quinta-feira, 30 de março de 2017

QUANDO TUDO VALE, NADA VALE; QUANDO NADA VALE, TUDO VALE

* Honório de Medeiros

O combate à meritocracia é a ponta-de-lança da defesa do relativismo moral.

O relativismo moral apregoa que os valores são relativos, ou seja, o que é certo para mim, pode não ser certo para você, o que justo para você, pode não o ser para mim, e não há nada, absolutamente nada, nesse sentido, que a ciência possa dizer quanto a essa questão, e que possa erradicar nossas dúvidas.

Tirando a ciência, que descreve o que algo é, e quando o faz, revela algo que você somente não aceita se não tiver juízo, tal como a lei da gravidade, ou a lei da entropia, sobra a religião, o senso comum, e por aí vai, mas quanto a isso cada um tem a sua, e acredita no que lhe der na telha, portanto a conclusão possível, segundo esses parâmetros, é que a moral seria relativa, e se assim o é, não existiriam valores absolutos aos quais devêssemos reverências definitivas.

Se não há valores absolutos então não podemos falar em mérito, pois este pressupõe que sejamos capazes de avaliar os outros e reconhecer, neles, qualidades que mereçam respeito, elogio, e, claro, confiança para lhes entregar responsabilidades que não estão ao alcance dos que não foram avaliados com o mesmo reconhecimento.

Se não é possível estabelecer critérios para reconhecer o mérito, então todos estamos no mesmo barco, ninguém pode avaliar quem quer que seja, e, dessa forma, a conclusão óbvia é que desapareceria a civilização como a conhecemos, e é bem possível que então somente sobrassem escombros, ruínas, o caos, enfim.

Voltemos ao ponto-de-partida. É válida a hipótese do relativismo moral, de que todos os valores são relativos?

Se acreditarmos  que os valores estão por aí, no espaço e no tempo, se acreditarmos que o certo, o errado, o bem, o mal, o justo, e o injusto existem por si mesmos, como entidades fora-de-nós, bastando que os encontremos onde estiverem e as colhamos, qual frutas maduras, e os utilizemos, então, sinto dizer, isso não tem o menor fundamento. 

É essa vertente filosófica, derivada de Platão, melhor dizendo, de sua Teoria das Formas e das Ideias, que os relativistas morais criticam e com razão, embora de forma oblíqua e a grande maioria da  vezes sem conhecerem seu fundamento, seus pressupostos teóricos. 

Mas os valores não são entidades, fenômenos físicos aguardando algum iluminado que as descreva e os coloque a serviço da humanidade. Não são objetos da matemática, física, química ou biologia. Não são, em si mesmos, objetos da ciência.

É por isso, e não por outra razão, que Jesus calou quando Pilatos lhe perguntou: "o que é a verdade?". Pilatos lhe fez uma pergunta de natureza ontológica. Provavelmente era um cético, quanto à moral, e somente acreditava no Poder pelo Poder. Se sua pergunta dissesse respeito à fé, Jesus teria lhe respondido: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida", e o seu silêncio não perturbaria tanto os filósofos através do tempo.

Entretanto se compreendermos que os valores são construções do homem ao longo do seu processo civilizatório, são estratagemas adaptativos, estratégias de sobrevivência, então a questão muda completamente de perspectiva. 

E a ciência nos dá razão porque, aqui, vamos estudar não o valor em si mesmo, mas os comportamentos que os criaram, sua finalidade, sua natureza. É o mundo da Sociologia.

É científico conceber que em algum momento da história o Homem, a nossa espécie, teve um "insight" que lhe permitiu dar um passo à frente no processo evolutivo: descobriu a cooperação. Percebeu, ele, que podia até mesmo enfrentar seus predadores naturais, e os vencer, caso cooperassem entre si. Percebeu, ele, trocando em miúdos, que a união faz a força. Naquele momento nasceu o que hoje chamamos de pacto social.

O pacto social, para existir, constrói e impõe direitos e deveres, e, em decorrência, valores, para que o grupo social, a Sociedade, possa avançar. Ele foi um "meme", uma invenção do processo evolutivo. Ou seja, foi uma construção humana, uma elaboração social, claro que sempre dependente de sua circunstância histórica.

Muito embora possamos rastrear a ideia de pacto social até Protágoras de Abdera bastando, para tanto, ler o diálogo platônico homônimo, é de se considerar que sua melhor descrição, de forma alegórica, está em "Leviatã", de Hobbes.

Homo homini lupus, escreveu Thomas Hobbes, o primeiro dos grandes contratualistas, o homem é o lobo do homem, Frase de Plauto, em “Asinaria”, textualmente Lupus est homo homini non homo, que expõe a causa-síntese, a constatação que impele o Homem a optar pelo pacto social: em o assegurando, a sociedade regula o indivíduo, o coletivo se impõe sobre o particular, e fica, assim, assegurada a sobrevivência da espécie.



