terça-feira, 4 de junho de 2013

PROUST: UM EXERCÍCIO DE ESTILO (SWAMM E AS MULHERES)


 
Marcel Proust
“Em Busca do Tempo Perdido”
Volume 1
“No Caminho de Swann”
Tradução de Mário Quintana; Editora Globo; 3ª edição; 6ª reimpressão; p. 243.
 
                               “Não era desses que, por preguiça ou resignado sentimento da obrigação que lhes impõe o fastígio social de se amarrarem a determinada margem, evitam os prazeres que lhes oferece a realidade fora da posição mundana onde vivem acantonados até a morte, acabando por chamar de prazeres, na falta de coisa melhor e por força do hábito, às medíocres diversões e aborrecimentos suportáveis que sua existência encerra. Swann, esse, não procurava achar bonitas as mulheres com quem passava o tempo, mas sim passar o tempo com as mulheres que primeiro achara bonitas. E muitas vezes eram mulheres de beleza bastante vulgar, pois as qualidades físicas que buscava sem se dar conta estavam em completa oposição com aquelas que lhe tornavam admiráveis as mulheres esculpidas ou pintadas por seus mestres prediletos. A profundeza, a melancolia da expressão, gelavam-lhe os sentidos, que despertavam, ao contrário, ante uma carne sadia, abundante e rosada.
                   Quando encontrava em viagem uma família com a qual seria elegante não travar relações, mas em que descobriria certa mulher com um encanto que ainda lhe era desconhecido, ‘guardar a linha’ e enganar o desejo que ela lhe despertara, substituir o prazer que poderia conhecer com ela por um prazer diferente, escrevendo a uma antiga amante para que viesse vê-lo, isso lhe pareceria uma abdicação tão covarde diante da vida e uma renúncia tão estúpida a uma nova felicidade, como se em vez de visitar a terra onde se achava, se metesse em seu quarto, a olhar ‘vistas’ de Paris. Não se encerrava no edifício de suas relações, mas fizera com ele, para poder erguê-lo novamente em toda parte onde uma mulher lhe agradasse, uma dessas tendas desmontáveis que os exploradores carregam consigo. Quanto ao que não podia ser transportado ou trocado por um prazer novo, ele o considerava sem valor, por mais invejável que parecesse aos outros. Quantas vezes seu crédito junto a uma duquesa, formado com os desejos que a dama acumulara durante anos, de lhe ser agradável, sem nunca haver encontrado uma ocasião propícia, não o desfazia Swann de uma vez por todas, reclamando dela, com um indiscreto despacho, uma recomendação telegráfica que o pusesse imediatamente em contato com um dos seus intendentes cuja filha lhe chamara a atenção no campo, como faria um esfaimado que trocasse um diamante por um pedaço de pão!”
 
