quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

O CANGACEIRO MASSILON E A REPÚBLICA DO PATAMAR DE SÃO VICENTE

Jânio Rêgo

Centralizando a figura do cangaceiro potiguar que foi parceiro de Lampião no ataque que foi rechaçado da torre da igreja, Honório de Medeiros remonta a engrenagem do coronelismo e do Poder político no Nordeste rural e repagina e estimula a revisão crítica da história da invasão do Rei do Cangaço a Mossoró em 1927. (...) um novo conceito para o cangaço, dentro de uma perspectiva científica que identifique o geral no particular e afaste, de vez, o estudo do cangaço do mero "contar casos".

O Cangaceiro Massilon e a República do Patamar de São Vicente

Acho que compreendo a dificuldade de Carlos Santos em escrever no seu blog sobre "Massilon - Nas veredas do cangaço e outros temas afins", o livro de Honório de Medeiros sobre o cangaceiro que foi um dos protagonistas mais importantes do ataque de Lampião a Mossoró em junho de 1927, mesmo ele tendo acompanhado o autor no primeiro lançamento do livro, no sertão do Cariri, durante um seminário sobre o tema Cangaço.

Não é fácil escrever sobre aquilo que acicata nossa memória e nos remete à infância, à turma do Patamar, ao que ele próprio, Santos, tratou de nomear como a "República Independente do Patamar da Igreja de São Vicente" da qual somos remanescentes, como o autor Honório de Medeiros que diz assim, na introdução do livro:

"Nasci e cresci à sombra da Igreja de São Vicente, a igreja da "bunda redonda", brinquei, assisti missa, novena de Santo Antônio, sem perder o contato com as marcas que o combate contra Lampião deixou em suas paredes e na sua torre".

Centralizando a figura do cangaceiro potiguar que foi parceiro de Lampião no ataque que foi rechaçado da torre da igreja, Honório de Medeiros remonta a engrenagem do coronelismo e do Poder político no Nordeste rural e repagina e estimula a revisão crítica da história da invasão do Rei do Cangaço a Mossoró em 1927. (...) um novo conceito para o cangaço, dentro de uma perspectiva científica que identifique o geral no particular e afaste, de vez, o estudo do cangaço do mero "contar casos".

Surpreende no livro também, além desse viés do pesquisador sobre o cangaço, o caráter genealógico e emotivo que o autor revela na introdução: (...)se agregou o interesse de sempre acerca da história da minha família materna, da qual é o momento precioso, desde a fundação de Martins até a resistência oposta por Rodolpho Fernandes à Lampião".

Ao mesmo tempo em que escreve sobre o roteiro geográfico e factual de Massilon que passa pela Paraiba e Ceará, estados por onde andou em busca de informações, Honório constrói um arcabouço emocional da marcante trajetória e origem da família materna dele, os Fernandes do Rio Grande do Norte, do qual ele faz questão de revelar que é a nona geração do patriarca que fundou e deu nome à cidade serrana de Martins.

Mas para leitores como nós, eu e Carlos, fica difícil não ver em cada capítulo a imagem da Igreja de São Vicente. Mesmo que não seja o capítulo em que Honório descreve, preciso como um roteiro cinematográfico, a hora do tiro disparado por Manoel Duarte e que matou o cangaceiro Colchete.

O patamar hoje está mais curto e mais baixo do que aquele em que os republicanos brincavam pela manhã e à noite. Apenas dois degraus e chão pedregoso como nunca. Arrancador de chamboque nos dedos dos pés.

Os canteiros, construídos por padre Sátyro no auge da perseguição aos jogos de bola dos meninos, estes permanecem intactos sendo que agora têm plantas. As crianças foram rareando nas residências em torno do Patamar. A cidade. O tempo. Os hábitos.

O jogo de bola acabou-se muito antes da capelinha da bunda redonda tornar-se cult e festejada.

Estivemos lá na igreja, na missa e quermesse dos 80 anos de idade do Careca com a entrega aos fiéis da capela pintada, restaurada, nova como em 1919. E amarela, bem amarelinha. Foi muito interessante.

Padre Sátyro no altar: "Eu vi São Vicente sorrir! Eu vi São Vicente sorrir!"

O octogenário e sua retórica vibrante, sabedoria dos oradores sacros, tradição dos copistas do conhecimento e da liturgia.

Depois tivemos que ouvir a Prefeita da Cidade.

Mas nos compensaram os doces vicentinos vendidos no meio da rua lateral, a Francisco Ramalho, defronte à casa de Marcos Porto, esse já tornado memória e lenda do Patamar que já carece de um livro. Ele também um Fernandes.

No Rio Grande do Norte esse lado familista é muito importante. O livro de Honório permite ver que laços ancestrais construíram esse orgulho familiar que de certa forma marca o Estado do Rio Grande do Norte.

Jânio Rêgo é jornalista - janiorego@blogdafeira.com.br

* Extraído do blog Cangaço em Foco do escritor e pesquisador do cangaço Dr. Archimedes Marques.

domingo, 8 de dezembro de 2013

O JUSTO NÃO ESTÁ FORA DE MIM

Guilherme de Occam



Honório de Medeiros

O nominalismo de Guilherme de Ockham questionou a possibilidade de as coisas (“a Coisa-Em-Si”, “ o Objeto”, “o Ser”, “a Realidade”) dizerem, ao Sujeito Cognoscente, aquilo que elas são (quais são suas essências).

Nós é que, enquanto demiurgos, ordenamos, organizamos, aquilo que nossos sentidos apreendem, de forma caótica, a partir do nosso conhecimento pré-adquirido (Kant, Bachelard, Popper).

Podemos rastrear tal concepção até o relativismo sofista (Protágoras de Abdera, Antístenes versus Platão), mesmo até Parmênides.

O nominalismo também impede a fenomenologia de Bérgson e Husserl e a pretensão de uma ciência cujo objetivo seja “compreender”: não é o termo “salinas” que me diz algo; eu é que digo algo dele, a partir do conhecimento que já possuo. Não há essência a ser apreendida, Platão estava errado, os sofistas estavam certos.

Thomas Nagel (“Visão a Partir de Lugar Nenhum”; Martins Fontes; SP; 2004; 1ª edição; p. 137; nota) observa que “Chomsky e Popper rechaçaram as teorias empiristas do conhecimento”.

Nominamos relações, processos, evanescências; não há coisas a serem nominadas. O Justo não está fora de mim, está em mim...

O VÔO DO SOLITÁRIO PARA O INFINITO

Plotino


Honório de Medeiros


“É como se vc, estando dentro de um ambiente fechado, uma clausura, criasse uma saída e a utilizasse. Lá, do outro lado da saída, lhe espera um outro ambiente, também fechado, só que maior, bem maior. Sua tarefa, assim, é sempre criar outra saída, sair, entrar em outro ambiente ainda maior, criar outra saída, sempre, em uma escala exponencial”, disse-me ele.

“Não tem fim?”, perguntei.

“A morte”, respondeu, “que acaba com tudo ou lhe leva a um infinito que está além de todas as coisas e fenômenos, onde não há qualquer tipo de limite ao conhecimento”.
 
“Agora", continuou, "ao lhe falar, sei o que significa aquela frase de Plotino, por meio da qual ele nos diz acerca do vôo do solitário para o infinito”.
 
"Penso que ele quis dizer que nossa busca pelo conhecimento é sempre solitária, e que somente a morte nos liberta e nos remete ao infinito”.