Caso não aconteça o pacto social, bellum omnium contra omnes, guerra de todos contra todos até a auto-aniquilação no Estado de Natureza, é o que ocorreria se imperasse a liberdade absoluta com a qual nasciam os homens, diz-nos, ainda, Hobbes, no final do Século XVI, início do Século XVII - recuperando a noção de contrato social exposta claramente por Protágoras de Abdera, a se crer em Platão.


Essa noção, de pacto ou contrato social, até onde sabemos, foi pela primeira vez exposta por Licofronte, discípulo de Górgias, como podemos ler na “Política”, de Aristóteles (cap. III): De outro modo, a sociedade-Estado torna-se mera aliança, diferindo apenas na localização, e na extensão, da aliança no sentido habitual; e sob tais condições a Lei se torna um simples contrato ou, como Licofronte, o Sofista, colocou, “uma garantia mútua de direitos”, incapaz de tornar os cidadãos virtuosos e justos, algo que o Estado deve fazer.

E muito embora um estudioso outsider do legado grego tal qual I. F. Stone defenda que a primeira aparição da teoria do contrato social está na conversa imaginária de Sócrates com as Leis de Atenas relatada no “Críton”, de Platão, há quase um consenso acadêmico quanto à hipótese Licofronte estar correta. É o que se depreende da leitura de “Os Sofistas”, de W. K. C. Guthrie, ou da caudalosa obra de Ernest Barker.

Tudo isso significa que o  conteúdo dos direitos e deveres pode variar no tempo e espaço, mas a noção da "fôrma", do "ambiente" que os contém, não. Ou seja, a ideia de pacto social é onipresente, mas seu conteúdo muda ao sabor das circunstâncias históricas.

É por essa razão que certas condutas anteriores ao tempo atual eram consideradas erradas, e hoje já  não o são, mas a regulação, as normas morais, o ambiente que as contém, não. Sempre existiram normas que regulassem a conduta humana. Repetindo: mudou o conteúdo, mas não mudou a forma.

Ainda: o que é certo e errado pode mudar no tempo e no espaço, mas a compreensão de que deve existir um conjunto de regras que mesmo de forma difusa diga o que é certo e errado, em cada época, isso aí não, por uma razão muito simples, tão bem apontada por Hobbes, qual seja a de que sem ele (o conjunto de regras) a civilização deixa de existir. 

Quando não temos um "norte" moral, tudo vale, e se tudo vale, nada vale.

Então, embora seja relativo o conteúdo da norma moral, a necessidade da existência de normas morais é absoluta,  um fenômeno sociológico, pelo menos no que diz respeito à realidade social conforme conhecemos, e não há como conceber outra.

É preciso que entendamos que a construção do conteúdo da norma moral é sempre resultante do entrechoque de ideias, interesses, crenças, etc., daqueles que integram a Sociedade. Mas ao contrário do que se supõe, o conflito social, a interação social é fundamental para a elaboração da "Constituição" moral á qual nos apegamos para sobrevivermos em Sociedade.

Por fim, o discurso do relativismo moral é sabidamente ilógico. Argumentar contra os valores também é uma postura moral. Não há alternativa à existência dos valores morais. O que há é a possibilidade de aperfeiçoamento desse instrumento social, das normas morais. 

É isso que estamos tentando fazer desde aquele remoto momento no qual o Homem se deu conta de que a cooperação permite sua sobrevivência.

No final das contas, ninguém foge da moral, seja contra ou a seu favor. Quem a critica, duvidando de seu papel social, questionando sua eficácia, quer apenas mudar as regras do jogo para se beneficiar, ou favorecer aquilo que defende.

Nada mais.

quarta-feira, 22 de março de 2017

A SOLIDÃO É IMOBILIDADE E SILÊNCIO

Imagem: Honório de Medeiros


* Antônio Gomes

Ah, você que se situa como antítese do que não perece.
Do vazio.
Somente seu coração bate.
Você que olha a noite escura recortada por pontos de luz,
e não encontrou o limite entre o horizonte e a matéria.
Sua busca somente encontra solidão.
Solidão.
Não há caminhos, não há som, somente espaço.
O nada.
A plenitude do nada.
Imobilidade aniquilante, o silêncio escoimando a vida,
a imensidão do céu estrelado.
Noite, silêncio, imobilidade.
Espaço, tempo.
O tempo não passa, é.
Solidão.
Eu lhe digo: a solidão é imobilidade e silêncio.

domingo, 19 de março de 2017

RUSSEL E O CÓDIGO DE CONDUTA LIBERAL

* Honório de Medeiros

Russell propôs, em sua autobiografia, um "código de conduta" liberal baseado em dez princípios, à maneira do decálogo cristão.

"Não para substituir o antigo", diz Russell, "mas para complementá-lo".

