quinta-feira, 2 de junho de 2011

"DEMIAN", POR HERMAN HESSE

Caim e Abel
generacionnepantla.blogspot.com


Honório de Medeiros


                   Aqueles que são de minha geração e gostam de ler, conhecem a obra de Herman Hesse, principalmente “Sidarta”, no qual ele romanceia a vida de Gautama Buda.

 Quem, no entanto, se deixou verdadeiramente fascinar pelos livros do escritor - e foram muitos na década de 60/70 -, leu praticamente tudo que foi traduzido para o português: “O Lobo da Estepe”; “O Jogo das Contas de Vidro”; “Demian”; “Gertrud”; “Pequenas Histórias”; “Narciso e Goldmund”...

                   Dentre eles é possível que “Demian” seja considerada um livro menor. Na verdade, a crítica faz loas a “O Jogo das Contas de Vidro” e, em menor escala, a “O Lobo da Estepe”, embora o mais conhecido seja, sem qualquer sombra de dúvida, “Sidarta”.

 Em “Demian”, Hesse nos apresenta a um adolescente que fascina um seu colega de escola – o relator da história – principalmente graças a sua mãe, mulher bela e misteriosa, e de sua iniciação em uma seita religiosa denominada “Cainismo”.

                    O que seria esse “Cainismo”? Quando essa questão aparece na convivência entre “Demian” e seu interlocutor aquele lhe apresenta, como ponto-de-partida para o conhecimento do Cainismo, uma longa relação de personagens condenados pela história oficial: é o caso de Caim, o irmão de Abel, cujo nome batiza a seita; é o caso de Eva; é o caso de Judas Iscariotes.

 Vale ressaltar que o “Cainismo” foi resgatado da total obscuridade, no século XIX, por Lord Byron, mas hoje voltou a mergulhar, até onde se sabe – é bom frisar -, nos subterrâneos profundos do Père Lachaise, e é possível que somente exista, enquanto referência histórica, em obras emboloradas de historiadores praticamente desconhecidos, a grande maioria compondo, também, o “Cemitério das Obras Esquecidas” que, até onde se sabe, fica em Barcelona.

                   A pergunta que “Demian” faz a seu interlocutor durante todo o transcorrer da trama é se haveria Abel sem Caim; o Homem, sem Eva; Jesus, sem Judas. Evidentemente, a pergunta implícita e fundamental por trás de sua doutrinação é se haveria Luz sem Trevas; se haveria o Ser, sem o Nada. O que nos remete, cada vez mais longe no tempo, até o Maniqueísmo do qual foi seguidor, por um bom tempo, ninguém mais, ninguém menos, que Santo Agostinho.

                   E que não se livrou de sua doutrinação inicial: que é a Civitas Dei senão a contraposição à Civitas Terrena, Deus versus Demônio? Luz versus Trevas?

                   Não seria essa percepção dualística da realidade o cerne do Catarismo, professado pelos Perfeitos, que a Inquisição, no Século XIII, varreu da face da França mandando matar todos naquela que seria a Primeira Cruzada e que foi liderada por ninguém menos que São Luis?

                   Questões como essa suscitaram ecos sólidos durante os famosos e psicodélicos anos 60/70, quando se questionava o modelo de vida que a sociedade materialista ocidental impunha a seus integrantes e ao resto do globo.

Havia o fascínio pelo Oriente e seu estilo de vida, enquanto contraponto ao capitalismo, mas não aceitava o marxismo. Desse fascínio e suas conseqüências somos todos herdeiros, de uma forma ou de outra, principalmente daquilo que seus maiores representantes, os “hippies”, nos deixaram de legado, e não foi somente sexo, música e drogas.

                   Ainda hoje há, em alguns espaços diminutos, uma preocupação esotérica com a vida que parece muito distante do feijão-com-arroz cotidiano da luta pela sobrevivência: discutem-se óvnis, vida após a morte, holística, e assim por diante.

Mas também há espaços diminutos que resultam de preocupações que têm raízes solidamente firmadas no concreto, no real, e que são voltadas para a compreensão, por exemplo, dos efeitos da existência da antimatéria.

