sábado, 11 de junho de 2011

MANUEL SEVERO, "O CORPO E A ALMA" DO CARIRI CANGAÇO

Manuel Severo

Manuel Severo é um gentil-homem empreendedor de alto nível. Do nada, à custa de disciplina e talento, criou esse evento acerca do Cangaço, Coronelismo e Misticismo, que é referência no Brasil. Este ano, em Setembro, estaremos todos juntos lá, no Cariri, sob sua batuta.
Ao blog, gentilmente, Severo concedeu esta entrevista: 

Blog: tudo pronto para o Cariri Cangaço deste ano? Quando será, quantos palestrantes, os temas...


Severo: Na verdade, o Cariri Cangaço não pára, é encerrando uma edição e já começando a formatar e preparar a próxima; entretanto, para um evento desta natureza e com abrangência e capilaridade que ele acabou assumindo, temos dedicado, neste último mês, mais atenção à finalização de sua programação.

 Este ano o Cariri Cangaço terá como sub tema “Da Insurreição a Sedição”, trazendo para nossos convidados dois episódios marcantes da história de nosso Cariri: a Insurreição de 1817, onde irão despontar personagens como Bárbara de Alencar, Martiniano de Alencar e Tristão Gonçalves, e a Sedição de Juazeiro, quando Padre Cícero e Floro Bartolomeu se levanta contra o governo de Franco Rabelo, protagonizando um dos épicos da história de nosso Ceará.

 Teremos 16 Conferências seguidas de Mesa de Debates, com temáticas versando não apenas acerca do Cangaço, mas temas nordestinos, passando pelo Messianismo, Coronéis, Arte, Música, Fotografia, Cinema, dentre outros.



Blog: Quantos municípios estão envolvidos no evento? O Estado participa?


Severo: o evento que iniciou com quatro municípios, Crato, Juazeiro do Norte, Barbalha e Missão Velha, agora conta com mais três importantes cidades: Aurora, Barro e Porteiras, cenários também de importância ímpar dentro do contexto do ciclo do cangaço do inicio do século passado.

 O governo do estado do Ceará ainda não confirmou sua participação, mas não temos dúvidas que teremos o apoio do senhor secretário da cultura, Professor Pinheiro e do senhor governador Cid Gomes.


Blog: Qual a previsão de público?


Severo: Já temos a confirmação de 118 pesquisadores e escritores de todo o Brasil. Serão representações de 14 estados da federação, além de um público participante nas sete cidades anfitriãs, de cerca de 1.300 pessoas, entre estudantes, professores, curiosos, público em geral.


Blog: abra o jogo e diga quais os maiores problemas que vc enfrenta para montar um evento dessa natureza!


Severo: sem dúvidas, e não é privilégio do Cariri Cangaço, o maior problema é a questão financeira, pois o evento exige uma infra-estrutura muito pesada, em todos os sentidos, só para os amigos terem uma idéia, no ano passado acolheu com hospedagem, alimentação e transporte, 104 personalidades do universo da pesquisa de temas nordestinos; ainda temos toda parte de mídia, de infra-estrutura dos espaços, enfim, o custo é considerável, e este ano já temos confirmados 118 convidados especiais. Considerando essa questão como a primordial, o resto fica por conta do empenho e dedicação de uma equipe formada por mais de 120 profissionais de todos os municípios, universidade, institutos culturais, enfim, que é a alma do Cariri Cangaço.


Blog: ainda há muita coisa a ser conhecida em relação ao Cangaço, em termos de fatos, ou o tema já se esgotou?


Não vejo o Cangaço como um tema estático ou mesmo esgotado em suas possibilidades de pesquisa, entendimento e ou aprofundamento. A enorme influência que o fenômeno acabou determinando às sociedades rurais em sua área de atuação e hoje difundidas na música, na poesia, na estética, na arte, na culinária, na medicina sertaneja, no entendimento da relação do homem com seu habitat, enfim, nos remetem a um universo inesgotável, inclusive vindo agregar ainda mais valor ao trabalho dedicado desses grandes vaqueiros da história, pesquisadores, memorialistas, escritores... Por isso não vejo o cangaço como algo que já não tenha o que comentar, estudar, discutir.

Blog: em termos de avanço no estudo do Cangaço, o que vc pode apontar de novo?


