quarta-feira, 18 de junho de 2014

O PACTO DOS GOVERNADORES PARA ELIMINAR OS CANGACEIROS (COM POST-SCRIPTUM)



* Honório de Medeiros

Teria havido um pacto entre os governadores para a eliminação dos cangaceiros, sem que lhes fosse dado o direito de responderem processo ante a Justiça?

O estudo dos cangaceirólogos e os indícios levam a crer que sim.

Houve uma reunião em Recife, no dia 28 de dezembro de 1926, entre os chefes de polícia dos estados do Nordeste, cujo teor não pôde ser vazado para a imprensa em decorrência do seu caráter reservado e das medidas de ordem interna que estavam sendo tomadas e não podiam ser reveladas.

O Governador anfitrião, Estácio Coimbra, na abertura do conclave, fizera críticas contundentes aos coronéis do interior e sua complacência com o banditismo. E já havia tomado algumas medidas radicais no combate ao cangaceirismo: nomeara, a 16 de novembro daquele ano, o Major Teófanes Ferraz Torres para comando geral das unidades policiais de cidades e vilas no interior do Estado e lhe dera “carta branca” para atacar o principal suporte dos cangaceiros, através da eliminação ou redução drástica de seus coiteiros, mesmo que para isso fosse necessário prender e torturar, como de fato foi feito ao longo dos anos seguintes.

Frederico Pernambucano de Mello[1] comenta o encontro:

“Daí para a idéia da promoção de novo encontro[2] ia apenas um leve passo. Ele é dado logo a 28 de dezembro desse ano[3] com a reunião, mais uma vez no Recife, de representantes dos Estados atingidos pela ação do banditismo – os tradicionais, como os mais recentes – de modo especial a que decorria do comando superiormente engenhoso de Lampião.

Da Paraíba, freguesa antiga do bandido, chega o chefe de polícia, Júlio Lira; do Ceará, Paes de Carvalho; do Rio Grande do Norte, Benício Filho[4]. Pernambuco se faz representar pelo chefe de polícia, Eurico de Souza Leão, e pelo secretário de Justiça, Genaro Guimarães. (...) Alagoas, Ernande Teixeira Bastos; (...) Madureira de Pinho, chefe de polícia da Bahia.” 

Vamos aos indícios: no Rio Grande do Norte, Sérgio Dantas relata o episódio da morte de Mormaço e Bronzeado[5]: 

“Mossoró, 12 de março. A cadeia pública passava por minuciosa revista. Prisioneiro recambiado para a cidade de Apodi deu conta às autoridades de plano de fuga encabeçado pelos cangaceiros Mormaço e Bronzeado. O objetivo da empreitada – segundo o delator – seria o aprisionamento do carcereiro e a tomada das armas depositadas no paiol. 

A polícia não titubeou e investigou sumariamente a denúncia. Descobriu sinais de arrombamento em porão localizado no setor norte do presídio. Sem maiores rodeiros, responsabilizou os dois cangaceiros por tentativa de fuga e os imobilizou à força de algemas[6]. 

Na manhã seguinte decidiu-se pelo encaminhamento dos prisioneiros para a capital. O tenente Laurentino ficou encarregado de facilitar o transporte. Além de Mormaço e Bronzeado, seriam de igual recambiados os criminosos Thomaz dos Santos e Waldemar Ramos, presos comuns, detidos há meses na cidade salineira.

A ordem de transferência para Natal – segundo insinuações surgidas no período subseqüente à eclosão do movimento revolucionário de 1930 – partira do Governo do Estado, ainda na véspera.

Fato concreto, imaculado de dúvidas, é que a transferência em discussão foi efetivamente autorizada. 

Entre Mossoró e Açu, no Sítio Lagoa Cerrada, os bandoleiros encontraram a morte. Foram fuzilados. 

Não se chegou, à época, a ser apresentada à sociedade civil versão verossímil para o caso.

Durante o governo revolucionário de 1930, entretanto, foi aberto Inquérito para apurar os extermínios de criminosos, inclusive cangaceiros. O Tenente Abdon Nunes – não se sabe a que pretexto – chamou para si toda a culpa pelos assassinatos. Isentou o Governo do Estado de qualquer responsabilidade. Durante interrogatório, disse, textualmente: ‘Não recebi ordens de ninguém. E diga ao Chefe de Polícia que tive pena de não ter podido matar os outros’[7]. 

No Ceará a imprensa reagiu à chacina, em tudo e por tudo realizada nos moldes utilizados para a morte de Jararaca, Bronzeado e Mormaço, comandada pelo Sargento José Antônio do Nascimento, do cangaceiro Lua Branca e quatro comparsas, remanescentes do bando de João Vinte e Dois[8]: 

‘Os grandes responsáveis são os poderosos e tranqüilos mandantes dessas tropelias dos cangaceiros. São vendedores de armas e munições. São os compradores solertes dos produtos de cada assalto’.” 

O que nos diz Fenelon Almeida[9] acerca da morte de Jararaca? 

“Não obstante as dores fortes que sentia, Jararaca dava sinais evidentes de que iria sarar dos graves ferimentos recebidos. Vinha aos poucos melhorando. Seu organismo resistia de maneira surpreendente. E isso passou a preocupar as autoridades policiais de Mossoró. Por temor ou por simples espírito de vingança, preferiam que ele morresse de vez, sem apelação. Que desaparecesse de Mossoró. Não queriam mais tê-lo ali nem uma semana.

O Tenente Laurentino de Morais [10] tinha ido a Natal, de onde regressou no dia seguinte (com quem teria estado ele?). A partir de sexta-feira, dia 17, começou a circular pela cidade a notícia de que o ainda temível cangaceiro seria transferido de Mossoró para Natal – uma informação lacônica, desacompanhada de qualquer comentário ou explicação da medida.”

Sérgio Dantas[11], novamente: 

“Até hoje ignora-se de onde ou de quem partiu a ordem para o extermínio do cangaceiro[12].”

Importante, para a compreensão da possibilidade desse pacto, é a leitura da carta publicada por Manoel Alves do Nascimento[13], enviada por Paulo Fernandes, filho de Rodolfo Fernandes, em 15 de setembro de 1963, ao escritor Nertan Macedo, que pela sua importância vai transcrita integralmente, sem ser editada:

“Limo. Sr. 

Nertan Macedo

Rio de Janeiro (GB)

Na qualidade de filho de Rodolfo Fernandes de Oliveira Martins, prefeito de Mossoró, RN, por ocasião do assalto de Lampião àquela cidade, tendo deparado à página 213, linhas 20/21 do seu livro ‘Capitão Virgulino Ferreira Lampião’ com uma afirmativa que não corresponde a verdade, cumpro o dever de refutá-lo e solicitar de V. SA. as providências que o caso requer. 

De V. SA. referindo-se à Jararaca, que ‘de madrugada, um conselho local, reunindo elementos de maior destaque da municipalidade, decidiu pela morte do bandido’. 

Jamais ouvira falar em tal reunião nem também ouvira imputar a elementos da municipalidade a decisão de eliminar o bandido Jararaca.

Quando ocorreu o assalto de Lampião (13 de junho de 1927), encontrava-me no Rio cursando o 6° ano de medicina. Menos de quatro meses depois meu pai veio a esta capital e aqui faleceu a 10 de outubro, tendo conversado comigo sobre os dramáticos acontecimentos e não me declarou entretanto ter mandado matar Jararaca. 

Posteriormente ouvi pessoas de minha família e também estranhos sobre os referidos acontecimentos e nunca ouvi qualquer coisa que induzisse pelo menos a um indício de verdade na afirmação de V. SA. 

Deliberei entretanto em viajar recentemente até Mossoró para investigar melhor o assunto. Falei a várias pessoas, homens honrados, alguns dos quais tomaram parte na defesa da cidade e de nossa residência e todos unanimemente repudiam a versão do seu livro. 

Embora cumpra a V.SA. e não a mim provar o alegado. Apresso-me em aduzir alguns comentários que esclarecem o assunto. Vejamos alguns fatos e circunstâncias em que se desenrolaram os acontecimentos em exame. 

