quinta-feira, 24 de março de 2011

COMO VOTOU CADA MINISTRO A LEI DA FICHA LIMPA

Enviado por Ricardo Noblat em 24.3.2011


Jornal "O Globo"

Gilmar Mendes

Primeiro a votar ontem, afirmou que a Lei da Ficha Limpa não pode ser aplicada na eleição de 2010. O relator do recurso de Leonídio Bouças ressaltou a importância do cumprimento do artigo 16 da Constituição, que impede a aplicação de novas regras eleitorais a menos de um ano antes da votação. Disse que o STF tem o dever de decidir de acordo apenas com a Constituição.

Luiz Fux

O voto mais aguardado do dia foi contrário à aplicação da nova lei nas eleições do ano passado. Também citou o artigo 16 como garantia da igualdade de competição entre os candidatos. Para o ministro, criar novas regras de elegibilidade às vésperas das eleições afeta a segurança de candidatos e eleitores. Mas Fux iniciou seu voto elogiando a lei.

Ayres Brito

Novamente, o ministro defendeu a validade imediata da Lei da Ficha Limpa. "O cidadão tem o direito de escolher, para a formação dos quadros estatais, candidatos de vida pregressa retilínea", defendeu. Ele ressaltou a importância do artigo 14 da Constituição Federal, que prega a moralidade na vida pública.

Joaquim Barbosa

Voltou a defender a aplicação da lei nas eleições do ano passado. "A História nos mostra que, de tempos em tempos, é preciso fazer opções. O STF está, neste momento, fazendo uma opção", disse. Ele ressaltou dois dispositivos constitucionais: o artigo 16, que fala da anualidade, e o 14, que prega a moralidade pública. "Essa é a opção que devemos fazer. Eu já manifestei minha opção há muito tempo".

Ricardo Lewandowski

Presidente do TSE, argumentou que a lei poderia produzir efeitos em 2010. Segundo ele, o princípio da anualidade não precisa ser observado porque a nova lei não alterou a igualdade na disputa. "Não se verificou alteração da chamada paridade de armas. Todos os candidatos de todos os partidos estavam exatamente na mesma situação antes do registro, antes das convenções partidárias".

Celso de Melo

Argumentou que a Lei da Ficha Limpa não poderia vigorar nas eleições de 2010, já que foi aprovada com menos de um ano de antecedência do pleito."O fato é que o artigo 16 (da Constituição) é intocável. O artigo é imodificável, quer por emenda à Constituição, quer por simples lei complementar."

José Antonio Toffoli

Votou contra a aplicação da lei nas eleições do ano passado, assim como tinha feito em julgamento anterior no STF. Foi bastante enfático ao defender que, a menos de um ano das eleições, não se podem mudar as regras. Segundo Toffoli, "a Lei (da Ficha Limpa) alterou o processo eleitoral ao afastar candidatos". Ele ressaltou que a lei tem validade, mas não para o ano passado.

Cármen Lúcia

Em voto breve, apresentou a mesma posição defendida em julgamentos de 2010: favorável à aplicação imediata da lei. Ela afirmou que o processo eleitoral começa com as convenções, quando as candidaturas são formalizadas. Portanto, as novas regras de inelegibilidade não teriam afetado diretamente os concorrentes. "Não vejo quebra das condições de igualdade", disse.

Ellen Gracie

Voltou a defender a validade da lei para o ano passado. No plenário, contou que recebe centenas de e-mails de pessoas preocupadas com o resultado do julgamento. Esclareceu que o STF não estava derrubando a validade da lei, só declarando que ela pode vigorar apenas nas próximas eleições. "A Lei da Ficha Limpa permanece. O STF não derrubou a lei. Pelo menos não por enquanto", disse.

Cezar Peluso

Disse que a lei não pode ser aplicada já, o que violaria a Constituição. Frisou que a decisão não significa que o STF seja contra a "moralização do processo político". Mas afirmou: "Essa exclusão da vida pública, com base em fatos acontecidos antes do início de vigência da lei, é uma circunstância histórica que nem as ditaduras ousaram fazer."

Marco Aurélio

Também ponderou que o artigo 16 da Constituição impede mudanças na regra eleitoral a menos de um ano da votação. "Vivemos sob a proteção de uma Constituição Federal que submete a todos indistintamente, inclusive ao próprio povo", afirmou. "O artigo 16 é cláusula pétrea, quer queiramos ou não".

WODEN MADRUGA E A "ARENA DAS DUNAS"

Jornal de wm, 24 DE MARÇO DE 2011:


"A copa e a pomada
 
As colunas políticas-esportivas dedicam seus espaços mais nobres às manobras da Assembleia Legislativa, em cujos gramados o Governo do Estado joga toda a sua força para aprovação dos editais e dos royaties da Petrobras que vão permitir a construção da Arena das Dunas. Estufe o peito do seu bairrismo, caro natalense, porque a cidade será uma das sub-sedes da Copa do Mundo de 2014! Nem que isso custe a bagatela de 1 bilhão e meio de reais.

Ouvi dizer (ou eu li?) que o Ministério Público estaria questionando alguns aspectos legais dos editais. Mas na praça Gentil Ferreira ninguém acredita que o projeto da Arena não seja aprovado. E com ele os bilhões assinalados e ferrados desde a sua origem.

Até porque é grande o contingente de cérebros que acredita que a Copa transformará Natal numa das vitrines do mundo, uma cidade quase perfeita, um cantão suíço à beira-mar plantado. Dos altos de Mãe Luíza e dos baixos do Maruim, a humanidade te contempla, Natal!

Enquanto isso vi na televisão (ou li na crônica social) que faltam remédios básicos na farmácia do Abrigo dos Velhos Juvino Barreto. Faltava até pomada para aliviar as coceiras dos nossos velhinhos campeões do mundo, nossos canarinhos-de-ouro, murchinhos, coitadinhos, coçando aqui e acolá."

quarta-feira, 23 de março de 2011

FILOSOFAR É PRECISO

psicanalisedebebado.blogspot.com

Honório de Medeiros

Diz a tradição que o filósofo é um amigo da sabedoria. Claro. Mas é algo além disso, até por que não são todos os amigos da sabedoria que são filósofos, desde que a entendamos como conhecimento – termo quiçá desconhecido na Grécia antiga onde foi cunhada essa definição de filosofia.

