Mesa:
JOÃO DE SOUSA LIMA
JULIANA PEREIRA
NARCISO DIAS

DOMINGO

Dia 14 de Outubro de 2018

9h - Visita Guiada ao Castelo Armorial

10h - Confraternização de Encerramento
Forró Pé de Serra


Realização
INSTITUTO CARIRI DO BRASIL
Co-realização
CASTELO ARMORIAL
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DE BELMONTE

Apoio
IHGP - INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO PAJEÚ
ICC - INSTITUTO CULTURAL DO CARIRI
SBEC- SOCIEDADE BRASILEIRA DE ESTUDOS DO CANGAÇO
GECC - GRUPO DE ESTUDOS DO CANGAÇO DO CEARÁ
GPEC-GRUPO PARAIBANO DE ESTUDOS DO CANGAÇO
LASER VÍDEO

Mídia e Redes Sociais
GRUPO LAMPIÃO CANGAÇO E NORDESTE
GRUPO OFICIO DAS ESPINGARDAS
COMUNIDADE O CANGAÇO
GRUPO HISTORIOGRAFIA DO CANGAÇO
O CANGAÇO NA LITERATURA
GRUPO SERTÃO NORDESTINO
PROGRAMA RAÍZES DO SERTÃO
ODISSÉIA DO CANGAÇO

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

CANGAÇO , CORONELISMO E FANATISMO SÃO MANIFESTAÇÕES DO PODER

Massilon: ele estava no ataque a Apodi e Mossoró em 1927

Honório de Medeiros
* Emails para honoriodemedeiros@gmail.com
* Respeitemos o direito autoral. Em conformidade com o artigo 22 dLEI Nº 9.610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998, que altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências, pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou.

O coronelismo e o cangaço, assim como o fanatismo (misticismo) tão característicos de certo período histórico do Sertão nordestino brasileiro, são manifestações do fenômeno do Poder, de como ele é obtido, se instaura  e é mantido em qualquer circunstância.

A forma como o Poder se instaura diz respeito a fatores circunstanciais, mas o conteúdo permanece o mesmo desde que o Homem surgiu na face da terra.

Exemplos que comprovam essa afirmação são quaisquer processos políticos que aconteceram ao longo da história, tais quais os descritos em farta literatura acerca de Atenas, Roma, a Inglaterra vitoriana, ou qualquer outro que seja.

A forma se modifica ao longo do tempo em decorrência do avanço tecnológico, por exemplo. Se antes o Homem combatia com arcos e flechas, hoje usa mísseis teleguiados.

Assim, o coronelismo, o cangaço e o fanatismo são "cases" do fenômeno do Poder próprios de uma determinada circunstância histórica. São semelhantes, em sua estrutura, ao feudalismo europeu e japonês.

As narrativas acerca do coronelismo, cangaço, e fanatismo devem ser estudadas levando-se em consideração o fator de "ocultamento" que é próprio da lógica de atuação dos que detêm o Poder.

Nesse sentido, escrever, omitir, manipular, direcionar os textos, tudo isso e mais, cumprem o papel de impor a lógica dos que podem impor sua percepção das coisas e dos fenômenos.

No Rio Grande do Norte, por exemplo, é difusa, porém persistente, a concepção de que os coronéis da política eram homens afastados da lide com o cangaço, bem como é persistente a concepção de que o cangaço, excetuando a invasão de Mossoró por Lampião, pouca relevância teve no Rio Grande do Norte.

São "esquecidos" José Brilhante, o Cabé; Jesuíno Brilhante; a invasão de Apodi por Massilon; a invasão de Mossoró por Lampião e Massilon; e a morte de Chico Pereira.

Não se estuda, como deveria ser estudado, a invasão de Apodi por Massilon e sua relação com a invasão de Mossoró por Lampião pouco mais de um mês depois. Bem como não se estuda a participação do coronelato da Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte no evento.

E perdemos todos pois, na verdade, em essência, o que se deve estudar quando analisamos fatos históricos como esses, é o fenômeno do Poder, tão onipresente quanto a existência do Homem na face da terra.

quinta-feira, 6 de setembro de 2018

MARXISMO E DARWINISMO



* Honório de Medeiros

O marxismo pretende explicar quase tudo e explica quase nada; o darwinismo pretende explicar quase nada e explica quase tudo.