1 – As forças policiais, sediadas em Mossoró, obedeciam ao comando do oficial Abdon Nunes[14];

2 – O Governador do Rio Grande do Norte, Doutor José Augusto Bezerra de Medeiros e o seu chefe de polícia, Desembargador Manoel Benício de Melo, estavam à época, em franco dissídio com o prefeito de Mossoró (meu pai); 

3 – Segundo consta, as autoridades estaduais não acreditavam que Lampião atacaria Mossoró e por isso não enviaram, com antecedência, forças suficientes para defesa da cidade;

4 – O Sr. Mirabeau Melo, chefe da repartição do telégrafo em Mossoró era irmão do chefe de polícia, e atuava como informante das coisas locais e porta voz do governo era um medíocre intrigante, inadequado para a missão que o destino lhe reservou pois tanto o governador do estado e seu chefe de polícia como o prefeito de Mossoró eram homens de bem e do mesmo partido político de modo só se compreende o dissídio entre eles em torno do problema de interesse público em virtude da ação maléfica de mexeriqueiros; 

5 – As advertências à população e providências tomadas por meu pai eram exploradas pela oposição até com o ridículo. Chamavam-no por exemplo de velho medroso por se preocupar com um possível ataque de Lampião à cidade;

6 – Quando porém se tornou certo o ataque e o pânico dominou a cidade nossa casa foi procurada como refúgio por alguns desses detratores. Segundo relato que me fez nosso motorista, José de Paula, já falecido, que assistiu à cena, um comerciante de alta projecção local, José Martins Fernandes ajoelhou-se aos pés de meu pai e lhe pediu perdão da campanha que movera e lá ficou, em nossa casa, perdoado, inerte e inútil, durante toda a luta;

7 – O telegráfo nem sempre foi voraz[15]. Recordo-me ainda de ter lido os telegramas vindos de Mossoró e retransmitidos de Natal para Juvenal Lamartine, governador eleito para o Rio Grande do Norte por eles ficava-se com a impressão de que Lampião dominará a cidade;

8 – Jararaca, preso, recusou o alimento que lhe fornecia o xadrez e declarou que só comeria comida da casa do prefeito. Minha mãe enviou leite para sua alimentação. Houve censura e comentários por essa atitude. 

9 – Boatos, intrigas políticas dominavam o ambiente apesar de que houvesse o real perigo de um novo assalto;

10 – Corriam porém ameaças de que o governo cogitava de desarmar os civis que eram afeiçoados a meu pai embora houvessem defendido à cidade e fossem todos homens pacatos em Mossoró não havia nem nunca houve o hábito do rifle; 

11 – Jararaca dissera ou mandara dizer ao meu pai que desejava falar-lhe em particular. Até hoje não se sabe o que ele pretendia dizer pois foi massacrado na noite que seguiu; 

12 – Pessoas fidedignas que conviveram com meu pai disseram-me agora que ele na intimidade reprovou a morte de Jararaca;

13 - Alega-se que se meu pai tivesse tido conhecimento prévio do massacre projetado teria se apressado em ir ao encontro solicitado por Jararaca pois no consenso de muitos, este desejava, no mínimo, revelar onde estava escondido seu dinheiro ou fazer qualquer revelação a respeito de Lampião, por vingança, pois ele não acudiu aos seus rogos para que o levasse ferido, deixando à margem de um desvio ferroviário rente aos fundos de nossa casa;

14 – Ainda está vivo um dos soldados da escolta que abateu Jararaca. É o Sr. João Arcanjo, hoje funcionário da prefeitura de Mossoró. Não o ouvi por escrúpulo. Deve ter sido um mero instrumento a cumprir ordens de algum superior sem nada saber nem poder se insurgir contra as mesmas; 

15 – Sabe-se ainda que o Sr. Amaro Silva, agrônomo, funcionário do Ministério da Agricultura, cortou as orelhas de Jararaca[16] e levou-as para Natal para exibi-las às autoridades. 

As circunstâncias e fatos narrados induzem a conclusão de ser pura invencionice afirmativa de que ‘um conselho local, reunindo elementos de maior destaque da municipalidade, decidiu pela morte do bandido.’ 

Os fatos devem ter ocorrido de outro modo. 

Ouvi a respeito do Dr. José Augusto Bezerra de Medeiros e ele me respondeu que o Jararaca morrera na luta. 

É cedo para esclarecer o caso. Ainda estão vivas pessoas envolvidas direta e indiretamente no assunto. Há ainda descendentes próximos de outros. 

Seria tarefa subversiva agitar agora essa questão. Meu objetivo é apurar os fatos, senão a bem da verdade e da memória de meu pai refutar a imputação que indiretamente lhe foi feita.” 

Assim como é importante entender os “bastidores” da morte de Chico Pereira, através da leitura de Adauto Guerra Filho[17]:

“Apesar de ser uma história longa e complexa, não é difícil entender a razão de tanta contradição. Em primeiro lugar, levemos em consideração uma informação do livro ‘Vingança, Não’ de F. Pereira Nóbrega, o qual diz que os dois Presidentes de Província, Dr. Juvenal Lamartine, então Presidente do Rio Grande do Norte, e João Suassuna, Presidente da Paraíba, fizeram um pacto de morte no dia 18.08.1928. Isto assim se explica: O Presidente da Paraíba não queria entrar em choque com o recém-eleito Cel. João Pessoa, que dera a Chico garantia de liberdade. Então idealizou uma forma de condená-lo fora do Estado. Ele bem sabia que cangaceiro no Rio Grande do Norte tinha vida curta e, por isso, oportunamente se aproveitou do assalto à casa do Cel. Quincó para idealizar uma forma de incriminar Chico Pereira[18]. Isto aconteceria ao induzir o bandido principal, Antônio Jerônimo, conhecido por Antônio Chofer, a dizer que Chico estava entre eles. Pessoas maliciosas vão mais além, afirmando que o assalto fora programado, tanto é que, logo após a ida de Chico para a detenção, em Natal, Antônio Chofer caiu no desinteresse da Justiça, inclusive sendo solto e ficando no anonimato.

Outro fato curioso que nos induz a pensar que o assalto foi programado é o excessivo interesse de Antônio Suassuna – o Tonho, sobrinho do Presidente da Paraíba, pela ‘liberdade’ de Chico Pereira. Ele próprio hospedou Chico em sua casa, na Fazenda Cajueiro, no município de Catolé do Rocha. Ali chegando, Chico foi alvo de sua atenção, havendo Tonho servido de mediador entre ele e João Pessoa, ao levá-lo à presença do Presidente eleito. Naquela ocasião, Tonho convenceu Chico de que, após o júri em Princesa, nada mais lhe aconteceria. Este fato, aliás, o demoveu da idéia de se retirar para Goiás.

Em Acari, Chico Pereira, sentindo o acre da traição, escreveu a Tonho, fazendo paralelos entre a cadeia e a Fazenda Cajueiro e, na doce ilusão de que um dia seria solto, dizia ao traidor que após ficar livre, não hesitaria em matá-lo.

Ainda com referência ao fato, o Sr. Abdias Pereira Dantas, numa conversa com o autor em Nazarezinho, no dia 04.01.1985, assim falou: 

“Só me queixo da morte do finado Chico, de João Suassuna. Depois que Chico morreu, ele mandou me chamar para conversar. Respondi que, com um bandido da qualidade dele, não queria conversa. Quem fez o assalto à casa do Cel. Quincó foi o sobrinho dele”. 

Ainda para tornar mais clara a contradição da Justiça, o Pe. Francisco Pereira Nóbrega falou ao autor em João Pessoa, em 10.01.1985, que, no momento do assalto, seu pai se encontrava no município de Pombal. Ele é também dos que acreditam na hipótese do assalto ter sido programado naquele lugar. 

Pelo menos uma coisa não se põe em dúvida: a morte de Chico estava programada. Isto está confirmado no depoimento de um soldado sobrevivente que reproduziu um diálogo entre Juvenal Lamartine e o Ten. Joaquim de Moura. O Presidente solicitou a presença do Tenente em seu gabinete e a ele assim se dirigiu: 

- É verdade que aquele cangaceiro da Paraíba vai voltar para Acari? 

- É, sim.

- Olhe! Não quero esse homem vivo.” 

Essa determinação, a priori, até dispensa pesquisadores de fazer exames mais apurados sobre notas de jornais diversos, tais como: 

“Correio de Campina – 17.12.1928. ‘Teria sido Chico Pereira vitimado mesmo de um desastre de carro? Pessoas residentes no interior do Estado (Rio Grande do Norte) põem dúvida à afirmação. O Presidente potiguar é acusado de mandar fuzilar sumariamente os sertanejos acusados’ (Livro “Vingança, Não”, pág. 254).” 

