sábado, 21 de janeiro de 2012

O TROFÉU "ALGEMAS DE OURO"


José Sarney, Jaqueline Roriz e José Dirceu, Os políticos premiados no 'Baile Pega Ladrão!'


Do "Blog de Ricardo Noblat"
O Troféu Algemas de Ouro de 2011 "consagrou" o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu (PT), e a deputada Jaqueline Roriz (PMN). Os foliões que compareceram ao tradicional Clube dos Democráticos, na Lapa, para participar do 'Baile do Pega Ladrão!', realizado na madrugada desta sexta-feira, 20, no Rio, vaiaram entusiasticamente os vencedores da votação realizada no Facebook, que teve sete mil eleitores.
Foram entregues as algemas de ouro, prata e bronze, respectivamente, a Sarney, que teve 59,5% dos votos, a Dirceu, com 18,8%, e à deputada Jaqueline Roriz, com 8,4%, filmada recebendo dinheiro de propina e que foi absolvida pela Câmara dos Deputados no ano passado.
O baile foi animado pelo conjunto vocal Anjos da Lua, de Eduardo Gallotti, que apresentou repertório inspirado na corrupção e na impunidade na política brasileira, como 'Se gritar pega ladrão!', de Bezerra da Silva; 'Pecado Capital', de Paulinho da Viola; 'Lama', de Mauro Duarte; 'Homenagem ao malandro', de Chico Buarque; 'Saco de feijão', de Francisco Santana; e 'Onde está a honestidade?', de Noel Rosa.
O 'Baile do Pega Ladrão!' e o 'Troféu Algemas de Ouro', foram organizados pelo Movimento 31 de Julho, que tem realizado atos contra a corrupção nos últimos meses. As iniciativas contaram com apoio de diversos movimentos do Rio e de outras cidades do País.
A proposta dos organizadores é manter a mobilização contra a corrupção e a impunidade mesmo neste período de festas e férias. O Movimento 31 de Julho planeja realizar um show na Zona Sul do Rio, depois do Carnaval, com a participação de artistas que apoiam a causa do combate à corrupção e à impunidade.
A agenda política dos grupos contra a corrupção inclui a realização de atos pela aplicação da Lei da Ficha Limpa nas eleições municipais deste ano; pela agilização do julgamento do Mensalão pelo STF; em solidariedade à ministra Eliana Calmon (CNJ); e em apoio à liberdade de Imprensa.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

A ARTE DE RAÍSSA MASS


Lagoa de Guaraíras, Tibau do Sul, Rn, arte fotográfica de Raíssa Mass

POLÍCIA PRENDE ACUSADO DE ROUBAR ÓCULOS DE LAMPIÃO


Óculos de Lampião


11.01.2012  
Carlos Madeiro
Do UOL, em Maceió
Uma das maiores relíquias do cangaço nordestino está de volta à Casa de Cultura de Serra Talhada, cidade no sertão de Pernambuco localizada a 414 km do Recife. Um mês após serem roubados, a polícia informou que prendeu nesta terça-feira (10) o homem acusado de furtar os óculos de Virgulino Ferreira da Silva, conhecido como "Lampião". O furto ocorreu no último dia 11 dezembro, durante horário de visitação do público ao museu da instituição. 
Segundo a polícia, os óculos estavam com Manoel Mecias da Silva Santos, 20. O acusado teria procurado a Casa da Cultura de Serra Talhada, proprietária dos óculos, para pedir uma recompensa para que o objeto fosse devolvido ao museu.

"Lalau" 
Após fazer a oferta do resgate, o acusado foi preso em flagrante pelos policiais e levado para a delegacia de Serra Talhada. A polícia agora quer saber se Santos agiu sozinho ou se contou com a ajuda de mais pessoas para furtar os óculos do museu. 
O roubo 
Segundo a Fundação Casa da Cultura, os óculos foram levados entre 18h e 22h, quando o museu estava aberto à visitação do público. Os óculos do maior cangaceiro da história --e que viveu no início do século passado aterrorizando as cidades do Nordeste-- eram em ouro 16 quilates e tinham selo de autenticidade. O museu não possui sistema de câmeras nem segurança particular. 
A relíquia foi doada por um filho de um coiteiro [pessoa que acobertava e dava abrigo] de Lampião e é a única peça comprovadamente autêntica que o museu pertencia. "Essa peça tem uma importância histórica inestimável. Os óculos passaram por uma análise e ficou provado ser realmente de Lampião”, afirmou o presidente da Fundação Casa da Cultura de Serra Talhada, Tarcisio Rodrigues. 
Para se ter ideia do valor histórico, Rodrigues conta que os óculos foram tema de um documentário do canal de televisão "History Channel", quando foi comprovada a origem do acervo. Em nota, a Casa de Cultura disse que chegou a emitir uma comunicado a instituições museológicas e meios de comunicação, a fim de evitar a venda dos óculos.

