segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

MESMO QUE EU NÃO O CONHEÇA, FELIZ NATAL

Por Carlos Santos

O que eu desejo para o Natal?
 
Respondo-lhe:
 
- Tudo que é comum a outros dias, em minhas manifestações. Bastam saúde e paz.
 
Não sei quem você é? Talvez não lembre do seu rosto, menos ainda do seu nome. És um estranho, provavelmente.
 
Sem problema. Nada me impede de continuar lhe desejando saúde e paz.
 
O caso não é um arroubo próprio do que costuma ser definido como “espírito natalino”. É até mais simples. Diria que é um mantra, resposta pacífica aos que resmungam, vomitam impropérios e que acabam o mundo em sua volta a cada amanhecer, sendo Natal ou não.
 
O Natal tem uma atmosfera ambivalente. É misto de alegria e melancolia, caldeirão de sentimentos. Soma e perda, um pouco do que quero e tenho; a certeza do que perdi e me falta.
 
Como resistir à criança com olhos cintilantes, que ronda a árvore enfeitada de sonhos?
 
Impossível não ser tocado pelo sorriso dos que nada possuem e que são lembrados hoje, mesmo que esquecidos logo amanhã, pela ‘caridade sazonal’ de alguns mais afortunados.
 
Os sabores e aromas mexem com nossos paladar e olfato. Atiçam todos os nossos sentidos.
 
Eis as luzes, o colorido, a mesa posta…
 
O presépio continua na minha infância nos arrabaldes da Capela de São Vicente e Igreja do Coração de Jesus, em Mossoró. A casa de dona Maria de Uriel transformada em Belém, nossa Galileia em miniatura, ao alcance da mão traquina.
 
A espera de Papai Noel está atualíssima, mesmo que agora sem mistério. Causava insônia. Dali nascia a tentativa de simular o sono para flagrá-lo exatamente àquela hora em que deixaria meu brinquedo embaixo da rede.
 
Ele, o bom velhinho, enfim descoberto. Um espectro na escuridão, de silhueta conhecida, cometia o inafiançável crime da perpetuação da felicidade.
 
Eu, cúmplice, prometi a mim mesmo nunca entregar sua real identidade.
Crescido, com a vida indo bem além do Cabo das Tormentas, não é o lúdico que me instiga nesta data. Entre o profano e o sagrado, tento ser indiferente ou pelo menos cumprir o ritual exigido para o bom convívio social.
Oscilo entre a alegria da atmosfera dos festejos e a própria deprê que paradoxalmente esse período provoca.
 
Bom, me conheço. Um velho amigo, Diassis Linhares, até emendaria com sapiência: “Algumas pessoas amadurecem, outras apodrecem”.
 
Amadurecer é estar pronto no tempo certo, uma forma de sempre nascer. Aí o Natal se encaixa perfeitamente. Palavra de origem latina, Natal vem de “nativitas”, que significa “nascimento”.
 
De algum modo renasço e sobrevivo às minhas perdas nos olhos daquela criança boquiaberta e encantada, diante do presépio de Maria de Uriel e à espera do Papai Noel. Meu presente – hoje – é ter passado.
 
O brinquedo embaixo da rede é apenas um detalhe. O que vale é o vulto dos meus bons velhos diante de mim, a cada amanhecer. A cada dia, outro nativitas.
Saúde e paz.

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