Justamente o que nosso amigo Honório de Medeiros provoca, rsrsrsrs: a Nova Onda do Cangaço; com um olhar diferenciado, analítico e sem preconceitos, contando com a participação das academias, dos centros culturais, das sociedades literárias, enfim; o que vejo de novo nesta seara do estudo e pesquisa do tema é justamente esse novo viés, ou seja, a partir das várias áreas do conhecimento humano, se criar um ambiente favorável para se entender melhor esse que foi sem dúvidas um dos mais marcantes episódios de nosso sertão.

Ao final é deixar um grande abraço e convidar a todos para nos dá o prazer de compartilhar conosco momentos inesquecíveis em nosso Cariri Cangaço 2011, entre os dias 20 e 25 de setembro, no Cariri do Brasil.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

UM BANCO DE IDÉIAS DO SERVIDOR PÚBLICO



Honório de Medeiros

                   Quando aceitei o convite do governo passado (Wilma de Faria) para ser Secretário de Estado da Administração e dos Recursos Humanos, uma das primeiras questões à qual nós nos propusemos foi o que fazer com o imenso capital humano composto pela massa de servidores públicos estadual até então totalmente inaproveitado.

 Nós sabíamos que era necessário, possível e desejável fazer algo com esse capital humano que alavancasse não somente a carreira do servidor público, mas, também, significasse uma forte presença do Governo na sociedade, evidentemente a médio e longo prazo, no que diz respeito à qualidade do serviço prestado pelos órgãos que o compõem.

                   De um lado tínhamos aproximadamente 100.000 servidores cuja potencialidade era plenamente desconhecida, aos quais vinha sendo negado, desde há muito, até mesmo o mínimo, ou seja, um Plano de Cargos e Remuneração. Do outro, uma sociedade que demandava serviços até então prestados de forma precária, quando não equivocada, em virtude do inexpressivo investimento em recursos humanos feitos pelos governos que nos antecederam.

                   Apresentei, na primeira reunião do secretariado, o esboço de um projeto denominado “Banco de Idéias”, a ser desenvolvido e gerido pela Secretaria de Administração e Recursos Humanos.

 Consistia no seguinte: os servidores públicos seriam estimulados a se cadastrarem em um ambiente virtual apresentando todo seu potencial informal, em termos de idéias e currículo, até então ignorado pela Administração Pública.

Por exemplo, na nossa própria Secretaria existia um ASG com doutorado em Tecnologia da Alimentação. Apareceriam, assim, especialistas, pós-graduados, graduados em áreas distintas daquelas nas quais eles trabalhavam. Apareceriam idéias importantes em relação à gestão pública estadual que permaneciam desconhecidas por não encontrarem interlocutores apropriados.

                   Constituído o Banco ele seria colocado à disposição, em ambiente virtual, dos gestores do Estado, através de um moderno sistema de busca.

 Caso um Secretário de Agricultura precisasse de algum especialista em “Tecnologia da Alimentação” digitaria esses termos e a ficha cadastral do ASG da Secretaria de Administração apareceria na sua frente. O Secretário de Agricultura nomearia o ASG para um cargo em comissão bem remunerado de uma reserva criada exatamente para ser preenchida em situações específicas iguais a essa, ou obteria sua cessão e lhe atribuiria uma gratificação apropriada, e o seu problema estaria resolvido sem que fosse necessário importar “consultoria” de fora.

Caso o Secretário necessitasse de idéias acerca de um problema qualquer, o acervo do Banco também lhe seria extremamente útil – ele disporia de uma consultoria de alto nível, potencializada pela experiência de quem vive a Administração Pública Estadual.

                   Esse Banco funcionaria em uma Escola de Gestão cujo programa resultaria da capacitação em torno da demanda do Governo. Essa demanda: o quê precisamos, quanto, quando, onde e por que, nortearia uma política de recursos humanos em termos de treinamento de servidores para ser possível, em um prazo de tempo razoavelmente curto no que tange às políticas públicas, darmos um salto de qualidade em termos de gestão administrativa.