PRENÚNCIO DE UMA GUERRA ANUNCIADA (II)

Por Manoel Severo

O ano é 1915 quando vamos reencontrar Né Dadu, retornando de Triunfo após ser absolvido de crime de morte de João Jovino. Naqueles dias uma volante se formava para capturar um dos maiores desafetos da família Carvalho. Sob o comando do Tenente Teófanes Ferraz Torres e contando ainda com os Carvalho: Antonio e José da Umburana e João Lucas das Piranhas, atacam São Francisco , mas não encontram Né Dadu, espancando fortemente uma negra de nome Antonia Verônica, governanta do lugar, conhecida por “Mãe Preta”  e prendem o mais novo dos filhos de D. Constança, irmão de Né Dadu: Sebastião Pereira, então com 16 anos.
A represália dos Pereira veio logo em seguida, quando é morto José da Umburana em emboscada de Vicente de Marina, o morticínio continua, desta feita mais um Pereira tomba, Né Dadu morre em 16 de Outubro de 1916, vítima de covarde traição de um ex-cabra dos Carvalho, Zé Rodrigues, Zé Grande ou simplesmente “Zé Palmeira” que o matou com seu próprio rifle no lugar Poço do Amolar, na fazenda Serrinha. Esse caboclo Zé Palmeira havia se aproximado de Né Dadu após ardilosa trama traçada pelos próprios Carvalho, simulando o rompimento do referido cabra com a família inimiga. Apesar de Atento e desconfiado Né dadu acabou sendo ludibriado pelo audacioso golpe e acabaria sendo vítima fatal do mesmo. 
A morte do irmão empurrou definitivamente o mais jovem da família para o mundo do crime, nascia ali aquele que seria o mais valente de todos os cangaceiros, segundo o próprio Virgulino Ferreira: Sebastião Pereira, vulgo Sinhô Pereira. Partindo na sanha da formação de seu grupo, Sebastião Pereira partiu em busca do Coronel Zé Inácio, do Barro, conhecido coiteiro e protetor de bandidos, dali saiu com um grupo de 20 cabras, tendo como seu lugar tenente seu primo, Luiz Padre, rumo a Vila Bela, no Vale do Pajeú. 
Invadindo São Francisco, depredou e queimou a loja de Antonio da Umburana e tomou a pequena vila, partindo dali para as fazendas dos Carvalho, Umburanas e Piranhas, depredando, queimando, matando animais, destruindo cercas, arrasando tudo. Os Carvalhos diante de tanta fúria se retiraram para a cidade, finalizando assim a primeira grande investida do grande cangaceiro. 
Sobre a eterna peleja entre os clãs vamos ter o episódio da invasão à fazenda Piranhas, narrado por inquérito na própria delegacia de Vila Bela, como segue: “... no dia 1º corrente apresentaram-se voluntariamente a prizão os indivíduos José Alves de Barros e José de tal conhecido por José Caboclo e Francisco Alves de Barros, Cincinato Nunes de Barros, Antonio Carvalho de Barros, conhecido por Antonio da Umburana, Antonio Alves Frazão, José André, Feliciano de tal, João Ferreira, Francisco Porphirio, Antonio Teixeira, Antonio Pedro da Costa Neto, Antonio Pequeno, José Flor e João Tapia todos denunciados neste município como incursos no artigo 294 por terem morto ao cangaceiro Paixão na ocasião em que os mesmos se defendiam do ataque feito a fazenda Piranhas pelo grupo chefiado por Sebastião Pereira e Luiz Padre dos qual fazia parte o referido Paixão (Informe ao Chefe de Polícia pelo delegado de Vila Bela, 5/9/17). 
Algum tempo depois Sebastião Pereira mataria o assassino de seu irmão Né Dadu, o indivíduo Palmeira, na localidade de Viçosa em Alagoas, tendo Luiz Padre sangrado o matador de seu pai Padre Pereira, Luis de França, em São João do Barro Vermelho. Em outra oportunidade na localidade de Queixada, sob a proteção do Coronel Pedro da Luz, acabou encontrando Antonio da Umburana que igualmente perderia a vida... assim se configurava a vingança dos primos, Sebastião e Luis Padre.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

PRENÚNCIO DE UMA GUERRA ANUNCIADA (I)


Manoel Severo, de terno, e Dr. Napoleão Tavares.
 