Arte em cincocentros.com

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

FILOSOFIA



* Honório de Medeiros

Quando leio alguns argumentos esgrimidos por certos pensadores que pontificam em nossa imensa aldeia global, me lembro de Camus em "O Homem Revoltado": "A filosofia pode servir para tudo, até mesmo para transformar assassinos em juízes".

Arte: filosofia.com.br

sexta-feira, 24 de agosto de 2018

A CRÍTICA É O PRESSUPOSTO DO CONHECIMENTO



* Honório de Medeiros

Um dos maiores, senão o maior, mal do qual padece a Educação, é a crença – o termo correto é esse – no aprendizado por informação.

Por essa crença nosso cérebro seria como um recipiente vazio que deve ser preenchido com informações que nos forem fornecidas.

Popper denominou essa crença de “Teoria do Balde Vazio”, e ela depende, fundamentalmente, da suposição de que conhecemos por que observamos, o que nos conduz a um empirismo ingênuo, no qual a observação do que somos e do que nos cerca é possível graças ao raciocínio indutivo.

Este não é o espaço apropriado para analises acerca dessas teorias. Convém lembrar, de forma parafraseada, entretanto, um “blague” que Popper, em tom irônico, apresentou em uma de suas obras dedicadas à Teoria do Conhecimento: se solicitarmos a algumas pessoas que durante certo tempo cronometrado apenas observem, e, em seguida, nos digam o que aprenderam com essa observação, provavelmente todas elas indagarão: “em relação ao quê?”

Pois parece óbvio que somente é possível o conhecimento de algo a partir de um conhecimento pré-existente, o que situa a observação no seu devido lugar, qual seja o de comprovar, ou negar, nossas hipóteses teóricas.

Não por outra razão a informação (conhecimento) que não é precedida de um conhecimento criticado, que nos permita compreender aquilo acerca do qual que se está sendo informado, resulta em nada.

E, também, não por outra razão, lê-se sem que se compreenda, participa-se dos fatos enquanto manipulados, fala-se e escreve-se o que não tem sentido, concretizando a imagem fiel da alienação intelectual que descreve tão bem o mundo em que vivemos.

Para que se estabeleça o processo de aquisição do conhecimento é preciso que algo deflagre, em nós, a angústia criativa de sobreviver a uma realidade que não mais é apreendida como o era até então. Ocorre em situações críticas, deliberadamente, como ocorre independentes de nossa vontade. O senso comum diz isso de forma brilhante: “a necessidade é a mãe da invenção”.

Podemos, claro, gerar esse processo de conhecimento. Se formos estimulados a criticar (no sentido de buscar falhas, contradições, desarmonias) na informação que nos é fornecida, com certeza avançaremos. A crítica, portanto, é o pressuposto do conhecimento consciente. Não por outra razão Bachelard, o poeta/filósofo, afirmou: “O conhecimento é sempre a reforma de uma ilusão”.

E não por outra razão o pensador dinamarquês Soren Kiekergaard nos impelia a “duvidar de tudo”.

Muito mais recentemente Karl Popper propôs que o conhecimento novo – não apenas a filosofia – começasse sempre por problemas. Esses problemas surgiriam do contraste entre o conhecimento antigo, a expectativa de que regularidades, padrões, se mantivessem, inclusive em relação a nós mesmos, e a fragmentação dessas expectativas.

Ao nos depararmos com algo que esse conhecimento antigo não explicasse, haveria uma fragmentação nas nossas expectativas e surgiria, então, o problema a ser solucionado.

Observe-se que tal teoria pressupõe a existência do conhecimento inato adquirido geneticamente, no que é referendada pela teoria da seleção natural de Darwin.

A técnica mais banal para o exercício da crítica é o uso do contra-argumento (contraexemplo). Uma vez tendo recebido alguma informação, submetamo-la à crítica argumentando contra, na medida de nossas possibilidades. Ou seja, "dialetizemos" (no sentido de Bachelard e sua "Filosofia do Não") a informação.

Se a informação sobreviver à crítica, teremos avançado.

Nada teremos a perder, muito teremos a ganhar em utilizando tal técnica. Outra técnica simples é indagar, dialogar com a informação. Para tanto cabe usar o que nos ensina a técnica jornalística, indagando a nós mesmos e também respondendo: Quem? Quando? Como? Onde? O quê? Por quê?