Tal questão poderia ser, em uma perspectiva descrita por Hesse, nada mais, nada menos, que o dualístico embate entre Luz e Trevas, para o qual o “Cainismo” foi, antes de tudo, em linguagem cifrada, uma descrição da realidade.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

FRANKLIN JORGE VEM AÍ COM "O ESCRIVÃO DE CHATAM"

Do blog: Em breve Franklin Jorge lança "O Escrivão de Chatam", para o qual o grande poeta, contista e crítico literário Anderson Horta escreveu o Prefácio aqui publicado em primeira mão:

 "Franklin Jorge abre seu livro de ensaios com uma citação sarcástica de Shakespeare, alusiva ao perigo dos homens da pena e do tinteiro.E já na página em que nos lança em seu universo expressivo, “Da Arte doEnsaio”, trazendo à baila fina observação de Lúcia Miguel Pereira, faz-nos entender o ensaísmo como “a expressão cabal de um humanismo inquiridor, vivo e inquieto”, moldada consoante a lição de Borges, isto é, de forma a induzir o deleite do leitor; longe, portanto, de certas “fórmulas acadêmicas que se comprazem em excluir o prazer do texto”. E tece a sua teia a partir dos fios produzidos por Bacon e Montaigne, levando-nos de Oscar Wilde a Baudelaire,de Thomas Mann a Ítalo Calvino, de Saramago a Truman Capote e Sábato e Vargas Llosa.

Revolta-se contra a praga moderna dos “escritores que prescindem do convívio dos livros”, do escrever que se tornou “um exercício de frivolidade que apetece a todo mundo, inclusive aos ágrafos”. Falta-nos, depreende-se do que diz e os fatos no-lo comprovam, uma eficiente política de propiciamento de bibliotecas em todo o território pátrio, de apoio ao livro e a seus fautores, de fomento ao hábito da leitura.

Os ensaios de Franklin Jorge são breves e ágeis, mercê, decerto, de sua destinação primeira –o jornal,a revista, a internet–, mas não menos do espírito agudo e moderno que anima sua pena; e são excitantes e saborosos, como a página que dedica ao hábito do café entre os intelectuais franceses, de Madame de Sévigné a Balzac, hábito que se universalizou e, contrariando a previsão da grande epistológrafa, persiste até hoje (meio diluído, em certos casos, como no café com leite de Proust e deBorges...). Transcrevo, aliás, um trecho dessa página, como demonstração das qualidades de pensamento e de estilo do nosso ensaísta:

“Borges, de paladar pouco exigente e apreciador de sopas,considerava o café com leite uma das poucas misturas perfeitas que há. Nisso concordava o autor de Em Busca do Tempo Perdido, que no fim da vida se alimentava exclusivamente de café com leite, abrindo exceção apenas, em ocasiões especiais, para um prato de batatas acompanhado de uma taça de champagne borbulhante e evanescente. Era o cardápio que pedia invariavelmente no Ritz,para si mesmo, e o que comia em casa quando tinha convidados para jantar, aos quais obsequiava, no entanto, com o bom e o melhor em matéria de gastronomia francesa. Em não sendo avaro nem egoísta, não impunha sua dieta minimalista aos demais.”

Franklin defende a chamada crítica impressionista, por capaz de estimular a leitura do autor analisado, em oposição à crítica universitária ou acadêmica, em geral, segundo ele, “firmada num jargão de especialista”que a torna enfadonha e desencorajadora. Isso nos lembra o saudoso ensaísta José Augusto Guerra, que, ainda antes de 1974, quando saíram seus Testemunhos de Crítica (por sinal, pela editora da Universidade Federal de Pernambuco), tomava já –a frase é de Waldemar Lopes– “pertinaz defesa da crítica impressionista”, sobrepondo “oimponderável da expressão estética” às “rígidasleis das ciências exatas”.

Com efeito, Guerra,dotado embora de notável aparato teórico, não se conformava com a frieza objetiva dos partidários de certos métodos críticos em voga, e concluía o ensaio primeiro de seu livro exatamente com estas palavras:

“Exercício de esterilidade crítica aquele em que o crítico,apesar de todos os levantamentos do quadro literário, das esquematizações filosóficas, das sistematizações sintagmáticas, permanece enlevado à cata dos elementos objetivos e teme dizer o que pensa da obra, com medo de incidir (estranha postura científica) numa falta de natureza subjetiva.”

Para o escritor alagoano, que se radicou em Brasília e morreu tragicamente na praia recifense de Boa Viagem, aqueles críticos que não ousam julgar ou opinar não saem dos “exercícios de paciência, juntando os elementos da estrutura verbal, como se a obra de arte possa parecer mais obra de arte quando transformada em frio painel anatômico de peças soltas,diligentemente catalogadas e numeradas”.

Revela Franklin Jorge extraordinária bagagem de leitura, perspicácia na observação, desenvoltura na manifestação de suas idéias políticas e sociais, capacidade tanto de admirar quanto de combater, e o dom de despertar e manter a atenção do leitor – que não é apanágio tão-somente do bom ficcionista, mas de todo bom escritor.