                   O espaço é curto para maiores exposições acerca do Banco de Idéias do Servidor Público. Do ponto de vista estratégico, entretanto, é possível oferecer a noção daquilo que está envolvido no programa/projeto: aproveitar o potencial oculto e inerte de 100.000 servidores que perplexos, vêem o tempo passar e não conseguem crescer enquanto profissionais nem têm a oportunidade de se colocar, concretamente, a serviço do seu Estado.


quinta-feira, 9 de junho de 2011

ENTREVISTA COM MANUEL SEVERO SAI SÁBADO


MANUEL SEVERO, O IDEALIZADOR E CURADOR DO "CARIRI CANGAÇO", FOI ENTREVISTADO POR ESTE BLOG.

SAIBA, ENTRE OUTRAS COISAS, COMO SERÁ ESSE GRANDIOSO EVENTO NACIONAL EM 2011.

E O QUE PENSA SEU CURADOR, HOJE, ACERCA DE COMO SE DISCUTE O CANGAÇO.

XIII FÓRUM DO CANGAÇO EM MOSSORÓ, RIO GRANDE DO NORTE

XIII Fórum do Cangaço

Tema: A arte comanda o cangaço

Mossoró/RN

13 a 16 de junho de 2011

Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN

OBS: As atividades foram transferidas para a Universidade Federal Rural do Semi-Árido - UFERSA

Local: Auditório Amâncio Ramalho – Auditório da Reitoria


Informações e inscrições:
Museu Municipal Lauro da Escóssia
Fone: 3315-4778

Horário: 07h00 as 11h00 e 14h00 as 17:00





"DISCURSO SOBRE A SERVIDÃO VOLUNTÁRIA", POR LA BOÉTIE

La Boétie


Honório de Medeiros

                   Leiam isso: “Aqueles a quem o povo deu o poder deveriam ser mais suportáveis; e sê-lo-iam, a meu ver, se, desde o momento em se vêem colocados em altos postos e tomando o gosto à chamada grandeza, não decidissem ocupa-lo para todo o sempre. O que geralmente acontece é tudo fazerem para transmitirem aos filhos o poder que o povo lhes concedeu. Ora, tão depressa tomam essa decisão, por estranho que pareçam, ultrapassam em vício e até em crueldade os outros tiranos; para conservarem a nova tirania, não acham melhor meio que aumentar a servidão, afastando tanto dos súditos a idéia de liberdade que estes, tendo embora a memória fresca, começam a esquecer-se dela”.

                   E isso: “Os teatros, os jogos, as farsas, os espetáculos, (...) as medalhas, os quadros e outras bugigangas eram para os povos antigos engodos da servidão, o preço da liberdade que perdiam, as ferramentas da tirania”.

                   Parece recente? Não o é. Trata-se, tanto um quanto o outro, de excertos da excepcional obra “Discurso Sobre a Servidão Voluntária”, de La Boétie, escrita entre 1546-1548. Esse francês, nascido em 1º de novembro de 1530, no condado de Périgord, França, e morto em 1563, perto de Bordéus, aos trinta e três anos, foi o maior dos amigos de Montaigne, que lhe era mais novo dois anos. Dessa amizade o próprio Montaigne deixou registro emocionante: “Vindo a durar tão pouco e tendo começado tão tarde, pois éramos ambos homens feitos e ele mais velho do que eu alguns anos, não tínhamos tempo a perder, nem tivemos de nos ater aos modelos de amizade moles e regulares que necessitam de precauções e conversações prévias”.

                   Quanto à genialidade de La Boétie é bastante o depoimento do seu tradutor, o português Manuel João Gomes na edição Antígona, de Lisboa, Portugal, 1997: “Para La Boétie é ilegítimo o poder que um só homem exerce sobre os outros; (...) O Discurso afirma a liberdade e a igualdade absolutas de todos os homens; Indo mais longe do que Maquiavel (o primeiro que reconheceu o poder efetivo das massas), La Boétie incita os povos a desobedecerem aos príncipes (governantes) e, com uma clareza até então nunca vista, põe em evidência a força da opinião pública”. Tudo isso aos dezoito anos de idade!