“Diário da Manhã, de Recife (PE) – 02.11.1928. “Chico Pereira, preso há pouco, ao ser transportado para a cidade de Acari, onde devia ser julgado, foi morto de ordem superior pelos policiais que o conduziam. Alegou-se que o carro que o conduzia capotou, verificando-se terrível desastre.” (Livro “Vingança, Não”, pág. 254).”

Continua, mais a frente, Adauto Guerra Filho: 

“O Sr. José Pereira da Costa, cidadão de Ouro Branco, tabelião da cidade e curioso das histórias da região, assim detalhou o fato, em 09.07.1984:

‘Chico Pereira chegou preso a Santa Luzia na companhia do Ten. Manoel Arruda e alguns soldados. O Ten. Francisco Honorato, de Serra Negra do Norte, foi indicado para recebê-lo. Chico vinha de paletó e gravata e isso provocou censura da parte do Tenente: 

- Como se conduz um bandido de paletó e gravata? Isso é um cachorro de fila. 

Em seguida, com arrebates, tirou o paletó e a gravata de Chico e autorizou os soldados a lhe colocarem as algemas. O Ten. Francisco Honorato esperava que o matador de Chico fosse ele. Porém a ordem do governo veio para o Ten. Joaquim de Moura. Ele ficou revoltado’. “

Quem matou Chico Pereira: João Suassuna e Juvenal Lamartine? Teria sido Aproniano, irmão de Chico Pereira, quem assassinara João Suassuna no Rio de Janeiro, contratado pela família de João Pessoa ou unicamente para vingar Chico Pereira? Corre essa lenda ou história no Sertão. Talvez não se saiba nunca a verdade. A morte de Chico Pereira é a prova do Pacto dos Governadores? 

Raimundo Nonato como que referenda essa tese[19]: 

“Em longo depoimento constante de publicação oficial (A República de 22-10-1930) por determinação ‘post’-revolução do Chefe de Polícia, João Café Filho, e prestado perante o 1º Juiz Distrital de Natal, D. Arnaldo Neto, declarou o Capitão Moura todos os pormenores do plano delegado para a morte de Chico Pereira, em 29-10-1930[20], no transporte do preso para julgamento, no Acari, de suposto processo. “

E publica também, em sua obra, a defesa de Juvenal Lamartine[21]: 

“Quando morreram[22] os bandidos de “Lampião”, no município de Mossoró, e Chico Pereira[23], num acidente de automóvel, no município de Currais Novos, o chefe de Polícia, de acordo comigo, mandou proceder ao inquérito pelo Delegado especial, a fim de que a verdade fosse apurada com rigor[24].

Vitoriosa a revolução, foi aberto novo inquérito a fim de ser processado o presidente do Estado, o chefe de polícia e os oficiais e soldados como responsáveis pelas mortes dos facínoras. A medida deve ser completada pela ereção de um monumento comemorativo das façanhas desses bandidos atacando cidades e fazendeiros honrados. É preciso glorificar o crime e punir os que defendem a propriedade, a vida e a honra ameaçadas por salteadores perigosíssimos[25].” 

Mesmo assim Raimundo Nonato chega a ser irônico quando aborda o episódio da morte de Mormaço e Bronzeado[26]:

“De todos, “Mormaço” foi o bandoleiro que prestou declarações mais importantes, tendo dado nada menos que quatro depoimentos: em Crato, CE., a Pau dos Ferros, Martins e Mossoró, RGN. Em todas as referências e as acusações são mais ou menos semelhantes. 

Juntamente com “Bronzeado”[27] e mais dois presos de justiça, que se encontravam na cadeia de Mossoró, foi levado para a estrada de Natal e morto com os outros. Do ocorrido há um processo, onde se fez prova de qualquer forma, que um dos bandidos pegou um fuzil, atirou nos companheiros, e depois, suicidou-se com a mesma arma...” 

Gutemberg Costa[28] noticia a reação do Tenente Abdon Nunes ao inquérito contra si aberto como conseqüência da execução e Jararaca: 

“Dois anos e meio depois da morte de Jararaca em Mossoró, o capitão Abdon Nunes de Carvalho, avocou para si toda a responsabilidade do episódio. Assim, o processo tão desejado, contra os ex-governadores José Augusto e Juvenal Lamartine não teve curso. Por causa disso a minúscula facção política de oposição (daquela época) fez violenta carga, pela imprensa contra o Governo, de acordo com comentário de Raul Fernandes na sua obra sobre o assunto, citada neste capítulo.” 

Houve ou não um pacto entre os governadores para a eliminação física dos cangaceiros, sem que lhes fosse dado o direito de responderem processo ante a Justiça?

[1] “GUERREIROS DO SOL”; Massangana Editora; A Girafa Editora Ltda. ; Segunda edição; 2004; São Paulo; SP.

[2] O anterior fora em 15 de dezembro de 1922.

[3] 1926.

[4] Benício Filho era Chefe de Polícia do Governador José Augusto Bezerra de Medeiros e irmão do Chefe dos Correios e Telégrafos de Mossoró, este acusado por Paulo Fernandes, ex-Prefeito de Mossoró e filho de Rodolpho Fernandes, de fomentar o afastamento de seu pai com o Governador do Estado que era seu correligionário político.

[5] “LAMPIÃO E O RIO GRANDE DO NORTE”; DANTAS, Sérgio Augusto de Souza; Cartgraf – Gráfica Editora; 2005; Natal; Rn.

[6] Terá sido armação? Por que esse preso foi recambiado para Apodi? Talvez tenha sido seu prêmio, caso contrário teria o mesmo fim dos outros presos comuns. Observe-se a rapidez com que a polícia agiu.

[7] Sérgio Dantas informa que a afirmação está em SUASSUNA e MARIZ, 2002, p. 236.

[8] “LAMPIÃO E O RIO GRANDE DO NORTE”; DANTAS, Sérgio Augusto de Souza; Cartgraf – Gráfica Editora; 2005; Natal; Rn.

[9] “JARARACA: O CANGACEIRO QUE VIROU SANTO"; ALMEIDA, Fenelon; Guararapes; Recife, Pe; 1981.

[10] Clóvis Marcelo de Araújo que se encontrava de guarda no Presídio onde estava Jararaca, afirmou a Raimundo Soares de Brito: “A escolta era composta do Tenente Laurentino de Morais, então Delegado e Comandante do destacamento; Tenente Abdon Nunes; Sargento Pedro Silvio de Morais; um Sargento do destacamento de Macau, cujo nome não recordo; Cabo Manoel de Tal e os Soldados Militão, Paulo e João Arcanjo (GURGEL, Antônio e BRITO, Raimundo Soares de; “NAS GARRAS DE LAMPIÃO”; Fundação Guimarães Duque; Fundação Vingt-Un Rosado; Coleção Mossoroense; Volume 1513; 2ª. Edição.

[11] “LAMPIÃO E O RIO GRANDE DO NORTE”; DANTAS, Sérgio Augusto de Souza; Cartgraf – GRÁFICA EDITORA; 2005; Natal; Rn.

[12] Jararaca.

[13] “POLÍGONO – REVISTA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ESTUDOS DO CANGAÇO – TOMO I – ANO I - Coleção Mossoroense; Série “C”; Volume 963; Co-edição ETFRN/UNED; Mossoró; 1997.

[14] Não era o Tenente Laurentino?

[15] Deve ser “veraz”.

[16] Na realidade as de Colchete. Segundo entrevista feira por Ilná Rosado com Jerônimo Lahyre de Melo Rosado, Amaro Silva foi até o Sítio “Canto”, onde estava sua mãe Dna. Marola, levando uma orelha de Colchete. Botaram-na em uma lata e esta dentro de outra e enterraram em baixo de uma árvore perto da casa que ficava próximo da porteira. Nunca mais a encontraram.

[17] “O SERIDÓ NA MEMÓRIA DE SEU POVO”; Julho de 2001; Editora: Departamento Estadual de Imprensa; Natal, Rn.

[18] José Ribamar Diógenes, filho de Antístenes Diógenes, este proprietário da Fazenda “Tombador”, entre Rodolfo Fernandes, Itaú e Pereiro, me contou que seu pai acoitou Chico Pereira. Informou, inclusive, que Chico Pereira casou-se com sua esposa por procuração através de um irmão seu, nessa fazenda. E observa que Chico Pereira era conhecido, no “Tombador”, por João Estrela.