Muito haveria ainda que dizer sobre este livro agradável e enriquecedor, interessante e apto a conduzir nosso interesse por entre um elenco de escritores de variada origem e diverso cariz, dignos todos de nossas estantes e de nosso conhecimento. Mas o leitor o verá por seus olhos, sem necessidade da trôpega orientação deste que é, também,um admirador atento da ensaística de Franklin Jorge.

E por aqui vou ficando,que o texto do apresentador não exceda em tamanho os apresentados...

Boa leitura!"

CARTAS E BILHETES ANTES DE LAMPIÃO EM MOSSORÓ EM 13 DE JUNHO DE 1927

Kydelmir Dantas

Por Kydelmir Dantas (*)


No capítulo da ‘Resistência ao Cangaço’, em Mossoró, há mistérios que ainda não foram desvendados pelos historiadores e/ou pesquisadores.

 Além de Isaías Arruda, de Aurora – CE, quem mais deu apoio ao ataque de Lampião e seu bando na Paraíba, no Pernambuco e no RN?

 Quem realmente arquitetou o plano (que sempre foi divulgado ser da responsabilidade de Massilon Leite)?

Qual o motivo principal, além da arrecadação do dinheiro, e por quê a agência do Banco do Brasil foi sequer molestada com um tiro?

 Qual a razão da trincheira de Rodolpho Fernandes ter sido o alvo principal e, será por isso que a mesma foi a melhor preparada para o revide?



Somando-se a isto há indícios de que o intendente de então, Rodolpho Fernandes, tinha a certeza de que seria o principal alvo deste ataque, devido a avisos e correspondências recebidas da Paraíba.



Raul Fernandes em A MARCHA DE LAMPIÃO, escreveu à página 29, que “em dezembro de 1926, Joaquim Felício de Moura, sócio da firma Monte & Campos; Primo, viajava pelo interior da Paraíba. Na cidade de Misericórdia (atual Itaporanga), encontrou-se com destacado comerciante e fazendeiro, Antonio Pereira de Lima” e este lhe contou do plano de Jararaca, Sabino, Massilon e Lampião de assaltarem Mossoró com 400 homens.

Inteirou-se sobre a possibilidade de defesa da cidade e lhe pediu que informasse ao prefeito Rodolfo Fernandes esses fatos. Rodolpho, ao tomar conhecimento deu ciência aos familiares e amigos mossoroenses; novamente Raul cita: “Daí por diante os boatos se sucederam. Dos remotos sertões de Pernambuco, Paraíba e do Ceará surgiram indícios dos agenciadores da vergonhosa empreitada”.

 O que nos leva crer na citação de nomes dos prováveis coiteiros.



Essa carta foi levada ao conhecimento dos amigos de confiança do prefeito que estavam preparando a estratégia para a formação das trincheiras nos pontos principais da resistência. Dentre eles, Joaquim Felício de Moura, Afonso Freire de Andrade e outras pessoas mais chegadas confirmaram tê-la visto nas mãos do Coronel Rodolfo.

 Para a família, dias após o ataque, Rodolfo Fernandes fez referências sobre a missiva do amigo paraibano de Pombal.



Outra confirmação do envio da carta está no artigo: “Major Argemiro Liberato de Alencar: o amigo de Rodolfo Fernandes", escrito pelo seu neto  Geraldo Alves de Alencar, hoje residente em São Luiz do Maranhão, que cita o seguinte sobre o avô: “Era fazendeiro, proprietário da Fazenda “Estrelo”, situada em sua cidade natal. Exercia também a profissão de comerciante, trazendo da Paraíba algodão transportado em costas de burros e vendido em Mossoró, estado do Rio Grande do Norte. O principal comprador era a firma cujo maior acionista era seu amigo e compadre o Cel. Rodolfo Fernandes. Em suas viagens como almocreve retornava a Pombal com sal e outros gêneros. Mesmo tendo um sobrinho nas hostes do cangaço, o qual atendia pelo nome de Ulisses Liberato de Alencar, Argemiro era profundamente contra o banditismo rural, chegando inclusive a avisar ao Cel. Rodolfo Fernandes, quando este era prefeito de Mossoró em 1927, que o cangaceiro tencionava atacar a cidade considerada capital do oeste potiguar. Declaradamente anti-Lampiônico, Argemiro Liberato de Alencar nunca chegou a ser perseguido pelo “rei do cangaço” porque Lampião sabia da amizade existente entre ele e o Padre Cícero.”