Os dez princípios são:
 
1. Não tenhas certeza absoluta de nada.
 
2. Não consideres que valha a pena proceder escondendo evidências, pois as evidências inevitavelmente virão à luz.
 
3. Nunca tentes desencorajar o pensamento, pois com certeza tu terás sucesso.
 
4. Quando encontrares oposição, mesmo que seja de teu cônjuge ou de tuas crianças, esforça-te para superá-la pelo argumento, e não pela autoridade, pois uma vitória que depende da autoridade é irreal e ilusória. 

5. Não tenhas respeito pela autoridade dos outros, pois há sempre autoridades contrárias a serem achadas.
 
6. Não uses o poder para suprimir opiniões que consideres perniciosas, pois as opiniões irão suprimir-te.
 
7. Não tenhas medo de possuir opiniões excêntricas, pois todas as opiniões hoje aceitas foram um dia consideradas excêntricas.
 
8. Encontra mais prazer em desacordo inteligente do que em concordância passiva, pois, se valorizas a inteligência como deverias, o primeiro será um acordo mais profundo que a segunda.
 
9. Seja escrupulosamente verdadeiro, mesmo que a verdade seja inconveniente, pois será mais inconveniente se tentares escondê-la.
 
10. Não tenhas inveja daqueles que vivem num paraíso dos tolos, pois apenas um tolo o consideraria um paraíso.

sábado, 18 de março de 2017

OS BÁRBAROS NÃO CHEGAM; CHEGARAM.

CARTAS A ANTÔNIO GOMES (1)

Caro Antônio,

Faz tempo que não nos vemos, desde antes de 2010, quando lhe conheci em Cajazeiras durante aquelas minhas andanças pelo Sertão com o escritor Franklin Jorge, no rastro de Massilon.

A escritora Luitgarde Oliveira Cavalcante Barros, autora de "Juazeiro do Padre Cícero (A TERRA DA MÃE DE DEUS)" e o escritor Franklin Jorge do Nascimento Roque, autor de "Ficções, Fricções, Africções", Prêmio Luis da Câmara Cascudo, em mesa do café da manhã do Cariri Cangaço, em Crato, Ceará, setembro de 2013.

A história desse encontro, como você sabe, está em "Massilon", e no meu blog http://honoriodemedeiros.blogspot.com.br/2016/03/de-um-encontro-casual-e-um-evento-comum.html

"Massilon", o livro, vai para sete anos de publicação. Muito tempo. "O tempo passa, o tempo voa", como dizia aquela antiga propaganda do Bamerindus, banco que não mais existe. Passou muito rápido. Poeira que o vento que adivinha chuva tange nos oitões do Sertão.

Este ano estamos completando oitenta anos da invasão de Mossoró por Lampião. Oitenta! E continuam dizendo que Lampião invadiu Mossoró única e exclusivamente para arrancar dinheiro da cidade. Essa versão arraigou-se de tal forma na história que parece impossível mudá-la.

Penso que perdi meu tempo escrevendo "Massilon", noves fora o prazer que me deu. Sete anos de pesquisa!

Tantas perguntas a serem respondidas apresentadas no livro e nada. Ninguém se apresentou para o debate.

O papel dos coronéis de antanho, a conexão da invasão de Apodi com a de Mossoró, a enigmática participação de Massilon nos dois episódios, os mistérios do acontecimento, tal qual a morte de Jararaca, que antes de ser morto já dispunha de um atestado de óbito pronto e bem acabado, ou o cerco exclusivo à residência do Prefeito Rodolpho Fernandes nas cercanias da cidade, enquanto o centro, onde estava o comércio e o dinheiro, jazia abandonado pelos cangaceiros...

Deixa pra lá.

Por falar em cangaço, no lançamento do meu "Histórias de Cangaceiros e Coronéis" surpreendi Alex Nascimento lendo as orelhas do livro, feitas por você.

Quando me viu, perguntou quem era. Respondi: "quase sessentão, de Cajazeiras - de onde saiu na infância, mora onde lhe dá na telha, tem um pequeno apartamento no Rio e outro menor ainda em Paris, é solteiro, e mais eu não sei porque o homem é mais fechado que freira reclusa".

Ele deve ter pensado: "isso é mesmo que nada e mais alguma coisa". Ou seja: conversa fiada. Alex é um dos grande escritores da terrinha, um dos melhores que já tivemos, dono de um estilo muito peculiar.

Diz pela noite - tem hábitos noturnos, que não mais vai escrever nada. Dedica-se, hoje, ao jazz, a Mariana no que faz muito bem, a aprender latim e a bater papo com Florentino Vereda, além de outras coisinhas mais. Grande figura. Um outsider.

O escritor Alex Nascimento, autor de "Um Beijo e Tchau", e a escritora Bárbara de Medeiros, autora de "Sindicato das Bailarinas Circenses".

