sexta-feira, 9 de junho de 2023
A GAROA BANHAVA AS PLANTAS...
quarta-feira, 7 de junho de 2023
SOMOS ESTILHAÇOS
Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
A realidade pessoal fragmentada: somos estilhaços. Cada estilhaço tem vida própria e conduta errática. Nós somos a soma de todos esses estilhaços, um sentido que emana da ausência de sentido. Paradoxo do mentiroso. Somos a água da correnteza de um rio descendo em enxurrada, na busca do oceano. O rio é a vida, o oceano, o destino final, a integração com o Um. Somos folhas rodopiantes, alucinadas, em dias de ventos traquinas. Abismos no tempo, fendas nas essências das coisas, fluímos vertiginosos. Um grito solitário no silêncio sepulcral do universo, quase. Pontes, caminhos para um infinito desconhecido. Pó das estrelas.
Cerro Corá, fevereiro de 2023.
terça-feira, 6 de junho de 2023
ENQUANTO ME DESPEDAÇO
Saia sem dizer até logo: é um adeus. Não olhe para trás. Não leve nada agora, tudo será seu. Pegue sua bolsa, alise as pregas do vestido, tire um ou outro fiapo imaginário do tecido, deixe as chaves na mesa, siga em frente. Raspe a parede das qual se despede com a ponta das unhas, delicadamente. Esconda as lágrimas teimosas. Não volte, por favor, não se volte. Lá fora, ainda há estrelas, mas logo chega a manhã. É madrugada alta. Tentamos, não deu. A ponte está fechada. Respire fundo enquanto caminha. Lembre-se daquela nossa velha canção. Eu, cá, digo adeus qual murmúrio, enquanto me despedaço.
segunda-feira, 5 de junho de 2023
AS HORAS DESLIZAM MACIAS...
Da casa onde estou, na Vila dos Pescadores, em Piranhas, Alagoas, não são mais que vinte passos até essa linda capela devotada a Santo Antônio, centro do local onde a cidade começou. São quase seis da manhã. Se olho para a frente, a partir do terraço da casa, tenho a Vila, ao longo; à minha direita, uma estreita estradinha de paralelepípedos e, depois dela, o rio São Francisco, lindo, maravilhoso; à esquerda, a capelinha. Mangueiras, no entorno, fazem a festa da passarada. Assim, as horas deslizam macias, tranquilas, como o bom dia sorridente que eu recebi da senhorinha que passava, enquanto fazia sua caminhada matinal...
domingo, 4 de junho de 2023
E A VIDA CONTINUA
Na Vila dos Pescadores, à margem do São Francisco, entre serrotes e o rio, em Piranhas, Alagoas, todos se conhecem há muito tempo. Enquanto a vida flui caótica, lá fora, esse pequeno enclave obedece a leis imemoriais que privilegiam amparo mútuo e destino comum. Há exceções, claro, como a dos que se vão e voltam em outro patamar, seja mais baixo ou mais alto. Não importa: a Vila os recebe serena, e a vida continua. Problemas, há, como em todos os lugares; a diferença é que, aqui, a dor, e a alegria, são compartilhadas...
quinta-feira, 1 de junho de 2023
ELE NÃO SABE LIBERAR A LIBERDADE
Um dia, não poderemos mais ir e vir sem assinar algum documento, ou fazer vênia ao burocrata responsável pelas estradas que percorremos. O maldito Estado constrictor, qual uma jiboia colossal e sem limites, segue aumentando o aperto esmagador sobre os indivíduos, enquanto cresce desmesuradamente, até que não sobreviva sequer uma migalha de liberdade para quem quer que seja. Tudo hoje é regulado em detalhes ínfimos. E, em qualquer lugar, sempre existe um burocrata à nossa espreita, sequioso para exercer seu poder medíocre. Ele, o burocrata, não sabe, mas trabalha contra si, ao longo de uma vida vazia e incolor: não sabe proibir proibições, tampouco liberar a liberdade.
quarta-feira, 31 de maio de 2023
QUE TAL BUSCAR UM ATALHO?