ARTE: william.com.br

segunda-feira, 3 de junho de 2013

A ROLETA-RUSSA DOS JOVENS BANDIDOS


Carlos Santos
blogcarlossantos.com.br

Entre nós
 
A Polícia Militar “fechou” dois marginais hoje pela manhã, no Sumaré (Mossoró). Saiu aplaudida por moradores. 
Os dois jovens adolescentes tinham assaltado pequenos comércios na área, relata a versão policial. Os bandidos reagiram à voz de prisão, empunhando revólveres contra policiais militares. Receberam o troco. 
Chegaram sem vida ao Hospital Regional Tarcísio Maia (HRTM). 
A Polícia Militar e a Polícia Civil, em Mossoró, fazem milagres. Com enorme déficit de homens nas ruas, desdobram-se como anteparo da sociedade acuada. 
Falta investimento em inteligência e polícia técnica. Não basta apenas termos homens nas ruas, carros/motos/armas/munição contra crime. 
A morte desses jovens não é registro isolado. 
Estudemos a vida de ambos. Vejamos seus grupos sociais, companhias e hábitos. Façamos um passeio por endereços nas redes sociais. Lá teremos algumas pistas muito importantes. 
Outros terão mesmo fim. Não é comum bandido morrer com cabelos brancos. 
Esses jovens vivem num universo de falso poder e são “referências”. Entre seus amigos, se destacam. São tratados como “guerreiros”, e exaltados pelo que “têm” e “conquistam”. Falsos rubís. 
A sociedade, amedrontada e vítima da violência, vibra com mais duas baixas no time da bandidagem. Não está errada. Reação normal de quem é vítima. 
Muitos desses rapazes têm emprego, profissão e moram com os pais. Mas querem tênis da Nike, iPhone e grana para saírem com as “mina”, mano. 
O consumismo, a vaidade doentia, necessidade de status, c0nceitos equivocados sobre o sucesso e a fragilização da família produzem esses monstros precoces. Precisam “ter”, para que pareçam um “ser” especial e diferenciado. Se a droga fizer parte do coquetel, aí tudo fica ainda pior. 
A polícia, mesmo matando dois ou três jovens assaltantes todos os dias, num confronto “natural”, não resolverá a escalada da violência. 
O buraco é mais embaixo. 
Por enquanto, a dor dessas “baixas” fica com pais e amigos mais próximos desses jovens. 
Amanhã, ninguém sabe. A gente não sabe bem de que lado estaremos amanhã. 
Podemos ser vítimas de outros jovens bandidos ou chorarmos a eliminação de outros mais próximos de nós, que não sabíamos ou fingíamos não saber que estavam à margem da lei. 
A roleta-russa continua girando.

CHORO E VELA

Regina Azevedo

http://reginazvdo.blogspot.com.br/
 
Levanta dessa cama, vai
Tira essa fronha molhada
o teu travesseiro está úmido
o seu rosto está vermelho.

Levanta daí, vai
Já é tão tarde
Já não temos mais tempo
nosso passado se faz presente.

Não importa o que aconteceu
Levanta daí, vai
faz de conta que foi só mais um pesadelo
nada aconteceu
Eu canto pra você dormir
e aí você vai ouvir a minha voz
e lembrar do seu pai.

Eu vou te balançar na rede
te inventar uma música
e vou desafinar
e você vai continuar molhando
o tecido da rede.

Você vai chorar na minha camiseta
vai tremer inteira sob meu peito
mas vai chorar.

Vai chorar até que tudo seque
e aí
começar de novo.

POEMINHAS POEMEUS!

 
 
Bárbara de Medeiros
 
 
1
Se te digo que te amo, por favor, acredite!
Amor não é fácil de encontrar nesses dias.
 
 
2
Sim, somos de diferentes cores, diferentes cheiros e diferentes gostos.
Mas todos somos igualmente bons.
 
 
3
E assim como as ondas vão e vêm,
eu vou,
e venho junto com elas.
Nada há que me prenda aqui.
Meu amor pelo mar me leva a extremos.
Então por favor, não tente me apaixonar:
não quero magoar ninguém,
não quero ficar.

domingo, 2 de junho de 2013

CRIE JUÍZO, MULHER!


