* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Massilon (Nas Veredas do Cangaço e Outros Temas Afins). Natal: Sarau das Letras. 2010.
APRESENTAÇÃO
* Honório de Medeiros
"Sapere Aude"
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Massilon (Nas Veredas do Cangaço e Outros Temas Afins). Natal: Sarau das Letras. 2010.
APRESENTAÇÃO
* Honório de Medeiros
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
O DILEMA ENTRE SER
FILÓSOFO OU SONÂMBULO
Ivan Maciel de Andrade
Ao nos ocuparmos de temas
jurídicos, sempre e inevitavelmente nos situamos diante do dilema proposto por
Ortega y Gasset: ou nos tornamos filósofos ou sonâmbulos. Filósofos – se nos
questionamos sobre aspectos ontológicos, axiológicos e epistemológicos do Direito.
Sonâmbulos – se nos conformamos com o mero conhecimento, interpretação e
aplicação das normas (genéricas e abstratas ou individualizadas) que compõem o
Direito Positivo. Não há outra opção. E sabemos que, habitual e frequentemente,
os profissionais do Direito – por falta de preparo teórico, resistências
ideológicas e outros fatores extrajurídicos – se limitam ao exercício de
atividades superficiais e mecânicas, alheios a qualquer preocupação crítica, o
que os caracteriza inelutavelmente como verdadeiros sonâmbulos. Muitas vezes
conseguem armazenar bom número de informações sobre leis, decretos, resoluções,
jurisprudência, e se utilizam desse material, criteriosamente organizado e
atualizado, para o desempenho das mais diferentes funções jurídicas. Mas esse é
o seu horizonte – a dogmática jurídica, na sua expressão mais restrita, mais
limitada, mais operacional.
Isso é o que distingue Honório de
Medeiros de outros muitos que escrevem sobre temas jurídicos. Honório tem uma
preocupação filosófica, mesmo abordando questões que têm acentuado interesse
para a própria dogmática jurídica. A ótica filosófica está muitas vezes
simplesmente subjacente, implícita, pressuposta no tratamento atribuído ao
estudo e à análise de uma vasta gama de enunciados (alguns deles controversos)
pertencentes a diferentes ramos do Direito.
Aspecto importante a ressaltar é
que os textos de Honório de Medeiros utilizam uma linguagem acessível, direta,
despojada de tecnicismos. Essa peculiaridade torna o seu livro de leitura não
somente útil como agradável. É algo que valoriza sobremodo a substância, o
conteúdo das concepções expostas e constitui notável exceção à forma –
geralmente inóspita – escolhida pelos autores de obras jurídicas para
expressarem suas ideias, cuja inconsistência, muitas vezes, fica disfarçada
atrás de palavras e construções de insuportável pedantismo.
Vale observar que poucos, raros,
no Brasil, se interessaram ou se interessam pela vertente filosófica do
Direito. Os exemplos de A. L. Machado Neto e de Tércio Sampaio Ferraz ainda
permanecem isolados e inigualáveis. Talvez não tenha surgido ninguém depois
deles com o mesmo grau e densidade de conhecimentos jusfilosóficos e com uma
contribuição tão original, profunda, complexa e, ao mesmo tempo, fortemente
didática à abordagem dos grandes problemas teóricos suscitados pelo fenômeno
jurídico.
Sempre me dediquei ao estudo
desses aspectos teóricos, sem prejuízo de minhas atividades no Ministério
Público Estadual e, depois, na advocacia. Na condição de professor de Introdução
ao Estudo do Direito da UFRN, habituei-me a questionar a respeito da natureza
do Direito, da necessidade de sua existência dentro da sociedade, dos
princípios que regem a criação, interpretação e aplicação das normas jurídicas.
Através desses estudos, creio ter construído uma modesta visão crítica e
analítica do Direito.
Lembrando-se, certamente, da orientação filosófica que eu imprimia às minhas aulas no curso de Direito da UFRN, Honório de Medeiros, meu brilhante ex-aluno, resolveu convidar-me para estas palavras iniciais. Sinto-me homenageado e, ao mesmo tempo, feliz em constatar o quanto Honório de Medeiros foi bem-sucedido nas investigações teóricas que realizou, augurando que elas sejam acompanhadas de novas produções de igual nível de qualificação – tanto no âmbito formal, como na abrangência e proficiência dos temas abordados.
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS FILHO, Francisco Honório. Poder Político e Direito: A Instrumentalização Política da Interpretação Jurídica Constitucional. Natal: A.S. Editores. 2003.