Andei publicando uns poemas seus no blog. Vá lá. Estou mandando estas "mal traçadas linhas" para aquele email que você me enviou via "messenger" do "facebook", e que nunca abre. Tomara que lhe alcance.

No mais, e tirando o mundo velho de meu Deus que parece repetir o ciclo da Alta Idade Média, com outra tecnologia - claro, quando os bárbaros pintaram e bordaram e quase destruíram a civilização, por aqui vamos seguindo.

Você conhece o poema de Konstantino Kaváfis, não? Para lhe poupar o tempo de rememorar, aqui vai ele:

À espera dos bárbaros

O que esperamos na ágora reunidos?

É que os bárbaros chegam hoje.

Por que tanta apatia no senado?
Os senadores não legislam mais?

É que os bárbaros chegam hoje.
Que leis hão de fazer os senadores?
Os bárbaros que chegam as farão.

Por que o imperador se ergueu tão cedo
e de coroa solene se assentou
em seu trono, à porta magna da cidade?

É que os bárbaros chegam hoje.
O nosso imperador conta saudar
o chefe deles. Tem pronto para dar-lhe
um pergaminho no qual estão escritos
muitos nomes e títulos.

Por que hoje os dois cônsules e os pretores
usam togas de púrpura, bordadas,
e pulseiras com grandes ametistas
e anéis com tais brilhantes e esmeraldas?
Por que hoje empunham bastões tão preciosos
de ouro e prata finamente cravejados?

É que os bárbaros chegam hoje,
tais coisas os deslumbram.

Por que não vêm os dignos oradores
derramar o seu verbo como sempre?

É que os bárbaros chegam hoje
e aborrecem arengas, eloqüências.

Por que subitamente esta inquietude?
(Que seriedade nas fisionomias!)
Por que tão rápido as ruas se esvaziam
e todos voltam para casa preocupados?

Porque é já noite, os bárbaros não vêm
e gente recém-chegada das fronteiras
diz que não há mais bárbaros.

Sem bárbaros o que será de nós?
Ah! eles eram uma solução.

Até mais, beije o Sena por mim.

Honório.

segunda-feira, 6 de março de 2017

APROPRIARAM-SE DO BRASIL

* Honório de Medeiros

Os depoimentos dos delatores ao Ministro do TSE Herman Benjamin levaram-no, segundo o Estadão (http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,para-relator-odebrecht-se-apropriou-do-poder-publico,70001688031) a elaborar aquela que, no meu modo de entender, é a mais precisa conclusão acerca do que aconteceu e está acontecendo no Brasil: houve e há um pacto informal entre as elites (políticos, procuradores, juízes, integrantes dos tribunais de contas, imprensa, empresários, etc.), excetuando-se as honrosas exceções de sempre para, em absoluto desprezo em relação ao restante da Sociedade, apropriar-se, privatizar, apoderar-se do Estado brasileiro.

A metástase não poupa qualquer instituição. Nenhuma. Em todas elas encontramos o câncer da participação direta ou da omissão nesse processo.

O resultado é aquele que o cidadão comum, indefeso, desinformado, espoliado, sente de forma visceral: saúde que não funciona, segurança inexistente, educação falida, infra-estrutura arruinada. Para ficarmos no mais visível.

E assim, de passo-em-passo, vamos lentamente retrocedendo.

Às vezes não tão lentamente. Às vezes numa velocidade medonha...

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

SOLIDÃO

* Antônio Gomes


Não há diálogo entre o homem e a noite absurda,
entre o homem e a terra.
Há imobilidade aniquilante,
o silêncio escoimando a vida,
percorrendo, uniforme, todos os caminhos.
Há imensidão de céu estrelado;
noite, silêncio, espaço sem rincões, tempo.
O tempo não passa; o tempo é.
Solidão.
A solidão é feita de imobilidade e silêncio.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

CAMINHAREMOS

* Antônio Gomes


"Caminharemos então tu e eu,
companheiros de nossas sombras,
da luz das estrelas, lua, sol,
e nossas pegadas saudarão o tempo 
e a terra, a pedra, o verde ou o asfalto, 
durante toda essa busca incessante.

Caminharemos então tu e eu,
falando da solidão que não sentimos,
dos seus efeitos nos homens e nas coisas,
enquanto a doçura indecifrável do instante
aprisiona a mim e a ti em uma teia 
cujo começo e fim começam e terminam no mesmo ponto.

Caminharemos então tu e eu,
e falaremos dos fragmentos dos discursos de amor,
lido às sombras de nossas sombras,
esses amorosos companheiros,
até que o presente se confunda com o futuro.

Caminharemos então tu e eu,
para falarmos das equações que o vento
(o vento?)
traça nas hastes flexíveis das abstrações,
antes que o efeito que projetam
o Homem, e as Formas, seja interrompido.