Eu ficava vezes sem conta vendo a água da chuva cair da goteira, alcançar o chão e começar a escorrer, descendo, em busca do seu destino. Quando algo se interpunha em seu caminho e não podia ser levado pela correnteza, tal qual uma touceira de capim, a água o contornava e seguia, lépida e faceira, em frente: descobrira um atalho. Assim também faz o luar... Tiro meu chapéu imaginário para o atalho que nos ensina, sempre que pode, uma lição de como viver. Está tudo escrito no livro da vida. Ao invés de enfrentar os osbstáculos diários arremetendo contra eles, que tal buscar um atalho?
segunda-feira, 29 de maio de 2023
NO OUTONO DA VIDA
No outono da vida, véspera do inverno, o cansaço se avoluma. As sementes, se houve, espalharam-se: estamos sozinhos. Uma certa lassidão, entre outras sensações, vai tomando conta dos nossos dias. O tempo parece fluir lentamente. Tudo parece repetir-se. Há lampejos, quais relâmpagos, que tão logo aparecem, iluminam a noite e repentinamente somem. É o ciclo da vida: "Pois és pó, e ao pó retornarás" (Gen 3:19), bem como "O que foi, isso é o que há de ser, e o que se fez, isto se fará, de modo que nada há de novo sob o sol" (Eclesiastes, 1:9).
domingo, 28 de maio de 2023
NADA ESPERE DE MIM
Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
Nada espere de mim: sou todos, sou ninguém. De mim colherá um instante, apenas um instante. Nele, o que há? O negro da noite; a gota de chuva na tempestade, a cinza, do fogo-vento. Frases pinçadas ao léu; se abismo, a queda; na pequena-morte, a evanescência. Não esqueça jamais: todos homens são Um, Um homem é todos. Tudo espere de mim.
sábado, 27 de maio de 2023
AGORA SOMOS SILÊNCIO, QUASE
Dia desses olhei para você e me vi. Éramos reflexos um do outro, recortados contra o claro-escuro. Cores que esmaeceram, tingidas de prata. Sépia. Como passaram vertiginosamente os dias e as horas! O tempo é um abismo: vidas que fluíram, esvaneceram-se. Agora, somos silêncio, quase. Dizemos mudos. Construímos pontes para um infinito desconhecido.
sexta-feira, 26 de maio de 2023
A BALADA DO RETORNO
Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com).
Agora, retorno. Recolho as velas da minha nau imaginária. Solto a âncora. Desço ao cais. Respiro fundo a solidão da noite. Olho as luzes, as construções. Sigo. Caminho lentamente. A neblina molha as pedras, me molha. Chego à minha porta. Entro. Enxugo o rosto molhado com o braço. Tomo um grogue. Eis que chega seu sorriso luminoso. Seu colo perfumado. Seu olhar de madrugadas. Nossa história comum. Então, há o silêncio. Depois, vinho, cantigas e risos. Dança-se. Estou em casa.
quinta-feira, 25 de maio de 2023
A BELA ENTRE AS BELAS: ANGLES SUR L'ANGLIN
Honório de Medeiros (honoriodemedeiros.blogspot.com)
Atribuíram-lhe o título de "uma das mais belas vilas da França". Nada mais justo. É difícil crer que haja outra tão linda. Supera Sarlat La Canéda. Um pedaço do meu coração ficou aqui, entre esses bosques, no rio L'Angles, nas suas águas verdes escuras profundas, e nas suas ruas tortuosas com casas antigas cujas paredes são tomadas por flores.
terça-feira, 23 de maio de 2023
UM ACORDEONISTA EM BORDEAUX
Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com).
SOU fascinado por artistas de rua. Quando os vejo, paro um pouco distanciado e tento absorver tudo quanto posso deles e de sua arte, na medida em que os encontro em minhas andanças.
Na Europa, eles são muitos. Há desde o acordeonista cuja execução de "La Violetera", uma "habanera" de 1915, tantas vezes escutada na voz de minha mãe, até a quase adolescente que canta, à capela, uma doce canção de sua terra natal, a Itália.