Uma vez que o espírito da crítica pedagógica, a vigilância epistemológica que pode conduzir à ruptura epistemológica, à “reforma das ilusões”, se estabeleça como “Paidéia”, padrão cultural, ideal civilizatório, o avanço será inexorável.

Para que se tenha ideia de como não evoluímos ao longo desses anos, em discurso na solenidade de formatura de todas as turmas concluintes do ano de 1982, representando os alunos, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, tive a oportunidade de dizer:

“Como entender, por exemplo, que no âmbito da Universidade, onde o sonho e a crítica deveriam caminhar de mãos dadas, permeando a efígie do futuro de esperança e conhecimento, nada mais se encontre do que o imediatismo, o pragmatismo solerte e a mera repetição anacrônica de informações? Como aceitar a inacreditável relação professor-aluno, completamente abstraída da consciência do saber, que conjuntamente com a preocupação de suscitar dialéticas, referendar críticas e debates livres, numa ontologia da ideia ensinada e na aplicação do racionalismo docente, constitui a preocupação básica de Gaston Bachelard, exposta em sua obra “Racionalismo Aplicado”, onde nos lembra: “De fato, numa educação de racionalismo aplicado, de racionalismo em ação de cultura, o mestre apresenta-se como negador de aparências, como freio a convicções rápidas. Ele deve tornar mediato o que a percepção proporciona imediatamente. De modo geral, ele deve entrosar o aluno na luta das ideias e dos fatos, fazendo-o observar bem a inadequação primitiva de ideia com o fato”.

Se na observação do problema limitamo-nos ao componente psicológico da relação professor-aluno, necessário se faz observar os próprios problemas estruturais em torno dos quais gravitam os específicos. Precisamos ir ao encontro do espírito mais geral que preside os fatos e as idéias no âmbito da Universidade. Fundamental é retornar à consciência crítica e política no sentido socrático-aristotélico, que é seu pressuposto maior. Fundamental é acreditar que quimera e contestação, a discussão, a livre manifestação de idéias - alicerce do conhecimento - caminham ou caminharão nos corredores da Universidade.”

Portanto precisamos ensinar a criticar, para que seja possível conhecer, afastando, de vez, essa perspectiva ideologicamente equivocada e intelectualmente ultrapassada de informar para formar.

* Arte em blog.ori.net.com

sábado, 18 de agosto de 2018

A ÁRVORE DO CONHECIMENTO



* Honório de Medeiros

O conhecimento pode ser imaginado como uma árvore cujo tronco repouse no chão ancestral onde o homem pré-histórico caçava, coletava e, graças à primitiva linguagem, bem como à incipiente capacidade cooperativa, se tornou uma espécie apta a sobreviver. Não é uma imagem precisa, tampouco absolutamente correta, mas cumpre seu propósito de ser assimilada.

Os problemas com os quais aqueles nossos antepassados se depararam e as soluções engendradas para ultrapassá-los formaram galhos, ramos, folhas, em ritmo cada vez maior e mais denso, em uma escala inimaginável. Cada folha, como se há de perceber, avança rumo ao infinito desconhecido por um rumo que sugere uma proporcionalidade inversa: quanto mais específico o conhecimento por ela simbolizada, mais ampla e profunda a vastidão a lhe servir de contraponto.

Se focarmos essa imagem em busca de nitidez podemos acompanhar, como parâmetro, o desenvolvimento da Matemática, desde os primitivos números naturais até o cálculo, hoje, de tensores hiperespaciais, essas projeções hipotético/geométricas interdimensionais. Podemos acompanhar, também, a evolução da linguagem como lembrada acima até a Babel dos tempos modernos, constituída de signos bem diferenciados – desde os sinais utilizados pelos surdos-mudos, passando pelo informatiquês e o idioma dos guetos, presídios, e subúrbios, até a lógica apofântica do sub-universo computacional.

Aliás, o mundo da informática é muito exemplificativo dessa teoria da árvore do conhecimento. No início, meados do século XX, um computador ocupava salas; hoje, os “chips” guardam quantidades colossais de informações. Que revolução não há de ser o surgimento do “chip” quântico!