                   Ler La Boétie é, principalmente, perceber quão antiga permanece a luta do homem para não ser completamente subjugado pelo Estado. Ela começou na longínqua Idade Antiga, quando os maravilhosos gregos inventaram a Democracia. Prossegue até hoje, apesar dos percalços. Mas está cada dia mais difícil: no Oriente Médio disputa-se o poder à custa do sangue de inocentes. Israel, secundado pelos Estados Unidos e sua doutrina da “guerra preventiva”, mata, como os nazistas faziam aos serem atacados pela resistência, a dez por um. E assim vamos marchando rumo à barbárie, inexoravelmente, e à tirania, sob o pretexto de combater o terrorismo, como quem está com um encontro marcado com o final de tudo.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

MASSILON SE CHAMAVA MASSILON?


Massilon

Honório de Medeiros


“Benevides”, “Massilon” ou “Massilon Leite”, assim o denominou Raul Fernandes[1]. “Benevides”, “Massilon Leite”, mas também “Massilon Diógenes”, em Raimundo Nonato[2]. “Massilon Leite”, o “Benevides”, para Frederico Pernambucano de Mello[3]. “Antônio Leite”, depois “Massilon”, segundo Hilário Lucetti e Magérbio de Lucena[4].

Qual era o verdadeiro nome de Massilon?

Tomado pela curiosidade digitei “Massilon” no “Google”. Surgiram muitas menções. Nenhuma alusiva ao cangaceiro. Uma delas chamou minha atenção: Jean Baptiste Massillon, 1663-1742. Sacerdote católico, nasceu em Hyères a 24 de junho de 1663. Inicialmente foi encaminhado para a área do direito, revelando-se, contudo, sua vocação para o sacerdócio. Ordenou-se padre e como excelente orador, ensinou retórica em colégios do sul da França. Foi em 1691 que se tornou famoso, após proceder a oração fúnebre do arcebispo de Vienne e dois anos depois do arcebispo de Lyon. Foi para um mosteiro, objetivando ali viver. Mas, em 1696 foi chamado a Paris para dirigir o Seminário de Saint Magloire. Foi pregador do Advento na corte em 1699 e das Quaresmas de 1701 e 1704, consolidando ainda mais sua fama de orador. Em 1709 ele profere a oração fúnebre do príncipe de Conti, em 1711 a do Grande Delfim. Em 1714, a de Luís XIV. Nomeado bispo de Clermont, em Auvergne, três anos depois, haveria de proferir célebres sermões perante Luís XV. Posteriormente, tais sermões seriam reunidos para compor a obra Pequena Quaresma.

Em 1719 a Academia Francesa o recebe. Daí, até o dia da sua morte, em Beauregard a 18 de setembro de 1742 ele não mais sairia de sua diocese. Representante clássico do moralismo, seus sermões foram muito apreciados por Voltaire e outros iluministas, como modelos de estilo e pela ausência de religiosidade dogmática.

Não custa nada imaginar um sacerdote, talvez europeu, talvez não, mas conhecedor dos sermões de Massilon, o francês, sugerindo aos pais batizar seu primogênito com o nome do grande orador sacro. Aliás, quando em Patos, em busca das origens do cangaceiro, fiquei espantado: no livro de registro civil no qual constavam os nascimentos abrangendo o período que começava em 1880 e ia até 1920, havia quatro Massilons! Nenhum, entretanto, era o nosso, por que os nomes dos seus pais não batiam com os nomes dos pais de Massilon Leite.

Em Julho de 2006, quando da última visita à Dna. Maria do Céu Leite, filha de Anézio Leite, irmão caçula de Massilon, conheci Luciano Pinheiro, idealizador e “tocador” da Rádio Mandacaru, em Luis Gomes. Fomos procurá-lo por ser ele amigo do jornalista Franklin Jorge, que me acompanhava naquele momento, desde outra época. Contei-lhe acerca da minha busca. Ele me disse que no Fórum de Luis Gomes existia o inventário por morte do pai de Massilon. Luciano se deparara com o inventário ao arrumar os processos do Fórum quando era estagiário. Não acreditei. Pedi a Luciano que me arranjasse o mais rápido que pudesse uma cópia, se possível em ambiente virtual. E ele me arranjou. No inventário, na página 3, está a relação dos irmãos de Massilon, segundo declaração da inventariante, sua mãe. Massilon, não, MACILON LEITE DE OLIVEIRA.

Mesmo assim, não há por que não continuar chamando-o de Massilon. Inclusive por que não há como saber se, na realidade, o Escrivão não se enganou na hora de escrever o nome do filho mais velho do inventariado. Por esta e em respeito à história, continuemos com Massilon, embora sabendo que seu nome completo e verdadeiro era MACILON LEITE DE OLIVEIRA. 