Estou escrevendo acerca das ruas centrais de Bordeaux ou da famosa Place de La Bourse, o palco de encontro de todos, viajantes ou não, que por aqui moram ou andam.
Aproximei-me do acordeonista lamentando não dispor do poder do personagem de uma história em quadrinhos de minha adolescência, que podia ler a vida de qualquer pessoa bastando, para tanto, mergulhar em seus olhos, se o desejasse.
Como não podia nada pessoal lhe perguntar, aqui é ofensivo, tampouco possuía qualquer poder, depositei algumas moedas em sua caneca estendida sobre um pano vermelho que já vira muitas estações, olhei seu rosto cansado, mal cuidado, atribui-lhe uns bons setenta e poucos, e lhe perguntei se por um acaso do destino não saberia tocar "La Violetera".
Ele parou, pareceu buscar alguma lembrança obscura em suas memórias, deu-me um pequeno sorriso e titubeando, no início, mas com desenvoltura, a seguir, inclusive fazendo floreios, digamos assim, jazzísticos, tocou a música que eu lhe pedira como se estivesse no palco do Grande Teatro de Bordeaux, sendo ouvido por todos quanto, ao longo de sua longa vida, em algum momento pararam para ouvi-lo e aplaudi-lo.
NO SERTÃO DA FRANÇA: SARLAT-LA-CANÉDA
Honório de Medeiros
honoriodemedeiros@gmail. com
Sarlat-la-Canéda é uma comuna francesa localizada na região administrativa da Nova Aquitânia, no departamento Dordonha, Périgord-Noir.
Aguardo a partida do trem e escuto "As Quatro Estações", Vivaldi.
E escrevo, claro.
No caminho, Bergerac. Lembro-me imediatamente de Anatole France: "Monsieur Bergerac em Paris".
Um dia, vou lê-lo novamente.
A região é a rural francesa.
Seus rios aquosos, plácidos, banham belas, sonolentas e ancestrais cidadezinhas perdidas no verde da França.
O Perigord é cheio de pequenos "chateaus" repletos de beleza e história que surgem de repente e são rapidamente deixados para trás pelo trem veloz.
Quero parar em cada um deles, conversar com seus castelões, desvendar seus segredos e os de seus antepassados, mas o trem não para.
Vivaldi continua.
A cerração matinal nos acompanha, o sol se esconde.
O orvalho molha a janela do trem e o mundo fica cinza...
Sarlat é linda, indescritível.
Andando pelo centro histórico, medieval, fico imaginando o dia-a-dia dos seus habitantes de então: suas relações, os amores, a comida, o sexo, a música, as intrigas políticas, os donos do poder, a escuridão e o silêncio da noite profunda.
Será que um dia volto e refaço todo esse percurso?
quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023
ESTUDO DE CASO: O CANGACEIRISMO
Um estudo de Caso: o cangaceirismo
* Honório de Medeiros
A hipótese do “Outsider” que diz “Não!”, aplicada ao estudo da história. Um método.
Lampião, porém, era um rude guerrilheiro, um gênio em
estratégia, inteligência e astúcia (...) um homem do seu tipo surge de cem em
cem anos (Lampião Cangaço e Nordeste, Aglae Lima de Oliveira)[1].
Nesse sentido, a mesma revisão feita sobre tantas das
revoltas políticas, sociais e religiosas brasileiras cabe no que toca ao
chamado banditismo rural nordestino, de cuja realidade ontológica também se
pode dizer gilbertianamente tratar-se de agressão à cultura primitiva,
recalcada, porém não destruída (Estrelas de Couro: A Estética do Cangaço, Frederico
Pernambucano de Mello)[2].
Na terra seca, o homem é castigado pela inclemência climatérica, mas tem a compensação da liberdade individual imensa, formando-se uma humanidade altiva, de uma independência quase selvagem, indisciplinada, sem submissões ao trabalho, sem vida sistematizada. Cada homem é dono de suas ventas e, acostumado aos horizontes largos, para ele o mundo é grande e Deus é maior. E Deus é a aventura. É a possibilidade de fazer de suas apragatas verdadeiras botas de sete léguas, que poderão ser utilizadas deserto adentro para os lados em que o sol se põe, sem nunca chegar à serra por detrás da qual ele se deita. Nessa direção, o sertanejo pode vagabundar num verdadeiro caminho para o infinito, fugindo da coerção que lhe venha da polícia ou do trabalho organizado (Brejos e Carracais do Nordeste, Limeira Tejo, citado em Guerreiros do Sol: Violência e Banditismo no Nordeste do Brasil, por Frederico Pernambucano de Mello)[3].