[19] “LAMPIÃO EM MOSSORÓ”; 4a. edição; Coleção Mossoroense; Série C; Volume CDVIII; 1989.

[20] A data não bate com a da publicação do jornal “A República”.

[21] “LAMPIÃO EM MOSSORÓ”; NONATO, Raimundo; COLEÇÃO MOSSOROENSE, SÉRIE “C”, VOLUME CDVIII; 1989; 3ª. Edição; 1965; EDITORA PONGETTI; Rio de Janeiro; Brasil.

[22] Juvenal oculta que os cangaceiros foram mortos, não morreram.

[23] Idem.

[24] Compare-se com o depoimento do Capitão Moura, citado acima, por Raimundo Nonato.

[25] Eis a debochada defesa de Juvenal quanto à morte de Chico Pereira.

[26] “LAMPIÃO EM MOSSORÓ”; NONATO, Raimundo; Coleção Mossoroense, série “C”, volume CDVIII; 1989; 3ª. Edição; 1965; editora Pongetti; Rio de Janeiro; Brasil.

[27] “Além de Jararaca, mais outros cangaceiros envolvidos com os ataques a Apodi e Mossoró foram, de maneira sumária e com os mesmos requintes de perversidade, justiçados pela Polícia sob o mesmo álibi: Transferência para o Presídio de Natal. Bronzeado e Mormaço (...) foram eliminados juntamente com Valdemar Ramos e Tomaz dos Santos, dois presos de justiça que se encontravam detidos e aguardando julgamento” (GURGEL, Antônio e BRITO, Raimundo Soares de; “NAS GARRAS DE LAMPIÃO”; Fundação Guimarães Duque; Fundação Vingt-Un Rosado; Coleção Mossoroense; Volume 1513; 2ª. Edição.).

E o Juiz e o Promotor de Mossoró da época: nada!

[28] “GOTA DE SANGUE NUM MAR DE LAMA”; COSTA, Gutemberg; Gráfica Santa Maria; Natal, Rn, edição do Autor.

POST SCRIPTUM 1:

Ao escritor Ângelo Mário de Azevedo Dantas, autor da “CRONOLOGIA DA POLÍCIA MILITAR DO RIO GRANDE DO NORTE” (175 anos de história – 1834 a 2009), volumes 1 e 2, prefácio de Manoel Onofre Jr.; edição do Autor; 2010; obra de inestimável valor para os estudiosos da história do Rio Grande do Norte, encaminhei a consulta seguinte:

“Amigo,

Consulta ao grande historiador da Polícia Militar do Rn:

Que temos acerca do Coronel Joaquim Teixeira de Moura, importante no Governo Juvenal Lamartine? Temos foto?

Um grande abraço,

Honório de Medeiros.”

E recebi, prontamente, a seguinte resposta:

“Como vai o amigo?

Quanto a Joaquim de Moura, temos sim!

Ele era um dos grandes homens de confiança de JL[1]. Era pau pra toda obra. Necessitando matar alguém era com ele mesmo. Aquela "estória" da virada do caminhão que transportava Chico Pereira ficou engasgada por muito tempo.

Eu vou separar aqui algumas informações que tenho sobre ele e repasso ao amigo. Tenho apenas duas fotos. Uma consta do livro História do Batalhão de Segurança. A outra foi tirada de um jornal de 1935, onde ele está postado ao lado de outros oficiais.

Joaquim de Moura atingiu o posto de coronel ao ser transferido para a reserva remunerada. Em serviço ativo só chegou a major, mas o pessoal daquela época conquistava até três degraus quando se aposentava.

Coronel Bento Manuel de Medeiros, pai de Maurilio Pinto era major quando passou para a reserva. Foi a tenente coronel por direito natural (um posto a mais) e foi a coronel por ter participado da intentona de 1935. Como ainda tinha direito a mais um posto e já tinha alcançado o mais elevado, então ganhou um adicional de 20% nos vencimentos.

Isso ocorreu com inumeros oficiais. Tivemos um oficial chamado Antonio Mozart Soares - genitor do coronel Simar Lasfir Soares. Ele foi pra reserva no posto de capitão era capitão quando atingiu o tempo de serviço para a reserva e foi promovido a major, tenente coronel e coronel num mesmo ato, justamente porque tinha direito a três promoções. A chamada lei de guerra e de esforço de guerra também beneficiou policiais militares. Este era o terceiro direito.



Ok, amigo: Vamos lá - da esquerda para a direita (o cara de chapéu nada tem a ver):

1) Tenente Francisco Bilac de Faria - parente de Juvenal Lamartine. Ele era o oficial de dia em 23 de novembro de 1935, quando irrompeu a Intentona Comunista aqui em Natal. Bilac chegou a Coronel e foi deputado estadual nos anos 60, salvo engano.

Como capitão, foi prefeito nomeado de Martins. Outro detalhe: foi o primeiro oficial combatente a se formar em odontologia, isso em 1940, e chegou a atuar como dentista da PM mesmo antes de se formar. Tais informações constarão do meu futuro livro - História do Serviço de Saúde da PM-RN que pretendo publicar em agosto próximo.

2) Capitão Joaquim Teixeira de Moura;

3) Tenente Coronel Luis Júlio - que era o Cmt da PM na Intentona de 1935. Ele também era sogro do Dr. Onofre Lopes da Silva - patrono do atual Hospital Universitário. Era cunhado do Tenente-Coronel Jacinto Tavares Ferreira que concluiu o inquérito policial contra Lampião acerca do Fogo da Caiçara.

Luis Júlio era tio da minha avó paterna, fato que descobri há cerca de quatro anos passados. Antes de 1970, morei na Av. Rio Branco, quase esquina com a Juvino Barreto e me lembro bem de um irmão mais novo do coronel Luis Júlio. Chamavam-no "Dinda" e ele gostava muito de mim, me levava para tirar retrato 3x4, cortar o cabelo etc.

4. Tenente Severino Raul Gadelha - era o Cmt do Esquadrão de Cavalaria durante a intentona. Chegou a ser Cmt Geral da PM nos anos 50.”

POST SCRIPTUM 2:



“Quem passa diariamente por aquele trecho da Maniçoba, talvez não perceba esta capelinha lá existente, a esquerda da Rodovia BR 226, sentido Currais Novos-Natal. Foi o exato local que o cangaceiro Chico Pereira foi assassinado quando vinha responder júri no Acari. E o pior é que Chico Pereira morreu inocente, pois nenhum crime seu foi constatado pela justiça norte-riograndense.” 

Imagem e comentário de Volney Liberato, filho de Currais Novos, Seridó - RN. Bacharel em Administração pós-graduado pela UFRN; repórter pela Oficina de Jornalismo "Genival Rabelo"; pesquisador do cangaço, história regional e cultura popular.


“Ruínas do casarão pertencente a Chico Pereira de Nazarezinho, Situado no sítio Jacu, município de Nazarezinho, encontra-se, infelizmente em ruínas” (Volney Liberato).

POST SCRIPTUM 3:

Em comentário acerca do esboço dessa matéria em honoriodemedeiros.blogspot.com, assim se manifestou Michael Pereira de Lira:

“Sou filho de um dos primos de 2ºgrau do Chico Pereira, Manoel Pereira de Lira, que nasceu em Souza-PB em 04/11/1928. Filho de Maria da Glória Pereira, dona da Fazenda Mãe D'Água. Soube de como mataram o Chico Pereira de forma diferente. Ele não foi preso por suspeita de assalto. Ele se entegou à polícia por orientação de seu amigo e advogado Café Filho que lhe prometeu um julgamento justo. Ele era caçado por ter matado um camarada que havia matado um membro de sua família. Ele prendera o assassino a primeira vez e o entregou à polícia, que logo em seguida liberou o assassino (Provavelmente quem o contratou para cometer o crime teve poder para isso). Chico Pereira prendeu, de novo o meliante, e o entregou à polícia com a promessa de que se o soltassem de novo, ele o mataria, e foi o que aconteceu. Quando soltaram o cabra pela 2ª vez Chico Pereira o matou, passando a ser foragido da polícia que passou a considerá-lo integrante do cangaço. Chico Pereira chegou a trocar favores com o Lampião e chegou a contar com a ajuda de Corisco para fugir das ciladas dos "macacos", como os policiais eram conhecidos na época. Depois que Chico Pereira se entregou à polícia, para ser julgado em Natal, no trajeto, eles o mataram simulando o acidente. Eu tenho um tio que tem este livro "Vingança Não!" Mas achava que o autor fosse o Frei Lira. Não sabia que era conhecido como Padre Pereira, afinal, eu tinha apenas 9 anos quando me contaram esta história. Hoje tenho 48. Sou economista, mas me interesso por história, principalmente quando se refere à cultura popular. Quando tiverem mais informações sobre o Chico Pereira e a família dele, me passem, por favor.”