                                                  - Vai dar certo. Mas só três vezes.
                                   - Três?
                                   - Não se lembra? Eu lhe disse. Mais que três fica perigoso. Uma já é perigoso. Três é bom, se tudo der certo: a primeira para experimentar; a segunda para se saciar; a terceira para se despedir.
                                   - Você é muito esquisito.
                                   - Vai ver que é por isso que você me quer. Ou será que é porque eu sou inteligente, lindo, elegante, charmoso, cheiroso?
                                   - Bicho besta...
                                   - Então, topa? E feche essa porta, mulher, você sabe como são as pessoas neste escritório, basta um nada para fazerem um tudo.
                                   - Topo. E vou logo lhe dizendo: topo mundo pensa que você me come, que come a estagiária.
                                   - Isso aí não tem como evitar, mas tem como manipular.
                                   - Lá vem você.
                                   - Não esqueça tudo que conversamos, viu? Depois das três é cada qual pra seu canto, somente fica a amizade...
                                   - Não precisa ficar dizendo isso o tempo todo.
                                   - É só para deixar bem claro. Você sabe, eu não sou muito de acreditar que uma menina nova e bonita como você queira ir pra cama comigo, um cinqüentão, só porque tem tesão em mim. Se fosse mais velha, eu não dizia nada, mas é muito nova. Será que é froidiano, seu caso?
                                   - Que porra é isso?
                                   - Deixa pra lá.
                                   (...)
                                   - Por que você não atende minhas ligações?
                                   - Não estou atendendo?
                                    - Sim, mas faz muito tempo que estou tentando. E eu que não queria acreditar que você só ia sair mesmo três vezes comigo...
                                   - Eu lhe disse! A gente conversou, tá lembrada?
                                   - Você pode ter comido muitas mulheres, mas não entende nada de coração feminino. Não se mancou que eu estava mesmo afim de você?
                                   - Eu lhe disse que não acreditava nessa história.
                                   - Você não queria acreditar, só queria me comer. Quer dizer que não quer mesmo mais saber de mim?
                                   - Eu lhe expliquei mil vezes. Não dá certo. Eu não vou acabar meu casamento e arranjar inimizade com meus filhos por conta de um caso. Eu lhe disse: não é bom para mim nem para você.
                                   - O que é bom para mim só eu sei. Egoísta!
                                   - Não é isso, eu bem que não queria essa história, você que insistiu, insistiu...
                                   - Quer dizer que não tem jeito?
                                   - Você sabe que não.
                                   - Isso não vai ficar assim!
                                   (...)
                                   - O que é que você tem?
                                   - Nada não, só estou meio chateado, meu amor.
                                   - Com quê?
                                   - A liberdade que uma estagiária lá no escritório vem tomando comigo.
                                   - Como é que é? E porque não botam ela pra fora?
                                   - Ela é muito competente e é quem faz o trabalho todo do sócio novo. Fica chato eu persegui-la. E perigoso. Vão pensar que eu quis dar em cima dela e ela não me deu bola. Você sabe como é escritório que tem estagiárias bonitas. Semana passada o pessoal estava falando em câncer de pele e eu disse que tinha muito medo desse negócio, e que tinha um sinal do tamanho de um feijão do lado esquerdo do pênis, vivia mostrando à dermatologista. Sabe o que ela me disse depois, no corredor?
                                   - O quê?
                                   - Então, doutor, muita mulher já viu esse feijão, não foi?
                                   - E você?
                                   - Dei-lhe um carão grande. Não gostei da intimidade. Por azar algumas colegas dela escutaram. E não gostei de como ela me olhou...
                                   - Deixe isso prá lá. Mas cuidado, eu estou de olho...
                                   - Não brinque com isso não.
                                   (...)                            
                                   - Pois é, você pode até não acreditar no que eu estou dizendo, mas eu tive mesmo um caso com seu marido e tudo só acabou porque ele me enganou, prometeu que ia lhe deixar e ia viver comigo, e o tempo foi passando e nada.
                                   - Olhe, não acredito em nada disso que você está me dizendo, e até em respeito a ele eu vou desligar. Você procure tratamento especializado, seu problema é psicológico, talvez psiquiátrico.
                                   - Vc está dizendo que eu sou doida, é? Pois eu vou lhe provar, p-o-pro-provar, que não estou mentindo. Você conhece bem os atributos do seu marido, não é? Pois eu vou lhe provar: ele tem um sinal, mais ou menos do tamanho de um feijão, do lado do pau. Agora me diga, tive ou não um caso com ele?
                                   - Desista, querida. Ele me disse, um dia desses, duas coisas: que estava muito chateado com uma estagiária que estava se botando para cima dele, faltando com o respeito, e que descobrira isso quando contou, no escritório, que tinha muito medo de sinais, de câncer de pele, e que tinha um do tamanho de um caroço de feijão perto do pau, como diz você. Eu chequei a história. Me disseram que o sócio dele e a estagiária estavam na hora. Confirmei tudo. Você saiu do escritório porque é oferecida demais. Vive se oferecendo pra tudo quanto é homem que tenha dinheiro. Vá com Deus e mude de vida.
                                   - E você acreditou nesse teatro? Não percebe que ele planejou tudo? Tem nada não: nada melhor que um dia após o outro com uma noite pelo meio. Acorde logo. Se demorar, você vai se lascar.
                                   (...)
                                   - Sabe de uma coisa?
                                   - O quê?
                                   - Eu acho que você comeu a estagiária.
                                   - Você é doida, é?
                                   - Intuição, meu filho, intuição! Mas como eu não posso provar nada...
                                   - Se fosse verdade, o que você faria?
                                   - Ah! Essa vai ser sua angústia. Agora eu lhe digo: você iria chorar lágrimas muito amargas...
                                   - Crie juízo, mulher!