Introdução
É
sob esse prisma, o dos inconformados (irresignados) que se revoltam e dizem
“Não!”, transgridem e, a partir de então, são considerados “Outsiders”, que
poderia ser estudado, por exemplo, o cangaceirismo...
CONTINUA...
sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023
GOVERNO DO RIO GRANDE DO NORTE (1935-2018)
Governo do Rio Grande do Norte (1935-2018)
sábado, 21 de janeiro de 2023
DE UMA LONGA E ÁSPERA CAMINHADA
O FIO QUE CONECTA A TRAMA
* Gustavo Sobral
Vicente Serejo
serejo@terra.com.br
Camarim
BRANDE - Para seus amigos não é surpresa, mas
será para seus novos leitores: a revelação do grande leitor que é o advogado
Honório Medeiros, visto e lido, praticamente, como o pesquisador do
cangaceirismo e do coronelismo no RN, com os seus três títulos que são grandes
referências.
LEITOR - Depois de Américo de Oliveira Costa - ‘A Biblioteca e Seus
Habitantes’ e os quatro volumes de “O Comércio das Palavras’ - Honório mantém a
tradição dos grandes anotadores de leituras com seu novo livro - “De uma longa
e áspera caminhada”. Edição da Viseu, Paraná, 2022.
quinta-feira, 8 de dezembro de 2022
domingo, 2 de outubro de 2022
PODER POLÍTICO E DIREITO (2ª edição)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
JESUÍNO BRILHANTE o primeiro dos grandes cangaceiros
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
TENENTE-CORONEL CHILDERICO JOSÉ FERNANDES DE QUEIROZ FILHO (Artigo)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Tenente-Coronel Childerico José Fernandes de Queiroz Filho. Natal: artigo em Revista do Instituto Histórico e Geográfico do RN / Instituto Histórico e Geográfico do RN. - v. 99. 2020.
CASCUDO E O CANGAÇO (Artigo)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Cascudo e o Cangaço. Natal: artigo em Revista do Instituto Histórico e Geográfico do RN / Instituto Histórico e Geográfico do RN. - v. 98. 2019.
PAU DOS FERROS ONTEM E HOJE (Artigo)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Pau dos Ferros Ontem e Hoje. Natal: artigo em Revista do Instituto Histórico e Geográfico do RN / Instituto Histórico e Geográfico do RN. - v. 97 (Ano 2018). 2018.
sexta-feira, 30 de setembro de 2022
FEUDALISMO, CORONELISMO E CANGAÇO (artigo)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Feudalismo, Coronelismo e Cangaço. Natal: artigo em Revista do Instituto Histórico e Geográfico do RN / Instituto Histórico e Geográfico do RN. - v. 92 (jan./mar.). 2016.
PARABELLUM (coletânea)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
GASTÃO, Paulo Medeiros (organizador). Parabellum: "Tiro Certeiro". Mossoró: Coleção SBEC - Universo das Caatingas - Nº 05 - Mossoró/RN.
Do Conceito de Cangaço, Cangaceiro e Cangaceirismo (Honório de Medeiros)
quarta-feira, 28 de setembro de 2022
HISTÓRIAS DE CANGACEIROS E CORONÉIS
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Histórias de Cangaceiros e Coronéis. Natal: Sebo Vermelho Edições. 2015.
APRESENTAÇÃO
* Antônio Gomes
MASSILON (Nas Veredas do Cangaço e Outros Temas Afins)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Massilon (Nas Veredas do Cangaço e Outros Temas Afins). Natal: Sarau das Letras. 2010.