Caminharemos então tu e eu,
e eu lhe falarei da solidão de quem pensa,
eu, um solitário de idéias absurdas,
resignado ante a longa estrada que nos resta percorrer,
enquanto a trilha que conhecíamos se esvai no tempo.

Caminharemos então tu e eu,
E você me falará na reforma das ilusões 
que se entoavam em rituais mágicos à luz das estrelas.
Conheceremos a história do Homem,
dos seus santos e das imagens vazias de vida
e prenhes de história.

Toda nossa caminhada nos dirá, quem sabe,
o significado oculto de tudo que percebemos,
o sonho loucos dos deuses alucinados,
a verdade última, a coisa-em-si,
e então, à sombra do futuro, descansaremos."

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

TODO HOMEM É UM INFINITO DE SOLIDÃO

* Antônio Gomes

Há algo que nós sabemos, e que os jovens não sabem.
E o que sabemos está escrito no coração e na pele.
Lembranças de tempos idos, marcas, rugas, cicatrizes.
Odores, sensações, imagens que não podem ser reproduzidas.

O que sabemos morrerá conosco tão logo cada um de nós se vá.
Pouco importam os livros, as imagens, pouco importam os museus.
E assim será amanhã com aqueles que estão hoje na aurora dos dias.
E assim será amanhã com os filhos dos nossos filhos dos nossos filhos.

Pois ao contrário do que se supõe e nos cantam os poetas,
Todo homem é uma ilha, e toda ilha um infinito de solidão.


quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

LAMPIÃO NA FAZENDA "VENEZA". MASSILON. CHILDERICO FERNANDES DE SOUZA.

* Honório de Medeiros

Reportagem do jornal “O Nordeste”, feita a partir dos depoimentos de Bronzeado[1], nos dá uma idéia acerca do temperamento de Massilon: "Em Bálsamo[2], juntaram-se mais 4 indivíduos de nome: Vicente Brilhante; outro que este chamava de primo; Vicente de tal e mais um morador de Décio[3]. Este acompanhou o bando até 3 léguas, voltando a exigências de Massilon, que presenciou a aflicção em que ficara a mulher[4] de Décio, que chorava e pedia não violassem as famílias."

Sérgio Dantas relata o que foi a passagem do bando de Lampião pelo povoado de São Sebastião, atual Governador Dix-Sept Rosado, um pouco antes de entrarem em Mossoró: algazarra, surras, depredação, saques, fogo, violações. "Massilon retornava da malsucedida tentativa de tomar a cidade de Apodi[5]. Impressionou-se com a quebradeira. Repreendeu, áspero, o cangaceiro Jararaca e culpou-lhe pela destruição do povoado. Entabulou-se ríspida discussão entre os dois. A contenda, entretanto, foi breve. Lampião interveio enérgico. Evitou maiores desdobramentos do ‘imbróglio doméstico’[6]."

  Mas o maior depoimento que se pode dar acerca do temperamento de Massilon está nas páginas que tratam de sua conduta na Fazenda Veneza, quando da fuga de Mossoró para Limoeiro, escritas por Raul Fernandes[7]. Nelas se expõe o drama pelo qual passou Childerico Fernandes de Souza[8], administrador da propriedade do seu parente Alfredo Fernandes[9], e sua esposa Felisbela (Dna. Bebela) Rodrigues Fernandes. Também estão expostos alguns episódios que dão a natureza do temperamento de Massilon. Em um deles Sabino começa a se vangloriar de que tinham entrando em Mossoró sem dificuldades, tomado o Banco do Brasil, a casa do Prefeito, quando é interrompido por Massilon, que diz: "Nada disso é verdade. Eles não entraram em Mossoró. Receberam balas do céu e da torre da igreja."

Em outro episódio, Raul Fernandes relata que enquanto o almoço era preparado por Dna. Bebela, os cabras aguardavam fora da casa impacientes. "Soada a hora, acorreram à cozinha, em turbulência, atravancando a passagem. Foi preciso Massilon chamá-los à ordem, obrigando-os a formarem fila."

Na hora da sesta, continua o escritor, "alguns cangaceiros bocejavam deitados à sombra de uma árvore, próxima a casa, procurando tirar uma soneca. De súbito são perturbados pelo choro ininterrupto de criança. Era o menino Ney Fernandes, de dois anos. Ralhações não conseguiram moderar o berreiro incontrolável.

Serra D’Umã, mestiço, alto, de compleição franzina, serviçal ordinário, resolveu dar mostras do que era capaz. Em bárbara ostentação, levantou-se, arrastou a lâmina de aço e engrolou:

- Vou calar aquela pestinha[10].

Caminhou, a passos tardos, desengonçado, à casa-grande.

Os companheiros foram incapazes de um gesto, para impedir a consumação do mais covarde e hediondo dos crimes.