sexta-feira, 31 de maio de 2013

A TCHECA


Honório de Medeiros                    
 
                            Nossa guia, em Praga, a quem tínhamos contratado desde o Brasil, via internet, para acompanhar nosso pequeno grupo – éramos nove – sorri algumas vezes, brinca outras, e é bastante acessível, o que a tornava diferente, aos meus olhos, da maioria dos seus compatriotas, bastante carrancudos.
                        Pergunto-lhe a razão desse estado de espírito. “O clima”, responde, em tom de brincadeira. Decerto aprendeu a fazê-lo assim no Brasil, onde morou por seis anos, principalmente em Salvador, amou, casou, teve um filho com um baiano, e, em assim sendo, não poderia escapar incólume. Ela confirmou.
                        Em português com pouco sotaque, embora às vezes errado nas declinações mais complexas dos verbos, ela atribui parcela considerável desse estado de espírito do seu povo à transição do comunismo para o capitalismo, e à fragmentação das expectativas dos tchecos com a Democracia.
                        “Antes”, diz ela, ajeitando os óculos “nerd” no nariz delicado, “nós não tínhamos liberdade para decidirmos nossas vidas, mas havia tranquilidade quanto ao presente e futuro: saúde, educação, moradia, trabalho...”  “Penso que as gerações anteriores sonharam com um mundo melhor no qual a ‘quase’ igualdade permanecesse, mas houvesse uma melhoria para todos nas condições gerais e, ainda por cima, liberdade.”
                        “O tcheco, de uma forma geral, é invejoso”, continua, assumindo um pouco o “physique du rôle” da antropóloga que diz ser, com diploma fornecido pela mais prestigiosa instituição universitária de seu País. Faço um parêntese para observar que escutei essa mesma observação, em Lisboa, dada por um português em relação a seus compatriotas.
                        “Mas é um invejoso justo: ele inveja o que o outro tem, querendo que todos tenham igual.” “Com o capitalismo, aos poucos está surgindo uma sociedade acentuadamente de classes, sem que os problemas mais antigos fossem resolvidos.”
                        Anete, esse é, em Português, o nome da nossa guia, espana a neve que vai caindo, minúscula, lentamente, por sobre seu elegante casaco azul escuro, nos diz que “no comunismo a divisão de classes era de outra forma, ou seja, a elite partidária possibilitava aos seus acesso à burocracia que lhes assegurava um status diferenciado.”
                        Já fizeramos um círculo em torno de Anete e a escutávamos atentamente. “Havia um contraponto natural à elite partidária comunista: os, digamos assim, intelectuais, que assumiram o controle após a queda do comunismo, e que se disseminavam, por exemplo, nas universidades secretas, onde se debatiam livros proibidos e se propunham alternativas para o modelo político existente.”
                        “Hoje há muitos saudosistas do comunismo. A Revolução de Veludo, na opinião deles, tirou as vantagens do comunismo e não acrescentou nenhuma do capitalismo...”
                        Não há tempo para muita conversa. Anete tem um trabalho a fazer, e o faz com competência, demonstrando conhecer, com profundidade, a história do seu povo. Leva-nos a lugares muito interessantes e nos conta, detalhadamente, o passado de cada um deles. Mas é sempre hora de ir.
                        Quando os dias chegam ao fim ela se vai pegar seu filho levando essa estranheza comovente de ter vivido em um País tão exótico, para os tchecos, quanto o Brasil. É assim que eles nos vêm.
                        Não somente. Além de ter vivido no Brasil, Anete amou um baiano de Salvador, e, do fruto desse amor, teve um filho que carrega consigo, pelas ruas da República Tcheca, essa mistura também exótica de sangue brasileiro e tcheco. É estranho e comovente. Eu gostaria de lhe ter perguntado acerca de como acontecera sua história de amor. Melhor não, pensei, e me contive.
                        Mas ainda lhe fiz uma última pergunta: você voltaria a morar no Brasil? “Não”, disse-me. “O Brasil é muito bagunçado.” “Além do mais, este é meu povo, esta é minha história.” “Vou voltar lá muitas vezes; não quero que meu filho cresça sem conhecer suas raízes.” “Mas não.” “Eu não voltaria.”
                        Seguiu Anete, após as despedidas, levando nossos cartões, pois nos disse que viria no final deste ano ao Brasil, para as festas de aniversário do seu ex-sogro. Entrará em contato? Duvido. Entretanto, tudo é possível neste mundo de meu Deus. Afinal não aconteceu de uma tcheca vir a Salvador desenvolver um trabalho social, conhecer um baiano, casar com ele, e dele ter um filho? Quem sabe ela não nos surpreenda?
                      Venha, Anete, é como lhe disse: nós a receberemos com imenso prazer. Quem sabe eu tenha coragem de lhe perguntar como foi sua história de amor no Brasil...
                       