A imagem da árvore do conhecimento é possível graças à Teoria da Evolução de Darwin. É, digamos, um corolário. Podemos perceber que o Conhecimento diferencia-se e se especializa na medida em que avança. Sabemos, hoje, quase tudo acerca de quase nada em cada “nicho” do conhecimento, embora tudo quanto descartado por não ter sobrevivido ao choque entre ideias forme uma contrapartida em negativo da realidade. Contrapartida que agrega: aquilo que descartamos não precisa ser outra vez cogitado.

Essa árvore é finita e limitada (conceitos distintos) no espaço e tempo conhecidos, mas infinita e ilimitada quanto as suas possibilidades de crescimento. O futuro, para onde ela avança, é construção do passado, e como cada estrada amplia a quantidade de lugares onde se há de chegar, cada problema resolvido no processo de aquisição do conhecimento implica na ampliação de universos de saber.

Ou seja, o tempo, cada vez mais, dá razão a Darwin. E não há limite para o Conhecimento.

Funciona dessa forma em termos macros, mas também funciona dessa forma em termos pessoais. Cada avanço nosso implica em ampliar o universo daquilo que não conhecemos. É um paradoxo: quanto mais sabemos, mais há a saber.

É, por fim, o voo do solitário para o infinito: “É como se cada um de nós, estando dentro de um ambiente fechado, uma clausura, criasse uma saída e a utilizasse. Lá, do outro lado da saída, lhe espera um outro ambiente, também fechado, só que maior, bem maior. Sua tarefa, assim, é sempre criar outra saída, sair, entrar em outro ambiente ainda maior, criar outra saída, sempre, em uma escala exponencial...”

Em termos pedagógicos, diria Bachelard: "todo conhecimento é sempre a reforma de uma ilusão."

terça-feira, 14 de agosto de 2018

DE SER OU NÃO SER ALIENADO

* Honório de Medeiros


"A verdade é filha da discussão, e não da simpatia" (Gaston Bachelard, "A Filosofia do Não").


Ausentar-se de si mesmo e viver a realidade do(s) outro(s), não a realidade das coisas ou dos fatos, posto que as coisas e os fatos são extensões nossas ou dos outros, são projeções de como os percebemos, na justa medida em que no limite último de cada coisa ou fato observado está uma ideia ordenadora, organizadora da realidade, e as ideias governam toda a realidade.

"No princípio era o Verbo" (João, 1). Tal ausência de si denominamos alienação.

Se de mim me ausento não percebo o Outro, apenas nossas sombras a se moverem na parede de uma caverna onde estamos prisioneiros, como na célebre alegoria de Platão em "A República".

Tudo, então, é aparência.

Não por outra razão o "conhece-te a ti mesmo", de Sócrates. E conhecermo-nos a nós mesmo implica em dizer não à aparência, a duvidar daquela nossa sombra na caverna. Somente somos livres quando ousamos dizer não ao que nos aprisiona, nos acorrenta, nos impede de perceber a realidade como de fato ela é.

Ser ou não ser alienado, na verdade, é Conhecer ou não Conhecer, eis a questão, eis o caminho.

Tal qual nos acicata Bachelard: "o conhecimento é sempre a reforma de uma ilusão".

quinta-feira, 2 de agosto de 2018

O TEMPO PASSADO E O TEMPO PRESENTE (MISSÃO VELHA)


* Honório de Medeiros

A memória do Coronel Isaías Arruda insiste em vencer o tempo e a apatia geral do nordestino com sua história, e aos poucos o transforma em mito na cidade que tomou pelas armas e onde exerceu seu poder de senhor feudal até que a morte viesse buscá-lo da mesma forma como viveu: violentamente.

Continuei relatando para Antônio Gomes o resultado da viagem ao Cariri.

“Estamos em Missão Velha”, disse-lhe. “Enquanto vagávamos no entorno da pequena praça principal fomos abordados e depois apadrinhados por Esly Almeida Melo, da velha aristocracia rural caririense e sua tradicional atenção sertaneja".

"Seu Esly, aposentado, filhos criados e no mundo, descia ou subia em busca da Matriz – depende do referencial – a pé, limpo, perfumado, barba feita, cabelos bem penteados acomodados na brilhantina, bem vestido, ‘puxar um terço’."

"Simpático, conversador, piadista, tornou-se nosso cicerone, historiador informal e foi o maior responsável pela obtenção, quase milagrosa, através das mãos da professora e escritora Célia Magalhães, de uma fotografia dos anos 20 onde o Coronel Isaías Arruda, ao lado de vários outros, todos de paletó claro, diferencia-se pela altura, a trigueirice e o porte altivo."