POST SCRIPTUM 4:

Do mediocridade-plural.blogspot.com.br, por Laélio Ferreira, acerca de JOAQUIM DE MOURA, Oficial da Força Pública do RN, matador de CHICO PEREIRA, In "Othoniel Menezes - Obra Reunida", "Sertão de Espinho e de Flor - Canto 11 ("taquigrafado numa feira")", com Nota de Laélio Ferreira (Honório de Medeiros):




"- Mermo prus perré [1] ,agora,

Café Fio é a lui da oróra,

Papai Noé do Brasí...



- Ante dele sê tão grande,

cafeísta era no frande [2]

na virola e no fuzí...



- Coração de mé de abêia,

o Café, ocês me creia,

imbora impate robá,

vai dá ciloura [3] e camisa

inté a Joaquim Marfisa [4],

se de tanto percisá...



- Cum tanto do “amigo novo”,

vai mái é ficá pru povo

deferente - é de amaigá!



Num adianta, esse luxo

de teimá sê péla-bucho [5]...

- camalião, vai pra lá! [6] "



[1] Nota de OM.

[2] Idem, idem.

[3] Ceroula, cueca.

[4] Joaquim Teixeira de Moura - Referência velada, ferina, ao Coronel da Polícia Militar do RN. Durante o relativamente curto período do governo (1928-1930) de Juvenal Lamartine de Faria (1874-1956), esse oficial notabilizou-se pela violenta repressão aos correligionários – e à própria família - do futuro Presidente Café Filho, inimigo político do Governador. Ficou célebre, quando tenente, em 1928, pelo frio assassinato de um certo Chico Pereira, acusado de roubo no interior do Estado e constituinte de João Café – que era advogado provisionado. Itamar de Souza, in "A República Velha no Rio Grande do Norte", conta, com detalhes, a terrível façanha do militar. Outro escritor, Ivanaldo Lopes – por sinal, filho de um outro coronel -, no livro Oficiais da PM (1980), retrata Joaquim de Moura como “quase perverso por obrigação do ofício”, revelando que “... às vezes, quando o sacrifício era próximo a núcleos residenciais, sepultava o bandido em cova rasa, ainda vivo, mas inerte, mantendo apenas a respiração ofegante de moribundo. Tanto assim era, que, em muitos casos testemunhados por transeuntes, as reações da vida faziam surgir do túmulo um braço ou uma perna, denunciador de alguém ali sepultado.”

[ 5] Ver nota de OM, adiante.

[6] OM, nesta e na sextilha anterior, critica João Café Filho – que praticamente nada fez pelos amigos da primeira hora, esquecendo-os quando assumiu o poder. Othoniel foi um dos que se desiludiram das promessas do político."

sábado, 14 de junho de 2014

OS ANARQUISTAS ESTÃO CERTOS

* Honório de Medeiros

Que dizem os anarquistas?

Qual o núcleo do capitalismo? A mais-valia. Sem mais-valia não há luta de classes. Lê-se isso em Raymond Aron, "O Marxismo de Marx": "Por último é a teoria da mais-valia que serve como fundamento para o conjunto da construção teórica de Marx, pois o regime capitalista só funciona na medida em que gera mais-valia (...)".

Como surge a mais-valia? Via divisão do trabalho social. Sem que muitos trabalhem para poucos, gerando o excedente, não há mais-valia.

E como, por sua vez, surge a divisão do trabalho social?

O que sabemos acerca desse momento da história no qual, pela primeira vez, surgiu a divisão do trabalho social?

Tal somente foi possível através da persuasão ou da força. A força da persuasão ou a persuasão da força.

Em ambos os casos, somente é possível a persuasão ou força por intermédio do Poder.

O Poder de persuadir, oriundo da capacitação intelectual, do desnivelamento intelectual, ou o poder da força, por intermédio da força física. A força do Poder, o Poder da força.

Tão óbvio isso que Engels tentou entender o papel da força quanto ao surgimento do capitalismo em "Anti-Duhring". Mas não há como negar a acumulação primitiva à custa do exercício da força. 

Então, na base, está o exercício do Poder. Somente há capital porque há Poder.

Os anarquistas estão certos.

sexta-feira, 13 de junho de 2014

DE CRIMINALIDADE




* Honório de Medeiros

Diferente da corrente majoritária hoje nas análises sociológicas acerca das causas da criminalidade e suas consequências, defendo uma abordagem, acerca do tema, de caráter darwinista. 

Ou seja, penso que está mais que no tempo de superar a falida postura de atribuir às condições sociais, à pobreza, por assim dizer, o surgimento da criminalidade.

A pobreza não é causa, é um dos ambientes do surgimento da criminalidade. Para o senso comum, principalmente o brasileiro, é fácil entender essa hipótese: basta acompanhar, diariamente, o noticiário acerca da corrupção. 

Existe uma lógica perversa, típica, por trás da difusão e aprofundamento dessa manobra diversionista que é atribuir á pobreza o surgimento da criminalidade. É uma lógica de gueto, secessionista, da qual se apropriam os interessados em usufruir da confusão que ela origina.

Acerca desse tema tive oportunidade de escrever um artigo que submeto à atenção do leitor: http://honoriodemedeiros.blogspot.com.br/2012/10/o-que-leva-o-jovem-ao-crime.html.

Em relação ao reconhecimento desse "ethos da hipermasculinidade”, ou seja, trocando em miúdos, “a busca do reconhecimento por meio da imposição do medo”, a literatura também se manifesta, mesmo que obliquamente, no sentido de reconhecê-la como uma das causas da criminalidade.

Leiam atentamente o trecho a seguir, pinçado de "Maigret hesita", do genial Georges Simenon, escrito em 1968:

"É provável que lá também encontrasse um pobre sujeito que havia realmente matado porque não podia agir de outro modo, ou então um jovem delinquente de Pigalle, recém-chegado de Marselha ou da Córsega, que eliminara um rival para se fazer crer que era um homem." 

Ai está o senso comum e a literatura mais uma vez mostrando de forma inequívoca por qual razão deve ser um ponto-de-partida para o conhecimento.


* Arte em armonte.wordpress.com

quarta-feira, 4 de junho de 2014

PROJETO DO PT É A LONGO PRAZO

Palma Nova, Itália, de 1539, cinturão externo de Veneza. Ideal renascentista.

* Honório de Medeiros

O projeto em curso no Brasil e em alguns países da América do Sul é obter hegemonia política a longo prazo para a esquerda de inspiração cubana, de caráter leninista, calcada em Gramsci.

Antonio Gramsci, que pretende ter unido Marx a Maquiavel, defendia a tomada do Poder por intermédio da corrosão permanente das instituições democráticas de molde liberal, tais quais o Poder Legislativo e Judiciário, para a obtenção da hegemonia cultural, da qual as outras seriam decorrência.

O planejamento, organização e implementação da estratégia, no caso do PT, está nas mãos dos reais detentores do Poder, como Zé Dirceu, e não é do conhecimento até mesmo de quem aparentemente dirige o País, como Dilma, escolhida por Lula em decorrência de sua ingenuidade truculenta.

A quem Lula trata como líder? Fidel. Onde foi o treinamento tático de Zé Dirceu? Cuba. A quem Hugo Chávez obedecia? Fidel.

Na estrutura real, para eles, o Poder é organizado a partir de círculos concêntricos um dentro do outro, do menor para o maior. As decisões que importam são tomadas no círculo menor e repassadas cuidadosamente ao círculo maior que o contém, e assim por diante, até o último, para garantir sua implementação.

Não é preciso mencionar que somente o círculo menor tem controle de todas as informações. Claramente, temos uma estrutura real x uma estrutura formal (aparente) de Poder.