INTRODUÇÃO
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Investigação Parcial Acerca da Solidão. Natal: Nossa Editora. 1984.
PREFÁCIO
INVESTIGAÇÃO PARCIAL ACERCA DA SOLIDÃO
determinação ou circunstância?
*
Pedro Simões Neto
O
livro começou a me interessar a partir do título. A solidão sempre merece uma
investigação – mesmo parcial (no duplo sentido).
No
Rio Grande do Norte, pelo que sei, é o primeiro trabalho no gênero. E dos
raríssimos escritos sobre metafísica. Embora os inéditos repousem, impunes, nas
gavetas dos estudiosos.
Sem
me decidir se o tema foi determinado, como matéria opcional de investigação, ou
circunstancial, produto da análise intro ou extrospectiva, intrigo-me com a
revelação da juventude de Honório de Medeiros. Conhecida, evidentemente, nunca
intuída ou deduzida, a se julgar pela gravidade do autor/personagem(?).
Surpreende,
ainda, o campo de estudos metafísicos empreendido por Honório. O SER, sua
existência e sua essência, eis a proposta de experimentações do jovem (?)
escritor. Na mesma linha de Liebniz, Bergson, Heidegger, Kierkegaard,
Wittgenstein e Sartre – só para alinhar referências.
Mas,
ao contrário dos ilustrados companheiros, Honório inaugura (sua ou dos outros?)
solidão, partindo de uma escritura intrigante. Hermética, a princípio, talvez
em razão do método de investigação, do enunciado metafísico. Aos poucos, no
entanto, vai tecendo a (sua ou dos outros?) solidão, com extrema desenvoltura
dialética, com liberdade poética. A partir daí o tema perde densidade
metodológica e conquista, com bastante vantagem, a condição de mesa de bar, de
cotovelos na janela e olhares presos no vazio. Ganha intensidade humana.
Talvez
porque se possa definir a obra como construção pessoal do autor, enquanto
singular, interessa menos o tecido de sua composição (a despeito de bem
elaborado e original) que o artesão que a tece.
O
que levaria um jovem em plena conquista de “status” sócio-cultural e econômico
– segundo a cartilha civilizatória ocidental – a manter tal base de estudos?
É
bem verdade que as referências históricas (contemporâneas ou não), como que
balizam a desesperada busca da juventude, por coisa alguma indexada nos valores
ditos culturais da civilização. A procura é introspectiva, não pode ser
mensurada por qualquer ordem de grandeza materialista.
O
“spleen”, o “Weltmerschz”, os “rebeldes sem causa”, a “geração perdida” ...
Aconteceu o Movimento Hippie. O ’68 na França. Schumacher fala do ideal de um
homem ajustado a uma sociedade perfeita. Fala com ironia. Como se o ideal
humano fosse realmente uma sociedade dadivosa, sacietária ...
Talvez
Honório esteja certo. Primeiro é preciso conquistar a essência para delinear a
existência. Porque é na essência que ele penetra, afastado o “seu” solitário
dos problemas da existência, concedendo-lhe o arbítrio do seu próprio projeto
de solidão. Cada qual tece e urde o seu próprio arquétipo solitário, que aos
poucos deixa de ter uma causa circunstancial e se afirma como opção
existencial.
Um
projeto ontogenético? Talvez. Talvez algo mais: uma estação poética obsessiva.
Que nos afasta de Orwell, de Toffler, de Berdiaev e de quantos concedem à
sociedade, à organização social e política, o projeto existencial do Homem.
Determinação ou circunstância, o “projeto” de solidão de Honório de Medeiros é fascinante. Sobretudo porque nos remete à preocupação com o SER, com o existir.
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com).
RÊGO, Janio Costa. Canto de Rua. Mossoró: Gráfica Tércio Rosado (ESAM). 1977.
* Honório de Medeiros
* honoriodemedeiros@gmail.com
Cobramos muito, dos outros, uma conduta que não seguimos.
Eis a verdadeira revolução: não exigir aquilo que não estamos dispostos a fazer.
Dar o exemplo, eis a questão.
* Honório de Medeiros
* honoriodemedeiros@gmail.com
Assim é a rede social: uma praça virtual semelhante a aquelas das cidades do interior de antigamente, onde a vida de cada um era passada a limpo todos os dias. Continuo crendo que o homem não mudou nada com o tempo, apenas antes andávamos a pé ou em cima de animais, hoje viajamos de avião. O homem continua o mesmo, talvez pior: está mais fragmentado, mais cheio de rancor e ressentimento.