É bem mais que isso, pois há os inimigos do conhecimento que são filósofos – dentre eles os irracionalistas de todos os matizes, incluindo os niilistas que seriam, digamos, os terroristas contra o saber. Da mesma forma que há amigos da sabedoria que, em relação a ela, cultivam um amor unilateral, não correspondido, pleno de atenção e aparato – pompa e circunstância – assim são os eruditos, a quem se atribui a condição de citar autores e obras sem lhes entender verdadeiramente o conteúdo.

Essa amizade há de ser crítica, é uma condição fundamental, para não ser ligeira e pouco consistente. Crítica no sentido da busca deliberada, metódica, determinada, de falhas, contradições, erros, equívocos, na sabedoria exposta, objetivada, anunciada: tudo quanto está oculto no espírito dos filósofos não interessa ao mundo, assim como a poesia que não se faz conhecida não será admirada ou enaltecida.

Há outra condição, um dever-ser, um valor: deve haver honestidade de propósitos no que diz respeito à busca da verdade. Sem que se faça presente esse pré-requisito o pseudofilósofo enreda seus argumentos nas armadilhas do ego e encontra miragens onde sequer há desertos.

Portanto há critérios para alguém ser considerado filósofo: é preciso haver apreço pela busca ao conhecimento; é preciso que haja a crítica dessa trajetória; é preciso que essa busca e essas críticas sejam metódicas; é preciso ter o espírito honesto nessa caminhada.

O filósofo deve ter o olhar da razão treinado para perceber as contradições da realidade na qual está imerso, sem esquecer que dela é parte integrante e inafastável. Não há olhar neutro por que quem olha é, ao mesmo tempo, sujeito e objeto desse olhar. E o treinamento deve ter sido, deve ser obsessivo, é a ginástica do espírito: ler, ler novamente, reler; pensar, pensar o pensamento, pensar o pensamento pensado – livros e a vida, a vida que é um livro e os livros que são vidas.

Por fim a filosofia é, então, o resultado de uma atitude. O filósofo, amigo crítico, metódico e honesto da sabedoria, assume uma postura em relação à Verdade; a ela tem afeto, que sua companhia, não a desrespeita nesse propósito, e a procura com critério. Talvez, para alguns, não seja simpática essa atitude, como o demonstra, por um lado, o martírio de Sócrates na Grécia antiga; a humilhação de Galileu, na Idade Média; o assassínio de Trotsky na era contemporânea; por outro lado, o menoscabo da elite, tão revelador, para com a filosofia e poesia.

Não importa. Se as idéias movem o mundo – e de fato o é, para o bem ou para o mal, quem as elabora, necessariamente, são os filósofos. Ou não foi isso que Karl Marx fez?

terça-feira, 22 de março de 2011

ARQUITETO MOACYR GOMES ANALISA LICITAÇÃO PARA O "ARENA DAS DUNAS"

Publicada no “Jornal de Roberto Guedes Via e-mail" de 21 de fevereiro de 2011:

"Caro Roberto:

Realmente a capacidade de persuasão da senhora governadora perante a Assembléia Legislativa na reunião da ultima quarta feira, se fosse num programa de auditório teria levado Gongo, mas entende-se, considerando-se que a ilustre senhora não é engenheira nem economista, mas é inadmissível a um secretário, engenheiro experiente, persuasão ZERO, dizer na televisão para todo o Rio Grande do Norte, que aquilo que anda sendo divulgado no site do Estado (http://www,portal.rn.gov.br) seria um um projeto que embasou uma licitação que se dizia internacional, na qual teriam sido inscritos vinte tantos interessados, mas, ao final, estranhamente só apareceu uma única ganhadora, apesar do governo dizer que a modelagem econômica é bastante atraente, como de fato foi, mas apenas para uma só empresa interessada. Que é isso?

Que projeto, secretário, como é que se faz uma licitação de obra pública, com base em simples imagens virtuais, desprovidas de quaisquer informações, mínimas que sejam, que possam levar pelo menos a uma estimativa, muito menos a um orçamento e a um cronograma ? Bem que o presidente do CREA vem há bastante tempo dizendo que não há projeto, e, se apareceu recentemente um projeto, cadê a TRANSPARÊNCIA, porque não se publica no site do Estado junto com orçamento e cronograma, para conhecimento da sociedade , que afinal é quem vai pagar a conta ?

Parece que o governo debocha dos engenheiros, arquitetos e economistas locais, como se fossem imbecis. A televisão mostrava claramente as fisionomias constrangidas de todos, inclusive da governadora e seu secretário, fingindo acreditar no que se dizia,numa espécie de fascinação pelo “canto das sereias”, e tudo indica, que no fim, vão aprovar a esbórnia mais facilmente do que a polêmica da poda do cajueiro de Pirangí.

Na pratica é o seguinte: o governo encomenda ao parceiro privado, um elefante branco, por R$ 300 milhões, sendo seu fiador, dando-lhe como fundo garantidor terrenos subavaliados por R$370 milhões, sabendo que valem três vezes mais, além de "royalties" de petróleo no valor de R$ 70 milhões, e admite que quando receber o paquiderme, seu custo terá um ágio de 300% a mais, isto é, terá um custo final multiplicado por 4 = R$ 1,2 bilhões. Resumindo, o Estado para candidatar-se a receber (ou não) do Governo Federal, R$ 3 bilhões para infra-estrutura (cadê os projetos ?) tem que pagar um juro de 40% ? FANTASTICO, nem nos Emirados Arabes, por isso, São Paulo se recusa a paga esse mico.