[1] “A Marcha de Lampião”; FERNANDES, Raul; 2ª. Edição; Editora Universitária; Natal, Rn., 1982.




[2] “LAMPIÃO EM MOSSORÓ”; NONATO, Raimundo; 6a. Edição; Fundação Vingt-Um Rosado; Coleção Mossoroense; Série “C”; V. 1489; Mossoró, Rn.




[3] “GUERREIROS DO SOL”; MELLO, Frederico Pernambucano de; 2a. edição; A Girafa; 2004; São Paulo, SP.




[4] “LAMPIÃO E O ESTADO MAIOR DO CANGAÇO”; LUCETTI, Hilário e LUCENA, Magérbio de; 2a. edição; Gráfica Encaixe; Fortaleza, Ceará.

terça-feira, 7 de junho de 2011

POLÍTICA

Madeleine Stowe
newbesthairstyles.com

"Política é uma ilusão, talvez uma das mais absorventes, quando se é jovem, para preencher o vácuo de nossa alma, o silêncio que assustava Pascal, que todos podemos ouvir se cessarmos alguns minutos de bugiar nossas paixões. Prefiro preenchê-lo com música, pintura e Madeleine Stowe, quem me dera..."

Paulo Francis, Jornal "O Globo", março de 1994

segunda-feira, 6 de junho de 2011

EM "DOUTOR PASAVENTO", DE ENRIQUE VILA-MATAS

Robert Walser


"Em Walser, o discreto príncipe da seção angélica dos escritores, eu pensava com freqüência. E já fazia anos que ele era meu herói moral. Admirava a extrema repugnância que lhe causava todo tipo de poder e sua precoce renúncia a qualquer esperança de sucesso, de grandeza. Admirava a sua singular determinação de querer ser como todo mundo quando na realidade não podia ser igual a ninguém, porque não desejava ser ninguém, e isso era algo que sem dúvida lhe dificultava ainda mais o desejo de ser como todo mundo. Admirava e invejava sua caligrafia, que no último período de sua atividade literária (quando se entregou àqueles textos em letra minúscula conhecidos como microgramas), foi se tornando cada vez menor e o levou a substituir o traço da pena pelo do lápis, porque sentia que este se encontrava 'mais perto da desaparição, do eclipse'. Admirava e invejava seu lento mas firme deslizamento em direção ao silêncio. O escritor mexicano Christopher Domínguez Michael chegou a dizer que em meus livros a aparição rotineira de Robert Walser era tão necessária como a de Sandokan no ciclo salgariano."

Enrique Vila-Matas, "Doutor Pasavento"  

domingo, 5 de junho de 2011

O TÉDIO

home.meninasonly.com.br


Honório de Medeiros

Ah!, o tédio. É insidiosa essa reclamação, idêntica, em sua onipresença, àquela fulva neblina da qual falou Elliot, em "A Canção de Amor de J. Alfred Prufrock".

"Taedium Vitae", diziam os romanos. Aliás, os mais belos textos oriundos daquela época, são os de Sêneca, Lúcio Aneu Sêneca, um estóico de carteirinha. Em "Consolação à Minha Mãe Hélvia", ou "Apocoloquintosis", são vertidos, em melancólica linguagem, conselhos para superarmos a dor da existência, à custo de desprezo.

Curiosamente esse estoicismo, defendido por Sêneca, e iniciado por Zenão, o Grego, sob distintas roupagens, floresceu mais ou menos na mesma época, em diferentes regiões da terra sem que, aparentemente, houvesse elos entre elas. Temos a Hélade, onde surgiu no Ocidente, Roma, séculos depois, a Índia, com o Budismo, e a China, com o Taoísmo. Existiria uma raiz comum?

Um pouco mais recentemente - quando o romantismo assumia contornos lúgubres - talvez chamássemos o tédio de "inquietude d'alma". Assim mesmo, com apóstrofe e tudo. Esse tédio era decorrente de uma angústia filosófica - o homem queria saber qual o sentido da vida, para onde caminharia a humanidade, etc...