Um morador avisou à genitora. Novamente, Massilon, interveio. Desmoralizou o cabra, fazendo-o retroceder.

As ameaças continuavam. Não havia sossego na fazenda. Coqueiro pediu a Bebela que lhe costurasse o bornal e como não foi possível, por falta de linha, arrebentou a máquina de costura.

Outro cabra, de punhal em riste, tomou-lhe a aliança. Massilon a acode. Obriga o perverso a devolver a jóia, após séria altercação. Advertiu-o, voz alta, que não permitiria ameaças, desrespeito e palavras malsoantes naquela casa. Voltou à sala, sentou-se ao lado de Childerico e continuou a falar, contrariado:

- Não sou bandido! Quando chegar ao Ceará, deixarei essa gente. Vou cuidar da minha vida.

Percebia-se seu arrependimento por estar ligado a essa corja malsinada. Fora a alma benfazeja em ‘Veneza’[11]."

Em Tabuleiro de Areia, Ceará, agosto de 1927, nos lembra Lauro de Oliveira Lima, já apartado de Lampião, Massilon e seu bando invadem a casa de Santana Gadelha e tomam todas as suas jóias. Santana pediu a Massilon que mandasse um dos cabras devolver sua aliança de casamento, sendo atendida ("mas só a aliança, disse o cangaceiro")[12].

* Excerto do livro "Massilon", do Autor.




[1] “O CANGAÇO NA IMPRENSA MOSSOROENSE”; PIMENTA, Antônio Filemon Rodrigues; Fundação Vingt-Un Rosado; Coleção Mossoroense; Série “C”; número 1104; Outubro de 1999; p. 70.

[2] Fazenda de Décio Hollanda localizada em Iracema, Ceará, na época pertencente a Pereiro, no mesmo Estado.

[3] Décio Albuquerque, o Décio Hollanda.

[4] Filha de Tylon Gurgel. Sobrinha, portanto, do Cel. Antônio Gurgel, refém de Lampião.

[5] Na verdade retomada. Dias antes ele havia tomado a cidade.

[6] “LAMPIÃO E O RIO GRANDE DO NORTE”; DANTAS, Sérgio Augusto de Souza; Cartgraf – GRÁFICA EDITORA; 2005; Natal; RN; Nota 4.

[7] “A MARCHA DE LAMPIÃO”; FERNANDES, Raul; 2ª. EDIÇÃO; Ed. Universitária – UFRN; 1981; Natal, Rn.

[8] Childerico era filho de Francisca Fernandes de Souza, avó materna da mãe do Autor e irmã do Coronel Adolpho Fernandes.

[9] Filho do Coronel Adolpho Fernandes, então Prefeito de Pau dos Ferros, RN.

[10] Contou-me Francisca Ida Fernandes de Oliveira, tia do Autor, que João Marcelino de Oliveira, irmão de seu esposo José Marcelino de Oliveira, e médico em Mossoró no ano de 1927, bem como responsável pelo atendimento a Jararaca, que este, ao ser por ele indagado se não sentia remorso pelos crimes que cometera, perguntara-lhe o que significava essa palavra.

Ao ser respondido, quedou silencioso por algum tempo e depois respondeu que uma vez jogara uma criança de mais ou menos dois anos para cima e a aparara com um punhal. Desde então, segundo ele, sonhava muito com ela.

Fenelon Almeida em sua obra “JARARACA: O CANGACEIRO QUE VIROU SANTO” conta que Lauro da Escóssia testemunhou a negativa veemente de Jararaca a uma pergunta a esse respeito, de bate-pronto, feita por uma popular.

A verdade é que provavelmente Jararaca contou a história a Dr. João Marcelino de Oliveira que a repassou para a frente e a conseqüência foi a pergunta da popular.

Provavelmente preocupado com a repercussão da história entre as pessoas que estavam em sua frente Jararaca desmentiu, categoricamente, aquilo que contara privadamente a Dr. João Marcelino de Oliveira, a quem devia não lhe ter sido amputado, covardemente, por um soldado da comitiva do Sargento Kelé, um dedo no qual luzia, reluzente, um anel de ouro.

[11] “A MARCHA DE LAMPIÃO”; FERNANDES, Raul; 2ª. EDIÇÃO; Ed. Universitária – UFRN; 1981; Natal, Rn.