Assim, sabendo-se que o governo não terá como pagar as contrapartidas, e que, os "royalties" não cobrirão o déficit do empresário, sua grande jogada será avançar nos terrenos, vendê-los, ou usá-los na especulação imobiliária e se locupletar.

E nós ficamos com a fama que atribuía Nelson Rodrigues aos beócios: chamando-os de "lorpas, pascácios e bovinos", enquanto os políticos e gestores ficarão impunes e continuarão a ser eleitos. No fim, essa aventura irresponsável de arriscar mais de R$1,5 bilhões para candidatar-se a receber R$ 3 bilhões, em promessas terá o custo de quantas vidas humanas desprezadas nos corredores dos hospitais durante os vinte anos, por conta de 2 jogos inexpressivos para enriquecer a CBF/FIFA e seus apaniguados?

Desculpe, Roberto, peguei carona no seu PS do jornal de ontem, sexta-feira 17, porque sei que você faz jornalismo com seriedade e coragem. Gostaria de publicar esses comentários em todos os jornais do país, até mesmo como alerta às outras cidades brasileiras que estarão sendo também enganadas por esse rolo compressor. Não sendo possível, estou enviando para os contatos que tenho por aqui, pois estou seguro que ainda tem muita gente sensata em meu estado, embora consciente de que nada mudará o curso dessa insensatez. Que venha a Copa para Natal, por meios lícitos, e não através de manobras abjetas.

Grande abraço do amigo Moacyr Gomes.

sábado, 19 de março de 2011

OBTER O CONTROLE. ESTAR NO CONTROLE. MANTER O CONTROLE.


Honório de Medeiros

Obter o controle. Estar no controle. Manter o controle. Faz parte da doideira ideológica que é a tal da estratégia militar ou de combate. Quem tem o controle tem o Poder, dizia, para um dos seus escravos, o extraterrestre que governava a terra no romance de L. Ron Hubbard, aquele autor americano de ficção científica que ficou mais famoso como criador da Cientologia, estranha seita preferida de 10 entre 10 atores famosos americanos.


O controle está para o Poder como a célula está para o tecido, o átomo para a matéria, digo eu. É através do controle que se estabelece a hierarquia, seja qual seja o ser vivo, parodiando Popper e sua Teoria Evolucionária do Conhecimento, ou seja, da ameba ao humano. Lula, que não é lido, mas não é burro, deixou bem claro ao analisar Pedro Simon e sua quixotesca candidatura a Presidente do Senado: “ele não é confiável”. Confiável ou controlável? Dá no mesmo nesse contexto sórdido da política.



Na raiz desse controle está a tendência inata do ser humano de explorar, absorver, extrair, para si, tudo quanto, naquilo que o cerca, amplie sua possibilidade de sobrevivência. Dawkins – esse mesmo que desencadeou uma cruzada contra Deus a partir de Darwin – afirmaria que fazemos isso manipulados pelos nossos genes. Para ele, nós somos nossos genes. O resto é invólucro. Ou seja, o resto é resto. Há controvérsias. Alguns acham muito radical essa teoria.


Trazer para o mais íntimo de nós, no aspecto físico, o que está por trás – mesmo que remotamente – das ações humanas deu um corpo de vantagem a Darwin sobre o velho Marx. Este, como se sabe, coloca a divisão do trabalho na raiz do problema do controle. Esta, a divisão do trabalho, vai fazer surgir a propriedade privada, ou vice-versa, as relações de produção, a infra-estrutura material, a superestrutura ideológica, enfim, ufa!, a luta de classes e a exploração do homem pelo homem.



Mas o que estaria por trás do surgimento da propriedade privada? O que está no começo da exploração do homem pelo homem? Marx não disse. Talvez seu companheiro Engels tenha esboçado algo a respeito a partir da análise dos estudos de Morgan, um antropólogo e etnólogo americano que andou estudando os nativos de seu país no final do século XIX, em uma obra que é muito citada nos meios acadêmicos e pouco lida. Pois Darwin disse. Disse claramente. E com ele, começou um novo capítulo das ciências sociais e, mais especificamente falando, da Psicologia Social Evolutiva.



Pois bem: voltamos ao ponto de partida. Somos levados, instintivamente, a controlar para explorar. Isso tanto em nível pessoal quanto social. Quem controla estabelece hierarquia. O povo, que não é besta, há muito denuncia, como pode, a arrogância da elite que põe o dedo em riste e pergunta ao Zé Mane: “você sabe com quem está falando?”, para tentá-lo controlar.



E não há limite para a intenção de controle. O céu é o limite. “Quanto mais temos, mais queremos ter.” O povo diz, o povo sabe. O senso comum é o ponto de partida para o conhecimento. Quanto mais queremos ter, mais nos tornamos predadores.



Claro que os controladores dão nomes bonitos a tudo isso. Faz parte do jogo, é uma estratégia de controle. Chamam a esse impulso predatório de ambição social, luta para deixar o legado na história, defender os interesses da sociedade, luta para ascender na escala social... Tudo lorota. Na essência, é o ruim e velho capitalismo de guerra e sua teia de argumentos justificatórios. No âmago do âmago, como diriam os exagerados, está esse egoísmo inato cujas vísceras Darwin expôs.



E os santos, alguém perguntaria. O altruísmo, diria eu, é sempre uma espécie do egoísmo.

sexta-feira, 18 de março de 2011

BRINQUEDINHO DE R$ 1,2 BI AJUDA A MATAR MILHARES DE POTIGUARES

Por Carlos Santos (blogdocarlossantos.com.br):

O brinquedinho denominado de "Arena das Dunas", que vai ser construído em Natal, para abrigar jogos subalternos da Copa do Mundo de Futebol de 2014, vai custar mais de R$ 1,2 bilhão.

O Governo do Estado garante a farra, que é a alegria de uns poucos, em detrimento de muitos.

A esperteza vence a sensatez.

Esses senhores e senhoras que estão incensando a obra deveriam passar um final de semana no Walfredo Gurgel e Tarcísio Maia, testemunhando uma carnificina própria de hospitais de campanha em Kosovo deflagrada, Cabul ou Teerã.