quinta-feira, 30 de maio de 2013

LIRA NETO DIZ COMO ENTENDER GETÚLIO VARGAS


                           
 
Honório de Medeiros
 
 
                   Como entender o camaleônico Getúlio Vargas?
                   No volume 1 do excepcional “GETÚLIO” (1882-1930), de Lira Neto, parece estar a resposta.
                   Borges de Medeiros, que andara às rusgas em relação aos Vargas, voltara a cortejá-los. São os idos de 1913-1915. Faz o convite a Getúlio para ocupar o importantíssimo, na época, cargo que ele mesmo ocupara, de Chefe da Polícia Estadual.
                   Getúlio analisa e recusa o convite.
                   “Mesmo rejeitando o convite”, conta-nos Lira Neto, (Getúlio) “tomou os cuidados necessários para que seu gesto não fosse interpretado por Borges de Medeiros como um acinte.”
                   Instado, pelos amigos, a se explicar, Getúlio Vargas o fez:
                   “Na luta, vencer é adaptar-se, isto é, condicionando-se ao meio, apreender as forças dominantes, para dominá-lo”, esclareceria ao amigo Telmo Monteiro.”
                   “Para Getúlio”, prossegue Lira neto, “aquela frase, de clara inspiração darwinista, passara a funcionar como uma espécie de mantra. Faria questão de repassá-la aos filhos, como uma fórmula explicativa da vida e do mundo.”
                   Vencer não é esmagar ou abater pela força todos os obstáculos que encontramos – vencer é adaptar-se, repetiria certo dia Getúlio ao filho mais velho, Lutero. Como o garoto ficasse em dúvida a respeito do verdadeiro significado da sentença, o pai detalharia:
                   Adaptar-se não é o conformismo, o servilismo ou a humilhação; adaptar-se quer dizer tomar a coloração do ambiente para melhor lutar.”
                   Essa informação, essencial para entender Getúlio Vargas, Lira Neto colheu em seu “DIÁRIOS” (2 volumes; São Paulo: Siciliano; Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas; 1995), e soube compreender sua importância.
                   Quanto à importância, muito embora essa informação, por si somente, a assegure, convém observar que dada sua relação com o pensamento de Lamarck, não propriamente com o de Darwin, pode ensejar rios de tinta enquanto dissertações de mestrado e/ou teses de doutoramento. Principalmente se a cotejarmos com as consequências epifenomênicas teórico políticas da existência de uma lei da evolução, qual seja o pensamento de Maquiavel ou de Gaetano Mosca, ou se cotejarmos com a vida de notórios manipuladores e sobreviventes de sua própria época política, por exemplo Talleyrand ou Fouché.
                   O certo é que Lira Neto, de forma brilhante, apreendeu a medula do aparentemente proteiforme Getúlio Vargas e a expôs no primeiro volume de sua biografia, uma obra já seminal. Nesse pequeno trecho lemos, oculto por uma vida intensa, complexa, onipresente ainda hoje, como pensava e agia o mais importante político brasileiro do século XX.
 