Aliás, várias instituições seculares funcionam plenamente de acordo com essa disposição estratégica. A mais notável delas é a Igreja Católica.

sexta-feira, 30 de maio de 2014

OS PONTOS A SEREM EXPLORADOS PELA OPOSIÇÃO AO PT




* Honório de Medeiros

Na guerra eleitoral que já está em curso e cujo objetivo é a Presidência da República, os pontos que devem ser maciçamente explorados pela oposição, junto à base da pirâmide social, reduto maior do PT, são a saúde, a segurança pública, e a inflação.

Se a oposição conseguir mostrar que durante o governo do PT esses três setores pioraram acentuadamente, e tendem a piorar ainda mais, a se manter o atual estado de coisas, a batalha pelos corações e mentes do eleitor da base social será vencida.

O povão não está interessado em corrupção. Está interessado no que sente na própria pele.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

QUANTO AO PODER



* Honório de Medeiros

Na Constituição Federal brasileira o imperativo normativo sobre o qual se alicerça o ideal democrático está exposto no parágrafo único do seu artigo 1º:

Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Esqueçamos a segunda parte do imperativo normativo. É mero corolário.

Na primeira parte está implícito que esse imperativo normativo traduz a vontade soberana do povo, ou seja, resultou de determinação sua, no que diz respeito à gênese do poder. É como se o imperativo expressasse que somente é poder aquele emanado do povo.

Ora, não poderia ser diferente, dado que juízos de fato nos dizem como é a realidade; como queremos que ela seja é tarefa dos juízos de valor.

O imperativo normativo é exatamente isso: um juízo de valor.

Vez que o imperativo normativo formaliza um juízo de valor, eis a razão do seu descompasso com a natureza das coisas: não expressou a vontade soberana do povo - isso é pura ficção - tampouco a expressará no que diz respeito ao futuro.

Quando muito a vontade de uns ou de outros, embora todos procurem a hegemonia.

Entretanto seguimos nós alimentando essa lenda e permitindo que cada um ou cada grupo que esteja, de fato, com o poder em suas mãos diga, até quando lhe for possível, não somente o que este é, mas, também, como quer que nós o entendamos.


Arte em www.sociologia.seed.pr.gov.br

terça-feira, 20 de maio de 2014

DE GENTILEZA, CORTESIA, POLIDEZ E HIPOCRISIA



* Honório de Medeiros


As pessoas confundem gentileza com fragilidade. Acham, embora não externem, que quem é gentil é fraco.


Elas não expressam o que sentem, às vezes, porque não conseguem abstrair a sensação que lhes acomete. Mas agem como se o conseguissem. Origina-se, daí, a condescendência, o menoscabo.

É fácil entender essa situação. A gentileza é um degrau além da cortesia que, por sua vez, está acima da polidez. Esta pressupõe um distanciamento, um desinteresse pelo interlocutor, embora, talvez, um certo respeito cético pelas convenções humanas.

A cortesia direciona a atenção das pessoas para seus interlocutores, podendo resvalar, se não houver algum cuidado, em plena hipocrisia. Já o gentil é, em todos os aspectos, realmente interessado e respeitoso com seus interlocutores.

Poderíamos dizer que o gentil é um romântico; o cortês, bem-educado; e o polido, distante, até mesmo frio.

Tudo isso para dar razão a um amigo que cansado de ser confundido com alguém a quem se possa tratar com condescendência, anda migrando lentamente para a polidez. Embora não o faça, ainda que por um pouco de hipocrisia, em sua mente, da mão que estende aos outros somente vai a ponta dos dedos.

Indagado acerca de sua mudança por aqueles que lhe são próximos, culpa, sarcasticamente, o avassalador crescimento da hipocrisia ingênua, aquela que o vulgo batizou de falsidade, tão diferente da hipocrisia irônica, na qual quem fala sabe que quem o escuta percebe facilmente que ali somente se vive um jogo, sutil, cujo resultado é sempre uma soma zero.

Eu, pelo meu lado, penso que na verdade o que acontece é que esse meu amigo vai, a marcha batida, no rumo do ceticismo.

Nada mais que isso.

Arte em arthur.bio.br

segunda-feira, 19 de maio de 2014

DESCANSE EM PAZ, MIGUEL!




* Honório de Medeiros

Em algum lugar do céu, cheio de livros, garrafas de vinho e boa comida, você há de rir, como sempre, ao se lembrar das histórias vividas na velha casa da Alexandrino de Alencar, em Natal, ou nos veraneios em Tibau, quando éramos todos tão jovens e a vida apenas o começar da existência.
 Adeus, Miguel. Descanse em paz.

DESCONCERTAR O LEITOR SISTEMATICAMENTE

Gustave Flaubert


* Honório de Medeiros

Na apresentação feita à "Bouvard e Pécuchet", de Flaubert, aqui no Brasil publicado pela Estação Liberdade, a pesquisadora Stéphanie Dord-Crouslé, autora do estudo "Bouvard et Pécuchet: une encyclopédie en farce" (2000), ao abordar o muito interessante "Dicionário de Idéias Feitas", um dos fragmentos que iria fazer parte do segundo volume, lembra que seu objetivo é "desconcertar o leitor sistematicamente". 

E menciona um trecho de uma carta de Flaubert, datada de 4 de setembro de 1850, enviada do Oriente para seu amigo Louis Builhet: "Você faz bem em pensar no Dicionário das Idéias Feitas. O livro, completamente rematado e precedido de um bom prefácio, onde se indicaria como o texto foi criado com o propósito de vincular o público à tradição, à ordem, à convenção geral, e organizado de uma maneira que o leitor não saiba se estão ou não zombando dele, talvez fosse uma obra estranha e capaz de fazer sucesso, pois seria muito atual" (grifo meu).

Não é esse insight algo que Borges, autor do "Manual de Zoologia Fantástica", nome primitivo do "Livro dos Seres Imaginários", assinaria embaixo?

Lá no "Dicionário de Idéias Feitas" encontramos: "poesia (A). É completamente inútil. Fora de moda", seguido de "poeta. Sinônimo de sonhador e de palerma". Um pouco antes: "pensar. Algo penoso. As coisas que nos obrigam a pensar em geral são abandonadas". Um pouco depois: "xadrez (jogo). Sério demais para um jogo, fútil demais para uma ciência".

Quanto à "Bouvard e Pécuchet", Dord-Crouslé lembra que o eixo temático que norteou Flaubert sempre foi enganar o burguês, mas não somente, também castigá-lo pelos assaltos repetidos da tolice contra o espírito. Para tanto lembra uma outra correspondência de Flaubert, desta vez para sua amante Louise Colet, datada de 16 de dezembro de 1852, na qual ele diz: "Às vezes, tenho pruridos atrozes de descompor os humanos, e um dia, daqui a dez anos, vou descompô-los em algum romance longo de amplo contexto..."

Viva Flaubert!

Arte em: irancartoon.ir 

sábado, 17 de maio de 2014

LIVROS ACERCA DE CANGAÇO, PARA VENDA, POR QUEM ENTENDE


O Professor Francisco Pereira Lima, membro do Conselho Consultivo do CARIRI CANGAÇO, dispõe, para venda, de vários títulos de autores do cangaceirismo, misticismo e coronelismo, podendo envia-los para todo o Brasil e exterior.

Os preços podem variar, para mais ou para menos, a qualquer momento, em decorrência do mercado.

O frete registrado, para todo Brasil,  já está incluso no preço do livro.

Os livros ficam reservados, no máximo, por uma semana, após o pedido.

É necessário confirmar o estoque antes de fazer o depósito bancário.

O acervo pode ser solicitado por intermédio dos seguintes e-mails:


ou

bem como diretamente pelos telefones:

(83) 9911 8286

ou

(83) 8706 2819

POR QUE AS INSTITUIÇÕES NÃO SAÍRAM EM DEFESA DE JOAQUIM BARBOSA?



* Honório de Medeiros

Ameaçado de morte por um malfeitor do PT, o Ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, não recebeu, até onde sei, a solidariedade do Governo, tampouco dos juízes, menos ainda dos procuradores, sequer dos advogados, ou seja, das instituições.

Não importa se, para muitos, ele não é simpático. Aqui se trata da defesa do próprio Supremo Tribunal Federal, representada por seu Presidente. Trata-se da defesa de uma instituição fundamental para a democracia.