Falta até esparadrapo.

Gente agoniza nos corredores. Outros ficam amontoados em enfermarias, quartos etc.

Mulheres, homens, jovens e idosos, todos pobres, entregues à voracidade do capital. Vitimas de outras prioridades.

Só mesmo uma força divina para punir essa gente.

Na terra, impossível. Não acredito.

terça-feira, 15 de março de 2011

MINHA ALMA É CHAMA

abismo.jpg

Honório de Medeiros

A minha própria alma é esta chama,

Insaciável de infinitos.

Flameja para o desconhecido sua ânsia,

É preciso asas quando se ama o abismo.

DO OFÍCIO DE ENSINAR

decisivo.com.br

Honório de Medeiros

De todas as atividades profissionais que exerci, nenhuma me deu tanto prazer quanto a de ensinar. Não por outro motivo continuo ensinando, e até diria que o afeto pelo ensino me levou, incontáveis vezes, a construir inconscientemente obstáculos que me impediram de aceitar outros compromissos mais rentáveis ou mesmo de maior projeção curricular.

Assim, nada me deu tanto orgulho quanto a obtenção, com louvor, do título de mestre através da defesa de dissertação acerca do tema “Poder Político e Direito” ante uma banca de examinadores formada por dois doutores e um livre-docente, este último, inclusive, visceral adversário da minha linha de pensamento no âmbito do Direito, claramente externada anteriormente em memorável prova oral de admissão ao curso de mestrado que durou quase quarenta e cinco minutos! Contou-me o Dr. Paulo Lopo Saraiva, depois, em jantar comemorativo, que ele insistira em compor a “minha” banca. Uma honra, com certeza.

A vida acadêmica seria, portanto, uma opção natural para mim quando terminei o curso de Direito em Natal. Seria se já naquele tempo do qual os professores universitários de hoje têm saudade, a profissão não fosse tão mal remunerada. E eu não precisava fazer muitas indagações para constatar essa realidade. A professora Elza Sena, minha tia, com quem eu morara durante meu curso universitário, ainda era viva, estava no penúltimo degrau de sua carreira, e ganhava muito mal. Tomei, portanto, outros caminhos, mas não escondia meu desejo de ensinar. Até que, em 1999, entrei, através de processo simplificado, na Universidade Potiguar, onde, desde então, ensino Filosofia do Direito, com raras incursões em outras disciplinas, quase sempre da área propedêutica, por opção própria.

Tenho ensinado, desde então, às vezes com sacrifício pessoal, mas sempre com renovado prazer. E tenho encontrado, sempre, compensações para o parco salário: as controvérsias em sala-de-aula, que enriquecem o conhecimento; a descoberta de talentos fulgurantes entre os alunos; a convivência com a diversidade de opinião entre colegas, no ambiente acadêmico; os laços de afeto que se formam entre professor e alunos; a criação do hábito de estudo para a preparação das aulas. Mas tenho sentido, na pele, dia após dia, o pouco compromisso da grande maioria dos nossos políticos com a educação, através da falta de investimento em recursos humanos, seja quanto ao básico, à parca remuneração dos professores, seja quanto ao complexo, o distanciamento da opção pela pesquisa científica.

Pedindo desculpas pelo texto auto-referente concluo observando que é inacreditável termos, no Brasil de hoje, ilhas de excelência na área de educação, resultado da abnegação, do sacrifício, da determinação de alguns. São estes, verdadeiros sacerdotes do saber, heróis anônimos, para recuperar uma definição surrada, batida, estropiada, mas absolutamente verdadeira. A eles, a nossa eterna e sincera homenagem.

domingo, 13 de março de 2011

A ARTE DE DECLAMAR E RAMIRO GUEDES

essênios.wordpress.com

Honório de Medeiros

Dia desses alguém tocou no nome de Ramiro Guedes. Nada sei a seu respeito, exceto que foi poeta, seus poemas cantavam estórias de conteúdo moral, e minha mãe os declamava com uma intensidade, uma carga dramática, um ritmo tal que invariavelmente nos conduzia às lágrimas. Ela tinha a arte de declamar.
 
Arte sim, sem dúvida. Como arte, com certeza, são os poemas de Ramiro Guedes, que foram feitos para serem declamados em saraus literários nos quais a sociedade ouvia, com raro deleite, versos às vezes não tão sofisticados – que importância teria o rigor formal? – assim como a estória em si – também não importa – e percebia aquele amálgama de talentos que torna grande o orador ou cantor: voz, presença, gestos, capacidade dramática, domínio de palco, interação com a platéia, noção de momento – esta, então, rara, vez que dom – ou seja, o declamador.

“D’antes, lá longe, nos confins d’Arábia,

Que se estendem do Líbano à Caldéia,

Vivia um velho sábio, d’entre os mais sábios,

Dos essênios da Síria e da Judéia.


Um dia uma lenta caravana,

Surgiu do horizonte pela calma,

Trazendo em canjirões de porcelana,

Essências de Bagdá, e óleos de Palma.”

E a declamação fluía lenta, nesse primeiro e hipnótico instante, transportando-nos para um Oriente misterioso onde dromedários, um atrás do outro, pacientemente, coroavam as dunas do deserto enquanto o sol morria suavemente. O poema prosseguia. Ramiro Guedes quer nos encaminhar ao sentido da vida através do mercador, dono dos animais, que busca, há muito tempo, resposta para essa pergunta angustiante; ele soubera que ali, no local de onde se aproximava, vivia alguém que lhe poderia responder.

O mercador consegue encontrar o eremita. E este se dispôs a escutá-lo. Ouviu-lhe o relato de uma busca incansável, por terras distantes e estranhas. Fora muito o tempo empreendido e os recursos gastos na busca. O mercador nada encontrara. Ninguém conseguira trazer-lhe o conforto e a paz tão ansiados pela sua alma inquieta.