ARTE: chargistaclaudio.zip.net

quarta-feira, 29 de maio de 2013

CÂMARA CASCUDO, FREDERICO PERNAMBUCANO DE MELLO, E O "ESCUDO ÉTICO"

Câmara Cascudo
 
 
Honório de Medeiros
 
 

Como sabemos, a famosa “Teoria do Escudo Ético” de Frederico Pernambucano de Mello está exposta em três parágrafos do capítulo 4 do clássico "Guerreiros do Sol", abaixo transcritos a partir de sua segunda edição:
"Muito se tem falado nos paradoxos da chamada moral sertaneja. No Nordeste, talvez melhor que em qualquer outra região, sente-se a existência desse quadro de valores - inconfundível em muitos dos seus aspectos. Chega a ser quase impossível, por exemplo, explicar ao homem do sertão do Nordeste as razões por que a lei penal do país - informada por valores urbanos e litorâneos que não são os seus - atribui penas mais graves à criminalidade de sangue, em paralelo com as que comina punitivamente para os crimes contra o patrimônio. Não se perdoa o roubo no sertão, havendo, em contraste, grande compreensão para com o homicídio. O cangaceiro - vai aqui o conteúdo mental do próprio agente - não roubava, "tomava pelas armas"."
"Dentro desse quadro todo próprio, a vingança tende a revestir a forma de um legítimo direito do ofendido. "No sertão, quem se não vinga está moralmente morto", repitamos mais uma vez a frase tão verdadeira de Gustavo Barroso, conhecedor profundo desse paralelismo ético sertanejo."
"Ao invocar tais razões de vingança, o bandido, numa interpretação absurdamente extensiva e nem por isso pouco eficaz, punha toda a sua vida de crime a coberto de interpretações que lhe negassem um sentido ético essencial. A necessidade de justificar-se aos próprios olhos e aos de terceiros levava o cangaceiro a assoalhar o seu desejo de vingança, a sua missão pretensamente ética, a verdadeira obrigação de fazer correr o sangue dos seus ofensores. O folclore heroico, em suas variadas formas de expressão, imortalizava-o, omitindo eventuais covardias ou perversidades e enaltecendo um ou outro gesto de bravura. Concretizada a vingança, por um imperativo de coerência estaria aberta para o cangaceiro a obrigatoriedade de abandonar as armas, deixar o cangaço. Já não teria mais a socorrer-lhe a imagem o escudo ético por esta representado. Como então realizar tal vingança, se o cangaço era um bom meio de vida?"
Já tive oportunidade de observar que o “escudo ético” não é propriamente um epifenômeno da cultura moral sertaneja nordestina, muito menos apenas do cangaço. Essa opinião é corroborada, como se pode depreender, a partir da entrevista de Anthony Daniels à revista "Veja" de 17 de agosto de 2011 - edição 2230, ano 44, nº 33 -, na qual o psiquiatra e escritor inglês, ao analisar a influência da tese do suíço Jean Jacques Rousseau de que o ser humano é fundamentalmente bom, e que a sociedade o corrompe, afirma que esta prejudicou profundamente sua noção de responsabilidade: "Por influência de Rosseau, nossas sociedades relativizaram a responsabilidade dos indivíduos."