"Ali estava aquele que foi, juntamente com Massilon Leite, o responsável pela invasão de Mossoró por Lampião".

"Célia Magalhães é bem jovem, foi Secretária de Educação de Missão Velha e escreveu acerca dos ex-prefeitos da cidade. Ela e seu Esly nos levam até a senhorial residência de Luís Jucá Arraes Maia, primo do ex-governador de Pernambuco, já falecido, Miguel Arraes."

"Luis Maia é considerado o “intelectual” de Missão Velha. Já quase não fala e anda, vítima de uma trombose."

"Mostra-nos sua coleção de selos e moedas antigas avaliada, por baixo, em mais de seiscentos mil reais. Já foi procurado por colecionadores do mundo inteiro". 

"Enquanto ele se comunica precariamente com o Professor Pereira, que nos acompanha desde Cajazeiras, tento invadir com meu olhar curioso os segredos daquela casa mais que centenária, cercada por construções muito antigas – sobrados geminados com janelas avarandadas que se abrem afastando-se cada banda para um lado, e separadas da rua por uma grade de proteção de ferro batido ornamentada com flores-de-lis estilizadas."

"Nada consigo. O sertanejo abre todas as portas de sua casa aos estranhos bem recomendados, mas conservam fechadas, a sete chaves, as portas de sua intimidade."

"Mesmo assim posso compreender até fisicamente a dor da castelã quando me fala que há mais de quarenta anos está desterrada ali, em Missão Velha, longe de Fortaleza, da família, dos filhos que se foram, do bulício da cidade grande, do mar, de tudo quanto ama, pois há o dever de ir, até o fim, no compromisso que assumiu ao pé do altar."

"‘A pior fase’, disse-me ela, ‘foram os três anos que passei enterrada no sítio.’"

"Como não compreender essa sensação que acomete aqueles condenados ao ritmo lento da cidade pequena – cinza vida cinza – que anseiam vivamente pela febril velocidade da cidade grande?"

"O verde do Cariri, um verde que se destaca pelo imenso contraste com o semi-árido dos carrascais, poeira, sol-a-pino, grotões que havíamos deixado um pouco antes..."

"A mansão feudal de Isaías Arruda, lá passamos, na qual há, inclusive, sala-de-armas e passagem subterrânea. A estação de trem, palco de tantos episódios históricos, similar a de Aurora, onde o Coronel Isaías tombou ferido de morte após levar, estranhamente sem reagir, embora estivesse armado, vários tiros desfechados por inimigos políticos seus."

"O prédio da Prefeitura por ele construída. A misteriosa história acontecida na casa onde hoje funciona a Secretaria de Educação. Os escombros de um passado já longínquo, mas presente, ainda recendendo a pólvora, sangue, baraço e cutelo da aristocracia rural sertaneja firmada em um ancestral código de honra. Os ‘cabras’, os jagunços, os cangaceiros. A Igreja legitimadora e terrena, também profana, com seus representantes abençoadores de bastardos e assassinos, semeadores de filhos e ilusões, testemunha engajada da vilania com a qual o povo, deserdado de clima, de poder, de bondade, carrega consigo, como última esperança, o paraíso que lhe foi prometido e do qual não se sabe se realmente lhe vai ser entregue.”

"O tempo passado e o tempo presente, confundidos na imagem que Missão Velha nos deixa na memória, quando lhe damos nosso adeus, e vamos em busca de outros fragmentos da história do Cariri, dos nordestinos sertanejos, dos homens, enfim".

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

LÓGICA INFANTIL

Bárbara

* Honório de Medeiros

Guardei várias histórias de Bárbara, minha filha, quando ela era criança. Uma delas, de quando tinha cinco anos, segue abaixo 

A mãe passa em frente à Escola Doméstica, em Natal, e Bárbara diz:

- Mamãe, me mostre a Escola Doméstica que eu quero ver um gatinho.

- Um gatinho?

- É mamãe, o gato não é um animal doméstico?

- Não é isso, minha filha. Esse doméstico aí não tem nada a ver com bicho. Animal doméstico quer dizer que pode ser criado dentro de casa, como o cachorro e o gato.

- Certo.

- Quando entraram no elevador, em casa, Bárbara se virou e comentou com a mãe:

- Mamãe, então eu sou um animal doméstico!