O sábio o escutou em silêncio. Depois, pede-lhe que empalme a areia do deserto sobre a qual está prostrado e a amolde à conformação de sua mão. Diz-lhe que do consegui-lo depende a resposta para o que busca. O mercador tenta. Pega a areia fina, branca, segura-a firmemente, mas quando descerra os dedos ela escorre entre suas falanges até o chão. O mercador percebe que há algo muito importante nesse pedido do sábio. Aos poucos, torna-se frenético. Desesperado tenta outra, outra, e muitas outras vezes, mas sempre a areia escorre entre seus dedos. Em seu desespero, as lágrimas fluem. Uma delas, em um instante mágico, cai sobre a areia que começara a escorrer da palma de sua mão. Naquele local onde a lágrima caiu, as partículas se agrupam e jazem unidas, repousando. Nesse momento, como que acordando de um longo sonho, o sábio diz: “eis o sentido da vida: pó inconsistente e frágil, basta uma só lágrima, um sentimento, para que a areia do deserto se torne sólida e permanente na palma de sua mão”.

sexta-feira, 11 de março de 2011

O SERVIDOR PÚBLICO E AS ELITES

mastersantucci.blogspot.com

Honório de Medeiros

Costumo iniciar, ano a ano, o curso de Filosofia do Direito, na Universidade Potiguar, falando a meus alunos que filosofar é desvendar a realidade, como se esta tivesse véus que a ocultassem e, por assim ser, impedisse os menos persistentes de encontrar a verdade que ela persiste em nos esconder. Essa imagem inicial guarda débito para com a bela elaboração da mitologia hindu, que nos apresenta a deusa MAYA como sendo responsável exatamente pela impossibilidade de podermos enxergar a realidade como ela é e percebermos que tudo quanto nos cerca nada mais é que pura ilusão, um devaneio infindável a nos impedir o verdadeiro conhecimento.
Um desses véus mais persistentes é – se pudermos usar essa imagem para melhor explicarmos – é aquele que despersonaliza a ação concreta do ser humano e a atribui a uma abstração, como é o caso da idéia de Estado. Ouvimos e vemos sempre que o Estado não se faz presente, no caso do Brasil, desde épocas passadas, na luta contra a desigualdade e exclusão social – algo inquestionável, por sinal, por que podemos constatar que, de fato, evoluímos quanto ao aparato tecnológico com o qual o capital se instaura, mas não conseguimos solucionar questões comezinhas como a da eliminação do analfabetismo. Não é o Estado que não se faz presente. Somos nós mesmos que estamos ausentes. Despersonalizar a ação de quem detém o poder, mascarando-a com esses artifícios dificulta sua responsabilização.

Outro véu onipresente é aquele que nos impede de percebermos como se instaura uma determinada lógica na ação daqueles que detém o poder e, a partir de então, ela passa a fazer parte do nosso cotidiano sem que, em qualquer momento, passemos a questioná-la em seus fundamentos básicos. No primeiro caso temos a persistente e programada despersonalização da ação da elite, através de artifícios que pretendem legitima-la, como é o caso do atual conceito vigente de Estado, que deixa de ser o “topos” onde ocorre a ação, para ser o instrumento burocrático atrás do qual se esconde o processo de instauração dos mecanismos do Poder. No segundo caso temos o discurso real, não o ilusório ou artificioso, que engendra a ação daqueles que detém o Poder.

Podemos considerar que o primeiro – a despersonalização – é conseqüência coerente do segundo. Ou seja, despersonalizamos por que precisamos ocultar o real. Seria como uma manobra diversionista, se utilizássemos a linguagem da guerra. E qual é esse discurso real? Lembremo-nos que, no Brasil, desde a ocupação portuguesa, o espaço público foi privatizado. Não é desconhecido que na carta de Pero Vaz de Caminha ao Rei, no final, ele solicita regalias para sua família. Tampouco o é o episódio das Capitanias Hereditárias.

O fato é que, desde o início, e até o presente, esse espaço público pertence à elite e esta tem ser revelado de um atraso inigualável. Raymundo Faoro demonstra, em sua obra “Os Donos do Poder”, criando o conceito de “estamento”, o quanto, ao longo dos anos, até o presente, a elite privatiza o público e o utiliza em proveito próprio. Ou seja, segundo Faoro, no capitalismo brasileiro não há, necessariamente, uma apropriação dos meios de produção por parte da elite, mas, sim, uma privatização do espaço público em proveito próprio. Assim é que vemos filhos de juízes sucederem aos pais, generais aos avós, deputados aos antepassados e assim por diante.

A vingança dos excluídos tem sido, ao longo do tempo, variada, mas permanente. Não é à toa que na literatura, na música, na arte, de uma forma geral, o “barnabé” é permanentemente motivo de chacota. Mas o resultado é inócuo. Continuamos tendo o espaço público privatizado. Essa ação da elite teve seu preço: a ampliação do espaço público, o gigantismo, o excesso de burocracia. Burocracia: mais cargos para atender a demanda, mais ações para atender a procura. Com a globalização, essa burocracia passou a ser um entrave para o grande capital internacional, legitimado pela doutrina do “Consenso de Washington”. A ordem passou a ser: devemos nos render ao Estado mínimo.

Chegamos, agora, ao ponto fulcral desta análise. A doutrina que passou a prevalecer após o ideário do “Consenso de Washington” exige um Estado mínimo para que não haja dificuldade na circulação do capital. Este tem que vir e voltar logo, bem mais gordo, para os bolsos de quem o possui. Para que não haja dificuldade nessa circulação, é necessário impor a ótica financeira na ação governamental. Essa ótica financeira demanda opções típicas de mercado, como equilíbrio nas contas públicas e pagamento dos juros extorsivos do dinheiro emprestado pelos organismos internacionais. Portanto, as políticas públicas de longo alcance, bem como os serviços e servidores públicos através dos quais elas são realizadas devem desaparecer para que a lógica da obra, em detrimento da meta intangível prevaleça. Não é à toa que os políticos somente pensam em termos de obras físicas. Acaso o investimento em uma meta real, concreta, significativa, de erradicação do analfabetismo traria retorno em termos de voto e dinheiro para financiamento de campanhas políticas? Construir uma ponte, sob o argumento de que é preciso desenvolver, traz retornos mais concretos que investir na erradicação da mortalidade infantil.