Como digo sempre: a realidade está na mente, antes de estar na realidade. Trocando em miúdos: o racional antecede, em última instância, o real.
E continua: "O pensamento intelectual dominante procura explicar o comportamento das pessoas como uma consequência de seu passado, de suas circunstâncias psicológicas e de suas condições econômicas. Infelizmente, essas teses são absorvidas pela população de todos os estratos sociais. Quando trabalhava como médico em prisões inglesas, com frequência ouvia detentos sem uma boa educação formal repetindo teorias sociológicas e psicológicas difundidas pelas universidades. Com isso, não apenas se sentiam menos culpados por seus atos criminosos, como de fato eram tratados dessa maneira."
Exemplifiquei, em texto anterior, citando o exemplo ocorrido neste começo de século XXI, aqui no Rio Grande do Norte, e que já virou lenda, no qual se atribui a injustos mal tratos físicos da Polícia, o ingresso do célebre Valdetário Benevides Carneiro, líder do bando dos Carneiros, no crime. "Como não há justiça" teria dito em outras palavras Valdetário, "vou fazer a minha."
Ou seja: há o escudo ético, mas ele não é específico da moral sertaneja nordestina. Parece ser um epifenômeno decorrente da criminalidade, seja rural, seja urbana, não sendo suporte, portanto, para uma teoria que caracterize o epifenômeno do cangaço.
Por outro lado, especificamente no que concerne a essa famosa “teoria do escudo ético” de Frederico Pernambucano de Mello, é certo lembrar que Câmara Cascudo, em 1937, no seu “Vaqueiros e Cantadores”, já o expunha, no que diz respeito ao cangaço, quando no Capítulo denominado “Ciclo Social”, trata do “Cangaceiro”.
Para Cascudo, ao explicar por que a valentia, quanto aos cangaceiros, originava a “aura popular na poética” dos cantadores, necessário se fazia a existência, como pressuposto, do fator moral, que nada mais era que o “escudo ético”. Disse Cascudo:
“Para que a valentia justifique ainda melhor a aura popular na poética é preciso a existência do fator moral. Todos os cangaceiros são dados inicialmente como vítimas da injustiça. Seus pais foram mortos e a Justiça não puniu os responsáveis.
Teria lido Pernambucano de Mello “Vaqueiros e Cantadores”? Na bibliografia de “Guerreiros do Sol” o grande teórico do cangaço arrola, de Câmara Cascudo, “Tradições Populares da Pecuária Nordestina” e “Viajando pelo Sertão”. O mais provável é que ambos souberam perceber, com quase cinquenta anos de diferença, na história da violência rural sertaneja nordestina do final do século XIX e início do século XX, esse fato específico, qual seja, a justificativa moral para a entrada dos cangaceiros na vida bandida.

A diferença é que Pernambucano de Mello transforma esse fato em algo determinante para explicar o cangaço, enquanto Cascudo propõe que o mesmo fato é fundamental para a existência da poética sertaneja nordestina de mitificação do cangaceiro.

terça-feira, 28 de maio de 2013

ASSESSORES JURÍDICOS E GOVERNO ENTRAM EM CONFRONTO

Carlos Santos
 
blogcarlossantos.com.br
 
terça-feira, 28/05/2013
 
Sem afinação

Qual o segmento do funcionalismo público do Rio Grande do Norte, que o Governo Rosalba Ciarlini (DEM) ainda não bateu de frente? Parece que não faltam áreas de atrito.

Entre os integrantes da Assessoria Jurídica do Estado do Rio Grande do Norte, a avaliação dos governantes é a pior possível. Estuda-se estratégia de negociação mais salutar ou confronto, após reunião do último dia 13, entre componentes da categoria e os secretários José Anselmo de Carvalho Júnior (Controladoria) e Carlos Augusto Rosado (Secretaria-chefe do Gabinete Civil).
 
O ambiente foi o mais carregado possível, deixando os membros da Assessoria Jurídica profundamente decepcionados e revoltados.
 