APRESENTAÇÃO
* Honório de Medeiros
domingo, 25 de setembro de 2022
JUSTIÇA versus SEGURANÇA JURÍDICA e outros fragmentos (ensaios)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
O DILEMA ENTRE SER
FILÓSOFO OU SONÂMBULO
Ivan Maciel de Andrade
Ao nos ocuparmos de temas
jurídicos, sempre e inevitavelmente nos situamos diante do dilema proposto por
Ortega y Gasset: ou nos tornamos filósofos ou sonâmbulos. Filósofos – se nos
questionamos sobre aspectos ontológicos, axiológicos e epistemológicos do Direito.
Sonâmbulos – se nos conformamos com o mero conhecimento, interpretação e
aplicação das normas (genéricas e abstratas ou individualizadas) que compõem o
Direito Positivo. Não há outra opção. E sabemos que, habitual e frequentemente,
os profissionais do Direito – por falta de preparo teórico, resistências
ideológicas e outros fatores extrajurídicos – se limitam ao exercício de
atividades superficiais e mecânicas, alheios a qualquer preocupação crítica, o
que os caracteriza inelutavelmente como verdadeiros sonâmbulos. Muitas vezes
conseguem armazenar bom número de informações sobre leis, decretos, resoluções,
jurisprudência, e se utilizam desse material, criteriosamente organizado e
atualizado, para o desempenho das mais diferentes funções jurídicas. Mas esse é
o seu horizonte – a dogmática jurídica, na sua expressão mais restrita, mais
limitada, mais operacional.
Isso é o que distingue Honório de
Medeiros de outros muitos que escrevem sobre temas jurídicos. Honório tem uma
preocupação filosófica, mesmo abordando questões que têm acentuado interesse
para a própria dogmática jurídica. A ótica filosófica está muitas vezes
simplesmente subjacente, implícita, pressuposta no tratamento atribuído ao
estudo e à análise de uma vasta gama de enunciados (alguns deles controversos)
pertencentes a diferentes ramos do Direito.
Aspecto importante a ressaltar é
que os textos de Honório de Medeiros utilizam uma linguagem acessível, direta,
despojada de tecnicismos. Essa peculiaridade torna o seu livro de leitura não
somente útil como agradável. É algo que valoriza sobremodo a substância, o
conteúdo das concepções expostas e constitui notável exceção à forma –
geralmente inóspita – escolhida pelos autores de obras jurídicas para
expressarem suas ideias, cuja inconsistência, muitas vezes, fica disfarçada
atrás de palavras e construções de insuportável pedantismo.
Vale observar que poucos, raros,
no Brasil, se interessaram ou se interessam pela vertente filosófica do
Direito. Os exemplos de A. L. Machado Neto e de Tércio Sampaio Ferraz ainda
permanecem isolados e inigualáveis. Talvez não tenha surgido ninguém depois
deles com o mesmo grau e densidade de conhecimentos jusfilosóficos e com uma
contribuição tão original, profunda, complexa e, ao mesmo tempo, fortemente
didática à abordagem dos grandes problemas teóricos suscitados pelo fenômeno
jurídico.
Sempre me dediquei ao estudo
desses aspectos teóricos, sem prejuízo de minhas atividades no Ministério
Público Estadual e, depois, na advocacia. Na condição de professor de Introdução
ao Estudo do Direito da UFRN, habituei-me a questionar a respeito da natureza
do Direito, da necessidade de sua existência dentro da sociedade, dos
princípios que regem a criação, interpretação e aplicação das normas jurídicas.
Através desses estudos, creio ter construído uma modesta visão crítica e
analítica do Direito.
Lembrando-se, certamente, da orientação filosófica que eu imprimia às minhas aulas no curso de Direito da UFRN, Honório de Medeiros, meu brilhante ex-aluno, resolveu convidar-me para estas palavras iniciais. Sinto-me homenageado e, ao mesmo tempo, feliz em constatar o quanto Honório de Medeiros foi bem-sucedido nas investigações teóricas que realizou, augurando que elas sejam acompanhadas de novas produções de igual nível de qualificação – tanto no âmbito formal, como na abrangência e proficiência dos temas abordados.