* Pinçado do www.navegos.com.br
* honorio de medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
IRRESIGNAÇÃO PERDOADA
Honório de Medeiros
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3,3 Mas
do fruto da aárvore que
está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem nele tocareis, para
que não morrais.
3,5 Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se abrirão os vossos aolhos, e sereis como Deus, bconhecendo o bem e o mal.
Do descobrimentopoetico.blogspot.com
* Honório de Medeiros
(honoriodemedeiros@gmail.com)
(honoriodemedeiros.blogspot.com)
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Em Ficções, Borges pondera:
“Desvario laborioso e empobrecedor o de compor vastos livros; o de explanar em quinhentas páginas uma idéia cuja exposição oral cabe em poucos minutos. Melhor procedimento é simular que estes livros já existem e apresentar um resumo, um comentário. Assim procedeu Carlyle em "Sartor Resatus" (...) Mais razoável, inepto, ocioso, preferi a escrita de notas sobre livros imaginários."
Borges cita Carlyle, de quem, possivelmente absorveu a técnica.
Entretanto Dumas pai, que foi contemporâneo do célebre ensaísta inglês, também a utilizou.
Em Os Quarenta e Cinco, lá para as tantas, ao relatar uma correspondência imaginária enviada por Chicot a Henrique III, e comentar a excentricidade do seu estilo, convida: “Quem quiser ter conhecimento dela encontra-la-á nas Memórias de l’Étoile”.
Ou, quem sabe, terão existido mesmo essas Memórias de l’Étoile e elas
ocupam algum escaninho empoeirado do “Cemitério dos Livros Esquecidos” que
Carlos Ruiz Zafón localizou em Barcelona, na saborosa e definitiva tetralogia iniciada com A Sombra do Vento?
Só o vento sabe a resposta...
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
Não há nada de novo sob o sol. Seguimos aparentemente em frente para destino ignorado, permanecendo os mesmos de tanto tempo atrás, enquanto as formas, os instrumentos, e os meios que são criação nossa, mas dos quais somos reféns para lidarmos conosco, os fenômenos e as coisas, tornam-se cada vez mais complexos e fugazes, em uma espiral, um "vir-a-ser", como diria Nietzche, de proporções incalculáveis.
Essência imutável, forma evanescente.
Leio em Os Crimes de Paris, de Dorothy e Thomas Hoobler, acerca de Vidocq, um personagem maior que sua vida. "Depois de cometer vários crimes na juventude, trocou de lado e se aliou à polícia. Foi o primeiro chefe da Sureté, o equivalente francês do FBI, e modelo para vários personagens da literatura", dizem-me eles.
Fascínio antigo esse meu por Vidocq. Camaleônico, sofisticado, indecifrável, também foi o criador da primeira agência de detetives do mundo, o "Bureau de Reinseignements", ou Agência de Inteligência. Que outro, além de um francês, criaria uma agência de detetives com esse nome?
Vidocq inspirou Maurice Leblanc na criação do célebre “Arsène Lupin, O Ladrão de Casaca”, que eu lia, fascinado, na adolescência, graças à bondade de um colega de ginásio, na Mossoró, minha Macondo particular, que não existe mais, pelo menos neste plano.
Inspirou, também, além de muitos outros, tais como Alexandre Dumas, Victor Hugo e Eugène Sue, o ainda mais célebre personagem de Balzac, Vautrin, presente em vários livros da Comédie Humaine.
Vautrin, o mesmo que em certo momento, lá para as tantas, explica o mundo:
"-E que lodaçal! - replicou Vautrin. - Os que se enlameiam em carruagens são honestos, os que se enlameiam a pé são gatunos. Tenha a infelicidade de surrupiar alguma coisa e você ficará exposto no Palácio da Justiça como uma curiosidade. Furte um milhão e será apontado nos salões como um modelo de virtude. Vocês pagam 30 milhões à polícia e à justiça para manter essa moral... Bonito, não é?"
Assim falava minha mãe: "vão-se os anéis, permanecem os dedos..."
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
1) APRENDEMOS quando nos defrontamos com um problema, qualquer que seja ele.