Afora essas cartas, há o registro dos famosos bilhetes trocados antes do ataque, um deles escrito pelo Coronel Antonio Gurgel, refém de Lampião, e respondido por Abel Freire Coelho a pedido do Prefeito, e o famoso, de Lampião, escrito de próprio punho, com a resposta à altura e escrita, desta vez, por Rodolpho.



Essa documentação foi, à época, publicada no jornal Correio do Povo, do jornalista José Octávio Pereira de Lima, como um Suplemento especial. Afinal, quem era o coiteiro de Lampião no Rio Grande do Norte? A dúvida continua após mais de 80 anos da resistência.



Fontes de Pesquisas:



ALENCAR, Elidete. Informações sobre Argemiro Liberato de Alencar. Natal/RN: Mimeo.(inéd.), 2003. 2 p.



FERNANDES, Raul. A Marcha de Lampião. Coleção Mossoroense. 6ª edição. 2005.



MELLO, Frederico Pernambucano de. Guerreiros do Sol: O banditismo no Nordeste do Brasil. Recife/PE: Ed. A Girafa, 2004.



(*) Pesquisador, sócio da SBEC e do ICOP.

terça-feira, 31 de maio de 2011

CARLOS SANTOS, NOSSO ENTREVISTADO DE SÁBADO PRÓXIMO, LANÇA LIVRO

Do Tio Colorau:

LIVRO “SÓ RINDO 2″ SERÁ LANÇADO EM 21/06

No próximo dia 21 de junho, às 19h30, será lançado o livro Só Rindo 2, do jornalista e blogueiro Carlos Santos. A obra tem prefacio do professor Honório de Medeiros e será apresentado pelo empresário Milton Marques de Medeiros.


O evento ocorrerá nos jardins da TV Cabo Mossoró.


A obra Só Rindo 2 traz inúmeros causos políticos ocorridos em Mossoró e no Rio Grande do Norte.

O AMOR

Shakespeare

"O amor pode tornar as coisas baixas e vis em dignas, excelsas. O amor não enxerga com os olhos, mas com a alma e, por este motivo, o alado Cupido aparece cego nas pinturas. Nem na mente do amor foi registrado qualquer discernimento. Asas...

Shakespeare, Sonho de Uma Noite de Verão"

segunda-feira, 30 de maio de 2011

ENTREVISTA COM CARLOS SANTOS SAI SÁBADO

Carlos Santos
 
 
CARLOS SANTOS, O "REBELDE COM CAUSA", FOI ENTREVISTADO POR ESTE BLOG.



SAIBA, ENTRE OUTRAS COISAS, ACERCA DE SUA OPINIÃO ACERCA DO GOVERNO ROSALBA CIARLINI.



VEJA SÁBADO, DIA 3 DE JUNHO, O RESULTADO.

O IDEALISMO RADICAL É A LOUCURA DA RAZÃO

fama.zupi.com.br


Honório de Medeiros

O idealismo radical é a loucura da Razão: nele estamos à mercê de uma realidade que somente existe em nossa imaginação - o sonho de um semideus demiurgo-, e, nele, sonhamos que sonhamos.

A instigante realidade imaginária de Matrix, única e exclusivamente criação em nosso sonho conduzido e coletivo, onde sonhamos que estamos vivos, é uma instigante analogia. Há, também, a semelhança com a realidade imaginária criada por Maya, a deusa hindu, que nos faz acreditar que estamos vivos e conscientes quando, na realidade, nada mais fazemos que sonhar.

domingo, 29 de maio de 2011

FRANÇOIS SILVESTRE: "ANALFABETEMO-NOS!"

Por François Silvestre
(pulicado no Novo Jornal/RN)

 Até que enfim a ignorância ganhou aliados públicos e não envergonha mais. Aliás, a ignorância é a mais universal das categorias do conhecimento.

 E não me venham com a desculpa de que a sabedoria popular produz a língua certa. A fala do povo não tem nada com isso. Ela é a mãe das línguas, em todas as terras. Mas o estudo e a preparação culta preservam a língua de falar e escrever no momento de expor a compreensão científica, filosófica e de humanidades. Não se faz ciência ou aprendizado com expressões do boteco ou da esquina.

 A língua portuguesa nasce da borra do latim, de um rebotalho perdido da língua culta desaparecida. Uma algaravia, que do Lácio confundia-se com o falar galego da Galícia. Redundância? Não. Poesia.

 Em fins do Século Quinze, Gil Vicente, no teatro, dá ao português fisionomia morfológica. No Século seguinte, Camões presenteia a língua do seu falar com a estrutura sintática que praticamente faz nascer o idioma. O que, “mutatis mutandis”, Chaucer fez com o inglês. Essa é a nossa língua. “Quero roçar minha língua na língua de Luiz Vaz de Camões”.