- Como assim, minha filha?

- É, mamãe. Eu não sou criada em casa? Então eu sou um animal doméstico. Tem gente que é criada na rua...

terça-feira, 31 de julho de 2018

O TEMPO, ESSE DESTRUIDOR DE LEMBRANÇAS

* Honório de Medeiros

Para Seu Chico Honório, onde ele estiver.


O tempo, esse destruidor de lembranças, nem sempre consegue êxito quando é confrontado com os vestígios físicos com os quais se confunde a imagem de alguém muito amado. É isso que concluo enquanto passo em frente à Igreja de São Vicente e dobro à direita, vindo pela Alberto Maranhão, do centro de Mossoró, cumprindo o percurso tantas vezes trilhado em minhas vindas de Natal para visitar Seu Chico Honório e Dona Aldeiza, como são conhecidos meus pais na cidade onde nasci. 

Assim o é porque nada me evoca com tanta firmeza a lembrança do meu pai quanto essa capela, destinada a ser um bastião fundamental na defesa da cidade ante o ataque de Lampião no longínquo ano de 1927, na qual ele, durante tantos anos, exerceu com a lhaneza no trato e a humildade no coração que o caracterizavam, o ofício de Ministro da Eucaristia.

Nossa história, a história de minha família com essa Capela é antiga e densa. Minhas lembranças de menino são permeadas de acontecimentos nos quais a Igreja, seu patamar onde nós, as crianças dos arredores, nos reuníamos, durante o dia ou à noite, para todos os tipos de brincadeiras possíveis e imagináveis em uma cidade cujos delinquentes eram todos conhecidos pessoais do Delegado e da população; seu interior, onde, à luz mortiça das velas, entoávamos as ladainhas cantadas na festa de Santo Antônio e aspergíamos os presentes com o incenso farto derramado dos turíbulos; as festas religiosas, as missas, tudo isso era o ponto central, o começo e o fim, o alfa e o ômega da nossa vida ainda fortemente delineada a partir dos laços invisíveis das relações familiares por ela albergados. 

Meu pai nos acordava cedo, a mim e a minha irmã, aos domingos, para nos aprontarmos e seguirmos para a missa na capela, que ele acolitava, juntamente com outros fiéis. Minha mãe, por sua vez, uma das responsáveis pelo coro, também compunha o grupo de moradores do entorno da Igreja que a faziam funcionar com a regularidade própria da face terrena dessa instituição milenar, a Igreja, sem a qual não é possível entendermos nossa civilização ocidental e cristã.

Durante a semana, noite após noite, reuníamos-nos sob sua inspiração para rezar quando o dia chegava ao fim e o sono nos aguardava, e, então, agradecíamos a Deus por tudo de bom que havíamos conseguido no tempo passado, desde a alimentação farta à saúde em ordem, seguido das intercessões para a obtenção de graças, mesmo que somente a manutenção da rotina feliz em que vivíamos.

Seja durante a semana, seja nos domingos, seja em que dia fosse, ainda hoje, a presença de meu pai, manso, discreto, polido, humilde, prestativo, com sua fé simples, inquebrantável, onipresente, foi e é uma referência moral da qual não me afastei, nem me afasto, e que norteia os exemplos e as conversas com os quais cuidei, e cuido, com as limitações próprias, da educação dos meus filhos. No meu casamento, um casamento feliz em todos os aspectos, o exemplo de sua relação com minha mãe, o respeito mútuo, o carinho permanente, a parceria sempre reiterada quando surgiam os obstáculos que a vida insistia em nos apresentar, estava sempre presente.

Conto para meus filhos, sempre que posso e a ocasião é oportuna, o pouco que sei de meu pai. Falo para eles de sua vida dura, no início; estranha, sob muitos aspectos; de renúncia, sempre, inclusive a uma parte de si, sua arte, o repente, a viola. Conto-lhes acerca de sua jornada espiritual, de sua crença ingênua no começo de sua vida adulta. Depois lhes recordo os anos de entrega à Igreja Católica, aos seus fundamentos, aos seus princípios, a tudo quanto, ao longo dos séculos, a manteve presente na história do Homem.