O Blog de Rosalie Arruda resumiu um pouco o que foi a  reunião, mas sem detalhar o nível do diálogo, carregado, do encontro.
 
Os deputados estaduais Getúlio Rêgo (DEM) e Ricardo Motta (PMN) é que foram elogiados em nota oficial pelos assessores jurídicos, lembrou a blogueira.
 
“Na nota, a ASSEJURIS critica o governo atual e agradece aos deputados pela ‘ defesa intransigente dos Assessores Jurídicos do Estado, a qual, mesmo resultando infrutífera nos justos reclamos desses abnegados servidores públicos, representa um sinal de esperança à injustiça praticada ao longo do tempo por sucessivos governantes’.
 
Bate-boca
 
Os Assessores buscam a Reestruturação da Carreira e o governo não quer acordo.
 
Na reunião com os dois secretários, Carlos Augusto chegou a ponto de desdenhar dos membros da Assessoria Jurídica: “Não tenho culpa de vocês serem advogados”.
 
Adiante, ainda acrescentou: “Eu só estou recebendo vocês em atenção a Getúlio e Ricardo Mota”.
 
O ambiente ficou ainda mais carregado, apesar da intervenção moderada dos deputados, quando Carlos avisou:
 
- Não posso dar aumento porque tem uma liminar de Joaquim Barbosa (ministro-presidente do Supremo Tribunal Federal-STF) proibindo qualquer aumento por conta do limite da Lei de Responsabilidade Fiscal.
 
Nesse momento, um assessor jurídico tomou coragem e fez uma réplica dilacerante, mostrando que ocorrera aumento pros procuradores gerais do Estado “um dia depois do acórdão” citado por Carlos Augusto.
 
Enfim, o diálogo não avançou. Ficou ainda pior se afunilar a discussão que ganhou dimensão de bate-boca.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

PROGRAMAÇÃO CARIRI CANGAÇO PARAYBA!

 

PROGRAMAÇÃO CARIRI CANGAÇO PARAYBA
Sousa e Nazarezinho

Sousa – PB
15 de junho de 2013 - Sábado
Local: Centro Cultural Banco do Nordeste
14:00h – Cerimônia de Abertura



14:20h - Mesa Redonda
Tema: Homem, terra, religiosidade, sertão e cangaço:
A construção histórica da figura do cangaceiro.
Coordenador da Mesa: César Nóbrega – Sousa/PB
Debatedores:
Lemuel Rodrigues – Mossoró/RN
Múcio Procópio – Natal/RN
Honório de Medeiros – Natal/RN



16:00h - Exibição do documentário:
“A violência oficializada no tempo do cangaço”
(Produção da Laser Filmes)
Debatedores: Aderbal Nogueira – Fortaleza/CE
Juliana Ischiara – Quixadá/CE



19:00h – Mesa Redonda
Tema: O cangaço na Parahyba
Coordenador da Mesa: Manoel Severo – Fortaleza/CE
Debatedores: Ângelo Osmiro – Fortaleza/CE
Bismark Martins – Campina Grande/PB
Wescley Rodrigues – Cajazeiras/PB


Nazarezinho - PB
16 de junho de 2013 - Domingo.
07:30h – Visita Técnica
A casa do Jacu e a casa de seu Abdias Pereira

08:30h – Cerimônia de Abertura
Local: Centro Social
09:00h – Exibição do documentário:
“Na cabeça do povo”
Produção: Helena Maria Pereira



09:30h – Mesa de Debate
Tema: O cangaço como caracterizador da cultura sertaneja e a importância da cultura material como elemento formador da
identidade de um povo.
-A memória do cangaceiro Chico Pereira
Debatedores: João de Sousa Lima – Paulo Afonso/BA
Paulo Gastão – Mossoró/RN

Exposição do Cangaço

...E em setembro:
Cariri Cangaço 2013
Crato, Juazeiro, Barbalha, Missão Velha
Barro, Aurora e Porteiras