PODER POLÍTICO E DIREITO (ensaio, 1a. edição)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS FILHO, Francisco Honório. Poder Político e Direito: A Instrumentalização Política da Interpretação Jurídica Constitucional. Natal: A.S. Editores. 2003.
INTRODUÇÃO
sábado, 24 de setembro de 2022
INVESTIGAÇÃO PARCIAL ACERCA DA SOLIDÃO (ensaio)
* Honório de Medeiros (honoriodemedeiros@gmail.com)
MEDEIROS, Honório de. Investigação Parcial Acerca da Solidão. Natal: Nossa Editora. 1984.
PREFÁCIO
INVESTIGAÇÃO PARCIAL ACERCA DA SOLIDÃO
determinação ou circunstância?
*
Pedro Simões Neto
O
livro começou a me interessar a partir do título. A solidão sempre merece uma
investigação – mesmo parcial (no duplo sentido).
No
Rio Grande do Norte, pelo que sei, é o primeiro trabalho no gênero. E dos
raríssimos escritos sobre metafísica. Embora os inéditos repousem, impunes, nas
gavetas dos estudiosos.
Sem
me decidir se o tema foi determinado, como matéria opcional de investigação, ou
circunstancial, produto da análise intro ou extrospectiva, intrigo-me com a
revelação da juventude de Honório de Medeiros. Conhecida, evidentemente, nunca
intuída ou deduzida, a se julgar pela gravidade do autor/personagem(?).
Surpreende,
ainda, o campo de estudos metafísicos empreendido por Honório. O SER, sua
existência e sua essência, eis a proposta de experimentações do jovem (?)
escritor. Na mesma linha de Liebniz, Bergson, Heidegger, Kierkegaard,
Wittgenstein e Sartre – só para alinhar referências.
Mas,
ao contrário dos ilustrados companheiros, Honório inaugura (sua ou dos outros?)
solidão, partindo de uma escritura intrigante. Hermética, a princípio, talvez
em razão do método de investigação, do enunciado metafísico. Aos poucos, no
entanto, vai tecendo a (sua ou dos outros?) solidão, com extrema desenvoltura
dialética, com liberdade poética. A partir daí o tema perde densidade
metodológica e conquista, com bastante vantagem, a condição de mesa de bar, de
cotovelos na janela e olhares presos no vazio. Ganha intensidade humana.
Talvez
porque se possa definir a obra como construção pessoal do autor, enquanto
singular, interessa menos o tecido de sua composição (a despeito de bem
elaborado e original) que o artesão que a tece.
O
que levaria um jovem em plena conquista de “status” sócio-cultural e econômico
– segundo a cartilha civilizatória ocidental – a manter tal base de estudos?
É
bem verdade que as referências históricas (contemporâneas ou não), como que
balizam a desesperada busca da juventude, por coisa alguma indexada nos valores
ditos culturais da civilização. A procura é introspectiva, não pode ser
mensurada por qualquer ordem de grandeza materialista.
O
“spleen”, o “Weltmerschz”, os “rebeldes sem causa”, a “geração perdida” ...
Aconteceu o Movimento Hippie. O ’68 na França. Schumacher fala do ideal de um
homem ajustado a uma sociedade perfeita. Fala com ironia. Como se o ideal
humano fosse realmente uma sociedade dadivosa, sacietária ...
Talvez
Honório esteja certo. Primeiro é preciso conquistar a essência para delinear a
existência. Porque é na essência que ele penetra, afastado o “seu” solitário
dos problemas da existência, concedendo-lhe o arbítrio do seu próprio projeto
de solidão. Cada qual tece e urde o seu próprio arquétipo solitário, que aos
poucos deixa de ter uma causa circunstancial e se afirma como opção
existencial.
Um
projeto ontogenético? Talvez. Talvez algo mais: uma estação poética obsessiva.
Que nos afasta de Orwell, de Toffler, de Berdiaev e de quantos concedem à
sociedade, à organização social e política, o projeto existencial do Homem.
Determinação ou circunstância, o “projeto” de solidão de Honório de Medeiros é fascinante. Sobretudo porque nos remete à preocupação com o SER, com o existir.