E quando, ao ir para Mossoró, entro na cidade, desço até o centro, pego a Alberto Maranhão, e passo em frente à Igreja de São Vicente, ao me lembrar dele, e de Dona Aldeiza, parece que os vejo: ele ao lado de Padre Sátiro Dantas, atento, enquanto este oficia; ela, nos primeiros bancos, defronte ao altar, no qual se postava o coro.

Então o passado se confunde com o presente e a Igreja de Deus, a Igreja de São Vicente, tão presente na nossa história pessoal, ajuda-me a vencer o tempo, pois resgata, com sua presença ante meus olhos, minha vida de menino e adolescente, e a imagem sempre tão cara de Seu Chico Honório e Dona Aldeiza em minha memória.

AS MULHERES SERRANAS


As serras

* Honório de Medeiros

Ah, as mulheres da Serra, frescas, em flor, sem nada que as enfeite exceto a simplicidade. Elas vestidas de simplicidade. “Uma carne sadia, abundante e rosada”, como descreve Proust, em “No Caminho de Swann”. Nada artificial, nelas. Não há um jogo sequer nas suas atitudes para com os homens. Ou com as mulheres. Beber, comer, amar, é tudo tão natural! Swann “prefiria infinitamente à beleza de Odette aquela de uma pequena operária fresca e rechonchuda como uma rosa, de quem se enamorara...” Em contraposição eis o universo urbano recheado de mulheres excessivamente enfeitadas, com a mente tomada por negaceios e dissimulações, no afã infindável de seduzir: o óculos de sol, a roupa de grife, o olhar tecnicamente distante, o celular através do qual são armados os lances do jogo. Por quem, no final, Vaumont se apaixona em “As Relações Perigosas”, de Chorderlos de Laclos, senão pela viúva Merteuil, por sua inteireza de sentimentos e ações, distante de qualquer dissimulação, a pureza da mulher que ele julgara tão fácil seduzir e descartar?

sábado, 28 de julho de 2018

CHILDERICO FERNANDES, O "GUERREIRO DO YACO"




 * Honório de Medeiros 

Em dias do ano de 1880 Childerico José Fernandes Queiróz Filho, nascido em Pau dos Ferros, Alto Oeste do Rio Grande do Norte, o segundo do seu nome, quiçá alavancado pelas histórias e estórias que vinham da Amazônia longínqua, das quais eram protagonistas homens do Sertão da Serra das Almas e arredores, contadas nas feiras e na lide com o gado e a lavoura durante o dia, e à noite, nos alpendres das casas, à luz das lamparinas, de riquezas imensas construídas de um dia para o outro na colheita do látex, ou mesmo pelo desejo de tomar distância de um futuro sem perspectivas para um órfão de pai e mãe cuja herança tinha muitos donos, montou num cavalo e arribou no mundo, no rumo da distante Belém do Pará. 

E assim se passaram quase sessenta anos até que seus ossos cansados pousassem de vez na mítica Casa-Grande da fazenda “João Gomes”, que pertencera a seu pai e ascendentes, adquirida comprando as partes de seus irmãos e herdeiros, famosa por tantas e tantas histórias, dentre outras a dos nove ou onze filhos e filhas concebidos pelo Padre Bernardino José de Queiróz e Sá e criados em seus sótãos, porão, quintais e oitões, uma das quais viria a ser sua madrasta, posto que herdeira única de toda aquela imensidão rural, por ter sido adotada pelo renomado Major Ephiphanio, o único irmão do sátiro de batina. 

Mas seu pouso duraria pouco. Childerico II trouxera consigo, da Amazônia, uma moléstia mortal que o conduziria ao descanso eterno em um lugar jamais antes por ele visitado, o Rio de Janeiro. 

Em 26 de março de 1939 o “Guerreiro do Yaco”, como o denominou Calazans Fernandes, autor de uma trilogia que por intermédio desse singular personagem, conta a história do Sertão do Alto Oeste do Rio Grande do Norte, o Sertão da “Serra das Almas” e arredores, desde sua origem até meados do século XX, finalmente foi acertar suas contas com o Criador, de quem ele, ferrenhamente, ateu convicto, negava a existência. 

Nos quase sessenta anos de vida na Amazônia Childerico II se transformou em uma lenda que sobrevive esmaecida em livros, documentos e relatos de muito poucos. Nada que possa dar a verdadeira dimensão de sua história, pelo que se infere. Somente aqui e ali encontramos o rastro forte dos seus passos e o eco de sua voz autoritária, a traçar contornos pouco nítidos de um homem que viveu muitas vidas em apenas uma existência. 