Então vemos o surgimento da publicidade: o “Governo investiu tantos milhões em obra tal e qual” e a sociedade esquece que mais importante é atingir metas mais abstratas, como a diminuição dos índices de violência pública. Sem contar que o discurso para legitimar as obras é impressionante em sua vacuidade: construamos para acelerarmos o desenvolvimento e aumentarmos a riqueza. Claro, o capital precisa de rapidez para circular. Então construamos estradas, rodoanéis, viadutos, pontes e outros mais, e esqueçamos o analfabetismo, a mortalidade infantil, a exclusão social, por que a riqueza vai circular mais rápido e tornar mais rico quem detém o capital, mas a desigualdade permanecerá, como o demonstra o crescimento desde Getúlio até os dias de hoje e a permanência da mesma desigualdade.

Nesse afã de tornar o Estado mínimo, faz-se a política da terra arrasada: não temos tempo nem queremos distinguir entre o que vale e o que não vale a pena eliminar: todo serviço público é ruim, e todos os servidores são ineptos. Esse é o discurso da elite que, infelizmente, encontra eco na sociedade nauseada com o mau serviço público e os maus servidores, que existem exatamente por que a elite apropriou-se do espaço público para se locupletar. Assim, aquilo que parece óbvio, qual seja a recompensa pela vocação do servidor público, uma aposentadoria digna, está desaparecendo e, com ela, o interesse em se devotar ao público.
















segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

QUE TIPO DE GOVERNO TEMOS?

brasillibertario.blogspot.com

Honorio de Medeiros

Não se iluda: governo, governança, gestão, administração pública, tudo isso significa a mesma coisa, ou seja, como aqueles que estão no Poder o exercem sobre nós, os pobres mortais. Vamos usar o antigo termo “governo”, a partir de agora, pois é o que com mais possibilidade é entendido por todos.


Como podemos rapidamente julgar um governo sem temermos cair no mero “achismo”? Um dos meios utilizados é analisar se esse governo pode ser definido como “reacionário”, “conservador”, “reformista” ou “revolucionário”. Aqui convém lembrar que não cabe discussão acerca do significado de cada termo citado. O que importa é o problema em questão: saber como podemos definir o governo analisado. Assim, cada termo desses pode ser utilizado a partir de como o entende o senso comum.



No caso de governo reacionário, o senso comum entende que é aquele que promove a volta ao passado, por entender que aquilo que existe hoje não atende às expectativas de quem está no Poder. Seria o caso dos saudosistas do governo militar, que querem a volta da ditadura implantada a partir de 64. Esses dizem sempre: “tempos bons foram aqueles...”



O governo conservador quer que tudo permaneça como está. Tem horror a mudanças, embora talvez tenha sido eleito prometendo algumas e sempre diga, quando na mídia, que está promovendo uma “reforma profunda” ou uma “verdadeira revolução” através de sua administração. Nesse tipo de governo, as coisas mudam para não mudar, ou seja, tudo quanto já existia permanece com outro nome. Para sabermos se um governo é conservador ou não, basta pensarmos se alguns dos eixos fundamentais da vida em sociedade sofreram modificação para melhor ao longo do tempo: a saúde pública melhorou? E a educação? E a infra-estrutura, ou seja, as estradas, o trânsito, a meio-ambiente? E a segurança pública?



O governo reformista estabelecerá políticas públicas que modificarão fundamentalmente a situação por ele encontrada ao chegar ao Poder. Foi o que aconteceu e ainda acontece, por exemplo, no Chile pós Pinochet. Foi o que aconteceu e ainda acontece, por exemplo, nos países escandinavos, nos chamados “tigres asiáticos”, no Japão e Alemanha pós-guerra. Essas reformas podem existir, também, em estados-membros e municípios. Foi o caso do governo Cortez Pereira, aqui no Rio Grande do Norte, que o Poder pós 64 impediu a continuidade inclusive no plano das idéias.



Por fim o governo revolucionário é aquele que faz mudanças radicais em curto espaço de tempo, sem qualquer preocupação quanto aos meios que conduzirão aos fins almejados. Foi o que ocorreu através da revolução americana de 1777, francesa de 1789, russa de 1917, e aí por diante.



Agora, pensemos: que tipo de governo temos no país, no nosso Estado, no nosso município?

domingo, 27 de fevereiro de 2011

PARABÉNS!!!

Bárbara Lima de Medeiros

PARABÉNS, PRINCESA!

QUE A VIDA LHE SEJA LEVE.

COM TODO O MEU AMOR,

Honório de Medeiros

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

BELEZA SERELEPE



Honório de Medeiros
Para B.M.F.L.

Ela, toda serelepe, explica por que não freqüenta academia: “esse povo pensa que vai ficar igual a essas modelos famosas. Não se tocam que não há musculação nem plástica que dê jeito em quem não nasceu para a passarela. Não há milagre que resolva o problema de quem nasceu baixa, por exemplo”. “Eu acho que você está sendo radical”, provoco. “Que nada”, responde, “estão todos é jogando dinheiro fora”. “E os saradões, as malhadas, com tudo em cima?” “Eu acho é graça; de que adianta tudo isso se esse povo só vê o próprio umbigo? Não se fixam em ninguém? Você não vê os atores e atrizes? A rotatividade nos relacionamentos? É como os adolescentes: a fila tem que andar”.

“Então esse negócio de beleza...” “Olhe”, ela interrompe, “se o cara está apaixonado, não está nem aí para a celulite ou a estria. Aquela modelo do Rio Grande do Norte, linda, Fernanda Tavares, não tem celulite? E não está noiva com um ator global? E se a pessoa ama esse negócio de beleza também é extremamente relativo. Quantos homens e mulheres não amam pessoas que não são nenhum padrão de beleza! Isso por que eu imagino que o amor é algo que se constrói dia-a-dia, uma cumplicidade, tipo uma sociedade bem firme, e então não se acaba por conta de uma barriguinha qualquer”.