 Pois bem. Vivemos o tempo da estupidez culta. No Direito e no Idioma. Toda burrice será coroada em nome da pressa e da ética de miçanga. Com desculpas aos quadrúpedes.
 A presunção de inocência que aprendemos nas lições clássicas do Direito Penal, não existe mais. Todo mundo agora é culpado ou suspeito. Só os éticos de miçanga são puros, santos e castos. Numa redoma ou bolha de pulhas éticos. Sem eficácia alguma. Corrupção e criminalidade continuam na cara deles, desafiando a pose jovem da estultice e fanfarra.

  Nas Ações que tenho recebido pelo chamado dessa tchurma, a ignorância não é apenas jurídica. Essa gente não estudou português nem o básico do colégio. Estou fazendo uma relação dos absurdos cometidos. Matam Camões e esfolam Gil Vicente.

 Vamos todos “nos analfabetar”. E vamos todos “nos desinocentar”. Para que nos atualizemos.

 É a fisionomia de um tempo. Onde a mobilidade social não se dá pelo trabalho, mas pela esmola. E a preguiça mental dos dirigentes da Educação, após concluírem que se a Educação não tem jeito, o jeito é investir na deseducação.
 Se a saúde não tem jeito, invista-se na doença. Se a segurança não tem jeito, invista-se na delinquência.
 E se a Democracia nossa não é lá grande bosta, invista-se na merda exposta para não morar dentro da fossa.

 A cara suja do nosso tempo. Tudo se resolve com espaço na mídia. Esse deus invisível e presente, que substitui as crenças de salvação pela venda de lotes no céu.
 Salas refrigeradas e linha direta com as redações. Claridade da investigação? “Meu inquérito por um holofote”. O povo e o resultado são detalhes de pouca monta. Você sabe o que é Parcela Autônoma? Té mais.

HOMEM, QUEM ÉS?

nasasasdomundo.blogspot.com


Honório de Medeiros                                 

Esse homem que o acaso colocou em minha frente é uma incógnita. Nada sei a seu respeito. Se observo os detalhes que a sua aparência externa coloca ante meus olhos, e concluo algo, posso incidir em uma oceano de erros. Afinal, sob seu verniz de civilização pode se ocultar qualquer ignomínia.

Não faz pouco tempo, foi ele gentil com uma criança. Vi, mesmo, de soslaio, a mãe lhe sorrir complacente, como quem acha muito natural receber, sua cria, as atenções do mundo. O gesto me fez lembrar as contradições do ser humano. Ele mesmo, o observado, que desarrumou, com um afago, os cachos do cabelo da criança, em outra ocasião, outra circunstância, uma guerra, talvez ordenasse um bombardeio que vitimaria tantos e tantos sorrisos infantis.

Por certo não falo a mesma linguagem que ele. Quantas formas há de entender uma só palavra? Malsã atividade, a dos lógicos, a dos filósofos da linguagem, que pretendem descobrir o meio de diminuir a distância entre aquilo que percebo e o que digo. Se lhe chamasse a atenção e perguntasse algo, poderíamos divergir tanto, e acerca de coisas tão banais...

"Todavia, entre mim e esse homem glacial, sinto todos os espaços vazios que separam os homens". É como disse Saint-Exupèry, em um artigo para o Paris-Soir, em 1935, contando sua experiência de viajar, à noite em um trem repleto de mineiros poloneses que voltavam à sua terra natal, expulsos da França pelas contingências da economia.

Vazios semelhantes àqueles expressados por Elliot, em "The Waste Land": a angústia da constatação da impossibilidade da comunicação humana; a percepção de sua solidão essencial, primitiva, indescartável.

"Estou mal dos nervos esta noite. Sim, mal. Fica comigo.
Fala comigo. Por que nunca falas? Fala.
                                  Em que estás pensando? Em que pensas? Em quê?
Jamais sei o que pensas. Pensa."

"Penso que estamos no beco dos ratos
Onde os mortos seus ossos deixaram."

"Que rumor é este?"

"O vento sob a porta."

"E que rumor é este agora? Que anda a fazer o vento lá fora?"
"Nada como sempre. Nada."
"Não sabes".

"Nada? Nada vês? não recordas
Nada?"

"Recordo-me
Daquelas pérolas que eram seus olhos."

(Uma Partida de Xadrêz, Elliot).