A história da construção de sua imensa riqueza, nos primeiros anos de saga amazônica, quando comprou um seringal denominado “Oriente”, fronteira com a Bolívia, maior que o Estado do Sergipe, depois de passar onze anos desaparecido na floresta, rio Yaco acima e adentro, onde homem algum, exceto índios ferozes, ousavam viver, bem como sua volta triunfal, conduzindo barcos e mais barcos repletos de látex, para serem vendidos a peso de ouro, nos portos de Manaus, por si só valem um livro. E que livro! 

Assim como valem um livro as batalhas que enfrentou: a luta pelo Acre com Plácido de Castro; a tomada pela força das armas de Sena Madureira, enquanto líder do Movimento Autonomista do Alto Purus; a luta armada por Bragança, da qual foi prefeito várias vezes, e Belém, no Pará, esta com Lauro Sodré; a luta ao lado do Governador Eurico de Freitas Vale, durante a Revolução de 30, quando compareceu para combater com trezentos homens por ele armados e municiados! 

Está lá, no Dicionário das Batalhas Brasileiras[1], de Hernâni Donato: “8.6.1912 – SENA MADUREIRA. AC. Movimento autonomista do Alto Purus. A 7.5[2], em protesto contra o então Prefeito regional e o alegado descaso do Governo Federal, autonomistas declararam instalado o Estado Livre do Acre, embrião do futuro Acreânia. Chefes, os “coronéis” Childerico Fernandes, José de Alencar Matos, Raimundo Freire. Armaram 350 homens para enfrentar forças a serem enviadas contra o novo Estado. A 8.6[3] estas se apresentaram federais e estaduais. E venceram, dispersando os autonomistas, depois de seis horas de combate, dez mortos entre os levantados, incêndios, assassinatos vingativos.” 

No inédito segundo volume – “Chamas do Passado” - da trilogia de Calazans Fernandes, a espinha dorsal, o fio-condutor da história continua sendo Childerico II. 

Sua saga perpassa cada capítulo, enquanto pano-de-fundo, permitindo-nos perceber a dimensão de homens como ele, heroicos, verdadeiros titãs, cuja fôrma está desaparecida. 

Homens que construíam o próprio destino na marra, como se diz no Sertão. Homens de feitos e glória. Homens que levaram “uma vida de conquistador bandeirante, de homem antigo, aventureiro das matas e da indiaria, reconstruindo com obstinação impassível o que a tempestade derrubava. Dessa fibra teimosa se teceram os ombros que empurraram o meridiano para o Oeste”, para citar Cascudo, parente distante pelos Fernandes Pimenta, que lhe escreveu um longo panegírico, ao saber de sua morte. 

No “Guerreiro do Yaco” nos damos conta de como são profundas as relações dos que nasceram no entorno da “Serra das Almas” com os cristãos-novos, os judeus que povoaram nossos sertões desde que por aqui aportou Pedro Álvares Cabral. Mas não somente. Também nos damos conta da presença de personagens significativos da nossa história potiguar a assuntar o ouro da “Serra das Almas”. 

Que dizer das armaduras e armas lá encontradas, no Serrote do “Cabelo, Cabelo-Não-Tem” ao lado de bruacas de couro cru cheias de pepitas de ouro? E quanto aos descendentes dos sobreviventes dos oito naufrágios nas costas do Rio Grande do Norte que subiram os rios Sertão acima, até o Alto-Oeste? 

São muitas histórias – e estórias também, imbrincadas entre si pelo talento de Calazans Fernandes, todas tendo como espinha dorsal a vida de Childerico II, a esperar que a Fundação José Augusto, muito apropriadamente, as resgate do limbo através da fabulosa Coleção Cultura Potiguar, impedindo assim que o pó do tempo sepulte, de vez, o conhecimento, pelos homens e mulheres de hoje, dos feitos e parte da vida dos nossos ancestrais. 

[1] IBRASA – Instituição Brasileira de Difusão Cultural Ltda. / Dos Conflitos com Indígenas aos Choques da Reforma Agrária (1996) / Premio Joaquim Nabuco 1988 (Academia Brasileira de Letras) /2ª edição, 1996.

[2] 7 de maio. 

[3] 8 de junho.