 
Por Manoel Severo (*)
 
Sem dúvidas é sempre importante quando nos referimos ao ciclo do cangaço de Lampião, procurarmos contextualizar o ambiente no qual ele nasceu, viveu, suas origens, o que o cercava; a que tipo de sociedade rural ele estava submetido, e também conhecer as oligarquias dominantes da região e suas implicações no destino do mais famoso filho de Zé Ferreira; hoje trouxemos um pouco da histórica disputa entre os Pereiras e os Carvalho.

Remonta ainda os temos do império a origem da quase eterna guerra entre as famílias Pereira e Carvalho, oriundas do Vale do Pajeú, sertão de Pernambuco, berço de dois dos maiores fenômenos do cangaço nordestino, Sinhô Pereira e Virgulino Ferreira da Silva, vulgo Lampião, não poderíamos de forma alguma retratar um pouco da história desses instigantes personagens sem falar desse pano de fundo que foi a batalha ao longo de quase um século envolvendo membros dessas duas oligarquias sertanejas.

Conta-se que tudo começou ainda em 1838, quando vivíamos a época do império; um representante do Partido Liberal, membro da família Carvalho, Francisco Aves de Carvalho foi acusado de mandante do assassinato do Coronel Joaquim Nunes Magalhães, do Partido Conservador, ligado à família Pereira. Ali começaria a guerra que seria nos idos de 1910 até 1922 pano de fundo para o surgimento deste que seria conhecido por Rei do Cangaço, Virgulino Ferreira.

Dentre as tantas “pelejas” entre as duas ilustres famílias, nos deteremos ao dia 15 de outubro de 1907 quando foi morto a tiros, o coronel Manoel Pereira da Silva Jacobina; o “Padre” Pereira, um ex-seminarista, daí o apelido. Filho do barão do Pajeú, patriarca do Clã dos Pereira, esposo de Dona Chiquinha e pai de Luiz Padre; Padre Pereira era irmão de outro Manoel Pereira, esse, pai do jovem Né Pereira, mais conhecido por Né Dadu e do menino Sebastião, futuro Sinhô Pereira. O assassinato de Padre Pereira a mando de João Nogueira, da família Carvalho, teve como motivo a disputa pela partilha de bens de sua própria esposa, uma Pereira, Dona Benuta, que era sobrinha do referido coronel, o que deveria vir a ser um elo para a pacificação das duas famílias acabou sendo a origem da fase mais sangrenta da luta entre os dois lados.

Sebastião Pereira, sentado, e Luiz Padre, de pé.
Padre Pereira, assumiu o comando da família após a morte de seu pai, o Barão do Pajeú. Era tido como um homem de paz, caridoso, que sempre estava fazendo o bem aos sertanejos do Vale do Pajeú. Por sua condição social, e seu caráter de liderança e conciliação, tinha a casa sempre cheia de amigos e agregados, por ser uma figura extremamente querida no seio da região, teria sido escolhido para ser morto pelo Clã adversário.
Dona Chiquinha a viúva, incutia no seio da família o desejo incontrolável da vingança e o ódio foi sedimentando ainda mais o coração dos membros do clã Pereira, principalmente a partir de seu filho único, Luiz Padre, na época com 16 anos. Ainda no mesmo mês de outubro, seu sobrinho, Né Dadu, cunhado de João Nogueira, matava dois membros da família: Joaquim, irmão de Nogueira e um primo deste. Ato seguido João Nogueira emboscava o cunhado com cerca de 20 homens em sua propriedade na Serra Vermelha, o fato é que também João Nogueira acabou sendo morto e a sanha de Né Dadu e seu grupo não parou por ai, ainda sob as ordens de D. Chiquinha mataram outro membro da família Carvalho, Eustáquio Carvalho, proprietário da fazenda Catolé, fato que trouxe ainda mais combustível para a ferrenha luta.

Em março de 1908 eclodia a resposta dos Carvalho que sob o comando de seu patriarca Coronel Antônio Alves do Exu ataca a vila de São Francisco, berço dos Pereira, à frente de mais de 300 cabras e jagunços. A defesa dos Pereira fica novamente a cargo de Né Dadu e pouco mais de 25 homens. O combate teria tido outro desenrolar se não fosse a chegada para ajudar os Pereiras de Manuel Pereira Lins, o Né da Carnaúba com cerca de 70 homens e do Coronel Antônio Pereira com mais de 60 cabras, que acabou com a fuga dos Carvalhos liderados pelo Coronel Antônio do Exu.