Hoje, a realidade é outra. O senso prático predomina. Na aldeia global, altamente informatizada, no mundo formigueiro, esse tédio é algo a ser combatido por terapeutas, psicólogos ou coisa que os valha, imediatamente, se afetar o processo de adaptação social. Lógico. O sistema não quer pessoas questionando o sentido de tudo que o cerca. Ele os quer trabalhando, produzindo. Em outro nível, o superficial, falar-se em tédio, é quase um cumprimento, contanto que essa afirmação seja dita assim, mais ou menos, como quem diz, languidamente, estar com preguiça.

Ora, o tédio, também hoje, é para os fartos. Aqueles que não o são sequer têm direito a isso - a luta pela sobrevivência não lhes permite. Dessa forma ele é, digamos, uma conseqüência do bem-estar - entediam-se apenas os que podem.
Quem quer que ouse afirmar que esse tédio é decorrência de outra coisa que não a ausência de dinheiro no bolso e um bom lazer será visto de soslaio. Haverá, dependendo da platéia, certo interesse cauteloso, mas não passará disso. Afinal, quem se entedia em Manhattan, Paris, Rio de Janeiro? Se a ousadia for além, e enumerarmos as causas que levam os homens a se entediar, como por exemplo, o ócio, abre-se a porta para o constrangimento.

Ernst Becker escreveu um livro chamado "A Negação da Morte", que até lhe deu o prêmio Pulitzer, no qual ele analisa o impulso psicológico primordial no homem. Tal impulso seria oriundo do medo da morte. Freud não tinha razão, segundo ele, quando apostava todas suas fichas no complexo de Édipo. Mas Otto Rank, que foi um seu discípulo não tão badalado, sim. E, para ele, o homem é um grande mentiroso - todas as suas lutas são ambições de imortalidade, tenham sido elas grandes ou pequenas.

 Ou seja, por exemplo, o desejo de procriar, ter filhos, nada mais é que uma aposta - perdida - contra a morte.

Becker foi mais além. Pegou o pensamento de Sorëen Kiekergaard e lhe extraiu a essência. Para Kiekergaard tudo isso que Rank disse é mais que verdade (lógico que não foram contemporâneos; este antecedeu aquele), embora visto dentro de uma perspectiva mística, ou seja, a única realidade neste mundo de ilusão seria a morte, companheira do homem desde seu nascimento e, a forma de enfrentá-la, criar um caminho para Deus.
Pois bem, no final sobrou algo assim: Becker acha que o impulso primordial psíquico do homem é originado pelo seu temor à morte; esse temor o leva a construir uma mentira vital para si - empreender uma ambiciosa história pessoal em busca da imortalidade seja qual seja ela (carreira política, etc.); mas o que conta, realmente, é a consciência do ato criador: criar é á única forma de transcender os limites da morte. Alguns têm consciência disso; outros, não.

Dentro de outro contexto, essa opção por criar é, talvez, a resposta inteligente para combater o tédio. Explica-se, assim, a razão de profissionais bem sucedidos, mas nauseados com a máquina de moer gente que é a luta pela sobrevivência, largarem tudo e começarem outra vida, mais conforme com essa ansiedade íntima de criar algo, ao invés de continuarem sendo mero instrumento dos projetos de imortalidade dos outros.

Observe-se que muitas pessoas recusam-se a pensar acerca desse assunto. Embriagam-se de trabalho, sexo, drogas, qualquer outra coisa, mecanicamente. Fogem. Pensar faz sofrer... O lema é "vamos tocando a vida, vivendo seus bons momentos, e deixando o resto para lá". E pronto. Aceitam constatar que o tempo passa e destrói os sonhos mais íntimos, mas é isso mesmo, acontece com todos.

Talvez haja certa lógica nessa postura. Afinal, como dito acima, desde há muito o homem pondera, mede e aquilata o tédio e nada. Talvez faça parte da condição humana, dizem eles e, como tal, não tem jeito.

O certo é que há muitos tédios. E só há um. Ou seja, cada qual com seu tipo de sapato, embora todos o usem. E, parece, no final das contas que ele é um instante que pode ou não durar muito. Até neste caso o tempo é relativo. Mas sendo ou não de curta duração, somente surge pela falta de algo: satisfação com a vida que se está vivendo, embora a mesma esteja sendo, digamos, confortável.

