sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

O AVILTAMENTO DA EDUCAÇÃO JURÍDICA

queverdadeeessa.com

Honório de Medeiros

Os cursos de Direito estão sendo encaminhados, lentamente, por imposição do mercado, para se transformarem em cursinhos preparatórios a concursos e exame da Ordem dos Advogados do Brasil, comprometendo o pouco que restou da preocupação das elites, após a ditadura militar, com a formação humanística.


A pressão para que isso ocorra, ainda difusa, vem de todos os lados, e não é contida pela presença formal, no currículo dos cursos, de disciplinas pertencentes à área propedêutica como filosofia, sociologia, teoria geral do Estado e outras. Incide tal pressão sobre os professores dessa área quando eles cobram os alunos, através de avaliações e presenças, e estes questionam apontando a pouca importância daquilo que lhes é ministrado em termos de mercado de trabalho; incide sobre os dirigentes institucionais, a quem se pressiona para que obtenha o relaxamento do educador quanto ao desempenho do educando em Filosofia do Direito, por exemplo, mas, ao mesmo tempo, que seja exigente quanto aos mestres que proferirão as aulas ditas “práticas”; incide nos estudantes vinda de seus pais, que estão de olho nos concursos públicos que seus filhos farão e acham que não adianta a preocupação com o estudo de algo que não tem “utilidade”; incide insidiosamente nos pais, na medida em que eles são cobrados por parentes e amigos quanto ao futuro profissional de cada um dos seus filhos.



O aparente renascer da Filosofia, que contrariaria o argumento acima exposto, constatado em alguns jornais e revistas de circulação nacional, não explora o aspecto “fashion” oculto na tardia opção de parcela da elite por algo aparentemente tão obscuro e de difícil compreensão. Muito mais que curiosidade filosófica, o que a motiva essa opção é a necessidade de ser “in” em termos sociais, na medida em que possa falar, mesmo que superficialmente – é o que se permite em reuniões sociais - no nome de filósofos ou obras até então relegados às bibliotecas de alguns poucos excêntricos.



É isso mesmo, trocando em miúdos: esse renascer é aparente e decorre da criação de mais uma forma alienada de se destacar socialmente, extremamente curiosa por que ela lida, concretamente, com o aparato intelectual – os livros e seus autores - que, em tese, em sendo utilizado corretamente, libertaria o alienado de sua alienação. Esse filme não é novo: posar de intelectual, há alguns anos, já rendeu seu charme...



O certo é que a proliferação de cursos de Direito oferecidos por instituições privadas vem acentuando o aviltamento do ensino. As universidades querem poder estampar nos jornais a relação dos seus alunos aprovados em concursos para poderem captar mais clientes, e como para eles serem aprovados precisam se submeter à lógica educacional própria de cursinhos preparatórios, onde o superficial e contingente prepondera sobre o profundo e estrutural, está armado o cadafalso onde serão guilhotinadas gerações presentes e futuras de possíveis pensadores, humanistas e críticos substanciais da nossa realidade.



Fatos como aquele ocorrido com um amigo meu, professor, que em sala de aula leu textos de Fernando Sabino, na tentativa de estabelecer com seus alunos a cumplicidade através do belo, e no final foi indagado acerca de em qual livraria seria encontrado “seu” livro fatalmente tende a ser um padrão. E que padrão...

3 comentários:

CARIRI CANGAÇO disse...

Caro amigo Honório, parabens pelo oportuno e lucido artigo,

grande abraço,

Manoel Severo

Kemil disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Kemil disse...

Parabéns professor.


Sintetizou bem o presente/futuro do ensino jurídico no Brasil.

Mas fiquei curioso. Esse fenomeno ocorre apenas aqui no brasil?
Só aqui que temos tecnocratas do direito?

O que é sabido, é que o futuro da educação juridica hoje pertence aos LFG´s, Praetorium´s e Marcato´s (nada contra!), mas o que deveria servir de auxiliar na formação acadêmica, é em verdade a sua base para um projeto de vida de "concurseiro".

Parece que esquecem ou desconhecem, que após o concurso existe um serviço público a ser prestado.
E tal serviço apenas não depende dos atributos "técnicos" da área que se pretende atuar.
Necessário é, um raciocinar pro-activo, humanístico, sensível, que encare os problemas do serviço público algo necessário ao nosso desenvolvimento "humano/social".

A maioria do "erros" juridicos e administrativo a qual tenho oportunidade de observar, são causados por falta de "sensibilidade".

Não sou intelectual, mas acredito que o conhecimento, perpasse além dos livros doutrinários e de preparação para concursos.

A poesia, arte, ciência, filosofia, o conhecimento vulgar, religioso, tudo contribui para o enriquecimento da alma.

Além disso, todas as pessoas que nos cercam, podem nos ensinar algo: o juiz, o porteiro, médico, agricultor, pedreiro, professor... Não importa!


Agora, infortunadamente, temos que colher os frutos amargos desse projeto de educação.

Lastimável.

Parabéns pelo post, e pelo blogue!

Comecei a segui-lo, estarei sempre por aqui!


Um abraço, sou um grande fã do senhor!