Onde anda a OAB, de passado tão glorioso? Transformou-se em uma mera repartição pública? Onde anda o Ministério da Consciência Negra? Onde andam as Associações de Magistrados, sempre tão lestas e dinâmicas na defesa dos seus interesses internos?

Chegamos a um nível de torpeza, neste País, incalculável. Não há mais limites para nada. Se é possível fazer o que esse malfeitor fez com o Presidente do Supremo Tribunal Federal sem receber a repulsa imediata de toda a Sociedade, onde vamos parar?

Tristes tempos.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

COPA DO VEXAME?




* Honório de Medeiros


O Presidente do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, escancarou o que muitos já dizem aos berros nos quatro cantos deste País sem eira, beira, nem cumeeira: "o Brasil vai passar vergonha na Copa". 

Ele não estava se referindo ao futebol, muito embora isso também possa acontecer.

Referia-se às obras inacabadas, apesar dos rios de dinheiro despejados nos bolsos dos espertos de sempre.

Ora, ora, não é que o Presidente Nardes foi contido? Muito contido. Deveras contido.

Sequer mencionou, por exemplo, essa vergonha nacional que é o menosprezo com o qual somos tratados pelas operadoras de telefonia. Fazem o que querem conosco. Não são punidas. E quando o são, devem rir da punição recebida. Como se explica que continuem a fazer o que fazem, sem que as autoridades tomem providências? Será corrupção? Não são essas autoridades acometidas dos mesmos problemas que nós, os reles mortais? Conseguem elas ligar quando querem e manter a ligação durante a conversa? 

Nem mencionou a (in)segurança pública. Hoje somos reféns dos bandidos, que nos encurralam em nossas casas, e furtam, roubam, matam, estupram, em escala cada dia maior, mas, também, do aparelho policial-militar que, ao cruzar os braços com seu oportunismo grevista, passa a senha para o crime surgir dos esgotos e atacar à luz do dia.

Tampouco mencionou a saúde pública. O povão, aqui, além da classe média, está se acostumando ao caos que é a saúde pública. As autoridades lidam com a questão de tal forma que já se espraia, nos corações e mentes, a sensação de que tudo isso é assim mesmo, não tem como mudar, e se mudar, é para pior. Enquanto isso somos espoliados pela máquina de arrecadação do Estado em níveis cada dia mais cruéis. Ou seja: pagamos cada dia mais, por cada dia menos e pior.

Também não mencionou a corrupção generalizada, onipresente, no nosso dia-a-dia. Nada, hoje, no Brasil, parece funcionar sem corrupção. Nada. Essa face horrenda do País estará à disposição dos turistas que vierem, em massa, acompanhar a Copa do Mundo, desde seu contato inicial com os motoristas de táxi, passando por momentos inesquecíveis nos bares, restaurantes e similares. Torçam, eles, para não terem que manter contato com a burocracia nacional. Torçam muito. E torçam ainda mais para não terem que manter contato com o aparelho repressor do Estado.

Enfim e por fim, não mencionou o Ministro que nem mesmo o brasileiro - pelo menos os das grandes cidades - é mais esse primor de cordialidade e hospitalidade que o Governo apregoa e espera reinar durante o evento. Muito pelo contrário. O brasileiro anda muito mal humorado. E com razão. Seu dia-a-dia - excluo os bem nascidos -, o dia-a-dia da imensa maioria dos brasileiros, piorou, vem piorando, vai piorar, e a esperança é, hoje, mercadoria em falta.

Não resta a menor dúvida: o Ministro Nardes foi muito comedido...

domingo, 11 de maio de 2014

FELIZ DIA DAS MÃES!


Aldeiza Fernandes Sena de Medeiros (20 de abril de 1926 / 27 de maio de 2010)
Como eu queria, agora, sentir seu perfume de Lavanda Inglesa.
Saudade imensa...

NÓS, OVELHAS; ELES, LOBOS




* Honório de Medeiros

"Foi buscar lã e saiu tosquiado"
DITO POPULAR 

Antes que me acusem de “simplismo” lembro, aos leitores, que guardando as proporções devidas entre o gênio e o provinciano inquieto, o texto a seguir, pelo menos na aparência, pode guardar alguma semelhança remota, no que diz respeito à ausência do embasamento erudito tão caro aos acadêmicos (nada mais que argumentos de autoridade quando não é possível comprovação empírica), ao “Manifesto Comunista” de Marx e Engels e ao “Servidão Voluntária” de La Boètie, ou mesmo ao “O que é a Propriedade”, de Proudhom.

Entretanto ouso dizer que é possível um tratamento “acadêmico” ao que se vai expor. Tanto é possível fazê-lo a partir da Filosofia, com Marx e os anarquistas ou, para não ser acusado de tendência óbvia pelo pensamento de esquerda, com base no pensamento de Gaetano Mosca, comprovadamente um autor de direita, quanto a partir da Sociologia, desde que haja, como matriz, a Teoria da Evolução de Darwin.

Posto isso, gostaria de iniciar apresentando a célebre fábula de La Fontaine, “o Lobo e o Cordeiro”, devidamente parafraseada:

“Um cordeiro matava a sede nas águas límpidas de um regato.”

“Eis que se avista um lobo que por lá passava em jejum e que lhe diz irritado”:

- “Que ousadia a sua, turvando, em pleno dia, a água que bebo. Vou castigar-te”.

- “Majestade, permita-me um aparte – diz o cordeiro – veja que estou matando a sede vinte passos adiante de onde o Senhor se encontra. Não seria possível eu ter cometido tão grave grosseria”.

- “Mas turva, e ainda pior é que você falou mal de mim no ano passado”.

- “Mas como poderia – pergunta assustado o cordeiro – se eu não era nascido”?

- “Ah, não? Então deve ter sido seu irmão”.

- “Peço-lhe perdão mais uma vez, mas deve haver um engano, pois eu não tenho irmão”.

- “Então foi algum parente seu: tios, pais... Cordeiros, cães, pastores, nenhum me poupa, assim vou me vingar”.

“E o leva até o fundo da mata, onde o esquarteja e come sem qualquer processo judicia”.

Os lobos são a elite política; as ovelhas, o povo.

Desde que o mundo é mundo, excetuando, talvez, um período provavelmente mítico no qual o Homem vivia anarquicamente de caça e coleta[1], sem chefes nem hierarquias[2], a Sociedade é assim mesmo: de um lado os exploradores, do outro lado, os explorados.

Lembremo-nos como era antes nas grandes civilizações arcaicas: a grega, a judia, a chinesa, a hindu. O quê mudou de lá para cá? Nada, exceto a forma: se antes a polícia do chefe usava lança, hoje usa fuzil AK-47; se antes o tributo era o butim arrancado violentamente sem qualquer justificativa, hoje a extorsão se faz sob a desculpa de se dar condições ao Estado para que este melhore a vida das ovelhas em Sociedade.

Não vou perder tempo discutindo o que é o Estado. Desde que surgiu, quando surgiu a Polícia, o Tributo, a Norma Jurídica, e a Propaganda, o Estado é isso mesmo que você, caro leitor, pensa que é: um conjunto de aparelhos de controle social que a elite política criou para manter o “status quo”. 

Pensemos, por exemplo, na Norma Jurídica. A elite política dissemina a idéia de que sua finalidade é o bem-estar social. Quando os gregos irridentes, nas guerras civis, pediram leis que submetessem a todos, a aristocracia pressionada acatou, mas tratou logo de controlar sua interpretação, produção e aplicação[3]. Hoje ainda é do mesmo jeito.

Aliás, a Norma Jurídica deve ter surgido como um estratagema de domínio: como não era mais possível dar ordens verbais a todos, e a escrita estava surgindo, nada melhor que cria-las, coloca-las em algum lugar público, e impor que “a ninguém é dado alegar o desconhecimento da lei”. Tudo sob medida.

Pois bem, e essa elite política se perpetua? Claro, em todos os lugares. No Brasil, desde o Império.