[12] “NA RIBEIRA DO RIO DAS ONÇAS (LIMOEIRO DO NORTE); LIMA, Lauro de Oliveira; p. 463; Gráficae Editora Assis Almeida; Fortaleza; Ceará.

sábado, 4 de fevereiro de 2017

CHILDERICO JOSÉ FERNANDES DE QUEIRÓZ FILHO



* Honório de Medeiros

Em dias do ano de 1880 Childerico José Fernandes de Queiróz Filho, nascido em 1865, Pau dos Ferros, Alto Oeste do Rio Grande do Norte, o segundo do seu nome, aos quinze anos de idade, portanto em 1880, quiçá alavancado pelas histórias e estórias que vinham da Amazônia longínqua, das quais eram protagonistas homens do Sertão da Serra das Almas e arredores, contadas nas feiras e na lide com o gado e a lavoura, durante o dia, e à noite, nos alpendres das casas, à luz das lamparinas, de riquezas imensas construídas de um dia para o outro na colheita do látex, ou mesmo pelo desejo de tomar distância de um futuro sem perspectivas para um órfão de pai e mãe cuja herança tinha muitos donos, montou num cavalo e arribou no mundo, no rumo da distante Belém do Pará.

E assim se passaram quase sessenta anos até que seus ossos cansados pousassem de vez na mítica Casa-Grande da fazenda “João Gomes”, que pertencera a seu pai e ascendentes, adquirida comprando as partes de seus irmãos e herdeiros, famosa por tantas e tantas histórias, dentre outras a dos nove ou onze filhos e filhas concebidos pelo Padre Bernardino José de Queiróz e Sá, e criados em seus sótãos, porão, quintais e oitões, uma das quais viria a ser sua madrasta, posto que herdeira única de toda aquela imensidão rural, por ter sido adotada por seu único irmão[1], o renomado Major Ephiphanio.

Mas seu pouso duraria pouco. Childerico II trouxera consigo, da Amazônia, uma moléstia mortal que o conduziria ao descanso eterno em um lugar jamais antes por ele visitado, o Rio de Janeiro. Em 26 de março de 1939 o “Guerreiro do Yaco”, como o denominou Calazans Fernandes, autor de uma trilogia que por intermédio desse singular personagem conta a história do Sertão do Alto Oeste do Rio Grande do Norte, o Sertão da “Serra das Almas” e arredores, desde sua origem até meados do século XX, finalmente foi acertar suas contas com o Criador, a quem ele, ferrenhamente, ateu convicto, negava a existência.

Nos quase sessenta anos de vida na Amazônia Childerico II se transformou em uma lenda que sobrevive esmaecida em livros e documentos. Nada que possa dar a verdadeira dimensão de sua história. Somente aqui e ali encontramos o rastro forte dos seus passos e o eco de sua voz autoritária, a traçar contornos pouco nítidos de um homem que viveu muitas vidas em apenas uma existência.

A história da construção de sua imensa riqueza, nos primeiros anos de saga amazônica, quando comprou um seringal denominado “Oriente”, fronteira com a Bolívia, maior que o Estado do Sergipe, depois de passar onze anos desaparecido na floresta, rio Yaco acima e adentro, onde homem algum, exceto índios ferozes, ousavam viver, bem como sua volta triunfal, conduzindo barcos e mais barcos repletos de látex, para serem vendidos a peso de ouro, nos portos de Manaus, por si só valem um livro. E que livro!

Assim como vale um livro as batalhas que enfrentou: a luta pelo Acre com Plácido de Castro; a tomada pela força das armas de Sena Madureira, enquanto líder do Movimento Autonomista do Alto Purus, e assim por diante. Está lá, no Dicionário das Batalhas Brasileiras[2], de Hernâni Donato: “8.6.1912 – SENA MADUREIRA. AC. Movimento autonomista do Alto Purus. A 7.5[3], em protesto contra o então Prefeito regional e o alegado descaso do Governo Federal, autonomistas declararam instalado o Estado Livre do Acre, embrião do futuro Acreânia. Chefes, os “coronéis” Childerico Fernandes, José de Alencar Matos, Raimundo Freire. Armaram 350 homens para enfrentar forças a serem enviadas contra o novo Estado. A 8.6[4] estas apresentaram-se, federais e estaduais. E venceram, dispersando os autonomistas, depois de seis horas de combate, dez mortos entre os levantados, incêndios, assassinatos vingativos.”

Ou a luta por Bragança, no Pará, da qual foi Prefeito várias vezes. E a luta por Belém, com Lauro Sodré, para depor Enéias Martins. Assim como a luta ao lado do Governador Eurico de Freitas Vale, durante a Revolução de 30, quando compareceu para combater com trezentos homens por ele armados e municiados!

Em – “Chamas do Passado” - segundo volume inédito da trilogia de Calazans Fernandes, a espinha dorsal, o fio-condutor continua sendo Childerico II. Sua história perpassa cada capítulo, enquanto pano-de-fundo, e nos dá a dimensão de homens como ele, heroicos, verdadeiros titãs, cuja fôrma está desaparecida. Homens que construíam o próprio destino na marra, como se diz no Sertão. Homens de feitos e glória. Homens que levaram “uma vida de conquistador bandeirante, de homem antigo, aventureiro das matas e da indiaria, reconstruindo com obstinação impassível o que a tempestade derrubava. Dessa fibra teimosa se teceram os ombros que empurraram o meridiano para o Oeste”, para citar Cascudo, parente distante pelos Fernandes Pimenta, de Caraúbas, que lhe escreveu um longo panegírico, ao saber de sua morte.