Poderia o amor, esse sentimento tão tipicamente cristão, aproximar os homens? Desnudar sua alma, lhe fazer não rir, nem chorar, mas compreender, com queria Spinoza? Dar, a eles, a capacidade de transcender a mesquinha luta pela sobrevivência, que coloca em lados opostos os que deveriam semear juntos?

Ou essa é uma missão utópica, e não há tempo para sentir quando não conseguimos refletir acerca dessa misteriosa rede de aliciamento e cooptação que nos induz a darmos o pior de nós mesmos em praticamente todos os momentos de nossa vida?

Podemos ter alguma esperança, mesmo depois de tantos mil anos de aperfeiçoamento na capacidade de destruir, matar, e nenhum progresso quanto ao ideal de fraternidade humana?

Mas Saint-Exupèry, esse tão injustamente banalizado filósofo da melancolia, da nostalgia, já dissera: "É absolutamente necessário falar aos homens". Em sua "Carta ao General X", escrita em La Marsa, perto de Túnis, julho de 43, para o “Le Figaro Littéraire”, ele denuncia: "Ah!, General, só existe um problema, um único, em todo o mundo. Restituir aos homens uma significação espiritual, inquietações espirituais. Não é possível viver-se só de geladeiras, política, orçamentos e palavras cruzadas, não é mesmo?"

Um sentido para a vida.

Tem a vida sentido?

Se nos indagassem: "homem, que és tu?", teremos de responder "aquele em cuja biblioteca os livros de poesia perderam seu lugar para os de computação?".


Meu companheiro anônimo se fora. Tinha perdido, eu, a chance de lhe falar acerca de tudo isso que poderia nos aproximar ou afastar: a solidão, o sentido da vida... Não seria dessa vez que construiríamos uma ponte entre a clausura de nossas almas.

sábado, 28 de maio de 2011

FRANKLIN JORGE, O INCONFORMISTA UTÓPICO

Franklin Jorge

 “Atingi uma idade na qual que posso mensurar a extensão do meu fracasso. Em nenhum momento da minha vida, antes de me tornar o que sou, conjecturei de abdicar do meu projeto – ou utopia, caso queira – de, através da elaboração de uma obra que me justificasse no futuro, dar o testemunho de minha existência: o breviário de uma existência dominada pelo ato de escrever. Sempre estive convicto de que nascemos para a realização de uma obra capaz de persuadir o mérito”. – Assim o escritor e jornalista Franklin Jorge se apresenta em conversa com este entrevistador, Honório de Medeiros.

[...]

Nascido no Ceará - Mirim e criado no Assu, em uma propriedade rural que explorava, quando nasceu, a cultura do algodão, a que chamavam de “ouro branco”, e foi pioneira na exploração da agricultura irrigada naquela rica e peculiar região do estado, Franklin Jorge pertence – ao seu Ceará - Mirim natal e ao Assu telúrico e primordial em sua sensibilidade; pertence, também, ao humanismo com que se nutriu o seu precoce talento.

Eis, na íntegra, a entrevista:

Honório de Medeiros: Vc saiu do NJ por quê?

Franklin Jorge: O jornal viu-se constrangido a fazer cortes, como outras empresas que estão sofrendo com os prejuízos causados à economia e aos demais setores pelo governo do ex-presidente Lula. Alguns acumularam editorias e funções. Eu continuo escrevendo meu jornal aos domingos.

Se assumisse a Fundação José Augusto [FJA] quais seriam suas primeiras medidas?

Franklin Jorge: Devolveria a instituição à Cultura, contrariando uma prática banal e corriqueira – “serviço”, como queiram - que tem prestado em quatro décadas a gestores inescrupulosos, arrogantes, cheios de si, auto-suficientes e inócuos em suas eventuais ou pontuais realizações que atendem tão somente e sempre à satisfação de uma fome indormida e contrariada de “poder” e notoriedade de egos doentes e sem pensamento; uma gente que tem mamado nas tetas da quê, aqui no Rio Grande do Norte, é velha e flácida – a cultura “pensada” pelo “oficialismo”.

Reuniria os reais talentos da nossa terra, independentemente de suas possíveis idiossincrasias e credos (estéticos, ideológicos, políticos, etc.), e transformaria suas idéias e utopias em ações plurais, concretas e interativas.

Tornaria a Fundação José Augusto instrumento da Cultura e extinguiria qualquer ranço de personalismo vigente, de homenagens auto-impostas, de cabotinismo consagrado por todas as gestões que deram o ar de sua graça e enfeitaram por um momento a comédia da cultura potiguar; masturbações, enfim, que só satisfazem o ego dos gestores nomeados por interesses partidários – ou como ocorre vulgarmente em todos os governos, por “afilhadismo”, como vimos com o chefe da Casa Civil de Micarla de Souza, empregando de uma só tacada dois filhos seus em sinecuras na Câmara Municipal de Natal.