Vejamos o caso do Rio Grande do Norte: nos Alves, Walter Alves é filho de Garibaldi Alves filho, que é filho de Garibaldi Alves pai, que é irmão de Aluízio Alves, que foi filho de Manuel Alves, o “Seu Nezinho”, líder político em Angicos, Rn, e de Maria Fernandes, da família Fernandes, de Aristófanes Fernandes, pai de Paulo de Tarso Fernandes; nos Maia, Felipe Maia é filho de José Agripino Maia, que é filho de Tarcísio Maia, que é filho de José Agripino Maia, que é parente próximo da esposa de Jerônimo Rosado, iniciador da oligarquia homônima em Mossoró, todos com raízes políticas ancestrais no Rio Grande do Norte e Paraíba; Larissa Rosado, por exemplo, é filha de Sandra Rosado, que é filha de Vingt Rosado, que é filho de Jerônimo Rosado; Fábio Faria é filho de Robinson Faria, que é filho de Osmundo Faria, latifundiário parente e protegido de Dinarte Mariz, de quem foi suplente no Senado; Dinarte de Medeiros Mariz, com ascendentes que vão até o Império, era parente de José Augusto Bezerra de Medeiros; este, por sua vez, familiarmente ligado a Juvenal Lamartine de Faria, de quem Márcia Maia, filha de Wilma de Faria, que é filha de Morton Mariz de Faria, parente de Dinarte Mariz, este por sua vez parente de José Augusto Bezerra de Medeiros, etc., etc..., é descendente colateral, todos com raízes que vão até o passado remoto do Rio Grande do Norte.

As oligarquias, para sobreviverem, em certas circunstâncias históricas usam talentos aos quais agregam, consomem e expelem para fora do círculo íntimo do Poder Político: Dinarte Mariz fez isso; Aluízio Alves, também; Tarcísio Maia o fez, os Rosados o fizeram; Wilma de Faria idem, e assim por diante. São os escalões intermediários entre o círculo íntimo e a base mais abaixo, constituída de “inocentes úteis”.

Brigam entre si os integrantes da elite política[4]. Mas, se ameaçados, se unem contra o inimigo comum. Vejam o caso de Mossoró. Não por outro motivo o PT, até Lula chegar ao Poder, era um anátema, posto que representasse uma real ameaça aos interesses políticos/econômicos dos detentores do Poder. Hoje, a história é outra.

Essa elite política, para sobreviver, se espraia por todos os aparelhos do Estado: Judiciário, Legislativo, Executivo. Aparelha tudo. Os aparelhos são integrados por membros das famílias que constituem a elite política ou agregados. Quando não é possível a nomeação de familiares ou agregados, ainda resta a cooptação e o exílio, o esvaziamento político/social. E, obviamente, se espraia também pela mídia servil, que bem paga, passa a filtrar os fatos – até mesmo criá-los, se for necessário - e lhes dá a conotação que interessa ao grupo dominante, assim como pelos negócios, através dos predadores empresariais, quase sempre sanguessugando, obliqua e dissimuladamente, a máquina estatal.

Obviamente, em certas circunstâncias históricas, como ocorreu recentemente no Brasil pós Lula, parece mudar os atores principais do teatro político. É possível. Mas a estrutura continua: uma nova elite política substitui a anterior que, derrotada, sai de cena. Os atores são novos, mas o Teatro e a tragicomédia são os mesmos, há sempre lobos e ovelhas, e continua tudo igual. “Mutatis mutandis”.

Portanto temos que a elite política domina o Executivo, o Legislativo, o Judiciário; os meios de comunicação, a tributação e os negócios empresariais com o Estado, bem como a Polícia. Ou seja, domina tudo. E o domínio é extremamente eficiente: os tributos alimentam o Tesouro que vai pagar as obras que vão, por sua vez, pagar toda a máquina política. Tudo isso legitimado por uma propaganda eficiente que cria a impressão de que a arrecadação vai ser usada para produzir e manter políticas públicas de interesse da ovelhada.

Enfim, não por outras razões, como não somos lobos, somos ovelhas: nos tempos de hoje, enquanto alienados, indo inevitavelmente para a tosquia, tão logo sejamos convocados, sem “tugir nem mugir”, ou, quem sabe, quando muito, discreta e aceitavelmente perorando pelos cantos, em voz educadamente baixa, para não levar castigo.

[1] Jacques Le Goff.
[2] Robert Wright.
[3] Nikos Poulantzas.
[4] Gaetano Mosca.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

UM A SÓS ENTRE TANTOS



Não consigo permanecer por muito tempo em um teatro ou cinema. Mal posso ler um jornal, raramente leio um livro moderno. Não sei que prazeres e alegrias levam as pessoas a trens e hotéis superlotados, aos cafés abarrotados, com sua música sufocante e vulgar, aos bares e espetáculos de variedades, às Feiras Mundiais, aos Corsos, aos centros culturais e às grandes praças de esportes. Não entendo nem compartilho essas alegrias, embora estejam ao meu alcance, pelas quais tantos milhares anseiam.
(O lobo da estepe; HESSE, Hermann)

* Arte em: gavetadoivo.wordpresse.com  

sexta-feira, 2 de maio de 2014

O QUE AQUILO DE FATO É




* Honório de Medeiros

Aquilo que você diz que (algo) é,
nada mais (o) é,
que aquilo que você crê.

Arte: matematicanoalvoilusaodeotica.blogspot.com

segunda-feira, 28 de abril de 2014

SOZINHO NA NOITE DE OUTONO




* Wang Wei



Sentado, sozinho,
na sala vazia,
antes de soar
a segunda vigília,
lamento o branco 
em minhas têmporas.
Na montanha, tombam
com a chuva as frutas,
e os insetos zumbem
em volta da candeia.
Impossível impedir 
o branco nos cabelos,
assim como criar ouro;
como se livrar da idade
e dos seus incômodos?
Melhor começar logo
o estudo do não ser.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

NÃO VEJO A LUZ NO FINAL DO TÚNEL. SEQUER VEJO O TÚNEL

* Honório de Medeiros


Encurralada, extorquida, abandonada, segue, inerme, a classe média brasileira, bem como a base da pirâmide social, ante a incompetência e a roubalheira generalizada que grassa nesse País.

A corrupção, hoje, faz parte da alma brasileira. Está em toda a parte, em todos os momentos, em todas as classes.

A falta de respeito dos dirigentes do Estado para com a Sociedade atinge níveis alarmantes. É um câncer. Em metástase.

Não sei o que seria do Brasil se não fosse o Ministério Público e alguns juízes abnegados.

Ouço, aqui e ali, pais inconformados, embora passivos, declararem seus sonhos com a ida dos filhos para outros países, onde a decência ainda é um valor cultivado. Aqui, todos os valores desmoronam lentamente. Alguns, em velocidade estonteante.

As regras implícitas que regem a Sociedade brasileira, neste atual momento da nossa história, são terríveis: não há o pensamento no outro, não há a solidariedade, não há o interesse social. Para onde dirigimos nossa atenção percebemos apenas falta de dignidade própria, ausência de respeito com os valores cultivados pelo processo civilizatório, descompromisso com a verdade mais comezinha, intuito de enganar, de manipular, de espoliar.

O resumo da ópera é esse: temos um aparato legal de faz-de-conta e uma realidade normativa social implícita derruidora. Os códigos dizem uma coisa, as ruas dizem outra totalmente diferente.

Os políticos, com raras e honrosas exceções, mentem e furtam sem qualquer pudor. Os administradores públicos, idem. As instituições estão corrompidas e tomadas pelo aparelhamento vil.

Quem discordar que mergulhe na história do Brasil. Analise o antes. Estude o agora. Pense no depois.

As consequências do que se está fazendo aqui, e agora, durarão gerações, para o bem ou para o mal.

Não vejo luz no final do túnel. Para ser sincero, sequer vejo o túnel.

Temo pelo futuro das futuras gerações.

PS: Acerca da classe média e sua pasmaceira, sugiro a leitura de   http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2014/04/23/uma-elite-perdida-por-ruth-de-aquino-533458.asp

terça-feira, 15 de abril de 2014

DIFERENÇA ENTRE ANDRÉ VARGAS E OS MENSALEIROS

PT tritura Vargas para preservar Dilma e Padilha

 * Josias de Souza

"Se Deus intimasse o PT a optar entre sua antiga cúpula que cumpre pena no sistema carcerário de Brasília e a humanidade, o partido daria uma resposta instantânea: “Morra a humanidade”. O deputado André Vargas (PT-PR) achou que seria beneficiário dessa mesma solidariedade fulminante e incondicional. Descobriu que pertence a um grupo de amigos 100% feito de inimigos."

Leia a continuação em: 
http://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/2014/04/14/pt-tritura-vargas-para-preservar-dilma-e-padilha/