Nesse segundo volume nos damos conta de como são profundas as relações dos que nasceram no entorno da “Serra das Almas” com os cristãos-novos, judeus que povoaram nossos sertões desde que por aqui aportou Pedro Álvares Cabral. Mas não somente. Também nos damos conta da presença de personagens significativos da nossa história potiguar a assuntar o ouro da “Serra das Almas”. Que dizer das armaduras e armas lá encontradas, no Serrote do “Cabelo-Não-Tem” ao lado de bruacas de couro cru cheias de pepitas de ouro? E quanto aos descendentes dos sobreviventes dos oito naufrágios nas costas do Rio Grande do Norte que subiram os rios Sertão acima, até o Alto-Oeste?

São muitas histórias – e estórias também, imbrincadas entre si pelo talento de Calazans Fernandes que a Fundação José Augusto, muito apropriadamente, poderia resgatar do limbo na fabulosa Coleção Cultura Potiguar. Por esse trabalho, pela Coleção, para a obra a ser apresentada ao público leitor, viriam todos nossos aplausos.

[1] Do padre.

[2] IBRASA – Instituição Brasileira de Difusão Cultural Ltda. / Dos Conflitos com Indígenas aos Choques da Reforma Agrária (1996) / Premio Joaquim Nabuco 1988 (Academia Brasileira de Letras) /2ª edição, 1996. 

[3] 7 de maio. 

[4] 8 de junho.

terça-feira, 31 de janeiro de 2017

FALTA TUDO E NÃO TEM NADA



* Honório de Medeiros


Minha faxineira é uma heroína.

Nova, ainda, trinta e cinco anos, aparenta bem mais. Casada com um pedreiro, é mãe orgulhosa de uma mocinha de dezoito, que “faz um curso de informática na cidade” após ter concluído o Segundo Grau.

Mora em “Jardim Progresso”, o último bairro da Zona Norte de Natal no sentido de quem vai para São Gonçalo do Amarante ou Extremoz.

Todo manhã ela acorda às quatro e trinta. Prepara o café, deixa pronto o almoço e começa sua luta diária para pegar transportes que lhe deixem nas diferentes casas onde ganha o pão de cada dia.

Lá pelas cinco, seis, a luta é para voltar para casa, essa mais difícil ainda.

No “Jardim Progresso”, cujo nome com certeza foi escolhido por algum burocrata sarcástico, não tem Posto de Saúde. Nem Delegacia. Tampouco Escola de Ensino Médio. Menos ainda creches.

“Creche? Tem no Vale Dourado. A semana passada um bocado de mulheres daqui foi dormir nas calçadas da creche para segurar uma vaga no atendimento do dia seguinte. Muitas voltaram sem conseguir.”

 Ou seja, falta tudo e não tem nada.

Quando lhe pergunto se a Polícia aparece por lá, ela ri. “Quando aparece é por que está perdida”.

“Dia desses dois vizinhos se travaram na faca. Ligamos para a Polícia. O policial que nos atendeu perguntou se tinha havido ferimentos. Quando soube que sim nos aconselhou a botar o ferido em um carro e leva-lo para o hospital mais próximo, que chegava logo. Nunca apareceu.”

Ônibus que é bom, somente os que passam no Vale Dourado, conjunto vizinho. Outro nome escolhido pelo burocrata sarcástico. Quando minha faxineira volta para casa, lá pelas seis da noite, pode ser que precise descer em Nova Natal. Então será quase uma hora de caminhada até a chegada.

Quinta passada entrei nos detalhes de sua vida como consequência da rebelião dos presos de Alcaçuz, aquele presídio-ratoeira construído por sobre dunas pelos políticos e burocratas do Estado.

Mais ou menos na hora do almoço eu lhe disse que o noticiário estava avisando acerca do recolhimento dos ônibus a partir das quatorze horas. Ela resolveu ficar. Perguntei como ia ser sua volta. Como suas explicações me soaram vagas, não aprofundei a conversa, mas lhe disse que se não encontrasse meio de transporte, voltasse. Eu lhe daria o dinheiro para pegar um “uber”.

Nesta terça soube de sua epopeia. Na parada para qual sempre vai encontrou uma mulher na mesma situação. Desceram até outra parada, depois outra, e nada de transporte. A mulher se lembrou do trem que vai até a Zona Norte. Desceram mais ainda, muito mais, pegaram o trem lotado e saltaram em Nova Natal. De Nova Natal até sua casa foi, mais uma vez,  uma hora de caminhada.

“Com quem você fez a caminhada?”

“Com Deus. E rezando.”

É uma heroína.

* Arte em pragmatismopolitico.com.br