Como observa Karl Raimund Popper, "cada problema surge da
descoberta de que algo não está em ordem com nosso suposto conhecimento; ou
examinado logicamente, da descoberta de uma contradição interna entre nosso
suposto conhecimento e os fatos; ou, declarado talvez mais corretamente, da
descoberta de uma contradição aparente entre nosso suposto conhecimento e os
supostos fatos."
a) Esse problema pode ser inesperado, e não por outra razão a sabedoria
popular diz: “a necessidade é a mãe da invenção”;
b) ou esse problema pode ser provocado:
b.1) quando problematizamos as coisas e/ou os fenômenos pois, tal qual
nos disse Gaston Bachelard, “O conhecimento é sempre a reforma de uma ilusão”;
b.1.1) sempre por intermédio da contra-argumentação, utilizando o
contraexemplo, para testar nossas teorias que tentam solucionar o problema.
2) QUALQUER problema é, antes de tudo, algo puramente racional, uma
questão intelectual, mesmo quando surge no âmbito de um trabalho puramente
mecânico.
a) Se constatamos a existência de um problema, é porque temos um conhecimento anterior a ele, que nos permite essa constatação.
3) Para tentar uma solução que resolva o problema, elaboramos teorias
que são soluções provisórias a serem testadas.
a) Os testes, ou o teste, dirão se erramos ou acertamos;
b) Até mesmo o erro nos ensina, posto que não precisamos mais trilhar o
mesmo caminho já tentado, e aprendemos o que não é certo para a solução do
problema.
4) SE o conhecimento é retificável, ou seja, pode ser modificado, é evolutivo, no sentido de que caminha sempre do mais simples para o mais complexo.
5) O conhecimento pode, então, ser compreendido como um “vir-a-ser” de complexidade cada vez maior.
6) A recusa em problematizar tudo quanto percebemos como um problema, conduz a neuroses. Aqui se compreenda essa recusa como uma fuga do problema com o qual alguém se defrontou.
7) O como dizemos algo a nós mesmos, ou aos outros, acerca do que
aprendemos é papel da Retórica: podemos tentar convencer ou seduzir tanto ao outro
como a nós mesmos.
8) NÃO é possível comparar INFORMAÇÃO com CONHECIMENTO: quando conheço, estou informado, mas, nem sempre, quando estou informado, conheço. Posso estar informado de algo sem compreendê-lo.
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Estamos cansados. Encenamos uma peça que não escolhemos, no teatro da vida, com parceiros que nos impuseram ou não soubemos selecionar, e uma finalidade que não é aquela que nosso coração escolheria. A razão ansiosa, sim, o coração, não. Lutamos pela admiração alheia, deixando de lado o olhar melancólico do nosso verdadeiro eu, que nos olha do espelho com olhos surpresos pelos nossos fracassos. E, quando menos esperamos, o tempo passou, tudo aquilo pelo qual valia a pena viver se foi como uma bolha de sabão ao sabor do sol, porque chegou o inverno, a última das estações da vida...
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* Honório de Medeiros.
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Sir Karl Raimund Popper
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(honoriodemedeiros@gmail.com)
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(honoriodemedeiros@gmail.com)
“Senti nesse texto como
se estivesse testemunhando o início da sua caminhada no curso de Direito,
quando você passou por um dilema que eu mesma vivi e vi muitos dos meus colegas
também passarem: primeiramente, a criação de um ideal que permitiria nos enxergarmos
como um verdadeiro aluno de direito, e nos fazia trabalhar em tarefas
auto-impostas para alcançar esse patamar também auto-imposto, e, em segundo
lugar, enxergar a situação do embate entre o que conhecemos e respeitamos e o
que somos apresentados e queremos respeitar. Eu não tinha noção da importância
de Hegel, e gostei de aprender sob sua influência, acerca da visão que os
outros autores tinham dele e de sua obra. Também achei que o texto acabou
mostrando de uma maneira muito delicada como é essa “jornada” do saber: inquietar-se,
questionar-se e a presença constante da mudança de percepções”.[1]
No final dos anos 80,
início dos 90 dediquei-me a estudar Hegel.
Peguei meu exemplar do Princípios da Filosofia do Direito, cuja primeira
edição é de 1918, e me lancei na empreitada, mesmo a contragosto, ante a
dificuldade de compreender o pensamento do autor, que se expressava em uma
linguagem deliberadamente abstrusa.
Fichte, a quem se atribui
ter sido a ponte entre Kant e Hegel, era ainda pior, mas eu acreditava que era
uma espécie de dever moral um estudante de Direito e do marxismo conhecer sua
obra.