Mas, qualquer que seja o tédio, desde Hesíodo e seu "Os Trabalhos e os Dias", a receita para combatê-lo, a mais simples, é o trabalho. De preferência criativo. Isso, desde que não se siga a Bíblia ao pé da letra. Por que está lá, no Eclesiastes: "Que vantagem tem o homem, de todo o seu trabalho, que ele faz debaixo do sol?" (1,3).                                                                     


sábado, 4 de junho de 2011

CARLOS SANTOS, O "REBELDE COM CAUSA"

Carlos Santos por Ricardo Lopes

Jornalista experiente, escritor, Carlos Santos firmou seu nome como sinônimo de estilo, profundidade e independência em seus textos. Atualmente seu blog, o www.blogdocarlossantos.com.br, é referência no Estado, e, até mesmo fora dele, em Política e áreas afins. A este blog, gentilmente, o "rebelde com causa" de Mossoró concedeu a entrevista abaixo:

Blog: Vc foi, até prova em contrário, o primeiro jornalista do Rn a apontar equívocos no início da gestão da Governadora Rosalba Ciarlini. A que vc atribui esses equívocos?

Carlos: Mais do que uma crise financeira, há uma crise de método, de mentalidade. Rosalba e seu grupo implementaram um conceito de relação, com os administrados, com base no que imprimiram na Prefeitura de Mossoró, plasmado numa visão unilateral. Aos poucos, eles percebem que "o Estado não é a Prefeitura de Mossoró e o RN não é Mossoró".

Blog: Quais os principais equívocos cometidos pela Gestão Rosalba Ciarlini nestes primeiros meses de Governo?

Carlos: Como disse há pouco, é de método, de mentalidade. A governadora já cometeu vários deslizes verbais que passariam despercebidos em Mossoró, mas não em Natal e no comando do Estado. Afirmou que o Estado estava quebrado e autorizou liberação de recurso para Carnaval e times de futebol; disse que não tinha nada com fechamento do Meios e depois saiu remendando financeiramente essa ONG; declarou que a violência urbana em Mossoró era culpa do Presídio Federal e em seguida mandou uma força militar passar alguns dias na cidade, só para se exibir nas ruas, sem que a violência fosse estancada. Para completar, escalou o culto e inteligente Paulo de Tarso Fernandes, secretário de Gabinete, para negociar com grevistas, mas gerando provocações e vilipêndios. Precisa descer dos "saltos". O Estado não é a Prefeitura de Mossoró. Simples assim. 

Blog: Do quê se leu na mídia no final do Governo passado e início deste qual a sua opinião: o Estado está quebrado ou está fazendo caixa?

Carlos: Balela. Já assistimos esse filme antes. Claro que o Governo faz caixa. É o mesmo álibi empregado na Prefeitura de Mossoró, em que a folha de pessoal sempre respondeu por custo ínfimo, longe de causar ameaça à estabilidade gerencial. Faz parte de nossa cultura política esse discurso, de satanização do antecessor-adversário, para parecer que a tarefa à mão é uma obra hercúlea. Wilma de Faria fez isso. Lembra? Em quatro anos, Rosalba deverá movimentar mais de R$ 45 bilhões e choraminga por um "rombo" que hoje não ultrapassaria R$ 800 milhões. Cadê a crise? Cadê o rombo? Ela tem coragem de convocar os outros poderes  para uma verdadeira reforma de estado, em vez de promover a asfixia salarial dos "barnabés"? Não creio. O Estado continuará sendo um Robin-hood pelo avesso, tirando dos mais carentes para servir a uma minoria privilegiada.

Blog: Quem realmente influi nas decisões da Governadora e por quê? 

A cabeça pensante, a visão ideológica de poder e gerencial, é Carlos Augusto Rosado, marido da governadora. Sempre foi assim, não será diferente agora. "É o cara", digamos. Mas ele ouve muito Paulo de Tarso, além de confiar sobremodo em dois técnicos capazes, Obery Júnior (Planejamento) e Kátia Pinto (Infra-estrutura). Contudo nada acontece sem seu aval. Ele é responsável pelo ousado projeto de poder que catapultou Rosalba à Governadoria. Resta saber se tinha também um plano de governo. Por enquanto, os primeiros sinais indicam que não.  

Blog: Vc acredita na possibilidade de um bom Governo Rosalba Ciarlini?  