“Além do mais”, continuou num fôlego só, “se eu fizer plástica, lipoaspiração, cuidar dos dentes, for à academia religiosamente, emagrecer, ficar nos trinques, nada disso me garante que eu vou conquistar quem quiser. E se a pessoa que eu quiser gostar de um outro tipo? De que adiantou todo meu esforço? Esse negócio de cultivar a beleza é uma armadilha. Nela só se dá bem dono de academia, cirurgião plástico, dentista, nutricionista, dermatologista, esse pessoal que vive da vaidade alheia. Muito mais importante do que isso tudo é você ter cabeça! Quantos homens e mulheres que não foram bonitos conseguem todos que quiseram...”

Ela argumenta e argumenta. Cita o caso de A, de B, de C... Lembra casamentos que se acabaram, traições, paixões que nasceram do dia para a noite nos lugares e entre as pessoas mais inesperadas, tudo sem que a beleza realmente importasse. Atribuiu o sucesso na conquista a algo que denominou de “atitude”. Disse-me ela: “você precisa ter atitude; se você tiver, vai conseguir”. Perguntei-lhe o que ela entendia por “atitude”. Ela respondeu que se eu não sabia, não adiantava explicar. “Isso é como paixão, se você está apaixonada, sabe que está, não precisa se perguntar”.

E, talvez cansada, mas mesmo assim lépida e fagueira, levantou seu corpo da cadeira, dardejou uma despedida através de um olhar negro como seus olhos, e danou-se no mundo, totalmente indiferente aos olhares de admiração dos homens e de inveja das mulheres que a viam passar.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

A NATUREZA É EQUILÍBRIO?

stcsociedade.blogspot.com

Honório de Medeiros

Embora pura metafísica, ou seja, além da possibilidade de explicação científica, pelo menos por enquanto, é possível que todos os sistemas, inclusive nós mesmos, tendam para o equilíbrio, como parece demonstra-lo a capacidade de auto-organização da sociedade próxima ao limite do caos social.

Observando a realidade social, parece fazer sentido essa tendência. Se nos lembrarmos das revoluções, insurreições, irridências acontecidas ou acontecendo mundo afora, constatamos que em todas elas há a fragmentação do tecido social seguida de uma ação espontânea organizadora que ergue, dos escombros, uma nova configuração para a sociedade. Foi assim com a Revolução Francesa, Bolchevique, a queda do regime comunista, e está acontecendo no Haiti, Iraque, Afeganistão e em outros países.

Qual seria a causa do início do processo de ruptura do equilíbrio? Platão diria que é cíclico e permanente. Algumas das modernas teorias acerca da realidade afirmam a infinita permanência desse processo no qual a Ordem sucede ao Caos e que não diria respeito apenas ao nosso Universo material, ao contrário, existiria inclusive dentro de cada um de nós. Outro filósofo lembra que nosso conhecimento é sempre dependente da fragmentação das nossas expectativas em relação a como tudo se comporta: se, por exemplo, uma determinada pessoa não se conduz como imaginávamos, buscamos saber qual a causa dessa contradição e, então, passamos a conhece-la melhor.

A posição desse filósofo permite-nos trazer a discussão acerca do equilíbrio como lei universal para o campo pessoal. Assim, a tese seria que o equilíbrio que nos mantém lúcidos e vivos precisa ser mantido e ele pode ser comprometido, por exemplo, quando dizemos algo e fazemos diferente. Ou seja, quando nossa teoria é diferente da prática.

Óbvio que nada aqui dito é novidade. As filosofias orientais há muito apontam para a busca desse equilíbrio como meta a ser alcançada. Na Grécia, base de nossa cultura ocidental, já havia o conceito de “homeostase” como algo a ser percebido e constatado. E a própria psicanálise teoriza acerca da “unidade do Eu”.

O que há de novo é a ressurreição dessa metafísica: haveria uma lei natural única, absoluta e eterna regendo desde o comportamento do universo às relações pessoais, passando pela interior da matéria. Não por outro motivo, alguns teóricos da psicanálise admitem que muitas doenças são originárias da ruptura no equilíbrio psíquico do indivíduo.

Quanto ao mundo biológico, mais precisamente em relação à teoria da seleção natural, a tendência comentada pode ser percebida nos processos adaptativos das espécies: quando se rompe o equilíbrio no meio-ambiente, aparece a “doença” ecológica: são os desastres dos quais nos dá notícia, quase todos os dias, a mídia.

Não é à toa que o sempre bem lembrado Aristóteles nos apontava o caminho do meio como o caminho a ser seguido. Esse meio é equilíbrio, simbolizado pela balança cujos pratos estão nivelados por igual, núcleo da idéia de democracia, legado maior da Grécia imortal à humanidade.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

O QUE LEVA O JOVEM AO CRIME

wellington-rodrigues18.blogspot.com

Honório de Medeiros

Uma das conseqüências possíveis relacionadas com a teoria da Antropóloga Alba Zaluar, Coordenadora do NUPEVI (Núcleo de Pesquisa das Violências), ligado ao Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, de que apenas a pobreza e a desigualdade social não explicam a ida de jovens para a criminalidade, é dar razão ao senso comum do povo quando clama pelo endurecimento da legislação penal.

A teoria, exposta em matéria assinada pelo jornalista Antônio Góis, da sucursal da Folha de São Paulo no Rio de Janeiro, apresenta como uma das causas do envolvimento de jovens com a violência a estrutura cultural que induz o surgimento do que ela chamou de “etos da hipermasculinidade”, ou seja, trocando em miúdos, “a busca do reconhecimento por meio da imposição do medo”.