Naquela época os dois clãs dominavam a política do Vale do Pajeú, de um lado os Carvalho sob a liderança do Coronel Antônio Alves do Exu e seus familiares e agregados. De sua fazenda Barra do Exu, comandava vários outros coronéis de barranco, distribuídos em várias fazendas das redondezas de Vila Bela e outros municípios, com destaque para a fazenda Umburanas de Sindário e seus irmãos Antonio e José. Já os Pereira tinham em Manuel Pereira Lins, da fazenda Carnaúba seu líder maior, o Né da Carnaúba, que sucedia o Coronel Antônio Pereira, forçado a fugir para o Ceará em função de perseguições políticas.

Continua...
 
(*) Manoel Severo é criador e curador do Cariri Cangaço (www.cariricangaco.com)

SALVEI VIÇOSA DAS PALMEIRAS IMPERIAIS

François Silvestre

Meu caro Honório. Taí o relato do que lhe contei por telefone. Levo a público o episódio, no seu Blog, antes de publicar no Jornal. Foi assim: passando por Viçosa, com destino a Pau dos Ferros, vi uma praça nova, na saída para Portalegre, com mudas de palmeiras imperiais. Essa palmeira feia e inútil, que Oswaldo Lamartine me avisou ser portadora de azar para quem as plantava. "Quando a parte verde do seu caule ultrapassa a cumeeira da casa, a família começa a ter problemas financeiros ou de saúde". E disse mais, que a FJA carrega a maldição daquela palmeira plantada no seu interior. Fiquei matutando como salvar Viçosa daquelas bostas. Lembrei que Toinho do Miragem, meu irmão de criação, líder inconteste de Viçosa, é bastante surpesticioso. Aí lhe assustei, contando sobre essa madição das palmeiras. Ele reagiu: "Mas França, essas palmeiras estão no custo da praça". Eu o tranquilizei. "Pode descartá-las. A arborização típica da Cidade é mangueira.  Arborização criada por você". E assim foi feito. As mudas de palmeiras imperiais foram arrancadas e mangueiras plantadas nas suas covas. Prestei esse serviço a Viçosa. E digo agora o que disse a Toinho. Pode arrancar essas porcarias e jogar a responsabilidade pra mim. Foi isso aí, Honório.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

A ESTUPIDEZ NATIVA


François Silvestre


          Começa o ano e a repetição do assassinato das grotas na serra já dá sinais de sua presença.
         São chagas imitando a catapora que as queimadas e broques ferram as encostas e descidas de uma serra minimalista, bela e descuidada. Não há governo federal, estadual ou municipal. Não há um órgão sequer de defesa do patrimônio ambiental que se manifeste ou reprima esse crime. Nem Ibama, Idema, Prefeitura ou Ministério Público.
         Olhos d’água, passarinhos, caças, angicos, ipês, macaúbas, mutambas, ubaias, frejós, mororós, cajazeiras, jitiranas, cajaranas, coqueiros, catolés, trapiás, jucás, mucunãs, jatobás. Tudo a pedir socorro ao infinito. Órfãos e vítimas da irresponsabilidade e nulidade desse aparato todo, caríssimo ao bolso de todos nós. 
         Seriam todas árvores seculares. E pássaros trinando a vida. Juritis, corrupios, pintassilgos, sanhaçus da grota, canários; não existem mais.
         E das árvores existentes, são filhotes que escapam do broque de hoje para morrer no ano que vem. Não engrossam o caule, não frondam, não belam.
         Dorme nas gavetas da Câmara Municipal um PL elaborado por mim, com a garantia unânime dos vereadores de que viraria Lei. Faz mais de nove anos. Nem sei se ainda dorme ou se foi sepultado na lixeira.
         Cuidava das grotas, da regulamentação da caça, da proteção da flora e do patrimônio arquitetônico. Nas primeiras ameaças dos eleitores useiros na prática da destruição, um vereador propôs uma audiência pública. Seria uma audiência para perguntar à população se a serra merece ou não ser preservada. Mesmo com a cavilação da proposta, tal audiência nunca ocorreu.
         Agora, ano de eleição, declarei que não voto em nenhum deles. Um grande amigo, que é vereador e participou da reunião que aprovou o projeto, disse que vai retomá-lo. Já lhe pedi permissão para não acreditar. E mantenho o voto nulo.
         Num sítio aqui perto da minha casa, o proprietário juntou o folharal e tocou fogo. Matou vários cajueiros e chamuscou alguns outros. Matam fruteiras para plantar palmeiras imperiais. Esse monstrengo arbóreo que só faz sentido no Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
         Um Juiz, que já foi desta Comarca, plantou três delas em frente da sua casa inabitada. Sua folhagem cobriu a rede elétrica. Quando cai uma palma sobre os fios, nós ficamos de quatro a cinco horas sem energia. Pois a Cosern tem um escritório para atender trinta e duas cidades.
         Enquanto isso todo mundo se descabela se arrancarem uma folha do “maior cajueiro do mundo”. Como se houvesse cajueiro em todo o resto do mundo.
          Cá, no oeste, tem a maior oiticica do mundo, a maior timbaúba do mundo. Sem falar nos jumentos, abandonados na beira das estradas, cada um com o maior do mundo. Té mais.