 Escusado dizer que nunca deram expediente... Enfim, velhas práticas que meramente extorquem ou exaurem os recursos públicos sem reverter em proveito efetivo para a Cultura e os potenciais consumidores de Cultura.

Efetivaria mudanças estruturais e avançaria com uma política de cultura debatida e bem pensada por setores que produzem ou consomem cultura na brava terra de Poti, índio velho que vinha a ser um comedor de cabeças de camarão.

Programaria uma política de cultura pluralista, absolutamente não impositiva, democrática – como deve ser a cultura antenada com os cidadãos. Enfim, valorizaria o uso dos nossos impostos extorsivos e malcuidados.

Decretaria obrigatório o dinamismo, a insatisfação, o exercício experimental da liberdade, a qualidade em tudo que diz respeito à cultura sem demagogia e populismo encruados e, antes de qualquer outra deliberação, aboliria o comodismo e o não ter o que fazer na Fundação José Augusto.  Creio que todos nós já sonhamos alguma vez com o dia em que a FJA deixaria de ser o túmulo da cultura norte-rio-grandense.

Quem, no RN, escreve bem hoje?

Franklin Jorge: Em prosa, Marcelo Alves Dias que acaba de lançar em Natal com grande sucesso seus “Ensaios Ingleses” para o qual que tive o prazer de escrever as orelhas; Rodrigo Levino, o que há de novo e instigante em nossas letras; Adriano de Souza; Woden Madruga, que jamais publicou um livro na vida e tem recheio para vários; Jarbas Martins e Márcio de Lima Dantas, meus críticos prediletos; Sheyla Azevedo; Nivaldete Ferreira; Bartolomeu Correia etc. Em poesia, hoje, no Rio Grande do Norte, qualquer calhorda escreve em versos e arrota em sonetos.

 A Sociedade dos Poetas Vivos e Afins, por exemplo, tem mais de 500 associados, ou tinha, pois li isso faz alguns anos, quando ainda não se difundira os blogues. Agora talvez tenha 15 mil! Poetas, aqui, nascem e morrem como moscas.

Quando vc vai voltar a publicar? Há algum livro para sair?

Franklin Jorge: Só Deus sabe... Não faço parte de panelinhas e cheiro mau para o “oficialismo”... Tenho, a despeito dessa contingência, 44 títulos inéditos, além dos dois últimos volumes do “Spleen de Natal”. Tenho, programado pela Editora Flor de Sal, “O escrivão de Chatam”, uma seleção do que escrevi sobre livros e autores estrangeiros (Proust, Shakespeare, Balzac, Osamu Dazai, Mishima, Marguerite Yourcenar, Wilde, George Orwell, Thomas Mann, Luisa Mercedes Levinson, Borges, Elias Canetti, Ernesto Sábato, Montaigne, Maquiavel, José Saramago, Eça de Queiroz, Baudelaire, etc.). Porém não tenho mais ânimo para rever textos, cortar, emendar, e, assim, vou sempre protelando a publicação...

 Ah, o livro tem um prefacio magnífico de Anderson Braga Horta, da Academia Brasiliense de Letras. É meu livro preferido, ao lado de “Fantasmas Cotidianos”, que espero reeditar; já está revisto e aumentado e continua sendo, em minha opinião, o melhor de meus livros.

 O jornal impresso e o livro tradicional estão condenados?

Franklin Jorge: O jornalismo está sendo reinventado na blogosfera e é muito mais dinâmico e pode ser, ainda, mais profundo, abrangente, interativo, pois é a comunicabilidade mais completa e capaz de se irradiar instantaneamente numa mídia planetária livre, que acolhe a participação universal. A edição impressa ainda não avançou nesse processo e corre sério risco, mas creio que, afinal, se casando com as novas mídias e tecnologias da comunicação, há de sobreviver para um público que cada vez mais se faz critico da informação. Quanto ao livro – como o conhecemos -, creio que caminha para ser um objeto de culto ou de fetichismo para alguns grupos de intelectuais e fetichistas que se deliciam com um belo artefato gráfico ou com o que transmite e contém o livro cultuado por uma confraria de leitores obsessivos. Nós leitores seremos perseguidos e caçados pela policia de governos totalitários que se foram gestando por socialistas e comunistas de plantão, ou seja, de partidários e adeptos dos regimes de mão única, totalitários e tirânicos, como vemos pipocar em toda a parte graças ao silêncio dos bons. Eu, pessoalmente, sempre pensei que chegaremos a viver nesse tempo de exclusões e tortura. E, como os antigos cristãos que se reuniam nas catacumbas de Roma para ouvirem a Palavra, também seremos perseguidos e nos esconderemos para discutir e desfrutar da suprema criação da inteligência humana – o Livro. A obra-prima do homem.