É algo decorrente da chamada “cultura machista”: os filhos homens são criados em ambientes que reproduzem condutas herdadas de desrespeito sistemático às mulheres, aos homossexuais, aos negros, às minorias, enfim, e valorização direta ou subliminar dos ícones da masculinidade distorcida; a música, a tradição oral, o lazer, a literatura, a própria postura passiva das minorias contribuem para a construção desse perfil medíocre e ameaçador.

A antropóloga lembra que “se a desigualdade explicasse a violência, todos os jovens pobres entrariam para o tráfico. Fizemos um levantamento na Cidade de Deus (conjunto habitacional favelizado na zona Oeste do Rio de Janeiro) e concluímos que apenas 2% da população de lá está envolvida com o crime.” É outra comprovação científica que respalda o senso comum: se apenas a pobreza fosse passaporte para o crime, não haveria Sociedade da forma como conhecemos. Melhor, não haveria tantos ricos criminosos.

De posse do trabalho apresentado por Alba Zaluar talvez pudéssemos pelo menos iniciar a discussão em torno da ampliação das penas no Brasil. Quem sabe instaurarmos a prisão perpétua: não outra punição merece uma quadrilha de assaltantes recentemente presa em São Paulo, todos na faixa dos vinte anos, especializados em condomínios, que se tornaram conhecidos por torturarem suas vítimas, fossem elas novas ou idosas. Prisão perpétua com alimentação, saúde, lazer, tudo pago com trabalho – há tantas estradas para ajeitarmos, Brasil afora, tanta terra para ser arada...

E o maior empecilho, para aumentarmos a dosagem das penas no nosso país, para criarmos a prisão perpétua, é exatamente esse remorso social – quando não é a defesa em causa própria, como por exemplo, o caso dos nossos congressistas, grande parte respondendo algum tipo de processo – hipócrita que nos corrói a capacidade de enxergar o óbvio agora corroborado cientificamente. Sempre achamos, segmentos da elite, que a criminalidade tinha ligação direta com a pobreza. Recusávamos-nos a perceber, com o povão, que sofre nas mãos da delinqüência e nas mãos da polícia, que não era assim, afinal não se justifica que haja tortura e morte desnecessária em cada assalto realizado: a crueldade é um ritual de passagem na hierarquia do crime, dependente da admiração dos companheiros: quanto mais cruel, mais admirado, quantos mais homicídios, mais enaltecido.

Agora é tempo de ir atrás do prejuízo antes que seja tarde demais: contamos nos dedos as casas e condomínios onde não há cerca elétrica e cães, isolamento e medo. Fazemos de conta que não há guerra civil em São Paulo e Rio de Janeiro. Iludimo-nos pensando que o Estado é soberano em algumas áreas das grandes cidades do Brasil.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

OUTROS FRAGMENTOS

Poesia
muraldosescritores.ning.com

Honório de Medeiros

“Iluminar a realidade”, disse-me o Prof. Gilson Ricardo de Medeiros Pereira, apontando o horizonte, quando lhe pedi ajuda. Ah, a poesia – como ela transfigura e sintetiza o comum, o banal, apesar de até mesmo no comum e banal, dependendo do contexto, haver beleza. Muitas palavras lavradas em tecniquês diriam o mesmo, até de forma mais precisa, reconheçamos. Entretanto essa frase descerrou véus e eu pude enxergar claramente, pois há sempre uma nesga, um fragmento de realidade a ser iluminada, revelada, exposta.

O – X – O

É em decorrência de nossa ambigüidade que florescem os nossos adversários. Quais adversários? Quaisquer. Basta que sintam, nos interstícios do que dizemos, ou fazemos, ou pensamos e expomos, a fragilidade de nossas posições ambíguas. Ambíguas por que não são claras, não estão concretamente dimensionadas, suscitam muitas e várias interpretações. Essa ambigüidade é uma das armas da elite política.

O – X – O

Teria existido alguma sociedade humana sem qualquer tipo de regulamentação? Não. Essa é uma constatação de fato. Algumas experiências anarquistas – notáveis em si mesmas – fracassaram. Assim sendo, seria a hierarquia algo inerente ao humano?

O – X – O

Nada tão contrário quanto Erhlich a Kelsen, Kelsen a Erhlich. Um alemão, outro tcheco naturalizado austríaco. Aquele a advogar que o Direito emana diretamente da Sociedade; este do Estado. Óbvio que o Estado está para a Sociedade como a espuma para o mar. Entretanto observemos: emana DIRETAMENTE da Sociedade e do Estado.

O – X – O

Se quiséssemos escrever uma história da literatura norteriograndense, ou outra, acerca do Poder no Rio Grande do Norte ao longo deste século, qual seria o eixo, ou melhor, a força motriz que estaria por trás dos fatos? Algo como a luta de classes, de Marx, ou a seleção natural, de Darwin, ou mesmo a psicanálise de Freud, talvez mesmo o instinto de morte de Ernst Becker? Constatação: somos devedores integrais dos gigantes do século XIX e XX, caso contrário, somos meros contadores de histórias.

O – X – O

O idealismo radical é a loucura da Razão: aqui estamos a mercê de uma realidade que somente existe em nossa imaginação, somos o sonho de um Deus, e nele, sonhamos que sonhamos. Há a relação necessária com o instigante universo imaginário criado em Matrix, única e exclusivamente em nosso sonho conduzido e coletivo, onde sonhamos que estamos vivos. Há a semelhança com Maya, a deusa hindu, aquela que nos faz acreditar que estamos vivos e conscientes quando, na realidade, nada mais fazemos que sonhar.

O – X – O

Nada tão instigante quanto pegar um fato qualquer, que tenha repercussão, e observar como cada veículo de comunicação o trata de forma diferente. As diferenças são de estilo e conteúdo, e deixam entrever as raízes ocultas das diferentes motivações existentes no seu interior. Um mesmo fato, várias interpretações: as ingênuas, as manipuladas, as tecnicamente absurdas, as cansadas, as óbvias, cada uma delas um indicativo acerca de quem a fez, uma assinatura, um estilo, uma personalização de quem por ela é responsável.