domingo, 15 de janeiro de 2012

CAMUS ENTRE NÓS


Camus


Transcrito do NOVO JORNAL [Natal, 14 de Janeiro de 2012]

Por Franklin Jorge



Recorda-se Jorge Antonio de um tempo norteado por Albert Camus, cujo inconformismo e paixão pela Justiça contribuíam para o esclarecimento dessa sensação de incompletude e mal-estar moral que nos oprimia e fazia-nos pensar sobre o potencial ético da arte e sua relação com a política.

Torturado pelo desgosto de existir, Camus é acometido pelo pernicioso hábito do pensamento reflexivo que compreende e sintetiza que viver não tem cura. Viver é fazer mal aos outros e a si mesmo, através dos outros, assim resumindo e tornando compreensível a todos a essência mesma do existencialismo – “o inferno são os outros”.

Até então não conhecera, entre os mestres do desespero, nenhum outro pensador mais apto do que ele para excitar a nossa inquietação de adolescentes diante da vida que se nos afigurava desmesurada e sem sentido.

Seu prestígio só rivalizava então com o de Hermann Hesse, ambos lidos em todo o mundo por centenas de milhares de jovens rebelados contra a guerra. Sempre atroz, em todas as culturas.

Muitos de nós, porém, ignorávamos ou sabíamos vagamente que o escritor franco-argelino, agraciado com o prestigioso Prêmio Nobel de Literatura, escrevera em seu diário de viagem à América do Sul e nele registrava com acuidade e argutamente, de maneira crua, suas impressões do Brasil, que visitou em 1949 – ainda sob os efeitos dissolventes da síndrome de A Peste, romance sombrio e alegórico que se lia em toda a parte, entre os rebeldes apregoadores da paz. – Lemos, Jorge Antonio e eu, com sofreguidão e desconforto os escritos de Albert Camus.

No dia 15 de julho, após resistir por duas vezes ao desejo de suicidar-se em alto mar, Camus anota em seu Diário Viagem que ao amanhecer viu à distância as luzes do Rio de Janeiro, cidade espremida entre o mar, a baía e as montanhas, vivendo sob a égide algo folk “de um grande e lamentável Cristo luminoso”.

Aqui, impressionado com a insolência do luxo mesclado à miséria, seu coração treme diante de tanta admirável desumanidade.

Camus vê o Brasil como uma terra sem homens. Um país submergido numa realidade intolerável para alguém incapaz de conceber um mundo absolutamente desprovido de amor.
Andando por intermináveis subúrbios num ônibus sacolejante, Camus logo percebe em meio ao caos que os motoristas brasileiros não respeitam a vida; ele os descreve como loucos alegres ou loucos frios sádicos, o que – sessenta anos depois – mantém a atualidade, apesar de todas as leis restritivas criadas desde então.

Camus pensava no suicídio como o único problema filosófico pertinente. E, olhando à sua volta, tem premonições sombrias e inquietantes. Observa, Camus, as tribos e intui, – ao pensar sobre essas multidões que não param de crescer -, que, num dia não muito remoto, asfixiarão a terra. Levam-no, ainda, a um terreiro de macumba em distante subúrbio carioca.

Ao visitar a Bahia, como parte dessa viagem ou peregrinação cultural pelo inferno tropicaliente, Salvador, em seu traçado urbanístico, parece a Albert Camus uma casbah fervilhante.

Recife, sua próxima parada, pareceu-lhe uma terra vermelha devorada pelo calor. Positivamente Camus gosta do Recife e o descreve como uma espécie de “Florença dos trópicos”.

De volta ao Rio, antes de partir para São Paulo, sua esperança é que nasça no Brasil uma nova cultura e que a América do Sul – apesar da perda da fé do desencanto característicos dos tempos modernos – talvez ajudem a temperar a besteira mecânica que domina e corrói o mundo.