Carlos: Repito o que disse após as eleições do ano passado e ratifiquei várias vezes em meu blog - www.blogdocarlossantos.com.br - sem qualquer ranço de má vontade, mas assinalando uma visão com base em elementos históricos e políticos: Rosalba caminha para fazer um bom governo, mas convencional, sem inventividade ou ousadia, como aconteceu em três passagens pela Prefeitura de Mossoró. Estamos longe de experimentar o que gestões como de Aluízio Alves e Cortez Pereira esboçaram para o Rio Grande do Norte. Depois deles tivemos muito "feijão com arroz" ou nem uma coisa nem outra. Lembro o genial paraibano José Américo: "Há uma miséria maior do que morrer de fome no deserto: é não ter o que comer na terra de Canaã". O RN.  

sexta-feira, 3 de junho de 2011

EFICIÊNCIA NA GESTÃO PÚBLICA

progestaoead.wordpress.com

Honório de Medeiros


                   Alguns anos atrás o Fórum Nacional da Previdência debateu os problemas da Previdência Nacional. E uma das propostas debatidas consta de um relatório elaborado por Vicente Falconi, do Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG), de Minas Gerais, o mesmo que foi responsável, entre 2002-2006, pelo choque de gestão pelo qual passou o Governo de Minas e que culminou em zerar o déficit orçamentário, que era de 2,3 bilhões de reais, originando um saldo para investimentos de mais de três bilhões.

                   Há algo de original, quanto à gestão pública, na “doutrina” Falconi? Não. Na verdade Falconi resgata, para o setor público, o conceito “PDCA” (Planejar, Desenvolver, Checar e Agir) desenvolvido no Japão, mas criado nos EUA na década de 20, para a iniciativa privada. Agregue-se ao PDCA, mais especificamente no P, de Planejar, os famosos “o que, por que, como e quando”, que a sopinha de letras está completa e o planejamento estratégico, pelo menos no papel, aparece perfeito.

                   Na verdade, conforme a própria literatura acerca de gestão pública aponta, o grande problema está no “Checar”. Tradicionalmente as administrações públicas relegam, quando existe algum planejamento – e o mais das vezes os governos começam sem nenhum – a atividade de checar e padronizar, se tudo estiver correndo bem, ou checar e corrigir, se algo não estiver dando certo. E relegam graças a uma série de componentes dentre os quais avulta, pela importância, o despreparo e a falta de compromisso com aquilo para o qual foram conduzidos pelo voto popular.

                   Não há checagem, por que não é dado prazo para o alcance da meta. Não é dado prazo por que não há decisão política de cobrar resultados quando ele termina. Pior: mesmo que houvesse prazos, o mau gestor não seria punido, vez que a razão principal de sua presença no “staff” decorre de conchavos políticos ou premiação espúria por conduta partidária. Não há acompanhamento rígido do planejamento estabelecido por que os compromissos políticos dobram as necessidades administrativas e todo o planejamento – quando o há – rui por terra já no primeiro ano de administração.

                   Então podemos creditar o sucesso do choque de gestão em Minas Gerais à decisão política do Governador de implementá-la, contra tudo e contra todos. Acredito plenamente que deve ter importado sobremaneira a capacidade de Falconi no sentido de convencer o Governado de que era possível alcançar as metas estabelecidas se houvesse respaldo às ações a serem desenvolvidas. Caso contrario teríamos mais uma boa intenção condenada. E o inferno, dizem, está cheio de boas intenções.
                  
                   O respaldo ao qual aludo acima é, principalmente, no sentido de punir todos quanto não estejam plenamente integrados ao planejamento. Se a checagem mostra que a meta não foi alcançada e isso não aconteceu por falta de competência ou interesse então o gestor intermediário, ou seja, o responsável terá que se afastado imediatamente sob pena de comprometer o esforço total. Esse elo da engrenagem que não funciona é como uma célula cancerosa: se não for destruída imediatamente vai originar uma metástase no futuro.

                   Portanto não há segredo. O problema é político. Embora seja necessário ressaltar: a tarefa de criar e conduzir esse processo demanda um “know-how” que não é para qualquer um. Existem ingredientes para além da “sopinha de letras” que somente são detectados, analisados e integrados por quem é do ramo: tem vocação, talento e disciplina.