A duros custos cheguei lá,
dadas as dificuldades que o texto, em si, e que são grandes, propunham, e do
qual o parágrafo abaixo é um bom exemplo:
O domínio do direito é o espírito em geral; aí, a sua
base própria, o seu ponto de partida está na vontade livre, de tal modo que a
liberdade constitui a sua substância e o seu destino e que o sistema do direito
é o império da liberdade realizada, o mundo do espírito produzido como uma segunda
natureza a partir de si mesmo.
Quanto mais lia, menos conseguia
esquecer a opinião que de Hegel tinha Schopenhauer, por quem nutro grande
admiração.
Para que se tenha uma
ideia dessa opinião, lembro a afirmação de Schopenhauer, citando Shakespeare (Cimbelina,
ato V, cena 4), em sua Vontade da Natureza, que a filosofia de Hegel era
"uma conversa de loucos, vinda da língua e não do cérebro".
Em O Mundo Como Vontade e Representação, Schopenhauer não deixou por menos:
Hegel, imposto de cima pelos poderes vigentes, como o
Grande Filósofo oficializado, era um charlatão de cérebro estreito, insípido,
nauseante, ignorante, que alcançou o pináculo da audácia por garatujar e
fornicar as mais malucas e mistificantes tolices. Essas tolices foram
barulhentamente proclamadas como uma sabedoria imortal, por seguidores
mercenários, e prontamente aceitas como tal por todos os tolos, que assim se
juntaram num coro perfeito de admiração, como nunca antes se ouvira.
Existe muito mais de
Schopenhauer em relação a Hegel, mas é o suficiente. Além dele, também da mesma
época há, por exemplo, Soren Kiekergaard, autor de O livro do Juiz,
crítico severo de seu historicismo, e citado por Sir Karl Raymund Popper
em A Sociedade Aberta e Seus Inimigos:
Houve - escreve Kierkegaard - filósofos que tentaram,
antes de Hegel ... explicar a história. E a Providência só podia sorrir ao ver
tais tentativas. Mas a Providência não se ria às escâncaras, pois havia neles
sinceridade e honestidade humanas. Mas Hegel!... Aqui preciso da linguagem de
Homero. Como os deuses gargalharam trovejantemente! Esse pequenino e horrendo
professor compreendeu simplesmente a necessidade de cada uma e de todas as
coisas que existem, e agora executa em seu hormoniozinho toda a peça: “Escutai,
deuses do Olimpo!”
Sir Karl Popper comenta a
citação dizendo que as expressões de Kierkegaard são quase tão fortes quanto as
de Schopenhauer, quando afirma, um pouco depois, que o hegelianismo, "esse
brilhante espírito de podridão, é a mais repugnante das formas de licenciosidade,
mofo de pompa, e possui um infame esplendor de corrupção".
Ainda em A Sociedade
Aberta e Seus Inimigos, Sir Karl Popper, lá para as tantas, se pergunta a razão
pela qual ainda precisamos nos incomodar com Hegel:
A resposta é que a influência de Hegel permaneceu como
força poderosíssima, apesar do fato de que os cientistas nunca o levaram a
sério (...) A influência de Hegel e especialmente a do seu jargão, é ainda
muito forte em sua filosofia moral, e social, como nas ciências sociais e
políticas (com a única exceção da economia). Especialmente os filósofos da
história, da política e da educação, ainda estão sob seu império, em ampla
extensão. Em política isso é mais amplamente mostrado de que tanto a ala
extrema marxista, assim como o centro conservador e a extrema direita fascista
baseiam suas filosofias políticas em Hegel; a ala esquerda substitui a guerra
de nações que aparece no esquema historicista de Hegel pela guerra de classes;
a extrema direita substitui-a pela guerra de raças; mas ambos o seguem mais ou
menos conscientemente (o centro conservador é, em regra, menos consciente do
que deve a Hegel).
Mesmo assim li Hegel.
Conclui minha tarefa autoimposta. Ter continuado a estuda-lo me permitiu, algum
tempo depois, procurar entender a ligação entre a dialética de Heráclito de
Éfeso, a de Hegel, com sua “Filosofia da Identidade”, e a de Marx. Fez-me capaz,
certo ou errado, de conectar esse entendimento com a “Teoria da Evolução”, por
intermédio da “Teoria do Meme”, exposta por Sir Richard Dawkins em O Gene
Egoísta.
Permitiu-me, por fim, compreender que sem a ciência qualquer teoria acerca de fatos históricos é mera especulação. Quanto à Filosofia, é pura metafísica, delírio da Razão.