De todas as polêmicas nas quais se envolveu, qual a que vc considera mais interessante?

Franklin Jorge: Sem dúvida a que surgiu em Mossoró, há uns vinte anos, quando fui perseguido pelo filho de Dix-huit Rosado, prefeito já muito velho e sem o tino certo que se deixou tiranizar por um filho pobre de espírito e descompensado.

Creio que fui a primeira pessoa, nessa época, a enfrentar de fato a oligarquia que sustenta os interesses da família Rosado, em mais de sessenta anos de exploração de uma indústria florescente – a política, patrimônio e usufruto de algumas famílias que se especializaram na exploração do Rio Grande do Norte. Ele moveu mais de vinte processos contra mim e foi perdedor em todos. Antes, quis me calar usando a força bruta.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

REFORMA DA REFORMA DA PREVIDÊNCIA

serjusmig.org.br

Honório de Medeiros


É razoável entender-se que o pano-de-fundo da questão previdenciária é de natureza estritamente financeira.

Como é óbvio constatar que essa questão demanda soluções urgentes e estruturais não atendidas pelas reformas anteriores.

É preciso levar em consideração que a experiência mundial aponta para a migração, mesmo em países avançados, no que concerne a investimentos sociais, para modelos distantes do regime próprio de previdência puro e simples, haja vista o exemplo da Espanha, Itália e os Estados Unidos da América do Norte. Saliente-se que a Noruega, a Inglaterra, e a Holanda, hoje, possuem um regime geral MAIS previdência complementar.

                                      Mas é preciso levar em consideração a compreensão histórica de que o tratamento diferenciado dado ao servidor público é uma política de Estado, calcada na distinção estrutural entre emprego e atribuição pública.

A aposentadoria diferenciada seria uma recompensa às exigências impostas pela responsabilidade, lealdade e sacrifício dos servidores públicos.

 É bem verdade que há um elevado custo financeiro, hoje, para a manutenção desses paradigmas. E esse custo, materializado em déficit previdenciário, tende a evoluir de forma assustadora para níveis que comprometem ou comprometerão a capacidade de investimento social e custeio da Administração, deixando desabrigados segmentos consideráveis da Sociedade e suas demandas, mesmo com as modificações na política de benefícios introduzidas pelas reformas efetuadas.

                                      Entretanto a reforma da previdência não pode somente se concretizar ao custo do escorchamento do servidor público. Ele é apenas o elo mais fraco da rede.

Se parece natural, para o Governo Federal, optar pelo modelo de Regime Próprio com Previdência Complementar, e tomar medidas legais que modifiquem estruturalmente a política de benefícios, também é necessário investir profundamente na compreensão de que essas medidas não resolverão, de “per si”, a questão do déficit previdenciário, e que o servidor público não deve ser espoliado mais do que já o foi e tem sido.

No atual contexto econômico-financeiro, não é possível qualquer Ente da Federação construir uma realidade previdenciária saneada sem que a União os desafogue quanto ao pagamento de sua dívida pública, por exemplo. Esse ponto é crucial.

É preciso que o Governo Federal entenda que os atuais indicadores macroeconômicos não permitirão vôos maiores na solução desse problema estrutural sem que seja discutida uma participação mais efetiva, de natureza financeira, da União, junto aos Estados e Municípios, para a solução do problema.

                                      Os Estados e Municípios não podem prescindir da ajuda da União no abatimento do seu déficit previdenciário.

É óbvio que nenhum Estado ou Município dispõe de ativos suficientes para sair de um sistema de repartição simples e custear inativos e pensionistas eliminando seu déficit previdenciário.

É factual que a aprovação das mudanças na política de benefícios não resolverá, mesmo em curto prazo, o problema de alguns Entes da Federação.

Assim, precisamos de um comprometimento maior da União, de ordem financeira, com essa opção pelo Regime Próprio mais Previdência Complementar. Até como conseqüência de que é a União quem fica com a maior parte do “bolo” tributário.

Medidas como o carreamento de pelo menos parte da dívida dos Estados para os Fundos Previdenciários, independente de outras porventura lembradas, pode ser o começo de um bom caminho.